Literatura e representações da Amazônia na França
p. 163-177
Texte intégral
1Em 1987, com apenas algumas semanas de intervalo, foram publicados dois romances franceses levando a Amazônia à cena1. Em 18 de maio de 1988, dois filmes entravam em cartaz em paris: «Eldorado», do diretor espanhol Carlos Saura, nova versâo de «Aguirre ou a Cólera de deus», de Werner Herzog, e «Yellow Dream» («O Inferno Verde»), filme ítalo-colombiano de Antonio Climati. O que provaria, se fosse preciso, a importância do lugar ocupado pela região no nosso imaginário. Entretanto, seria um erro pensar que foi sempre assim. Introduzida em nossa literatura mais ou menos no fim do século XVIII, esta região era, antes, objeto de textos mais ou menos fantasiosos, narrações de viagens ou testemunhos; nada, porém, que a tomasse como motivo literário propriamente dito, como aconteceu, por exemplo, com o Oriente.
2Ao longo de sua história, em vários períodos dissociada politicamente da história do Brasil Colónia, bem como dos textos que falam dele, a Amazônia estruturou-se como um espaço autônomo, Eldorado ou Paraíso perdido. A suposição da existência de uma tipologia uniforme da Amazônia seria, porém, um engano: meio hostil abrigando tesouros escondidos, natureza gigantesca e impenetrável da qual emana uma impressão de potência e fascinação... A leitura dos romances e relações de viagem sobre o assunto revela uma certa diversidade de tratamento. Dependendo dos autores, do gênero, e principalmente da época, que utilizam visões do mundo e estratégias próprias, a representação da Amazônia se modifica, sublinhando ora os aspectos paradisíacos, ora, ao contrário, a selvageria etimologicamente inerente à selva. Temos que proceder através de uma passagem pela história a fim de captar as causas dessas representações, sejam elas redutoras ou reveladoras.
3Resta, enfim, que a encenação de um espaço «real» numa obra de ficção levanta sempre a questão da relação entre os fatos e a transcrição que é feita deles. Muitos autores escrevem «sem sair de casa», bem inspirados ou não por leituras mais ou menos abundantes, que são, elas mesmas, mais ou menos bem-documentadas. Como analisar esta relação sem negar a especificidade da obra literária ou artística? Através De uma releitura dos textos de ficção publicados desde o século XIX, principalmente os de Bernardin de Saint-Pierre e de Jules Verne e de suas fontes, nós nos propomos aqui delinear pistas de leitura que levem em consideração essas advertências.
A amazônia maravilhosa
4Os primeiros textos que possuímos sobre a Amazônia, a maior parte de origem estrangeira, são ainda marcados pelo imaginário medieval, povoado por monstros pertencentes à geografia mítica dos séculos precedentes. A narração fundadora de toda esta literatura, escrita por Gaspar de Carvajal, crónica da primeira viagem no «rio-mar» dirigida em 1541 pelo espanhol Orellana, renova a lenda das Amazonas. Dentre os mitos que brotam ou eventualmente se prolongam, os da procura do Paraíso Terrestre, do País dourado2 ou da Terra prometida foram, durante muito tempo, associados à Amazônia. A maior parte persistirá pelo menos até o século XVIII: o padre de La Neuville menciona ainda em novembro de 1722, no «Journal de Trévoux»3 a «república de mulheres», que ele situa a cerca de 200 léguas da foz do rio, numa «ilhota muito bonita e muito fértil, que não mede mais do que três léguas de comprimento por duas de largura». Vinte e três anos mais tarde, La Condamine ainda acha que ele merece toda credibilidade, segundo diz, cientificamente provada, no seu relato de viagem4, redigido para a Academia.
5Do século XVI até o século XVIII, florescem então alguns textos curtos, valorizando o curioso e o espalhafatoso. A corrente barroca e os círculos preciosos retêm das lendas correntes, as que se inserem na sua estética: as pedras verdes, o país da Canela, etc. O poeta e epistológrafo Vincent Voiture, freqüentador do Hôtel de Rambouillet, faz alusão, em uma de suas cartas5, às virtudes terapêuticas, que ele diz ter ressentido, do que se tornaria a «muiraquitã» tão cara a Macunaíma. Porém teria existido realmente, o tempo todo e em todas as circunstâncias, uma fé cega nessas crenças?
6As narrações maravilhosas desse gênero não são as únicas a circular na época. Tal como transparece na carta do «Journal de Trévoux», havia quem duvidasse do que parecia uma fábula. Da mesma maneira, o autor da dissertação introduzindo a tradução francesa do texto de Cristóbal d’Acuña, publicada em 1682, mostra um grande ceticismo, seguindo o próprio cronista espanhol, a respeito do lago Parima e da cidade de Manoa, onde Eldorado foi situado pela lenda: «Será através de seus próprios autores (trata-se dos Espanhóis) que se provará que este pretenso lago de quatrocentas a quinhentas léguas de perímetro, estes reinados e estes povos são obras da imaginação ou da credulidade, e talvez da avareza dos Espanhóis»6.
7O fato de Humboldt provar concretamente a inexistência de tal lago, no começo do século XIX não impede o mito de Eldorado de propagar-se como construção imaginária, ideal ou compensadora, independentemente de qualquer convicção científica. Em «Candide», Voltaire já se servira dele, de maneira muito pessoal, para a história e as teses que defendia. Mais recentemente, alguns de seus elementos parecem «funcionar» ainda no apelo a uma nova conquista do Oeste, desta vez brasileira7.
8Voltando aos textos antigos, é preciso lembrar que as pessoas, na época, tinham necessidade de localizar-se geograficamente, adquirir conhecimentos sobre essas novas terras para avaliar o seu interesse e nelas sobreviverem. Esta é, provavelmente, uma das razões pelas quais o padre capuchinho português Cristóvão de Lisboa redige sua História dos Animais e Árvores do Maranhão (1624-1627). É ponto pacífico hoje em dia o reconhecimento de um certo valor etnográfico em textos de alguns missionários, como por exemplo os de Claude d’Abbeville. Tem-se também que levar em consideração o inevitável efeito de propaganda em autores cuja preocupação principal era defender uma obra de fé ou de implantação comercial8.
9Ora, o leitor da época nem sempre tem capacidade para separar a parte de observação e a de fantasia. Das abundantes compilações constam, freqüentemente, no mesmo piano, preocupação cientifica e tendência para a «singularidade». Entretanto, três séries de textos esboçam uma certa evolução: L’Histoire des Voyages, do Abade Prévost, Les Lettres Edifiantes, peças de um vasto conjunto constituído por narrativas de missionârios, e as narrativas dos navegantes.
10A respeito da obra do Abade Prévost, Michèle Duchet observa que as opções desta encomenda oficial correspondiam, quase sempre, à atualidade e que seu sucesso servia de incentivo a uma política de expansão9. Esta obra, «somando o divertimento à instrução», mais de um século antes das Voyages Extraordinaires, de Jules Verne, contribuiu para fazer das narrativas de viagem uma literatura de consumo corrente, esboçando ao mesmo tempo um trabalho crítico relativamente lúcido, o que permitiu a toda uma época reconhecer-se nela: «esclarecida quanto à sua evolução, implicada em seus interesses vitais», isto é, principalmente o feito colonial e suas conseqüências. As narrativas dos religiosos serão muito importantes sobretudo para a formação da sensibilidade de Bernardin de Saint-Pierre, aluno dos jesuítas. O entusiasmo suscitado por essas leituras será tal que pedirá ao pai autorização para tornar-se jesuíta também «visto estar absolutamente decidido a converter os povos selvagens»10. Finalmente, a multiplicação das circunavegações, por volta da metade do século XVIII (Cook, Bougainville, La Pérouse...) abre novos horizontes, modifica o estado dos conhecimentos e o campo das discussões filosóficas.
11Os Enciclopedistas interessam-se muito por essa literatura e pela abertura ao mundo que oferecia. No entanto, se é possível, com relação a Montaigne, pensar que ele deixara em aberto a comparação entre o Antigo e o Novo Mundos, os Enciclopedistas, ao contrário, a utilizaram, muitas vezes, exclusivamente num sentido único: as conclusões tiradas voltam-se para a Europa e seus problemas, servindo de prova para suas teses. Além do mais, como os Franceses estão mais empenhados no Norte que no Sul da América, a imagem de um Huroniano ou Iroquês será mais familiar aos homens do Século das Luzes que a de um Tupinambá – para não falar dos Bororós ou dos Nhambiquaras – isto apesar dos testemunhos deixados por Claude d’Abbeville e Yves d’Evreux. O imaginário vive das modas e interesses estratégicos do momento. Paradoxalmente, a ficção inventa pouco, e serve-se do que já é conhecido. Parece ser preciso esperar a repercussão parisiense das aventuras de Madame Godin des Odonais11 para que a Amazônia tenha acesso à condição de espaço ficcional. O Barão de Grimm comenta, em novembro de 1786, na correspondência literária, uma peça de Favart, filho, L’Heureux naufrage, que se desenrola onde vivem as Amazonas. E dos 39 volumes da coleção de Voyages Imaginaires, publicados em Amsterdam entre 1787 e 1789, dois retomam as aventuras do infeliz casal.
A amazônia utópica
12No começo do século XIX, mais precisamente entre 1800 e 1804, Bernardin de Saint-Pierre, considerado por muitos como o pai do exotismo romanesco, redige os «fragmentos» de um romance, L’Amazone. Apresentando-se como um diário, o texto mistura, de maneira espantosa, o imaginário a alusões autobiográficas. Fugindo do regime de terror que assola a França revolucionária, o narrador embarca, em Amsterdã, no «Europe», para uma viagem que será interrompida por uma série de catástrofes. Salvo, milagrosamente, graças ao fiel negro Samson e sua família, ele navega o Amazonas acima num barco a vela. Depois de encontrar selvagens, Será acolhido pelos fundadores de uma comunidade ideal, a «República dos Amigos».
13O que surpreende, imediatamente, nesses fragments de L’Amazone, é a dimensão utópica conferida por Bernardin de Saint-Pierre à região. No texto, o lugar é situado fora de espaços conhecidos: a narrativa estabelece uma clara distinção entre o Brasil e a Amazônia, territórios que nem se encontram nem se confundem. O léxico empregado sô raramente pertence a uma realidade local específica. Mesmo se menciona a «Précoracá» (isto é, a pororoca), cacaueiros, e papagaios, estes últimos coabitam sem problemas com rolas, camelos, limoeiros e faluchos. O cenário utiliza à vontade temas da tradicional paisagem mediterrânea, africana ou oriental.
14A Amazônia nunca é designada como tal na obra: ela, simplesmente, não tem nome. Apenas o rio serve para identificá-la. É apresentada como um universo secreto e fechado: os personagens chegam a ele após uma série de cataclismas – incêndio no barco, tempestade provocando naufrágio, macaréu – elos que a protegem e isolam, enquanto correntes e ventos empurram irresistivelmente rio acima. Os lugares atravessados revelam-se também fechados, quer se trate da floresta recoberta por uma «abóbada de verdura», «sombria», «só deixando ver massas de sombras espessas», ou a planície na qual se instalou a República dos Amigos, que oferecia um espaço mais aberto, porém cercado de montanhas cujo cume se perdia nas nuvens. O autor resume esta densidade numa frase, esclarecedora quanto às suas intenções: «A natureza escondeu-a num labirinto de escolhos para dissimulá-la das potências arbitrárias da Europa»12.
15As paisagens daí são encantadas. A natureza luxuriante autoriza uma abundância de superlativos, pelas suas árvores, «duas vezes mais altas que na Europa», por seus cipós imensos, pela beleza e harmonia que dela emanam. Nesse acordo perfeito entre a fauna e a flora, os cipós entrelaçam e unem as árvores entre eles; os animais «tão pouco ariscos», do cisne ao flamingo, são escolhidos pela serenidade e ornamento que proporcionam; os macacos olham os estranhos visitantes passarem sem medo, e dão gritos de alegria. Esse quadro idílico opõe se ao espaço primitivo e ameaçador que o precedeu: «Antigamente havia aqui apenas uma floresta repleta de tigres, serpentes e crocodilos»13. Estes animais devoradores (dos quais a piranha poderia ser, hoje em dia, uma sobrevivência) fazem parte da era dos canibais, e correspondem ao primeiro dos três estados pelos quais passam, segundo Bernardin de Saint-Pierre, quase todas as nações: estado de barbárie, de natureza e de corrupção.
16Os protagonistas do romance fazem parte de três grupos raciais: brancos, selvagens e negros. Os primeiros aparecem sob traços de malfeitores, de caçadores ávidos e destruidores: inscrevem-se no mundo corrupto. Os selvagens esses, distinguidos pelo autor em dois grupos: os que riem e os que choram, retomando, diz ele, a divisão feita pelo missionário jesuíta espanhol Gumilla, a respeito dos povos do Orenoco. Os que choram só aparecem uma vez na narrativa, de noite, sob um aspecto um tanto assustador. O narrador tem contatos mais freqüentes com os que riem, que passam o tempo todo rindo e dançando, efetivamente, de tal maneira que acaba censurando neles «esse excesso de alegria». Os Negros, finalmente, são representados principalmente pelo bom Samson e sua família. Verdadeira força da natureza, hábil e engenhoso, mas só preocupado com o presente, salvará diversas vezes da morte seu patrão e companheiro francês, que é um tanto passivo na narrativa. Chega-se à conclusão que nem os selvagens, na infância ainda, nem os Negros, povo imprevidente, podem, sozinhos, indicar o caminho da sociedade ideal. A história confiará esta missão essencialmente aos Europeus, aos atores da República dos Amigos, sociedade deísta e patriarcal que se dedicará a uma exploração racional das potencialidades do lugar. Estruturada simbolicamente em doze tribos reunidas em torno de uma pirâmide, regrupando em seu meio os homens de bem, salvos da corrupção – «um médico sueco, um construtor holandês, um engenheiro francês, dois filósofos ingleses, um espanhol salvo da inquisição, um brâmane hindu»12 – ela vai, entre os selvagens ignorantes, colher baunilha, anil-bravo, cacau, cultivar laranjeiras, bananeiras, construir usinas, casas, aeróstatos...
17Esse texto inscreve-se, de uma maneira evidente, numa tradição bastante bem enraizada na literatura européia e inaugurada por Thomas More. Quase três séculos depois da utopia escrita pelo humanista inglês, que situa sua «descoberta» numa ilha das Américas, a conjunção do rousseauísmo e das expedições científicas do Século das Luzes14 reativará este gênero literário, retomado particularmente por Restif de la Bretonne em La Découverte australe.
18Porém se fôr procurada uma especificidade ao espaço amazônico, ela é encontrada, resumida parcialmente, nessa observação mais geral de António Cândido: «Com efeito, a idéia de pais novo produz na literatura algumas atitudes fundamentais, derivadas da surpresa, do interesse pelo exótico, de um certo respeito pelo grandioso e da esperança quanto às possibilidades. A idéia de que a América constituía um lugar privilegiado se exprimiu em projeções utópicas [...]». O crítico brasileiro diz ainda que com os românticos, o céu americano «era mais azul, as nossas flores mais viçosas, a nossa paisagem mais inspiradora que a de outros lugares [...]»15.
19Aliás, a comparação entre L’Amazone e Paul et Virginie mostrará movimentos inversos. No romance «mauriciano» (de 1788), a história começa com um idílio iniciado na Ilha da França, lugar exótico e paradisíaco e, depois da volta à Europa, acaba antes de chegar às costas da ilha, com um infeliz naufrágio no qual perece Virginie. Em L’Amazone, ao contrário, a terra da felicidade é a de destino final, que só é descoberta na segunda parte da narrativa. Mesmo se o naufrágio tem nesse livro, de uma certa maneira, a mesma função de demarcação de espaços míticos, o desenlace é feliz. O território americano é portador de esperança: terra do porvir, lugar de projeção e, às vezes, de realizações dos desejos e fantasmas dos Europeus, o espaço do otimismo.
20Num texto que parece tradução de um texto americano, Alexandre Dumas, pai, fez a adaptação da primeira versão romanesca da utopia amazônica. Em Un pays inconnu16, seus personagens descobrem uma sociedade asteca no coração da floresta. Ali refugiada desde o século XVI para escapar ao massacre perpetrado pelos conquistadores espanhóis, ela reconstituiu-se completamente, protegida do mundo branco.
21Apesar de não ser especificamente amazônico, pois após algumas páginas descrevendo o trajeto através da floresta para chegar à aldeia, ele passa à descrição desta sociedade, este romance leva a duas observações.
22Evoca, outra vez, um universo fechado e secreto, comum às regiões mal-conhecidas. No entanto, apesar das múltiplas explorações de todos os recantos amazônicos, ou quase, esse tópico é ainda hoje muito ativo, tenha ele lógica ou não, inclusive na imprensa, que há apenas alguns anos, deu como manchete a descoberta dum tribo de Indios vivendo na «idade da pedra». Em 1912, Conan Doyle reutilizara-o em Lost Continent17, que narrava a fabulosa expedição de quatro Ingleses à procura, frutífera, de espécies animais da era secundária (pterodáctilos e dinossauros), consideradas desaparecidas. A terra do porvir só é do futuro porque, ao contrário da Europa, ainda não atravessou todas as etapas do desenvolvimento. Esta juventude do «Novo Mundo» legitima igualmente a tese defendida por Buffon e retomada por Hegel sobre a «imaturidade da natureza americana, cuja fauna sofreria uma certa degenerescência devida a uma interrupção do desenvolvimento»18.
23A segunda observação diz respeito ao lugar ocupado pelo tema amazônico na literatura francesa do século XIX. Na realidade, ao consultar a lista dos títulos publicados nessa época, recenseados por Chinard19, constata-se que a história hispano-americana, Peru e México principalmente, esta muito mais presente no conjunto das obras, talvez por ser mais rica em acontecimentos, em matéria cultural e de civilização – basta pensar nas lutas cruéis entre colonos e Índios, divulgadas pelos missionários. Já no século XVIII, a colonização espanhola fornecerá já vários temas dramáticos para a prosa e o teatro da época. Em 1747, as «Lettres d’une Péruvienne» lançaram uma moda, prosseguida pelas «Lettres illinoises, iroquoises» ou ainda «cherokeesiennes». No século XIX, as sociedades pré-colombianas permitem uma variação temática para o romance histórico romântico. Mas o contexto político também intervém, pois o México, por exemplo, interessa muito o Segundo Império. Assim, nada de espantoso que dentre as primeiras obras publicadas por Jules Verne se ache o título: Les Premiers Navires de la marine mexicaine (Os primeiros navios da marinha mexicana) (1850).
24No entanto, o enfoque científico, as revoluções políticas, as agitações internacionais renovarão a curiosidade e a maneira de ver a Amazônia. Durante a segunda metade do século XIX, ela tornou-se objeto de cobiça econômica e comercial. A borracha desperta o interesse e a cobiça das nações industriais. As informações científicas sobre a região tornam-se, inclusive, mais exatas. A partir do final do século XVIII, Portugal começa a autorizar, pouco a pouco, a realização de expedições científicas. Tinha havido a «viagem filosófica» de Alexandre Rodrigues Ferreira, entre 1783 e 1792. Verdadeiro compêndio enciclopédico, seus trabalhos são ainda hoje muito mal conhecidos, apesar da utilização que parece ter feito deles Geoffroy de Saint-Hilaire. Na confluência dos séculos XVIII e XIX, Humboldt e Bonpland cruzarão o Orenoco, dando um impulso decisivo às pesquisas científicas na região. A abertura dos portos brasileiros em 1808 atrairão, por sua vez, um grande número de estrangeiros, que farão questão de testemunhar, primeiro sobre a corte portuguesa em «exílio» e a região do Rio de Janeiro, e também, logo em seguida, sobre todo o território, inclusive seus recantos mais recuados. O movimento toma impulso apôs a independência do Brasil. As explorações multiplicam-se no Norte20. A abertura do Amazonas à navegação internacional vem satisfazer pressões cada vez mais fortes do exterior.
25Os Franceses não haviam nunca totalmente renunciado a uma presença na região. Em 1682, 68 anos apôs o fracasso da colônia dirigida por La Ravardière em São Luís do Maranhão, a Guiana, no espírito do autor da Dissertation sur la Rivière des Amazones21, devia servir, em um momento determinado, de trampolim para projetos mais ambiciosos: «[Esta obra] pode ainda tornar-se útil para as Colônias francesas de Caiena, quando serão numerosas o bastante para expandir-se». Menos de um século mais tarde, Jean Godin des Odonais, enquanto esperava sua esposa em Caiena, tinha concebido um piano de conquista da Amazônia, piano que ele mandara, com uma carta, ao conde de Hérouville. A conquista efêmera da Guiana pela coroa portuguesa, entre 1808 e 1814, despertará a atenção dos Franceses para a região.
A amazônia colonizada
26O romance de Jules Verne, La Jangada, inscreve-se justamente dentro do contexto colonial e imperialista da segunda metade do século XIX, em que a maneira de ver o outro e os outros lugares vai ser profundamente modificada. O autor se apropriou da noção de progresso propalada pelas nações européias, bem como da sólida fé na Ciência. O método do romancista, membro, durante um certo tempo, da seção de Correspondência da Sociedade de Geografia, vai adaptar, como conseqüência, sua «viagem sem sair de casa» a essas modificações. Esse método consiste em informar-se, 1er sobre a região, e colocar esta documentação à disposição do objetivo didáctico da obra22. O título da coleção dirigida por Hetzel, Biblioteca de Educação e Recreação, resume o desejo de divulgar conhecimentos e distrair o leitor (tanto os jovens como os sedentários, ou «cul-de-plomb», segundo expressão do autor). É nesse espírito que o escritor nantês começa a narrativa do périplo pelo Amazonas, de Iquitos até Belém, a bordo de gigantesca jangada; viagem, lembremos, que tem duplo motivo: celebrar o casamento de Minha Garral e Manoel Valdez, e provar a inocência de Joam Garral, o pai de Minha, injustamente acusado de assassinato, razão pela qual refugiou-se na Amazônia peruana.
27Além dos temas tão a gosto de Jules Verne, como o erro judiciário, os criptogramas ou a ilha flutuante, o que mais chama a atenção é sua maneira de tratar a paisagem. O autor dedicase, varias vezes, a fazer enumerações de plantas, flores, árvores, procedendo como a nomenclatura científica e técnica, optando, quando necessário, pelo termo local, que tem efeito erudito e pitoresco ao mesmo tempo. A exatidão do vocabulário ou de sua transcrição não tem muita importância – o problema vem também das fontes por ele utilizadas –; a palavra estrangeira mostra uma realidade irredutível, intraduzível e, ao mesmo tempo, integra aos conhecimentos franceses um saber do qual é possível apropriar-se. As exatidões numéricas com que ele acompanha, eventualmente, as medidas das árvores, são apenas uma ilustração a mais do espírito científico em ação, enquanto que comentários inseridos na «nomenclatura» acentuam ou o valor etnográfico («os Índios as utilizam para fabricar seus machados de guerra»), ou seu interesse industrial («todas essas árvores poderiam ser utilizadas para obras sólidas, construção ou grande carpintaria»), ou ainda um valor puramente decorativo, com laivos poéticos. Na verdade, e isso é válido para vários outros textos, uma sexualidade latente é freqüentemente atribuída às paisagens («suas cascas se mostravam nuas»), os troncos são «nus escorchados», [o sol] «não tinha talvez jamais acariciado [este solo úmido]...)23. O rio, a floresta, os animais são também outros elementos voltados para o antropomorfismo e para a projeção psicanalítica, sem que seja possível estabelecer regras sistemáticas de equivalência, porque o jogo de referências é próprio a cada autor e a cada texto.
28Na verdade, resta paralelamente que a natureza seria feita para ser explorada, para render. Esta concepção, que já existia na obra de Bernardin de Saint-Pierre, tinha ficado, no entanto, ligada a uma expressão muito idealizada, abstrata e submetida à noção de harmonia a ser preservada. Desde então, o lema otimista de Humboldt tem sido sempre citado: «É aí que o comércio e a civilização do mundo devem concentrar-se um dia»24. Jules Verne o imita. Em sua obra, o cultivo, o arroteamento, a colonização participam de um vasto projeto capitalista e industrial que o esgotamento dos recursos não pode interromper. E tanto o cenário quanto os indígenas são tratados como acidentes do relevo: «Sim, no Alto Amazonas, muitas raças de Índios já desapareceram, entre outros os Curicicurus e os Sorimoas (segue-se longa enumeração de tribos desaparecidas).
29É a lei do progresso. Os Índios desaparecerão. Diante da raça anglo-saxã, australianos e tasmanianos sumiram. Diante dos conquistadores do Far-West, extinguem-se os índios da Norte-América. Um dia, talvez, os Árabes serão aniquilados pela colonização francesa»25. A ação civilizadora deve substituir a natureza selvagem por uma natureza cultivada, domesticada, que acarreta, inevitavelmente, a destruição do nativo. Além do mais, a noção de terra virgem (que leva também a conotações sexuais) significa que tudo que é «descoberto» não tem proprietário. Tudo existe em estado de total disponibilidade, pronto para a exploração ou para a experimentação26.
30Voltando aos indígenas, presença acessória e decorativa na história, cujos papéis principais são interpretados por Brancos, e os secundários, eventualmente, por Mestiços, eles diferenciam-se dos Negros, explica o autor, por estarem acostumados a viver ao ar livre, em plena liberdade, enquanto que os africanos acostumam-se facilmente a uma vida familiar reclusa. Mesmo se, em determinados momentos, Jules Verne mostra preocupações humanitárias, principalmente com relação à escravidão, ele não se distancia do senso comum de sua época, que tem muita dificuldade em considerar Índios e Negros como iguais, ou simplesmente como homens. O Índio é, essencialmente, um ser próximo da animalidade. La Condamine, seguro de sua autoridade científica, que lhe permite, por exemplo, chegar à conclusão de que as línguas indígenas são pobres por serem incapazes de exprimir o abstrato, já enuncia esse conceito nos termos seguintes: «Como os Índios das missões são tão limitados, para não dizer tão estúpidos, quanto os selvagens que gozam a liberdade, não é possível constatar sem humilhação quão pouco se diferencia do animal o homem abandonado à simples natureza, privado de educação e de sociedade»27.
31No século XX, Henri Michaux, em sua narrativa de viagem «Ecuador»28, opõe-se à convenção do exotismo, e mais ainda, questiona a possibilidade da existência de uma visão «transparente» do viajante – o que será repetido por Lévi-Strauss em Tristes Trópicos: «Eu detesto tanto as viagens como os exploradores» –; porém o humanismo social de Ferreira de Castro, que se exprimia num fundo de decadência do sonho da borracha, transfigurado pela tradução e textos de Blaise Cendrars29, e a consciência etnoecológica, por sua vez, farão renascer nossas representações amazônicas. Essas rupturas em locais diferentes, a visão social e a revelação da exploração econômica, a evolução da etnologia, «que é ao mesmo tempo filha do colonialisamo e prova de sua agonia»30, a instauração do inconsciente, «ponto culminante da descoberta do outro em si mesmo»31, a aparição do turismo também, fazendo da paisagem uma mercadoria, vão transtornar nosso enfoque do espaço e de seu ocupante.
32O que é certo, no entanto, é que os textos literários, mesmo quando se inspiram em mitos antigos e os modernizam, ou dão deles novas leituras, são sempre portadores de «imagens» que eles transformam, ou no caso dos mais ricos, elaboram. A paisagem permanece como uma «construção cultural complexa, uma maneira de dar um sentido ao mundo exterior»32. A ficção, como pensamos ter demonstrado, é inseparável da história, e da situação das ciências na qual ela é escrita, pois elas nutrem-se mutuamente, uma estruturando a outra.
33Ora, a idéia de um progresso linear e contínuo do conhecimento tem que ser rejeitada. Como já disse Lévi-Strauss com relação a sua disciplina, é deplorável que o progresso dos instrumentos de análise e de compreensão avance junto com um afastamento da sociedade tribal original, conhecida somente pelos primeiros viajantes. E a própria questão étnica não se coloca em termos de progresso ou de retorno ao passado. O encontro com a alteridade se dá ou não. Francis Affergan, num «ensaio sobre o exotismo», publicado recentemente33, coloca parâmetros para uma revisão do procedimento antropológico. Ele defende uma abordagem fenomenológica do outro, ao oposto de uma abordagem científica e classificatória (Linné-Buffon), herdeira da lógica leibnizo-hegeliana, e opõe o conceito da diferença, originário das ciências exatas, à irredutibilidade e assimetria que pressupõe a alteridade, pois a permuta entre o Eu e o Você é impossível. Os três níveis problemáticos propostos por Todorov34, que são o piano epistemológico (O(re)conhecimento do outro), o piano axiológico (do julgamento de valor e da hierarquia) e o piano praxeológico (a relação ao outro, distante ou próximo, contendo os diferentes modos da assimilação, da identificação, da submissão ou da indiferença), propiciam também alguns critérios para a análise, reintroduzindo nela uma dimensão ética. Se o conhecimento de si mesmo passa pelo do outro, não se trata de um benefício egoísta tido com o encontro. O que muda então não sou eu, mas sim eu e o mundo, eu na minha relação ao mundo e, por conseguinte, ao outro.
34Que conclusão tirar destes exemplos que não seja pessimista sobre a possível compreensão do alhures? Seria este o paradoxo: que por seu estatuto de ficção, os textos literários manifestem ao mesmo tempo a presença e a ausência da Amazônia? Seria necessário, na verdade, por um lado, levar em conta uma distinção fundamental entre o ensaio, talvez até mesmo as narrativas de viagens, e o romance; o primeiro introduziria, freqüentemente, mais matizes nos julgamentos, enquanto que a ficção pareceria voltada para um maior maniqueísmo na sua maneira de apreciar. Porém, mais do que tudo, não se deveria condenar nossos mitos, não vendo neles nada mais do que uma visão deformada de um lugar que seria tratado mais rigorosamente por um manual de história ou de geografia. Os filmes sobre o Far-West, se bem observados, ensinam muito sobre as forças simbólicas da colonização do Oeste americano. Além disso, contribuíram mais do que qualquer outra forma de expressão, para tornar presentes, no mundo inteiro, um certo espaço e homens, mensageiros de um ideal que se pode ou não contestar, mas cujos valores se impuseram graças à força e à qualidade da mensagem. Os textos sobre a Amazônia – já escritos no passado, os do presente e os do futuro- nos falam todos com o mesmo ímpeto. Resta-nos a tarefa de dar-lhes um sentido, sentido esse indissociável daquele que imprimirmos à nossa História.
Notes de bas de page
1 Au-delà du Rio Negro, de Jean-Yves Provérbio, editado por J.-C. Lattès, e Le Comité des risques, de Jean Soublin, editora Seuil.
2 «El dorado» significa, originalmente, homem de ouro. Teria sido um rei (da tribo dos Cibcia), cujo corpo saíra, coberto de ouro, do lago Guatavita. Em 1537, os espanhóis Sebastiãn de Belalcazar e don Gonzalo Jimenez de Quesada, e alemães (Nikolaus Federmann) encontram-se no planalto de Cundinamura, sede da atual capital colombiana, Bogotá; não acharam ouro no lago, mas apenas alguns tesouros. Depois, o mito inicial aplaca-se e provoca o surgimento de várias lendas, entre as quais a de Eldorado, cidade de telhados de ouro, situada perto de uma grande extensão de águas, chamada Manoa ou Parima. Com a expedição de Orellana, sua localizaçâo desloca – se para as cercanias do vale do Rio Branco e Roraima, motivando uma viagem de 800 km pelo Orenoco feita pelo inglês Sir Walter Raleigh.
3 Jornal fundado em 1701 pelos Jesuítas, e que Voltaire, como outros filósofos, atacou em «Candide» (capítulo 16,1.13).
4 Charles-Marie de La Condamine. «Voyage sur l’Amazone». Paris, La Découverte, 1981. A passagem referente às Amazonas situa-se nas p. 84-89. Sua convicção, após exame crítico das informações, baseava-se na concordância dos testemunhos recolhidos por ele junto a índios que se encontravam distanciados por milhares de quilômetros.
5 Vincent Voiture – Carta 23, dirigida à Sra. Paulet.
6 Longo prefácio, intitulado «Dissertation sur la Rivière des Amazones», feito para a relação de viagem de Pedro Teixeira (1637-38),) redigida por Cristobal de Acunã: «Relation de la Rivière des Amazones», traduzida pelo finado Sr. de Gomberville (autor do romance gigantesco «L’exil de Pfolexandre», no qual ele transporta seus heróis do Egito faraônico até a Dinamarca, passando por Roma antiga e o México pré-colombiano. Paris, 1682, 3 v. A citação vem das p. 72-73.
7 Ver, a respeito, o indispensável texto de Sérgio Buarque de Holanda, «Visão do Paraíso». São Paulo, Cia. Editora Nacional, 1985.
8 Este tema lembra os textos de Cristobal de Acunã, já citado, do capitão Simão Estácio de Silveira, autor da «Relação sumária das cousas do Maranhão» (1618-1624). Lisboa, Imprensa Nacional, 1911; ou ainda, do jesuíta João Daniel, «Tesouro descoberto no Rio Máximo Amazonas», 5a parte. Rio de Janeiro, Imprensa Real, 1820. Das obras contemporâneas, poderíamos citar, num outro aspecto, «Les merveilles de l’Amazonie», de Willard Price, traduzido do inglês (americano. Paris, Payot, 1953.)
9 Michèle Duchet. «Anthropologie et Histoire au siècle des lumières». Paris, Flammarion, 1977. (ver, respectivamente, p. 83 e 79).
10 In: Aimé Martins, citado por M. Duchet, ibidem p. 71.
11 Jean Godin des Odonais, artesão dos agrimensores na equipe de La Condamine, casa-se, em 1743, com a filha de um corregedor natural da região de Quito, Isabelle. Para Caiena, tentará, durante mais de 20 anos, trazer para perto de si a esposa. Escreve cartas, principalmente, em 1765, ao Conde de Hérouville, em Paris, um amigo do Duque de Choiseul, para que a França interceda junto a Portugal; isto provoca muita emoção nos «salões mundanos», e dá alguns resultados. Após muitas complicações, ao descobrir que seu marido a esperava ainda, Isabelle resolve realizar, com muitos riscos, a viagem. No fim do ano de 1769, encalhada numa das margens do Amazonas, presencia a morte de dois de seus irmãos, bem como de todos que a acompanhavam. Escapa milagrosamente à morte, é salva e levada até Caiena onde, finalmente, reencontra seu marido em meados de 1770. Três anos depois partent juntos para a França. Ver «Voyages extraordinaires, Songes, et Visions et Romans». Amsterdam, 1787-1789. volume XII (carta do Sr. Godin des Odonais escrita de Saint-Amand ao Sr. de La Condamine, em 28 de julho de 1773), e volume XXXIX (no qual a mesma carta precede-se de uma relação de La Condamine sobre a expedição). Este episódio serviu a um romance de Marc Blancpain: «Le plus long amour». Paris, Grasset, 1971.
12 Bernardin de Saint-Pierre. L'Arcadie-L'Amazone. Paris, Genève, Statkine, 1980 (Coleção «Ressources»). (Reimpressão da edição de Paris de 1833). p. 294.
13 Ibidem, p. 292.
14 Seria possível, aliás, ver na citação de Bernardin de Saint-Pierre, de um certo capitão James e de um jovem personagem da República dos Amigos, Bentinck Cook, uma explicação alusiva ao desaparecimento de James Cook durante sua terceira expedição. O navegante inglês, cujas viagens representaram um passo decisivo para o melhor conhecimento do mundo, tinha contribuído muito, até mesmo antes de Bougainville, para o êxtase de seus leitores através das idílicas descrições de Taiti e das Ilhas da Amizade, alimentando a convenção sobre o Bom Selvagem. O romancista francês encontrou, assim, uma maneira de prestar-lhe homenagem, dando-lhe descendentes.
15 Antonio Cândido. Literatura e subdesenvolvimento, p. 343-344. In: UNESCO. A América Latina em sua literatura. São Paulo, Perspectiva, 1979.
16 Alexandre Dumas. «Un pays inconnu». Paris, Michel-Lévy, 1865. F.W. Reed, autor de uma bibliografia de Alexandre Dumas, pai, inclina-se, efetivamente, por uma tradução revista do romancista francês.
17 Conan Doyle. «Le monde perdu». Paris. (Le livre de poche).
18 Citado por Mario Carelli em «France-Brésil – Bilan pour une relance». Paris, Ed. Ententes, p. 125. Ver também Sérgio Buarque de Holanda, op. cit. p. XXV.
19 Gilbert Chinard. «L’Amérique et le rêve exotique dans la littérature française aux XVIIe et XVIIIe siècles». Paris, 1913.
20 Para mencionar apenas as viagens mais conhecidas: de Spix e Martius (austríacos, 1818-1820) a d’Orbigny (francês, 1826-1834), de Bates (inglês, 1848-1859) e Spruce (inglês, 1848-1855) a Wallace (inglês, 1848-1852), de Marcoy (francês, 1848-1860) a Avé-Lallemant (alemão, 1859), de Biard (francês, 1858-1860), à Comissão Científica do Pacífico (Espanha, 1862-1866) de Agassiz (suíço, chefe de uma expedição norte-americana, 1865-1866) a Coudreau (francês, principalmente 1895-1898).
21 «Dissertation sur la Rivière des Amazones», op. cit., p.76-77.
22 Jules Verne, aliás, não deixa de utilizar, às vezes fartamente, as narrativas dos viajantes citados acima, bem como as de um autor que o precedeu: Emile Carrey. Especializado em literatura para crianças e adultos sobre a Guiana e a Amazônia, este último publica, na editora Michel-Lévy, uma série de quatro romances regrupados sob o título de «L’Amazone» («Huit jours sous l’équateur» – 1856; «Les métis de la savane» – 1857; «Les révoltés du Pará» «La dernière des N’hambas»), citados por Eidorfe Moreira em seu artigo: «A Amazônia de Jules Verne», in: Geografias mágicas. Belém, 1985. Na leitura de «Les métis de la savane» nota-se, ao mesmo tempo a intenção didática: «[...] nosso objetivo principal, que é o de divulgar a América Latina, terra prometida, ainda deserta, mal-conhecida, que dorme enquanto espera sua hora» (p. 77); e a ambição colonizadora que rivaliza com a penetração norte-americana: «As primeiras tentativas de emigrações potentes, ou de ocupação pela força, não obtiveram sucesso, mas outras o obterão, cedo ou tarde. Somente nacionalidades modernas podem conjurar este futuro, parar os Estados Unidos e sua inundação crescente; pois a raça indígena que povoava a América do Sul é uma raça fatalmente condenada, que se vai morrendo com o alento da raça branca. É uma triste conseqüência da emigração, mas ela é fatal. Lá onde o branco coloca um pé colonizador e vitorioso, a raça indígena recua, apaga-se e morre (p. 84).
23 Ver, a respeito, a biografia de Daniel Soriano: «Jules Verne» (Le cas Verne). Paris, Julliard, 1978.
24 Num espírito tão triunfante quanto este, e que indica claramente o destino desses tesouros, Louis Boussennard, em seu romance «Les chasseurs de caoutchouc» (Paris, Marpon e Flammarion éditeurs, 1886) cita também esta frase de Agassiz: «apodrecem, anualmente, riquezas suficientes para acabar com o pauperismo europeu».
25 Jules Verne. «La Jangada». Le livre de Poche, p. 57. Ver a citação da nota n° 22 e os textos de Henri Coudreau: «[...]» este Pará onde se pode ter a certeza de que, devido a seus campos e suas terras altas, irá constituir um eterno domínio da raça ariana». In: «Viagem ao Tapajós» (1895-96). Belo Horizonte, Itatiaia; São Paulo, EDUPS, 1977. (Coleção Reconquista do Brasil, 44).
26 Ver, a respeito, o artigo de Silviano Santiago, In: Folhetim (Suplemento de «A Folha de São Paulo», São Paulo 16.12.84).
27 In: La Condamine, op. cit., p. 62.
28 Gallimard, 1929. Citado em «Braise». Paris, no 5/6.
29 Ferreira de Castro. «A Selva». 1930. A tradução de Blaise Cendrars é publicada em 1937, na editora Bernard Grasset.
30 Tzvetan Todorov. «La conquête de l’Amérique». Paris, Seuil, 1982. p. 253.
31 Ibidem, p. 252.
32 D.E. Cosgrove & S.J. Daniels. «The iconography of Landscape». Cambridge Press, 1987. Citado em «Le Monde», Suplemento: «Campus», de 6 de novembro de 1987.
33 Francis Affergan. «Exotisme et alterité». Paris, PUF, 1987. Para melhor situar sua crítica da antropologia moderna, nós o citaremos: «É revelador que a antropologia moderna origine sua gênese ou suas premissas nos discursos do século XVIII [...]. Se o século XVIII representou tal papel foi precisamente porque abriu a era da universalidade, tanto ao nível das funções da razão quanto no piano dos direitos e deveres» (p. 19); ou ainda: «Os movimentos discursivos racistas e xenófobos começam entre o fim do século XVII e o século XVIII, com o pensamento classificatório, onde o outro se integra na única forma calculável: uma diferença na lógica descritiva». (p. 18).
34 Op. cit., p. 191.
Auteur
Revista «Braise»
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