I A figa em portugal
p. 177-206
Texte intégral
1. Definição de figa: gesto e amuleto
1Chama-se figa a um gesto mágico que se obtém com a mão fechada de maneira que o dedo polegar sobressaia dentre o indicador e o médio. Qual das mãos?
2Umas vezes a esquerda, outras a direita; e essa variedade se patenteia de facto nos desenhos que acompanham este trabalho. A mesma variedade se nota também lá fora. Em Lisboa, porém, como ouvi a muitas pessoas que consultei, homens e mulheres, crê-se que, embora dê mais jeito fazer a figa com a mão direita, se deve fazer com a esquerda; o preceito é fazê-la com a esquerda; a esquerda tem mais virtude, mais acção.
3Pode também fazer-se este gesto ao mesmo tempo com ambas as mãos, estendendo ou encruzando os braços.
4O gesto da figa imita-se artificialmente, dando-se-lhe forma de amuleto, de vários tamanhos, de 1 centímetro, ou menos, para cima, até 5 centímetros, ou mais, o qual amuleto consta da mão disposta como fica dito, e de parte do antebraço, onde se faz um sulco ou um orifício de suspensão, ou a que se adapta uma argola, às vezes por intermédio de um fio ou de um engaste metálico1. O orifício nem sempre está no antebraço, pode estar na própria palma da mão.
5O amuleto fabrica-se ou tem-se fabricado de várias substâncias, já de si mágicas, por exemplo, âmbar, azeviche, coral, como, ferro2, já indiferentes, por exemplo, barro, coquilho, loiça, madrepérola, marfim, mármore, osso, ouro, prata, vidro (ou cristal). Fazem-se também de massa, ou de outras substâncias (celulóide, galalite), para se imitarem algumas daquelas.
6Convém juntar as seguintes observações particulares. Ao azeviche alude J. B. de Castro, no Mappa de Portugal3, baseando-se em parte no que se lê em Duarte Nunes do Lião4: azeviche da Batalha, empregado para figuinhas e outros brinquinhos; Fr. Manuel de Azevedo consagra-lhe o capítulo IX do seu tratado do quebranto5. Ao âmbar consagra o mesmo Azevedo o capítulo X, onde lhe dá o nome de alambre, isto é, ambre ou âmbar, com adição do artigo arábico. O coquilho especifica-o Brás Luís de Abreu, no Portugal Medico6, a par com o marfim, etc., e daí fez cópia literal um dos comentadores dos Fastos de Ovídio e Castilho7. Das figas de barro, de Estremoz, fala M.me D’Aulnoy, no Voyage en Espagne8. As figas de ouro são tão apreciadas pelo seu valor material, que uma cantiga popular, que adiante se citará, as lembra com distinção. – Acrescentarei que hoje já não se fabricam figas de coquilho, e que não me consta que se fabriquem de barro em Estremoz. De barro só conheço uma, quase de tamanho natural, que comprei em Lisboa para o Museu Etnológico, fabricada não sei onde, como simples galantaria artística (Fig. 1).
2. Função da figa (como gesto, como amuleto, e meramente como vocábulo)
7A figa, como gesto ou como amuleto, emprega-se fundamentalmente, segundo já notei, contra a fascinação; mas nas mesmas condições, ou apenas como vocábulo, emprega-se contra outros males, e exprime também desprezo, zombaria, má vontade a alguém, e anulamento de uma afirmativa: ainda que nem sempre julgo fácil distinguir estes empregos do antecedente. Às vezes o vocábulo figa entra em locuções ou de carácter supersticioso, ainda evidente, ou de carácter apagado, isto é, gracioso. Temos, pelo que disse, três grupos principais de empregos da figa: e em seguida os vou especificar melhor.
A. Figa declaradamente contra fascinação
8Que a figa livra de fascinação é crença mais ou menos comum a todo o Portugal, o que posso afirmar por observações directas que fiz por todas as nossas províncias e em algumas das ilhas adjacentes, e por observações feitas por outros investigadores9. A crença nas virtudes da figa até passa da rude prosa da vida para a suavidade do verso:
Adeus, ó Rua Direita,
Em te ver me dá cubranto’.
Eu hei-de-te mandar pôr
Uma figa a cada canto...
diz uma cantiga que ouvi na Beira.
O meu amor é tão lindo,
Que é de todos cobiçado:
Hê-de-l’e dar uma figa
P’ra ninguém l’e dar olhado...
diz outra que ouvi no Alentejo.
Tenho meio tostão em prata
Para comprar uma figa,
Por causa das invejosas
Que se metem na m’nha vida...
diz também uma ouvida por Tomás Pires nesta última província10. O mau-olhado, se pode ser deitado involutariamente, pode também ser deitado por inveja. Em Lisboa, quando o namorado oferece à namorada, ou vice-versa, uma prenda, faz escondidamente uma figa para a prenda não receber mau-olhado, não se extraviar, etc. Como é natural, a crença na virtude da figa contra a fascinação aparece muitas vezes consignada na literatura, já como intuito moral, satírico, ou de curiosidade, já para se obterem efeitos artísticos. Vou apresentar alguns exemplos, partindo dos textos mais modernos para os mais antigos, visto que comecei por falar do presente, e desejo mostrar até onde posso fazer ascender a antiguidade da crença, para por fim lhe buscar a origem.
9Na Confissão Geral do Marujo Vicente, Lisboa 1888 (reprodução de edição anterior), folheto de literatura de cordel, diz Joana ao Vicente: «toma, toma sete figas, que não quero dar-te quebranto»11. O número «sete», como é sabido, figura muito na magia, e em geral no folclore: por isso aqui Joana multiplicou desse modo o gesto da figa. Camilo, nas Aventuras de Basilio Fernandes, 1863, faz que José Fernando diga a Basílio: «Vae-te regalar, rapaz, vae ver mundo, e volta com bastantes figas para enterrares pelos olhos d’estes invejosos»12. Em 1826 publicou-se no Porto um curioso jornal político chamado A Figa, de que só saíram dois números, cada um com o gesto como emblema no princípio, executado com a mão direita. Diz assim o 1.° número, em guisa de programa: «Este emblema, e esta epígrafe, tão célebres nesta Cidade, desde a época em que a exaltação d’huma exacerbada vingança fazia o timbre dos que se dizião Realistas, não ressurgem agora para rebendita; renascem para quebrar os olhos dos feiticeiros, que dão quebranto quando encárão presentemente os verdadeiros Realistas, que são os homens amigos das Instituições Liberais, que tem por honra ser Constitucionais, porque o seu Rei assim o ordena». No número 2.° há afirmação semelhante, a que logo me referirei. De um soneto manuscrito de Bingre, que faz parte de um poemeto intitulado Cidadão Liberal Rindo, com a Sua Sanfona, dos Corcundas Portugueses, 1822, extraio este quarteto:
Eu bem sei que esta tropa cocundeira
Me ha de assaz pragejar, dar mau olhado,
Mas de figa, azebiche eu ando armado,
Presente de Canidia, a Feiticeira13.
10Do século XVIII podem ver-se as já citadas obras de Fr. Manuel de Azevedo, Brás Luís de Abreu, e João Bautista de Castro, a que neste lugar adicionarei passos de outras obras. Dos meados do século, sem data, é o Banquete das Damas, folheto de cordel, e aí diz Brásia Martins às suas regateiras
Vinde ca, patuscas Manas,
Como vindes prazenteiras!
tomay, que contra o quebranto
mil figas darvos quigera.
Figas para as orteloas!
(folheto anónimo)14. O poeta burlesco Fr. Simão António, que em seus versos tem várias alusões a crendices e costumes, e que era cego de um olho, dirige-se assim ao presidente de uma das Academias a que pertencia:
Lembra-vos, meu Presidente,
Aquele dia fatal,
Quando huma manhã vos vi,
Talvez antes de almoçar?
Não sei se vos enguicei
No em jejum! tal não mostrais,
Mas talvez que a figa fosse
O antídoto principal15
o que melhor se compreende, sabendo-se que, por causa da debilidade da pessoa, alguns actos mágicos se realizam com maior eficácia em jejum que depois de comer. Por esse modo hão-de explicar-se uns versos de Nicolau Tolentino, que pertencem a uma das mais chistosas poesias que conheço em português, feita a um fradeleigo, vesgo, a quem um soldado tocara na cabeça com um espadim (o poeta está falando ao soldado):
Homem de tenção damnada,
Só tu conseguiste o fim
De entrar o teu espadim
Aonde não entra nada;
Da repentina estocada
Cahe o Padre desmaiado;
Mas quando recuperado
A ti os olhos volveu,
Sabes o que te valeo?
Foi teres já almoçado.16
Do contrário, o leigo, por ser vesgo, ter-lhe-ia dado má-olhadura, ou, para dizer com Fr. Simão António, ter-lhe-ia causado enguiço, que ele toma por sinónimo de quebranto. O jejum desempenha ainda outras funções na magia: quem está assim, está um tanto purificado (por isso a Igreja manda comungar em jejum); porém disso não tenho agora de tratar.
11Continuando a recolher notícias literárias antigas a respeito da figa, encontraremos logo no primeiro quartel do século XVII a seguinte endecha de Rodrigues Lobo:
Nisa, os teus amores
Estão mal mudados,
Que diz toda a aldea
Que lhes deu quebranto.
Tinhão mil extremos,
Erão muy gabados,
De muito pequenos
Lhes deu mal de olhado!
Olhou-te Lucindo,
O dos olhos brancos,
Que são peçonhentos
Como cão danado.
Não lhe deste figas,
Derão-te cuidados,
A todos suspeitas,
E a muitos agravos:
no romance pastoril O Desenganado17. Referindo-se no Viriato Tragico (1.a edição, 1656) a um prémio dado a Adónis na festa da serra da Estrela em tempos de Viriato, diz Brás Garcia de Mascarenhas:
Hum Cupido de prata com grã figa
De ouro fino, que algum desenganado
Sobre os olhos lhe poz em vez de liga18:
já se vê que se nos patenteiam aqui costumes do século xvii, e não da época lusitana. Ao mesmo século pertence António Barbosa Bacelar ( ߙ 1663), que na Fenix Renascida invectiva gongoricamente uns olhos tortos:
Travessos olhos, que na travessia
Deixais os olhos todos derrubados,
Contra quem só três dedos cavalgados
São na manhã remedio a todo o dia19,
onde com tres dedos cavalgados exprime o gesto da figa, e com manhã a importância mágica da vacuidade do estômago, de que já falei.
12Colecção não menos soporífera do que a Fenix é a que se intitula Academia dos Singulares, 1.a parte, 1665, 2.a parte, 1698. Numa das sessões foi assunto «hũa dama, a quem pedindo Fabio hũa prenda, soltou o cabello, & lhe deu com a mão hua figa» (isto é, lhe fez o gesto da figa). Ao assunto se dedicou um epigrama latino, dois sonetos portugueses, uma canção, uma décima, e quatro romances20. Clama um dos poetastros:
Mas se figas haveis dado
a quem olhado vos ha,
que figas merecerá
o que vos não der olhado?
e adiante:
pois me tratais por ama,
com figas, como a menino.
Vem outro em seguida:
Nos olhos lhe quebra a figa,
Mas Fabio amante confessa
que tomára mil quebrantos
sómente por esta quebra.
À vista de tais estultícias, é bem de perceber quem é que merecia as figas!
13Também o nosso grande cómico do século xvi, tão conhecedor da vida nacional, porém de senso e gosto literário a que nem de longe se compara o dos singulares académicos, faz que a Velha, na farsa Quem Tem Farelos (1505), rogue esta praga a Aires Rosado:
Má cainça que te coma,
Mao quebranto te quebrante,
E mao lobo que t’espante!
Toma duas figas toma!21
14No mesmo autor, e em poesias do Cancioneiro Geral, de autores contemporâneos dele, ou anteriores, respiguei ainda outros documentos, que incluí no terceiro grupo dos empregos da figa, de que me ocuparei em breve. Agora passo a ocupar-me do segundo.
B. Figa contra vários males
15Quando na rua uma pessoa encontra outra que a possa tolher, faz-lhe uma figa com a mão esquerda e diz:
Alho-porro tem três folhas,
O maldita (ou maldito) não me tolhas!
até sem ter alho algum na mão, embora ele seja realmente amuleto, que às vezes se traz na algibeira. Nesta superstição, que é corrente em Lisboa, tolher deve significar «enguiçar». Também na capital se pensa que, quando alguém encontra uma pessoa de quem não gosta, lhe faz escondidamente uma figa, ou duas (com ambas as mãos), e diz:
Viloa, viloa danada,
Quando Deus veio ao mundo, tu não eras nada22,
essa pessoa fica sobressaltada, isto é, sem saber para onde há-de ir, até que a outra se afaste.
16Especial encontro de um preto antes de almoço, por um homem, ou de uma preta, por uma mulher, é muito desfavorável, e o branco faz-lhe igualmente uma figa, às escondidas, murmurando:
Deus te salve criatura!
Deus me dê tanta ventura,
Como tu tens de negrura!
fórmula de que existem variantes, e se baseia no princípio mágico dos contrastes. A superstição tem muita voga em Lisboa, onde, desde o século xv, não faltam pretos pelas ruas. Superstição análoga existe aqui a respeito do corcunda ou giboso. Ambas se fundam noutro princípio mágico: que o que é estranho é maravilhoso. Creio que na atribuição de má sorte aos pretos influiria a ideia demoníaca que se relaciona com a cor negra23, ideia que há muito vivia no espírito do povo, e se definiu melhor depois que ele melhor conheceu os pretos. Com esta ideia coincide o rito de fingir que se espirra diante do preto que se encontra, pois o espirro para alguns povos significa entrada, e para outros saída, de um espírito ruim no corpo, do que ainda conservamos vestígios quando a alguém que espirra respondemos com «Jesus», e «Dominus tecum!» ou um simples «viva!»24. Todavia, encontrar um preto de outro sexo dá ventura. São surpresas e aparentes contradições que surgem com frequência no caminho de quem estuda o folclore, as quais não posso porém agora esmiuçar. Acrescentarei relativamente ao giboso que, cuspindo-se fora, e esfregando-se o cuspo com o pé, se detém o dano que ele causa, porque a saliva, já desde a Antiguidade, é tida supersticiosamente por profiláctica contra muitos males25. Outro obstáculo à acção funesta do giboso obtém-se dando um nó num lenço ou nó mágico, bem conhecido dos etnógrafos26.
17Se a figa é válida contra a acção sinistra de certas pessoas, sobretudo defeituosas e anómalas, compreende-se que muito o seja também contra as Bruxas, estoutras entidades de carácter sobrenatural e malévolo, que tanto martirizam a imaginação do povo. Por isso se usa a figa como amuleto para as evitar, e se faz o gesto, quando se vê uma mulher que se supõe ser Bruxa, ou quando se lhe passa pela porta. Em algumas terras, por exemplo, no concelho da Guarda, supõe-se que as Bruxas causam um burburinho ou remoinho de vento e poeira, indo dentro, e diz-se então que se deve fazer uma cruz, mas o que se faz é o gesto da figa, donde fica manifesto que o povo viu uma cruz na ligação do dedo indicador com o polegar. A um povo cristão, como o português, afiguram-se cruzes por toda a parte: na anatomia humana, os quadris, ou região lombar, são cruzes; na anatomia animal, a cernelha é uma cruz; quando atravessamos uma perna noutra, cruzamo-las; e até na ordem moral, por cruz se entende trabalho ou tormento. Nestes vaivéns do vocabulário acontecem não raro fenómenos notáveis: assim damos às extremidades da cruz o nome de braços, pela semelhança que têm com braços abertos; perdida a noção da metáfora, a expressão tornou-se real para a mente de quem fala, e portanto pôde inversamente Guerra Junqueiro chamar cruz da redenção aos braços de Impéria27. No que toca ainda ao burburinho, desejo observar que a crença de que nele vai uma Bruxa é comum a vários povos da Terra28, e que neste caso a Bruxa representará um espírito da Natureza, de acordo com uma acepção mitológica antiquíssima.
18Há uma superstição comum às Bruxas e ao Diabo, tido este também como causador de mal. Quando a lenha estala no lume, sobre o lar, supõem muitas pessoas que são as Bruxas quem produz o ruído, e por tal motivo dão estocadas na lenha, até que o lume se apague: durante a operação dizem no concelho do Bombarral:
Figas, Diabo! || Sapo tosquiado || mostarda e alho!
O que me elas desejam || nelas o vejam!
Sapo tosquiado, isto é, cuja pele é desprovida de pêlos (epíteto pleonástico e gracioso); mostarda, por causa do seu cheiro forte e acritude, quando aplicada como cataplasma; alho, por causa também do cheiro. – Teria de me alargar muito para explicar tudo isto, que no primeiro momento faz em verdade rir, mas que tem raízes profundas na psique humana: basta notarmos a associação do Diabo com as Bruxas, e o emprego da palavra figa, que de certo acompanha o respectivo gesto, reforçando-o: porque assim como em Medicina há a polifarmácia, também na Magia um agente se associa a outro, para se obter melhor êxito (polimagia).
19No concelho do Cadaval, ao ver o povo milhafres ou corvos em volta dos lugares, diz: «figas, Diabos», ao mesmo tempo que faz figas. Àquelas aves de rapina atribui naturalmente funções diabólicas. Expressão paralela a «figas, Diabo!» (no singular) é «Figas, Canhoto!», completada às vezes com outra, para rima: «Figas, Cão-Tinhoso!», porque Cão-Tinhoso é nome vulgar do Diabo. Já no Rigveda se fala de cães-demónios29, posto que a nossa expressão não viesse de tão longe, e se deva apenas ao sentido pejorativo que tem na língua portuguesa em alguns casos a palavra cão. A tinha é também um reforço de repugnância. Canhoto significa «esquerdo», tendo-se pois assim atribuído ao Diabo qualidades de inabilidade, e por extensão de sentido qualidades de inépcia. Nos Contos ao Soalheiro, Coimbra, 1876, p. 34, põe igualmente Augusto Sarmento as seguintes palavras na boca de Francisco, que está dialogando com a tia Michaela acerca do projectado casamento do filho dele: «Figas, Canhoto, se o via caído em tal arriosca!» E Trindade Coelho, nos Meus Amores: «Cruzes, Canhoto, arreda p’ra lá que me pegas a sarna!»30. Isto prova a generalidade da concepção. A sarna fica equiparada à tinha como dermatose asquerosa31.
20Da poesia popular colho mais dois documentos da conexão que se estabelece da figa com o Diabo: um esconjuro, e uma canção. O esconjuro diz:
Cruzes, figas, Anjo Bento,
Vade retro, Satanás!
Faça-se um defumadoiro,
P’ra tudo ficar para trás!
que ouvi em Lorvão, e se recita para espantar o medo, quando, por exemplo, se anda de noite. Defumadoiros, ou fumigações mágicas, são muito empregados na medicina supersticiosa. A canção (de Alvaiázere) diz:
Rapazes da minha terra,
Meninas do meu lugar:
Dêem quatro figas ao Demo,
Não se deixem enganar!
onde quatro (para o efeito bastariam duas ou uma) é número redondo e indefinido que significa «muita quantidade», como na frase: mais vale um gosto que quatro vinténs32.
21Curioso exemplo do emprego antidemoníaco da figa no-lo patenteia uma obra mística do século XVIII, da qual consta que um padre-confessor mandava uma freira de Odivelas dar um par de figas ao Inimigo, sempre que este a tentasse33. Ou submetido a duas, ou a quatro, ou a muitas, ou só a uma, o pobre Diabo devia ver-se quase tão aflito com as figas que lhe davam ou faziam, como as criaturas com as tentações dele!
22Desde, pelo menos, Hipócrates, pai putativo da Medicina, se sabe quanta acção tem a atmosfera na produção e andamento das doenças e na transmissão das que são contagiosas. Ao povo não escapou o conhecimento disto, só com a diferença, que onde o médico descobre, ou descobria, eflúvios, miasmas, micróbios, o povo imagina, de modo genérico, coisas ruins: ar de vivo, ar de morto, ar de excomungado. O ar, para ele, não é unicamente um veículo de peste, ou de doença em geral, é um agente nefasto, uma emanação que ele repele com figas, como os outros males até aqui enumerados.
23Falta falar do terceiro emprego da figa, pertencente porém mais à Etnografia e à Lexicologia, do que à Medicina.
C. Figa como sinal ou expressão de desprezo, etc.
24Gestos e locuções andam juntos para manifestar desprezo, zombaria, má vontade a alguém.
25Tentarei uma classificação.
a) Casos gerais
26Cantam no Alentejo a seguinte cantiga:
Minha avó, quando morreu,
Ficou com um olho aberto,
E deixou em testamento
Uma figa para o neto34,
isto é, não lhe deixou nada, ou deixou-lhe pez para os olhos, como também dizemos.
27Analogamente se lê num entremez de cordel, do século XVIII:
«Ainda queres mais comer? Come uma figa»35,
o que corresponde a: vai comer ao Inferno; come coisa que não preste, já que não mereces mais; come uma sénica, ou «arsénico» que te mate.
28No século XVII tratou fantasiosamente da origem da figa Domingos Pereira Bracamonte, natural de Amarante; mas enumera algumas das qualidades que o povo lhe atribui, por exemplo, «a de negar alguma cousa com desprezo, quando um galan pede favores a uma dama, se ella responde com uma figa»36.
29Do século XVI para o XVII escreveu Soropita: «e o bom do rapagão... ainda agora ali estava ancorado na cuba da Boa-Vista, com quatro figas nos pavezes para o madraço do Palmellão»37, onde por figas para se entende «figas contra». Temos outra vez aqui o número quatro, como há pouco.
30E António Prestes, século xvi:
... quando comeres migas,
Para ti se tornem figas!38
ideia paralela à que se exprimiu no citado entremez.
31Um contemporâneo de Prestes, isto é, António Ribeiro, o Chiado, escreveu: «quem se corre39 II de lhe tirar40 pulga ou piolho, II metam-lhe figa no olho»41. A frase que o poeta empregou a modo de rifão equivale a: apresentem-lhe uma figa, fujam dele.
32Finalmente, no Cancioneiro Geral encontrei os versos que vou transcrever:
Oxalá me visse eu
co’ ele já nessas briguas,
para lhe paguar em figuas
todo o seu,
referidos a Jorge de Oliveira, que cobrara dinheiro excessivo por um despacho42 e:
Bem mereço eu myl fygas
& fadyguas
poys que perco meus cruzados,
postos na boca de Vasco Abul, a quem uma rapariga não quisera restituir uma cadeia de ouro que este lhe havia dado por brincadeira43.
b) Espécie de praga
33Nas Pupillas do Senhor Reitor, 1867, lê-se este diálogo entre o Reitor e João Semana: – «Então deixaste alguma sangria mal vedada, João Semana? Ah! Ah! – Uma figa para a graça! disse o cirurgião contrariado44. E nos Rasgos Metricos, século xviii, diz Alexandre António de Lima:
Tu não ouves, rapariga?
Anda, valha-te huma figa45.
34A expressão que aqui vemos corresponde a muitas outras de que a linguagem quotidiana se sobrecarrega sem cessar, como: valha-te a breca! valha-te o Porco Sujo! às quais na origem se ligou sentido efectivo, pensando-se que o mal, assim expresso, recaía na pessoa a quem ele se desejava: com o andar do tempo, e os progressos da instrução, degeneraram em meros bordões de estilo. Ainda assim, o povo em Lisboa acredita a sério que casa praguejada, ou em que muito se praguejza, nunca é ajudada. Aquilo que uma vez se enraizou no espírito, tarde se desenraíza!
35Comparáveis à expressão valha-te uma figa podem considerar-se as seguintes, que se lêem, por exemplo, nos Contos ao Soalheiro: ó bonifrate d’uma figa! Bruxa d’uma figa!46 nos Mysterios do Alentejo: remolga duma figa47; na Familia do Antiquario, século XVIII: pobretona de huma figa!48; Nos Disparates de Hum Acêrto, do mesmo século: senhora sopeira de uma figa!49. O que tudo equivale a: «Fulano ou Fulana, és tão desprezível ou tens tanta maldade, que mereces que te façam uma figa!». Considerando figa a própria pessoa, pois de se desejar mal a um indivíduo, facilmente se passa a chamar-lhe mau, diz Marta Gil de si mesma, com ironia, ao Diabo, no Auto da Barca do Purgatório de Gil Vicente.
Embarcade la esta figa50,
isto é: «embarcai-me agora a mim».
c) «Fazer» ou «dar figa»
36Faz-se uma figa a uma pessoa ou a uma coisa, com o intuito de a rebaixar. Assim afirma o povo, como tenho ouvido.
37Uma cantiga confirma isto, quanto a Melgaço:
Eu a todos faço figas,
Faço figas, figas, figas:
Vem o Demo do rapaz,
Entra ao rol das raparigas!
isto é, vem intrometer-se na roda onde elas estão. «Para arrenegar um rapaz qualquer! explicou a mulher que ma ditou; mas ele ri-se, e volta ainda mais depressa, se é atrevido!»
38Também o folgazão Francisco Palha versejou de modo semelhante, quando pôs um sapo a discretar assim na serra de Sintra:
Cantigas! boas cantigas!
Quem trinca, trinca, trincou;
As doninhas que hei papado,
Por mais figas, figas, figas,
Ninguem d’aqui m’as tirou,
o que alude à opinião de que a doninha se mete automaticamente na boca do sapo51. Por mais figas, isto é, por mais figas que me façam.
39Outra cantiga popular, ouvida por mim no Sul:
Não venhas à minha rua,
Não te assomes ao mê canto,
Não venhas cá fazer figas
A quem te queria tanto.
40Ainda nas mais graves circunstâncias as pessoas supersticiosas ou amigas da tradição não se esquecem da figa. Conta um jornal52 que um tenente-aviador, ao passar por sobre um sítio em que, havia três anos, por causa de incêndio do seu avião, tivera de aterrar, lhe fez uma grande figa, segundo declaração deste. É claro que o tenente quis dizer que olhara para o sítio com horror; mas convém arquivar a expressão de que se serviu.
41Dentro do mesmo círculo de ideias, penso que há-de explicar-se um adágio publicado por Bluteau no século XVIII: Hũa figa ha em Roma || para quem lhe dão & não toma53, ou por outra: a corte papal faz uma figa àqueles a quem lá se dão ou concedem graças, e de quem ela não recebe nada em pagamento.
42No Auto da Natural Invenção, de Chiado, trava-se este diálogo entre o Escudeiro e o seu Moço, a propósito da namorada do primeiro:
escudeiro:
Se eu hoje, por tua industria,
fallo a essa rapariga,
tens de mim...
moço: Quê?
escudeiro: Esta figa!
pois que queres que te diga?54
onde figa aparece por gracejo.
43Era porém tal no século XVI a crença na ruindade do gesto, que em 2 de Janeiro de 1553 Afonso Anes denunciou à Inquisição um cristão-novo, por este «fazer figas ao Santíssimo Sacramento»55; e em 1547 o governador da índia, por os moradores e capitão de Goa não terem acudido a Bardês e Salsete contra os Mouros, escreveu à Câmara, dizendo-lhe «que lhe dava muytas figas pera todos os que tomárão tal achaque... e na carta lhe mandou muytas figas pintadas»56.
44Sinónimo de fazer figas é dar figas, que aparece em algumas canções populares, e sobretudo na literatura antiga. Das canções populares já acima vimos uma.
45Agora temos outras:
Quero cantar e bailar,
Dar quatro figas ò mundo:
Quem se meter no Inferno,
Que se meta bem no fundo.
46(Alentejo)57;
Chapéu de moeda d’ouro
Ninguém no tem coma o meu:
Hei-de amar a quem quiser,
Dar figas a quem mo deu...
47(Cadaval);
Quem me dera «5 réis»
Para comprar uma figa,
Para dar àquela esperta...
Que lhe importa a minha vida?
48(algures);
Tenho «5 réis» em prata
Para comprar uma figa,
Para dar às invejosas
Que falam na minha vida...
(Lisboa); esta última, com uma variante no primeiro verso: «Tenho “5 réis” em ouro» (também de algures). Primeiro, como se vê, disse-se simplesmente «5 réis», que se subentende que eram de bronze; depois o bronze mudou-se em prata e em ouro, por arredondamento poético, e porque a figa, de verdadeiro amuleto, se tomou, como já notei, objecto valioso, feito de qualquer daquelas duas substâncias58. Segundo a minha interpretação, o povo não atendeu ao rigor lógico, e só à ideia de valor, que lhe pairava no espírito. Nas duas últimas cantigas, que no conjunto são variantes de uma que acima transcrevi, onde se fala de «meio tostão» (pág. 180), há trocadilho entre o nome do gesto (dar figa) e o do amuleto, como objecto material, que se compra e se dá, ou oferece, a alguém. Outros textos nos falam de figas dadas realmente por prenda:
Eu tenho uma figa d’ouro
Ao canto do meu baú,
Para dar ao meu marido...
Queira Deus que sejas tu!
diz uma cantiga colhida por A. T. Pires59; e acima (pág. 180) transcrevi outra que ouvi no Alentejo (Vidigueira). Num insípido mas etnograficamente curioso poema do século XVIII lê-se também:
Passada a Pascoa, seguem-se os Prazeres:
Tempo de hir aos Prazeres, e escolheres
Os corações dourados, negras figas,
Para off’recer ás loucas raparigas60,
isto é, ir à festa dos Prazeres comprar figas de azeviche, e objectos cordiformes.
49Fechado este parêntesis acerca da figa, dada como prenda, passarei a transcrever trechos literários de séculos passados, a respeito da frase dar figa.
50No Saloyo Cidadão, comédia de cordel do século XVIII, temos este diálogo:
– Então dá-me um abraço?
– Hum abraço? Huma figa.
Já você queria?61
51Noutra peça de cordel, do mesmo século, Acta da Forneyra de Aljubarrota, lê-se: «...Algarve, em cujo reyno, ainda que seus moradores [não] possão muito, contudo sempre dão figas a muitas terras de Portugal»62. Temos aqui mais um trocadilho entre dar figas e dar ou produzir figos, visto que a nossa extrema província meridional é terra de figueiras; ou talvez aqui se tomefigas por «bêberas», e então o trocadilho fica ainda mais apurado.
52No poema joco-heróico, Benteida, de Alexandre A. de Lima, de 1752, o herói está transformado em mulher; e depois:
qual a figa lhe dá, qual o abençoa63.
53Nas Rimas Sonoras, que já citei, de Fr. Simão António, fala-se de cosméticos:
...Do unguento cetrino
Ha duas caxas cheas de contino,
Que dando a muitos figas,
Servem de campa ás covas das bexigas64.
54Bluteau arquivou em 1713 o provérbio: «urinar claro e dar duas figas ao médico», que mostra que, para o conceito popular, logo que a urina se apresente com os caracteres físicos normais, a doença não tem importância. Na Espanha corre o mesmo provérbio65, e de lá nos veio provavelmente o nosso; mas, ao passo que nós, dando maior importância ao médico, dizemos duas figas, os Espanhóis contentam-se com uma.
55Do século xvii, além do que a outro propósito já citei acima (pág. 182):
...dou-me hũa figa,
Já que não mereci mais,
diz Simão Machado66, e igual frase se lê em versejadores da Fenix Renascida67, e em Soropita (sécs. XVI-XVII); neste último:
Namora uma menina de dez anos,
Que lhe chora no colo e dá-lhe figa68
56A expressão que acima interpretei dar quatro figas, que vimos numa cantiga popular e em Soropita, aparece várias vezes no século XVI: Jorge Ferreira emprega-a, pelo menos, na Aulegrafia, duas vezes69 e na Eufrosina, uma70. Confirmando a minha interpretação de quatro no sentido de «muitas», diz Afonso Álvares, dirigindo-se ao seu antagonista Chiado: ...dou-te quarenta figas !71, o que combina com os versos de cordel mencionados há pouco (pág. 181), onde se lê dar mil figas. Vê-se que ainda eram precisas mais mãos, para as fazer, do que as que tinha o gigante Briareu!
57A mesma expressão, reduzido porém a um o número das figas, a achamos em Gil Vicente:
Quem te dera hua gran figa
Nos olhos bem pespegada!
quando Caterina conversa com Joane no Auto Pastoril72.
58Também em Caminha, tomando por mote uma cantiga velha, que diz:
Quien piensa que tiene amiga
Tiene una higa,
Quien piensa que tiene amada
No tiene nada,
glosou-a assim:
Piensalo quien lo merece,
Mas cuitado,
Pues tan mal se le agradece
Su cuidado.
En pago de su fatiga
Danle una higa,
Y a su alma mal tratada
No le dan nada.
Si a pensar esto s’atreve,
A si se ciega,
Porque adonde más se deve
Más se niega.
Siempre a la mayor fatiga
Mayor higa,
Y es su vida bien penada
Y mal mirada73.
59Não falta igualmente no Cancioneiro Geral a nossa expressão, variando somente o número das figas:
Day-me la figua, ó porteyro,
cor de brasa74
Sam75.. tam honrrado,
que dou tres figas ós Gôdos76.
E doy tres fygas aa morte,
se vós nam andardes quente77.
aas boticas dou myl fygas78.
60Há pouco vimos figas contra os médicos; agora contra os boticários, e contra a própria morte! Ninguém escapa, pois é desejo natural do homem querer aguentar-se na vida. Novamente temos aqui números definidos com significação de indefinidos: três e mil. De três afirma o povo que é a conta que Deus fez, de acordo com a sentença virgiliana:
numero Deus impare gaudet79:
e por isso figura frequentemente na magia. Mil a cada passo o dizemos por «muito», ou no falar corrente, ou em falar semi-supersticioso, por exemplo: com mil diabos!
61Para além do século XV não encontrei textos com a frase dar figa ou fazer figa, nem tão-pouco com qualquer menção de «figa», o que não quer dizer que os não haja.
d) A figa como anulamento de palavra dada
62Tenho aqui muito pouco para dizer, pois só sei que em Coimbra se conta, não sei se por brinquedo, se a sério, que se alguém, ao empenhar a palavra de honra, faz uma figa escondidamente com a mão direita, fica ipso facto, perante a própria consciência, desobrigado de cumprir aquilo que prometeu.
63Dar um homem a sua palavra de honra corresponde nos povos civilizados à mais solene afirmação possível da seriedade do carácter. Nas coisas mágicas, contudo, e às vezes nas religiosas, tem maior importância o formal que o real; o que importa, é o que se imagina praticar, e não o que efectivamente se pratica. Por isso um negociante, quando quer inculcar a um freguês a verdade de um asserto, mete o dedo na casa do colete, e jura: «arrasada seja esta casa, se eu minto», supondo que o freguês pensa que ele fala da casa de habitação. Os budistas queimam em honra de Buda papel dourado, para ele cuidar que é ouro, e o restituir como tal80. Muitos actos que hoje nos parecem, ou são na realidade, gracejos, derivam de estados psicológicos antigos muito sérios e muito diversos dos actuais: só por análise histórica e miúda os compreendemos ou descortinamos.
D. A figa como protectora de animais e coisas
64O papel profiláctico ou apotropaico que a figa desempenha como gesto e como amuleto, não é somente em benefício de pessoas, é-o também em benefício de animais e de coisas; por fim de contas, sempre em prol do homem, pois que ele utiliza estas coisas e animais.
65No Alentejo os carreiros ou carrejões e os almocreves penduram vários amuletos, e entre eles figas, na testeira do gado muar, cavalar e asinino, para o preservarem da acção de espíritos malévolos; por causa ainda de mau-olhado é costume pôr ao pescoço de um burro recém-nascido uma coleira encarnada, de que pende uma bolsita com alho e uma figa81. A virtude dos amuletos está no último caso reforçada com a cor da fita, porque o encarnado goza de virtudes mágicas em vários povos, e já desde a Antiguidade, como podia aqui provar com muitos exemplos.
66Em Alcácer do Sal, quando nasce um bezerrinho, põem-lhe ao pescoço uma figa, também por causa de quebranto; quando cresce, tiram-lha82. O mesmo praticam na Figueira da Foz83. Fica manifesto que o animal, quanto mais tenro é, mais sujeito naturalmente o julgam ao influxo de entidades ou males sobrenaturais.
67Depois dos animais as coisas. A figa pode ter-se em casa, em qualquer parte, para defesa desta, especialmente pendurada do leito de dormir, ou de um berço. Em Angra até a atam a uma máquina de costura, para não emperrar, o que se atribui a mau-olhado. Há anos comprei para o Museu Etnológico um prato de faiança, que julgo ser do século XVII, o qual tem no fundo, entre ornatos de carácter vegetal, a seguinte pintura: uma figa voltada contra o olhar de uma pessoa que jaz muito próximo dela. A figa está mal desenhada; todavia não há dúvida que é figa. Vid. a Fig. 2. Acho bastante significativo o desenho: quis-se que quando alguém comesse no prato, os alimentos lhe não passassem quebrantados para a boca. Há do mesmo modo vasilhas que por motivo análogo, quanto a líquidos, têm figurado um sino-saimão, estoutro vivaz amuleto português.
68Numa comunicação, que o ilustre oficial de Marinha, o Sr. Quirino da Fonseca fez à Associação do Carmo em 19 de Abril de 1924, mencionou, a par de muitas naus com denominação religiosa, uma do tempo de D. João II, chamada Figa. No meu entender, esta nau teria pintada na proa ou no costado uma figa que lhe evitasse qualquer dano sobrenatural; e da pintura lhe proviria o nome. Uma figa possuía então, como ainda hoje, quase as mesmas virtudes miríficas que uma cruz, uma imagem de santo, ou um sino-saimão, que realmente por vezes se vêem pintados em barcos. Os Egípcios, os Etruscos, os Gregos figuravam também olhos nas suas naus, com intuito análogo84.
69Da figa, como protectora de edifícios, mencionarei adiante um caso notável da Galiza, pertencente à Idade Média.
3. O vocábulo figa
70Ao vocábulo português figa correspondem vocábulos análogos noutras línguas, como se dirá adiante, quando se tratar da origem da superstição.
71O nosso tem no uso vulgar duas formas, que convém arquivar, por se relacionarem intimamente com a doutrina exposta no capítulo II: fígueda ou fig’da, que ouvi no Alandroal, e finga, que ouvi na Figueira da Foz. em fígueda influi manifestamente, por etimologia popular, a palavra fígado85, o que se deduz do carácter apotropaico da figa, e de depender do fígado, na concepção do vulgo, e na da antiga Medicina, o chamado temperamento bilioso, donde até vem a expressão familiar Fulano tem maus fígados, com fígado no plural, como noutras línguas românicas86. Finga parece-me que resultou do cruzamento de figa com o verbo fincar, pois que, sendo a figa destinada, como disse, a deter ruindades da vista de outrem, finca-se para isso nos olhos do malvado, ou «enterra-se», para me servir da expressão camiliana que há pouco mencionei.
72Por abuso de linguagem, ou antes por generalização, o povo no concelho de Estremoz chama figa a outros amuletos que, como este, evitam quebranto: ao cornicho, e ao dente de verrasco. Acima vimos (pág. 186), que por causa do seu feitio, se dava à figa na Guarda, como gesto, o nome de cruz.
4. Modo de trazer o amuleto chamado figa
73A figa, como amuleto, anda por exemplo, no pulso de mulheres e crianças, ou ao pescoço, pendente de um colar. Os homens trazem-na na corrente do relógio. Escreve F. Manuel de Azevedo na Correcçam de Abusos (século XVII): «as velhas ardilosas & matreyras, que tudo adivinhaõ & experimentaõ, nas suas crianças põem no hombro, pescoço, ou maõs, figas de azeviche, & fios de contas miudas, para as assegurarem de feytiços & quebranto»87.
74Pode o amuleto trazer-se junto de qualquer peça de vestuário, já cosido ocultamente a ela (Figueira da Foz)88, já à mostra:
Chapéu de meia moeda
Traz o meu amor ò campo,
Cercado de figas d’ouro
Para lhe não darem quebranto,
como afirma uma canção do Alentejo89. Nicolau Tolentino retratou-se a si próprio do seguinte modo:
Colchete no cabeção,
Sahi novo Adonis bello,
Figa no coz do calção,
Carrapito no cabello,
E hum biscoitinho na mão90;
e em 1794, na procissão do Corpo de Deus, nas Ilhas Adjacentes, os tabaréus (soldados mal exercitados) levavam
Na véstia e nos calções grosseiras figas,
segundo o autor do Diario Secular91.
75Umas vezes o amuleto traz-se sozinho, outras aos pares, como parece inferir-se de um documento do século XVIII, citado por Borges de Figueiredo92, outras junto com vários amuletos. Ao conjunto chama cambada o já citado jornal portuense A Figa, n.° 2, e enumera alguns dos amuletos.
76Em vez de cambada, que porém é boa palavra tenho ouvido dizer cambulhada93, e de modo geral arrebiques. Além de andar a figa em cambulhada, ao pescoço, no braço etc., associa-se artisticamente a outros amuletos, fazendo um todo com eles. No presente trabalho vemos a figa assim associada muitas vezes ao cornicho (n.os 17 a 22, e 23 a 29), e uma vez associada à meia-lua (n.° 30), que é amuleto infantil de grande voga. Quando a figa está associada ao cornicho, este faz as vezes de antebraço. Também no estudo que consagrei ao Signum-Salomonis, publicado em 1918, inseri catorze amuletos mistos, onde entra a figa94. Os Antigos agrupavam a cada passo divindades e atributos divinos a amuletos95: tudo isto segundo o princípio da polimagia, enunciado acima, (pág. 187).
77Mais talvez por causa da sua forma regular, que se presta a aplicações artísticas, do que pelo seu sentido mágico, embora não perdido este totalmente, fabricam-se vários objectos de uso, de forma de figa, ou adornados com ela. No Museu Etnológico existe um frasquinho de vidro coalhado, destinado a perfumes, que figura um braço cuja mão faz uma figa; vi dois semelhantes, mas com esmalte, em casa de um curioso, em Viana, e creio que outros tenho visto análogos em museus estrangeiros. No Museu Etnológico há mais os seguintes objectos de osso: ganchos de meia (Figs. 36 a 38 etc.), uma agulha de fazer malha (Fig. 40), bicos de escapelar (Figs. 41 e 42), uma caneta ou pena de escrever (Fig. 43), cada um deles com uma das extremidades elegantemente afeiçoada como braço terminado em figa, e também uma guitarrinha (Fig. 44), feita por simples curiosidade, com o respectivo braço terminado do mesmo modo. Sei, além disso, que uma criada de certo hotel de Lisboa costumava trazer nas orelhas brincos pretos, cada um de forma de figa, talvez feitos de massa.
78Disse eu que me parecia não estar ainda extinto o sentido mágico: de facto, todos estes objectos são de uso, ou representam objectos de uso, e neles pois frequentemente se pega, o que equivale a ter na mão um instrumento apotropaico de grande valia.
5. Acrescentos ao que fica dito do gesto e do amuleto
79Se, com poucas excepções, o amuleto se traz às claras, ou como objecto destinado a evitar que de longe ou de perto advenham males a quem o usa, ou como objecto artístico, que às vezes é, e que portanto deve ser visto de todas as pessoas, – o gesto, pelo contrário, quando se dirige contra um inimigo individual, ou contra alguém que com ele possa naturalmente ofender-se, faz-se às escondidas96. Assim era já em tempos antigos, como consta de Gil Vicente:
Qualquer me disser que é resuscitado,
Dar-lhe-ão ua figa debaixo do manto97,
e como também se lê num poeta do Cancioneiro Geral:
Dar de baixo do mantão
figua a quem der na trincheira98.
80O povo, de muito crer na virtude do azeviche contra o mau-olhado, chega a afirmar peremptoriamente que a figa estala, quando exposta a este, o que eu e outros investigadores temos ouvido com muita frequência99. O mesmo acontece, já se vê, com contas feitas da mesma substância: e as mulheres até apresentam às vezes contas quebradas, como prova, a quem duvida. O mesmo se lê em 1826 no jornal portuense A Figa, de que já falei; e que a crença provém do passado, o demonstra o seguinte passo da Correcçam de Abusos: «contaõ os naturaes, que para preservar de olhado, & quebranto tem (o azeviche) tanta efficacia, que primeyro elle se deyxa quebrar em mil pedaços, que consentir que a maligna qualidade do olhado mao passe a alterar & fazer enfermar a creatura que o trouxer consigo no braço, ou pescoço, dependurado»100.
81Refere o ilustre entógrafo e professor, o Dr. Augusto César Pires de Lima, que em Santo Tirso as figas estão a ser substituídas por medalhas e cruzes101. O mesmo acontece em muitas terras, por exemplo, na Beira, e nos Açores, o que atribuo a obra dos padres. Pelo contrário as mulheres em Lisboa fazem grande apreço da figa, por influência, como penso, dos ourives que vendem figas de prata e ouro de todos os tamanhos e preços: numa rua de Lisboa, até houve, como me informam, uma ourivesaria que tinha por insígnia uma figa muito grande, exposta num mostrador. Tudo vai do sentido que se liga às cousas. Ao passo que quem traz consigo uma figa, é para afastar males, aqui a figa é para atrair fregueses! E é claro que mais razão assiste ao ourives do que a estes! As ourivesarias do Porto também espalham figas para muitas partes, principalmente para o Norte e para a Beira. Em regra vendem-se figas de pouco preço em todos os mercados e feiras: e nisso está outro motivo de não morrer a superstição, ajudada a perpetuar-se sob a forma de dixes.
82Falta juntar breves considerações acerca do fabrico, comércio e estética das figas.
83As figas de ouro e prata provêm de indústrias caseiras que se exercem em Gondomar, Avintes, e outras terras vizinhas do Porto. Há-as maciças e ocas. As maciças são fundidas segundo os processos normais de fundição (areia, gesso, siba, ou osso de choco, também chamado pelos ourives casca), e depois cinzeladas. As ocas são estampadas com cunhos de aço, ferro e bronze. Também há um processo especial de fundição, que se denomina de ceras perdidas, pelo qual se forma logo uma figa muito acabada e artística, sem intervenção de cinzel. De vários ourives tenho sabido que as figas que mais se fazem, e que o público procura e prefere, são as esquerdas; figas da mão direita, somente por encomenda se fabricam. Isto concorda com o que escrevi, supra, pág. 177. As figas de ouro e prata entram no mercado por intermédio de corretores que as tomam em Gondomar etc., à consignação, e as dispersam por todo o Portugal; quando não conseguem vendê-las todas, entregam as restantes aos fabricadores.
84As figas de coral, madrepérola e azeviche são esculpidas. Segundo informações que me deram, havia dantes em Lisboa, ainda na primeira década do presente século, ourives escultores que as faziam, e depois as passavam às mãos de outros ourives, para estes as encastoarem de ouro. O castão, também chamado engaste, era às vezes muito artístico, e até de filigrana. A madrepérola vinha da nossa Índia e da África (sobretudo de Bazaruto: ostreiras de pérolas). O coral vinha igualmente de África. O azeviche, conquanto existam em Portugal jazigos de lignite, de que ele é uma variedade102, costumam comprá-lo na Galiza, mas provavelmente era oriundo das Astúrias, donde se forneciam os azabacheros de Santiago, de que falarei adiante. Um documento de 1581, respectivo a estes azabacheros, gaba a excelência do azeviche asturiano, que contrastava com o de Portugal, a que chama morto e falso «porque no sufre en si calentura, ni ayre ninguno, y hiende y se quebranta al sol y al ayre»103. As figas de coral, madrepérola e azeviche, que cá se preparavam, lançavam-se no mercado por muitas maneiras. Hoje, como me dizem, já não se fabricam cá: vêm de outras nações, Suíça, Itália, etc.
85As figas de osso são feitas ordinariamente por presos, por exemplo, no Limoeiro, na Penitenciária, na cadeia das Caldas da Rainha. Muitas das figas de osso do Museu Etnológico provêm desta última prisão, onde os próprios presos as vendem, através das grades, a quem passa na rua.
86As de chavelho e outras grosseiras creio que são feitas avulsamente por curiosos.
87As de mármore fabrica-as um único canteiro de Algés. Nunca vi nenhuma, falo por informações que me deram. Consta-me que as há de 5 centímetros de tamanho, e maiores.
88As de vidro, marfim, galalite e celulóide vêm, todas, ou quase todas, de fora (Alemanha, etc.), bem como as de massa, que ora é preta, para imitar azeviche, ora encarnada, para imitar coral, ora de porcelana, para imitar madrepérola e marfim, conforme as cores ou tons que lhes dão.
89As de azeviche, de tipo compostelano, que cá às vezes se encontram, são evidentemente importadas da Galiza: n.os 31, 32, 33. O frasquinho de loiça terminado em figa (n.° 45), de que falei a pág. 202, chegou cá, vindo também de fora.
90Da proveniência de figas de ferro não pude saber nada.
91De barro conheço um único exemplar, que é o que se aqui figura com o n.° 1: dele já falei acima pág. 179.
92Agora pelo que toca à estética. Além da figa de barro, feita com toda a naturalidade, há-as de prata e de ouro analogamente apuradas. Em poder de um meu conhecido vi uma de azeviche com unhas de ouro, anel da mesma substância metido no dedo anular, e punho de camisa cravejado de diamantes. Este indivíduo é muito rico, e atribui em parte a riqueza ao influxo da figa! Numa ourivesaria de Lisboa vi também uma figa com punho de ouro muito nítido. Mas a maioria das outras que conheço são mais ou menos estilizadas, algumas até muitíssimo, por exemplo, os n.os 4, 13 e 29, que têm os dedos estendidos (o n.° 4, ao todo, só com três dedos!); mas a disposição da mão é a da figa. Conquanto entre nós se use a mão natural da toupeira como amuleto, não conheço nenhuma representação artificial da mão humana, tida como tal: pelo que me parece que nos n.os 36, 37, e 38, apesar de estarem aí estendidos os dedos, o artista quis figurar figas. A estilização que aqui se observa é comparável à de muitas figas galegas, como consta do que diz Osma, a pág. 178 e 234 do seu livro intitulado Azabaches compostelanos, a que já aludi, e a que adiante terei de tomar a referir-me.
93Na superstição, e também não raro nas coisas religiosas, o hábito faz que a ideia chegue a ficar representada por mera esquematização ou símbolo: e o símbolo ou a esquematização é o suficiente.
94Na Espanha floresceu, na época ibérica, um santuário a que se levavam, como ex-votos, figuras de bronze representativas de seres humanos: com o tempo a arte destas figuras decaiu de tal modo, que elas já não passavam de simples pregos ou alfinetes, onde a cabeça significava a cabeça humana, e a haste significava o resto do corpo104. Os Romanos, em certo período adiantado da sua história, ofereciam ao rio Tibre, considerado como deus, cabeças de papoulas em substituição de antigos sacrifícios humanos105. No exemplo que indiquei da Espanha havia esquematização; aqui havia propriamente simbolismo. Em qualquer dos casos as modestas figas portuguesas têm com quem emparelhem e se consolem no que toca a simplificação artística. Além disso, em muitas figas estrangeiras, que adiante citarei ou figurarei, encontraremos estilizações iguais.
Notes de bas de page
1 À figa, como gesto mágico, ou como amuleto português, se têm referido vários AA. nossos, antigos e modernos. Dos antigos, por exemplo, entre outros que adiante citarei: Cardoso (séc. xvi), Barbosa (séc. xvii), Bluteau (séc. xviii), Morais (séc. xviii-xix), nos seus respectivos dicionários. Dos modernos, por exemplo, T. Braga, O Povo Portuguez, II, 527; A. Pimentel «Fazer Figas», capítulo do livro Atravez do Passado, Paris-Lisboa, s.d. (parece que é de 1888); A. Tomás Pires, Amuletos Alentejanos, Eivas 1904, p. 8; Goltz de Carvalho in Portugalia, I, 347, num artigo intitulado «Amuletos de Buarcos»; Cardoso Marta e A. Pinto, Folclore da Figueira, ii, Esposende 1931, pp. 82-86 («Amuletos»); A. C. Pires de Lima in Rev. Lusit., XVII, 37 ss. («Amuletos»); U. de Mendonça Dias, A Vila (Açores), IV, 10. O autor do presente estudo falou da figa: em 1882, na Rev. da Soc. de Instr. do Porto, II, 397, num artigo intitulado «Amuletos italianos e portugueses»; em 1892 num opúsculo Sur les amulettes, pp. 8 e 10; em 1915 na Hist. do Museu Etnologico, pp. 232-234 («Amuletos»); em 1917 na Etnografia Artistica, III, 19-20 («Gestos mágicos»; 2, a figa»); em 1924, no Boletín de la Acad. gallega, n.° 165, pp. 209-210, num artigo intitulado «Duas figas». O autor inglês W. L. Hilfburgh mencionou a figa in Folk-lore, xix, n.° 2 (1908), pp. 214-215, num artigo que se intitula «Notes on some contemporary Portuguese amulets» (com estampas).
2 Acerca do carácter mágico do âmbar, do azeviche e do coral, vid. Religiões da Lusitania, I, pp. 88, 129, nota 4, e p. 136-139; Tradições Popul. de Portugal, pp. 99-103; e o que escrevi no Bolet. da 2. a cl. da Acad. das Sc., X, 638-641. Acerca do azeviche vid. também, Osma, Azabaches compostelanos, Madrid, 1916, pp. 3, 5, 66.
3 T. i (2.a ed.), p. 175, § 13.
4 Descrição de Portugal, p. 107, da ed. de Lisboa, 1785, de que me sirvo.
5 Correcção de Abusos, já cit., II, 82-85.
6 Pág. 626, § 151.
7 iii-1, 345.
8 Apud. T. Braga, O Povo Portug., ii, 91, e D. Carolina Michaëlis, «Pucaros de barro de Portugal» in Bullet. Hispan., vii, 141, 142 e nota 1 (há 2.a ed. em volume à parte).
9 Da superstição em geral fala J. M. Adrião, in Rev. Lusitana, xxiii, 108: diz que a quem, estando em jejum, vir um coxo, um corcunda, um cego, um vesgo, ou um maneta não corre bem o dia, e que como oposição convém fazer-lhes figas. Subentende-se que todas estas pessoas dão olhado por pertencerem à classe das pessoas defeituosas estabelecidas pelo médico do século xviii Fonseca Henriques (vide supra). Da superstição na Maia fala em particular D. Maria Peregrina num artigo reproduzindo na citada Revista, ibidem, VI, 134. E vide também as obras citadas na nota da p. 177.
10 Cantos Populares Portugueses, I, 155, n.° 893.
11 Folheto anónimo, p. 5.
12 Cap. VII.
13 Vi este manuscrito, se bem me lembro, em Aveiro.
14 Consultei-o na Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra.
15 Rimas Sonoras, Lisboa 1731, p. 126.
16 Poesias, ed. de 1801 (Lisboa), II, 179.
17 A 1.a ed. é de 1614; mas sirvo-me da ed. das Obras, Lisboa 1723, p. 400 (discurso 9.°).
18 Canto xi, est. 65.
19 Fenix Renascida, I (1746), 162. – Ao jejum me refiro várias vezes neste trabalho.
20 1.a parte, pp. 7-14. Mais alusões a figas noutras sessões: p. 29 e 146.
21 Obras, ed. de Hamburgo, iii, 20.
22 «nascida».
23 Cfr. Rev. Lusitana, IX, 74.
24 Cfr. Trad. Pop. de Portugal, § 344-m.
25 Vid. Etnografia Artística, vi, 10-17.
26 Vid. Signum Salomonis, p. 70.
27 Morte de D. João, 1.a ed., pág. III.
28 W. Manhardt, Wald- u. Feldk., 2.a ed., ii, 37-38, 85, 92 etc.
29 Vid. De Gubernatis, Mytholog. zoologique, ii, 26.
30 3.a ed., p. 200. – Nos Ensaios Ethnographicos, IV, 357, reuni algumas notícias acerca de Canhoto.
31 Cfr. A. Lima Carneiro, As Tinhas na Trad. Pop. e na Literatura Port., Santo Tirso 1924, onde também se refere ao Cão-Tinhoso.
32 Acerca do número quatro vid. Rev. Lusit., XVI, 289 ss.
33 Apud Borges de Figueiredo, Mosteiro de Odivellas, p. 302.
34 A. T. Pires, Cantos Pop. Port., I, 155, n.° 896.
35 Entremez, da Assemblea do Isque, Lisboa 1770, p. 15.
36 Banquete que Apolo hizo a los embaxadores del-rey de Portugal, Lisboa 1642: apud Alberto Pimentel, Atravez do Passado (que já citei acima), p. 211.
37 Poesias e Prosas Ineditas, ed. de Camilo, p. 36.
38 Autos, ed. de T. de Noronha, p. 459.
39 = quem se envergonha.
40 = de lhe tirarem.
41 Ed. de A. Pimentel, p. 166.
42 T. iii, p. 279.
43 T. iii, p. 524.
44 Pág. 129 da 18.aed. (1917).
45 Lisboa 1742, p. 148.
46 Pág. 12 e 114.
47 Pág. 22. – Remolga em calão quer dizer «mandriona»: vid. A. Bessa, Giria, s.v. «remolga».
48 Lisboa 1773 (comédia de cordel), p. 23.
49 Lisboa 1764 (cordel), p. 4.
50 Obras, I, 258.
51 Musa Velha. – Devo à Ex.ma Senhora D. Maria Angélica Furtado de Mendonça, da Rapa, a indicação destes versos.
52 Diario de Noticias, de 12-V-1925.
53 Vocabulario, t. i (1713), p. 110. Em Roland vem toma na primeira parte do adágio, em vez de Roma, por engano, e assim copiaram os colaboradores do Grande Dicionário!
54 Ed. do C. de Sabugosa, Lisboa 1917, vv. 781-784. No texto está que to diga; parece será te.
55 A. Baião in O Archivo Hist. Port., vi, 477.
56 Lendas da Índia de G. Correia, IV, 616. No texto das Lendas reproduzem-se as figas da carta.
57 A. T. Pires, Cantos Pop. Port., i, 156, n.° 897.
58 Conquanto houvesse nos séculos XV e XVI uma moeda de prata chamada cinco ou cinquinho, que valia a quarta parte de um vintém, isto é, «cinco reais», não viria de tão longe a quadra; além disso nunca houve cincos de ouro.
59 Cantos Pop. Port., i, 155, n.° 895.
60 Diario Secular de J. P. Soares, Lisboa 1794, p. 18
61 Lisboa 1773, p. 6.
62 Lisboa 1761, p. 2.
63 Canto iii, est. 52.
64 Lisboa 1731, pp. 293-294. Cetrino: vid. Morais, e o Dicc. da Academia Espanhola.
65 Mear claro, y dar una higa al médico: em Sbarbi, Monogr., p. 54.
66 Comedias, 1631, fls. 31.
67 T. i (1746), p. 375; t. v (1728), p. 15.
68 Poesias e Prosas Ineditas, p. 52.
69 Fls. 64 v., 84 v. A única ed. que existe é de 1619.
70 Ed. de 1786, p. 113.
71 Ed. de A. Pimentel, p. 198.
72 Obras, i, 133.
73 Poesias Ineditas, ed. de Priebsch, Halle a. S. 1898. pp. 392-393.
74 T. I, p. 464.
75 «sou».
76 T. III, p. 661.
77 T. III, p. 137.
78 T. III, p. 245.
79 Ecloga VIII, 75.
80 In L’Anthropologie, XVIII, 135.
81 A. T. Pires, Amuletos Alemtejanos, Elvas 1904, p. 32.
82 Informação que lá colhi.
83 Goltz de Carvalho, in Portugalia, I, 347.
84 Vid. um artigo que escrevi na Estrela do Minho de 19 de Agosto de 1923.
85 Vid. Rev. Lusit., IV, 223 (§ 34).
86 Vid. Schuchardt in Zs. f. roman. Philologie, XXVIII, 436; e cf. 440.
87 Parte II, tratado I, cap. 9.°, p. 83
88 Goltz de Carvalho in Portugalia, I, 347.
89 A. T. Pires, Cantos Pop. Port., I, 155, n.° 894.
90 Obras, I (1801), 90.
91 Lisboa, 1794, p. 22.
92 Mosteiro de Odivellas, p. 302 (lugar já citado acima).
93 Cfr. C. Marta & A. Pinto, Folclore da Figueira, II, 86.
94 Signum Salomonis, Lisboa 1918, pp. 92-93 (separata do Arch. Port., vol. XXIII), Figs. 104 a 108, e 110 a 113.
95 Vid. Religiões da Lusitania, III, 352-356.
96 Cf. também o que se disse supra (pág. 185).
97 Obras, I, 352.
98 Tomo III, p. 281.
99 Cf. A. A. Pires de Lima, Trad. Pop. de Santo Tirso, I, 23 (extr. da Rev. Lusit. vol. XVIII).
100 Parte II, trat. i, cap. 9.°, p. 85.
101 Obra citada supra, nota 2, ibidem.
102 Vid. Religiões da Lusitania, I, 136; e cfr. o que escrevei supra pág. 178.
103 Este documento foi transcrito por Osma, Azabaches compostelanos, Madrid, 1916, p. 162.
104 El santuario iberico de Castellar, por Landier, Madrid 1917, Est. XXVII, Figs. 28-31.
105 (Perdi a indicação do livro onde li isto).
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