II Parte. A pesca do pilado
p. 121-129
Texte intégral
1A pesca do caranguejo pequeno em cardumes – o pilado, ou patelo e patela, e ainda mexoalho 1e escasso 2(Portunus puber L., ou Polybius Heuslowi Leach, crustáceo decápode da família dos Cancridae) –, para adubação das terras, era, como a apanha das algas, uma importante faina que interessava à lavoura mas que tinha lugar no mar, e onde coexistiam aspectos agrícolas e piscatórios de modo mais sugestivo ainda do que naquela apanha.
2A partir de cerca de 1940, estas pescarias, por toda a nossa costa, foram sendo progressivamente postas de parte, e encontram-se hoje totalmente extintas, como actividade específica. Uns entendem que tal se deve ao facto de o caranguejo em cardumes ter desertado estas paragens, por razões aliás difíceis de precisar – correntes marítimas que o teriam desviado para outros lados, a generalização das grandes artes de arrasto que revolvem os fundos, destruindo as criações, ou porventura outras causas ainda – ; outros, que sustentam que o caranguejo subsiste como dantes (o que julgam comprovado pelo seu aparecimento nas redes de outras pescarias, embora sem dúvida em muito menor escala), faltando somente quem o vá buscar, pretendem que os lavradores é que se desinteressaram desse fertilizante, de tão laboriosa procura, uma vez que têm agora à sua disposição adubos químicos que o substituem com grande economia de trabalho; outros ainda, concordam que o pilado desapareceu da nossa costa, mas afirmam que já antes desse desaparecimento ele havia sido desbancado pelos adubos químicos; enquanto que outros, que também concordam que o pilado desapareceu, estão porém convencidos de que, se ele voltasse, recomeçaria a sua procura, e os adubos químicos é que seriam preteridos. Esta discordância corresponde talvez a conceitos económicos de dois níveis : o primeiro, a gente que já ingressou numa economia mais quantificada e racionalizada; o segundo, a gente ainda fechada na velha economia familiar e qualitativa, que não contabiliza o trabalho da gente da casa; ou então corresponderá a uma diversidade de condições de procura daquele crustáceo: onde ela era fácil e não obrigava a grandes deslocações e trabalhos, o pilado tinha vantagens sobre os adubos industriais; onde pelo contrário ela era trabalhosa, perigosa e difícil, a situação era inversa.
3Seja como for, a pesca qualificada do pilado acabou ; e por isso, como dissemos, os elementos de que dispomos e que a seguir indicamos, baseados em apontamentos por nós colhidos antes daquela data e em relatos da autoria de escritores ou estudiosos, e sobretudo em informações de pessoas que participaram naquela actividade, mostram certas lacunas e imprecisões, que não é mais possível completar ou esclarecer com a observação directa e actual dos factos.
4Não possuímos quaisquer referências, descrições ou iconografia, relativas à pesca do pilado, anteriores ao final do século XIX. As mais antigas que conhecemos são as menções feitas a essa actividade em Baldaque da Silva, que se reportam a 1885 ; e, no que respeita a Lavra, o P.c António Ramos diz mesmo, em 1943, que conheceu a pessoa – um velho «venerando», de nome Salvador – que ali ensinou o processo de pescar o pilado, que «dantes ninguém sabia aproveitar». A indicação da pescaria do caranguejo nas «Memórias sobre algumas observações feitas no ano de 1789 relativas ao estado da pescaria na Província de Entre Douro e Minho», de Constantino António Botelho de Lacerda Lobo, incluindo num mesmo parágrafo o caranguejo e a lagosta, indigita sem dúvida que se trata de espécies comestíveis3.
5O caranguejo para adubo era pescado entre nós, expressamente, até àquela data, desde a foz do rio Minho até à Nazaré4 e, com aspectos peculiares, na ria de Aveiro. Ele aparecia também no litoral alentejano, de Sines a Vila Nova de Milfontes, e por toda a costa algarvia, da Bordeira a Vila Real de Santo António; mas, nestas duas zonas, ele não era verdadeiramente conhecido como fertilizante5 : quando vinha nas redes, arrastos e armações de sardinha ou outros (o que sucedia com frequência), era deitado outra vez ao mar, por vezes mesmo com grande dificuldade, e apenas uma pequena quantidade se aproveitava como isco para outras pescarias.
6O habitat normal deste crustáceo – e que parece ter-lhe sido bastante favorável – eram os bancos arenosos próximos do litoral, onde se criava em quantidades tais que, a despeito da procura maciça que o dizimava, ele chegava a representar um factor prejudicial à pesca, nomeadamente da sardinha, cujos cardumes afugentava6. Ao norte do rio Douro, o pilado aparecia com especial abundância nos limpos de Âncora e Afife, e também, em menor escala, na Aguçadoura ; em muitos portos, ele era pescado em certos locais conhecidos, próximos de tais portos; mas de quase toda a parte íam também pescá-lo àqueles limpos, em expedições que em alguns casos demoravam muitas horas, à vela se soprava vento favorável (o que aliás sucedia com frequência), ou a remos no caso contrário (constituindo então um trabalho extremamente pesado), e em que gastavam pelo menos dois dias, um para a ida e outro para o regresso.
7Em praticamente toda a área portuguesa, a pesca do pilado fazia-se com redes varredouras e envolventes de cercar e de arrastar para bordo de embarcações (ou, muito excepcionalmente, na ria de Aveiro, para terra). Este tipo de pesca implica, além da sua rede específica e de uma tripulação organizada em companha (de modo a fazer face aos vários trabalhos que são necessários simultaneamente – remagem e lançamento da rede) : 1) um elemento imóvel, onde se prende a extremidade de um dos cabos dessa rede, e que pode ser um barco fundeado, ou uma boia fixa a uma âncora (e, no caso excepcional do arrasto para terra, o próprio areal, onde ficou essa extremidade do cabo da rede); e 2) um elemento móvel – um barco – donde a mesma rede vai sendo lançada depois de deixar aquela extremidade presa ao elemento imóvel, até fechar o cerco junto desse mesmo elemento. Em todos os casos, a alagem da rede para bordo era feita a braço; e quando o saco aflorava junto da borda, o caranguejo era retirado também para bordo, geralmente com o auxílio de pequenos rabichéis ou enxalavares.
8Dentro desse sistema básico de arrasto para bordo, a pesca do pilado apresentava-se portanto sob duas formas fundamentais:
– usando-se dois barcos, sendo o elemento imóvel um deles; estes barcos eram ora ambos iguais, ora de tipos e tamanhos diferentes, conforme as funções que a cada um deles competia; e neste último caso, o maior era o elemento imóvel, e o mais pequeno era o que fazia o cerco;
– usando um único barco, sendo o elemento imóvel uma bóia (ou a própria terra).
9A primeira forma encontrava-se sobretudo ao norte do rio Douro, com dois barcos iguais em Anha, S. Bartolomeu do Mar, Castelo de Neiva, Apúlia, Aguçadoura, Averomar, Vila Chã, Pampelido e Angeiras, e com dois barcos diferentes em Âncora, Montedor e Mindelo ; mas ela encontrava-se também ao sul daquele rio, com dois barcos iguais na Costa Nova e na Nazaré, e com dois barcos diferentes em dois grupos da ria de Aveiro – Murtosa e S. Jacinto –.
10A segunda forma, por seu turno, encontrava-se sobretudo ao sul daquele rio, na Afurada, Aguda, Espinho, Esmoriz, Cortegaça, Furadouro, Torreira, Costa Nova, Vagueira, Mira, Tocha, Quiaios, Buarcos, Gala, Cova e Costa de Lavos, e Leirosa ; e, ao norte daquele rio, em Matosinhos. Na Póvoa de Varzim, até cerca de 1930, empregavam-se, nesta pescaria, dois barcos, diferentes; depois daquela data, passou a empregar-se apenas um. Em alguns pontos, como por exemplo na Costa Nova (conforme se depreende da enumeração que fizemos), empregavam-se ambas as formas. E de um modo geral, para lá da forma característica regional, se o caranguejo aparecia em grandes quantidades numa praia onde por costume se empregava apenas um barco, uma companha que possuisse mais do que esse, ia incidentalmente pescar com dois; e inversamente, onde por costume se empregavam dois, uma companha que de momento, por qualquer motivo, não tivesse o segundo, ia pescar só com um. Pelas mesmas razões, empregavam-se barcos grandes ou pequenos em vez dos barcos pequenos ou grandes do costume.
11Onde se empregavam dois barcos diferentes, o maior – que era o elemento imóvel do cerco–, à ida, transportava a rede, e no regresso, o pilado pescado; o mais pequeno – que era aquele que fazia o cerco – transportava a rede (que ia lançando) durante o cerco, e, em princípio, regressava vazio. Muitas vezes, contudo, quando a pescaria fosse boa, enchia-se também o barco pequeno, para o regresso. Estes barcos levavam nomes diferentes, de acordo com as funções que desempenhavam : assim sucedia, por exemplo, no Mindelo, onde distinguiam o barco da carga e o barco de lancear. E, em muitos casos, isto sucedia igualmente, mesmo tratando-se de barcos iguais: assim, por exemplo, na Apúlia, onde distinguiam o barco do ferro e o barco da rede ; na Aguçadoura, o barco da paixão e o barco do caceio ; em Averomar, o barco do fundeadouro e o barco de lancear ; em Vila Chã, Angeiras e Pampelido, o barco da carga e o barco da carreira ; na Murtosa e em S. Jacinto, o barco da barra e a bateira (dando ao conjunto dos dois barcos o nome de amarração) ; na Nazaré, o barco do ponto e o barco da rede ; etc.
12Por vezes os dois barcos diferentes eram designados por nomes também diferentes, mas que correspondiam à sua categoria geral : assim por exemplo na Póvoa de Varzim, a lancha e o caceio. Finalmente, na Tocha, à bateira do pilado davam o nome de barco caranguejeiro.
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13Por toda a área costeira a norte do rio Douro em geral, a gente do campo desde sempre viveu em estreita familiaridade com o mar, não só, como vimos, apanhando o sargaço, mas sobretudo praticando a pesca do caranguejo7 – que ai se designava por pilado –, com barcos e redes que eram sua pertença, e em vista essencialmente à adubação das próprias terras (embora com frequência tivesse lugar uma pequena comercialização de excedentes, e algum desse pilado, em «verde» ou depois de seco, fosse vendido a outras pessoas, da própria terra ou de fora, que dele necessitassem).
14Muitas vezes –por exemplo em Montedor, Fão, Aguçadoura, e outras localidades –, os lavradores, além do pilado, dedicavam-se a outras pescarias, utilizando os seus barcos, redes e conhecimentos da arte; e então, não raro as companhas do pilado, compostas de gente do campo, iam também à pesca da sardinha. Nestas companhas, um dos companheiros, pelas qualidades, experiência e competência no assunto, era escolhido para arrais. E, muitas vezes, o arrais era também o dono do barco e das redes.
15Normalmente, na época da safra, esses lavradores contratavam jornaleiros, cabaneiros ou pescadores, para os auxiliarem nesta actividade ; e nos casos em que, mais tarde, o lavrador se divorciou do mar, ela passou, aí, quase inteiramente para as mãos destas gentes. Assim sucedeu por exemplo em Averomar, onde, dantes, os lavradores iam muito ao pilado, mas que desertaram totalmente a praia depois de um naufrágio ali ocorrido há cerca de 20 anos, em que pereceram várias pessoas.
16Ao lado das companhas de lavradores, as mais das vezes havia porém outras, de pescadores, que também possuiam os seus barcos e aparelhos; e nos aglomerados definidamente piscatórios deste sector, nomeadamente em Matosinhos, Angeiras, Vila Chã, Póvoa de Varzim e Âncora, eram mesmo sobretudo os pescadores quem se dedicava a esta actividade, para venda aos lavradores, e com exclusão – ou pouco menos– destes8, mormente a partir de uma certa data. Neste caso as companhas eram frequentemente mais pobres do que as dos lavradores – por exemplo em Vila Chã, onde os lavradores tinham sempre dois barcos grandes, ao passo que os pescadores não raro tinham um grande e um pequeno, e até mesmo apenas dois pequenos; e, além de organizados em companhas, estes pescadores pescavam o pilado com um barco pequeno por processos mais simples e menos rendosos, que os lavradores desconheciam.
17Ao sul do rio Douro, diferentemente, a pesca do caranguejo – que, além de pilado, passa a designar-se também por mexoalho ou escasso – era exercida essencialmente por pescadores, para venda integral aos lavradores; e os barcos e aparelhos pertenciam geralmente a um dos camaradas, que em regra era então o arrais da companha.
18Na área da xávega, de Espinho para o sul até à Nazaré, as companhas do pilado eram compostas quase sempre de pescadores matriculados naquelas artes, e que por isso pescavam o mexoalho apenas à noite ou na folga ou escusa do seu trabalho específico, durante o Outono, e depois de elas fecharem, do Natal em diante9. Em Buarcos elas compreendiam frequentemente pescadores de Mira que para ali iam pescar nas épocas mortas da sardinha, antes de seguirem para as cavas do arroz do Ribatejo ; e na Nazaré trabalhavam muitos pescadores da Praia de Vieira.
19Na Tocha, porém, essa pescaria era praticada pelos lavradores, a quem pertenciam o barco caranguejeira e as redes – e que, na época própria, também pescavam a sardinha com as artes da xávega – e também os palheiros da praia, onde se instalavam durante a safra, nos períodos em que os trabalhos agrícolas o permitiam; e o mesmo sucedia na Vagueira, onde aliás existia apenas uma companha trabalhando por conta de um grande lavrador da região.
20Esta gente, lavradores e pescadores, por toda esta faixa costeira, tinha na praia os seus barracos e palheiros, onde em certos casos vivia, e onde guardava a utensilagem do mar, barcos e redes de pesca. E, ao norte do rio Douro, além disso, as alfaias do sargaço; e era também neles que recolhia, durante a estação morta, os barcos e redes do pilado. Hoje, desaparecido o caranguejo e extinta esta actividade, vêem-se os barcos, agora inúteis, esquecidos nesses barracos arruinados, ou, mais frequentemente, abandonados a desfazer-se, nos areais onde os lavradores já praticamente não vão.
21Como vimos, a forma com dois barcos correspondia sobretudo ao norte do rio Douro, onde predominava a pesca do pilado por gente da lavoura; e a forma com um único barco sobretudo ao sul desse rio, onde predominava a pesca por gente piscatória; mas não se verificava uma coincidência estricta de elementos variáveis: a primeira forma ocorria também ao sul do rio Douro, – na Murtosa, S. Jacinto, Costa Nova e Nazaré – e, ao norte desse rio, também em grupos piscatórios – Âncora, Póvoa de Varzim (outrora) e Vila Chã – ; e, inversamente, a segunda forma ocorria também ao norte do rio Douro – em Matosinhos – e ao sul desse rio também entre gente da lavoura – na Vagueira e na Tocha –. Apesar disso, porém, julgamos poder entender-se que a primeira forma caracterizava fundamentalmente a área a norte do rio Douro e a pesca do pilado feita por gente da lavoura, enquanto que a segunda forma caracterizava fundamentalmente a área a sul desse rio, e a referida pesca feita por gente piscatória. O emprego de dois barcos em Âncora, Póvoa de Varzim (outrora) e Vila Chã explicar-se-ia naturalmente por uma contaminação do processo geral das respectivas áreas, para lá de quaisquer particularismos de grupo profissional; e o de um único barco em Matosinhos, por influência do processo conhecido na área Sul, de que esse porto seria o limite norte, ou pela do processo mais recente usado na Póvoa de Varzim, de que Matosinhos, sob o ponto de vista piscatório, foi sempre cultural e demograficamente tributário; e sobretudo porque em Matosinhos, ao contrário do que sucedia nos demais locais nortenhos onde os pescadores também iam ao pilado, não havia praticamente uma pesca local exercida por lavradores.
22As companhas – que em alguns casos, mormente quando de lavradores, tinham uma certa estabilidade e criavam entre os seus membros laços de solidariedade que ultrapassavam as meras actividades da pesca – eram constituídas por um número de homens variável de localidade para localidade, conforme se empregava um ou dois barcos, o seu tamanho e número de remos, as dimensões das redes, e o costume local. Onde se empregavam dois barcos diferentes, geralmente ao barco pequeno, durante a viagem, competia uma tripulação muito reduzida; mas, para fazer o lanço, parte da tripulação do barco grande – que então ficava parado, e às vezes só com um homem a bordo – transferia-se para ele, de modo que houvesse pessoal para remar e pessoal para lançar a rede; terminado o cerco, faziam nova transferência, de modo a ficar um número de homens igual em cada barco, para a alagem da rede; e só para o regresso é que o arranjo das tripulações de ambos os barcos, em certos casos, voltava a normalizar-se. E o mesmo se passava para o lançamento da rede, quando os dois barcos eram iguais.
23Como veremos, ao norte do rio Douro os barcos grandes as mais das vezes tinham – ou utilizavam – 4 remos, 2 de cada bordo (remando em geral um homem com dois remos, à proa ou à ré, e os restantes com um cada), e os pequenos, 2 remos, 1 de cada bordo. Ao sul desse rio, as bateiras tinham as mais das vezes 2 remos, 1 de cada bordo (remando 2 ou 3 homens a cada remo). Na Póvoa de Varzim, as lanchas tinham 8 a 12 remos, 4 a 6 de cada bordo; e na Gala e Cova de Lavos, elas tinham também 8 remos, 4 de cada bordo (remando 2 homens a cada remo)10.
24A composição das companhas, nas diversas localidades, era a seguinte:
A) Onde se empregavam dois barcos.
1) Ao norte do rio Douro.
25Em Âncora, 6 ou 7 homens (pescadores), 4 a 5 no barco grande e 2 no pequeno ; em Montedor, 8 homens (lavradores), 6 no grande (4 remos) e 2 no caique (2 remos); em Anha, 6 ou 8 homens (sobretudo lavradores), 3 ou 4 em cada barco (iguais), conforme iam pescar em frente à praia ou para o norte, até Âncora ; em Castelo de Neiva e S. Bartolomeu do Mar (de lavradores), Apúlia (de lavradores e pescadores), Aguçadoura (de lavradores), Averomar (de lavradores e pescadores) e Pampelido (sobretudo de lavradores), 6 homens, 3 em cada barco (iguais) ; no Mindelo, 4 homens (lavradores e pescadores), 2 no grande barco da carga e 2 no pequeno barco de lancear ; em Vila Chã e Angeiras, 4 homens (lavradores e pescadores), 2 em cada barco (iguais).
2) Ao sul do rio Douro :
26Na Murtosa e S. Jacinto, 6 homens (pescadores), 4 no grande barco da barra (de 2 remos) e 2 na bateira pequena (também de 2 remos) ; na Costa Nova, 8 a 12 homens (pescadores), 4 a 6 em cada bateira (iguais).
B) Onde se empregava apenas um barco :
27Em Matosinhos, Afurada, Aguda, Torreira, Mira e Leirosa, 5 homens (pescadores); em Espinho11, Esmoriz, Cortegaça, Furadouro e Costa Nova, 6 homens (pescadores)12 ; em Buarcos, e em certos casos na Gala, 5 a 6 homens (pescadores); na Tocha, 8 a 12 homens (lavradores). Na Gala e na Cova de Lavos, elas eram de 17 homens (pescadores), 2 por cada um dos 8 remos (4 por bordo), e mais o arrais com a espadilha, servindo de remo e leme.
28Na Póvoa de Varzim, semelhantemente, elas eram de 18 a 20 homens (pescadores), para a lancha, dos quais destacavam 3 ou 4 para o caceio, quando este ia dar o cerco.
29Normalmente, as companhas eram constituídas sempre apenas por homens. Excepcionalmente, em Vila Chã, as mulheres também pescavam, e havia-as mesmo que tinham carta de arrais; referiram-nos o caso de uma que estava grávida e, andando ao pilado no mar, teve que vir precipitadamente para terra ter o filho; e, muitas vezes, eram os filhos pequenos quem preparava a comida, porque o pai e a mãe andavam a pescar.
Notes de bas de page
1 Em Buarcos chamam «mexoalho» à rede com que se pescava o pilado, nome que deram ao caranguejo em questão. In Aguçadoura, p. 47, mencionam ainda «navalheira» (que nos parece porém designar o caranguejo grande, comestível) e «caranguejo mouro», que não confirmamos.
2 Escasso, na ria de Aveiro, significa uma mistura de «detritos das pescas e das espécies impróprias para alimentação, ou pelas suas qualidades, ou pelas suas ínfimas dimensões, de mistura com a folhada que as varredouras trazem do fundo. O caranguejo, o camarão bruxo, mouro, vermelho, e a enguia são os principais elementos deste adubo, em que entram em grande proporção, também, os embriões de todas as outras espécies» (Regalia, p. 46). Augusto Nobre, Jayme Affreixo e José de Macedo, A Ria de Aveiro,, Lisboa 1915, pp. 99-100, precisam : «enguias novas, de 1 a 11 cm, pequeníssimos mugens, linguados, robalos, douradas, choupas e as próprias lampreias... caboz, peixe-pau, etc., e todas as espécies inferiores que servem de alimento aos peixes adultos».
3 Ramos, op. cit., p. 390. A Memória de Lacerda Lobo vem incluída nas «Memórias Económicas» da Academia Real das Sciencias de Lisboa (1812) (ap. Póvoa de Varzim – Boletim Cultural, I, 2, Póvoa de Varzim, 1958, p. 252).
4 Baldaque da Silva, op. cit., pp. 100-121 regista a pesca do pilado, entre nós, apenas de Sedovem (um pouco a norte da Apúlia) até à foz do Mondego: Sedovem, Apúlia, Aguçadoura, Abremar, Póvoa de Varzim, Vila do Conde, Vila Chã, Lavra, Leça e Matozinhos, Foz (do Douro), Afurada, Lavadores, Granja, Espinho, Paramos, Esmoriz, Furadouro, Torreira, S. Jacinto, Mira, Buarcos, e Figueira da Foz. É porém fora de qualquer dúvida que ela ocorria igualmente a norte do Cávado, até ao rio Minho, e a sul do rio Mondego até à Nazaré.
5 Indicam-nos esse aproveitamento apenas uma vez, em Burgau. Mário Areias, op. loc. cit., p. 282, indica o nome de carraça pelo qual o pilado seria conhecido no sul e designadamente em Silves. Em Sines chamaram carraça ao caranguejo branco, do mar ; e em Silves, ao caranguejo negro, do rio – nem um nem outro, como dissemos, utilizado como fertilizante.
6 Jayme Affreixo, «Pescas Nacionais – A região de Aveiro», II, A Tradição IV, Serpa, p. 118, nota, a este respeito, também que «...anos há que nos bancos, as montanhas de caranguejo são tantas e tão extensas, que nem a sardinha quer atracar para terra, nem as artes a conseguem ensacar, porque tão depressa ela pressente as garras do crustáceo arrastando na frente da rede, foge espavorida em todas as direcções».
7 Godinho de Faria, pp. 279 e 183-184.
8 Em Matosinhos havia algumas – muito escassas – companhas de lavradores da região, e também de Arada, que iam ao pilado.
9 Baldaque da Silva, p. 111, referindo-se a Espinho, onde «a apanha do mexoalho é muito importante», fala do espectáculo «vulgaríssimo» da «permutação desses... caranguejos por nozes e frutas». Ver também Jayme Afreixo, op. loc. cit., IV, p. 168.
10 Octávio Lixa Filgueiras, «Barcos», Arte Popular em Portugal, III, p. 353.
11 Em Espinho, Affreixo, IV, 1902, p. 168, fala em companhas de 6 a 8 indivíduos, que eram muitas vezes filhos do mestre do barco, ou de um seu vizinho. Ver notas 204, 218 e 219.
12 Para as companhas dos chinchorros e das chinchas da ria de Aveiro, ver notas 204, 218 e 219.
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