2 O Corpo e a visibilidade da diferença
p. 23-44
Texte intégral
1O estudo da diferença, tanto étnica como cultural, está nos fundamentos do próprio saber antropológico. Todavia, o processo pelo qual a diferença começa a ser observada, nomeada e exibida é um processo localizado histórica e culturalmente, a partir do qual se podem delinear ao mesmo tempo as linhas de continuidade e de ruptura. Este artigo aborda o processo visual de constituição da diferença racial e os seus pressupostos teóricos e epistemológicos. A partir de que momento e em que configuração epistemológica a diferença racial começa a ser enquanto anteriormente não era digna de menção? Porque é que o facto de ver conduz à exigência teórica e metodológica de dar a ver? É nosso objectivo interrogar, por um lado, os laços estreitos que unem o estudo da diferença racial à constituição, na segunda metade do século XIX, de colecções e de espaços reservados ao exercício do olhar. Por outro lado, questionar as relações entre saber antropológico e colecções, bem como o lugar destas no seio de um conjunto de representações visuais.
2A leitura de textos de antropólogos do século XIX revela que a constituição de colecções, longe de preceder as intuições teóricas, serve, pelo contrário, para consolidar os objectivos teóricos. Assim, Samuel George Morton (1799-1851), a quem se deve uma das primeiras colecções sistemáticas de crânios, escrevia:
O objectivo principal da elaboração desta colecção foi comparar as características do crânio nas diferentes raças humanas, bem como comparar estes com os crânios dos animais inferiores, especialmente no que diz respeito à capacidade interna do crânio enquanto indicadora do tamanho do cérebro (1844 — Nota preambular à segunda edição).
3Segundo Morton, a sua colecção foi constituída devido à impossibilidade de encontrar materiais para “ilustrar” o curso de anatomia:
Iniciei o estudo da etnologia em 1830; nesse ano, tendo tido a ocasião de proferir a Introductory Lecture on Anatomy, ocorreu-me ilustrar as diferenças nas formas dos crânios tal como se verificam nas cinco grandes raças humanas... Quando procurei os materiais para a minha palestra, foi com grande surpresa que me apercebi de que eles não podiam ser comprados nem tomados de empréstimo. (“Introdução” de Meigs 1857: 13).
4Podemos concluir que a adesão a priori a uma concepção da diferença racial presidiu ao desenvolvimento das colecções e à constituição de um ramo no seio da antropologia, a craniologia. Uma vez estabelecida a existência de diversas raças humanas, segue-se a descoberta e a investigação dos caracteres diferenciais entre elas, onde em primeiro lugar figuram os caracteres da face e do crânio. Para Paul Broca (1824-1880), “a craniologia não fornece apenas os caracteres de primeira ordem para a distinção e classificação das subdivisões do género humano; fornece também dados preciosos sobre o valor intelectual destes grupos parciais” (1866: 7). O privilégio dado aos caracteres da face e do crânio fundamenta-se numa espécie de consenso da comunidade científica, naquilo que se pode designar de convenções, que regem, de qualquer modo, não somente os objectos de estudo, mas também os preceitos metodológicos a utilizar. O desenvolvimento da craniologia ao longo do século XIX, com a aplicação da craniometria, de todo um sistema de medidas estabelecidas com a ajuda de instrumentos específicos que fornecem índices e registos cuja comparação permite constatar as variações entre as raças e os indivíduos (Delisle, s. d.: 642), constituiu a confirmação teórica da diferença racial.
5Argumentos de ordem teórica e metodológica serão invocados pelos antropólogos para justificar o privilégio atribuído ao estudo dos caracteres físicos; o argumento central é a profunda convicção “de que a organização física, em particular as características craniológicas, governaram o desenvolvimento das capacidades psíquicas” (Williams, 1994: 259) de um determinismo racial evidenciado pela craniologia. “Por um lado, com efeito, o estudo da conformação da cabeça fornece elementos preciosos para a comparação anatómica das raças; por outro, o crânio contém o cérebro, que é o órgão do pensamento, e cuja disposição parece por natureza influenciar tanto os fenómenos de inteligência como a configuração exterior da cabeça” (Broca, 1861a: 139). No entanto, seria redutor avançar que a predominância dada aos caracteres físicos, e nomeadamente àqueles que se referem à cabeça e ao crânio, é imposta sem dificuldades. Muitos antropólogos, entre os quais Hamy e Armand de Quatrefages (1810-1892), professor da cadeira de antropologia no Muséum d’Histoire Naturelle (Paris), levantaram objecções contra um procedimento que privilegiava o sistema em detrimento do método. Portanto, eles próprios acabaram por se submeter ao sistema na sua obra Crania Ethnica: “O estudo da cabeça óssea permite, apenas a ela, distinguir entre a imensa maioria dos casos os diversos elementos étnicos que entram na composição de uma dada população” (1882: VII).
6É, então, sobre o Outro — raças inferiores, mulheres, idiotas, anormais — que se debruçam os estudos antropológicos, procurando os “caracteres diferenciais do crânio e da face nos grupos humanos, a fim de determinar as proporções, o volume, o sexo, a idade, o lugar na série dos seres vivos” (Dally, s. d.: 642). A noção de diferença que está na base do empreendimento antropológico não é um elemento dado, uma noção “descoberta” pelo exame da “natureza”, mas uma noção construída com a ajuda de um raciocínio metafórico e constituída em função de pressupostos teóricos, políticos e culturais, como o mostrou notavelmente Nancy Stepan:
A variação e a diferença humanas não eram sentidas “tal como elas são de facto, na natureza”, mas sim através de um sistema metafórico que estruturava a experiência e a compreensão da diferença e que, no fundo, criava os objectos da diferença (Stepan 1993: 362).
7Intimamente associada à noção de diferença encontra-se a perspectiva comparativa. Comparação entre o homem e os animais, por um lado, comparação entre as raças humanas, por outro, é em suma o programa que Broca consigna à antropologia, apenas para especificar melhor a linha de demarcação entre os domínios antropológico e médico. Neste sentido, a craniologia é essencialmente comparativa, distinguindo-se da osteologia anatómica, que é puramente descritiva. É verdade que, por vezes, a fronteira entre espécimes antropológicos e espécimes medicinais era muito ténue, sobretudo no que respeitava à anatomia patológica.
Mostrar a diferença: as colecções
8A nossa análise assentará sobre as colecções antropológicas ligadas a instituições que se afirmavam como tendo um carácter científico — Muséum d’Histoire Naturelle (Paris), Société d’Anthropologie de Paris — e, deliberadamente, excluímos do quadro da nossa análise as colecções expostas em feiras, como também as colecções frenológicas. Não se trata de opor dois modelos, um “científico”, outro dependente da “pseudociência” e do “popular entertainment”, mas, pelo contrário, centrando o nosso texto nas colecções estritamente “científicas”, segundo os modelos de cientificidade da época, de evidenciar as representações que as fundam e as implicações teóricas e práticas que se seguem.
9Tendo em conta o nosso quadro de análise — a antropologia em França na segunda metade do século XIX —, é necessário precisar que o termo antropologia é entendido no seu sentido lato; antropologia física, arqueologia pré-histórica e etnografia estavam reunidas numa ciência do homem ou história natural do homem designada por antropologia, cujo programa teórico e metodológico foi levado a cabo por Broca, fundador, em 1859, da Sociedade de Antropologia de Paris. A institucionalização rápida da antropologia francesa através de revistas especializadas, de laboratórios e de colecções especifica o campo de investigação e contribui para a sua difusão no estrangeiro. No entanto, o objectivo epistemológico de um complexo de ciências depressa cedeu o lugar a uma concepção mais restrita, antropologia identificando-se com a antropologia física, o estudo dos factos culturais estando subordinado à dimensão biológica, distinguindo-se, assim, da concepção anglo-americana da disciplina, onde o desenvolvimento da etnologia e depois da antropologia social e cultural contribuiu para a dissociação do biológico e do cultural.
10Partindo do postulado de que a cabeça e o crânio se apresentam ao olhar daqueles que sabiam ler para lá das aparências, os antropólogos da segunda metade do século XIX dedicam-se a constituir bases de dados, colecções, através das quais os caracteres físicos adquirem uma visibilidade. Contudo, os caracteres que se procuram dar a conhecer encontram-se, por sua vez, na aparência externa e dependem da organização; ou seja, não são tanto caracteres visíveis, mas caracteres observáveis, detectáveis unicamente a um olhar disciplinado munido de instrumentos de observação e de medida.
11Trata-se, portanto, de questionar a natureza das relações entre um saber fundado sobre o estudo dos caracteres diferenciais observáveis e a constituição de colecções enquanto evidência material. Se as colecções dão a conhecer a diferença, desempenhando assim o papel de confirmação visual, permitem também, através da classificação e da medição, completar as descrições verbais e apresentar os resultados sob a forma de números. Para a antropologia trata-se, então, de descobrir uma linguagem nova, visual, que escape às “impressões subjectivas” subjacentes às descrições textuais. A instauração de uma linguagem visual para demonstrar a diferença é apenas uma das vertentes do saber antropológico; outra vertente diz respeito à utilização de espaços de exposição, onde através dos quais a diferença era dada a ver e inscrevia-se na memória dos visitantes. Se se admitir que o processo de constituição da diferença é inseparável das modalidades da sua visualização, do que pode ser visto e é visível, segue-se que as explicações, quer em termos de “descoberta” de vestígios ósseos para justificar a constituição de colecções, quer pela necessidade de materiais para demonstração, passam ao segundo plano. Assim, o privilégio concedido à anatomia comparada das raças humanas em detrimento da fisiologia, ao estudo dos dados osteológicos — esqueletos, crânios — só ganha inteligibilidade no seu relacionamento com a orientação espacial da antropologia e isto numa altura em que as exposições e os museus foram concebidos para tornar as coisas visíveis e vistas de um modo específico.
12O recurso a factos anatómicos, a factos “naturais”, permitia elevar a antropologia ao estatuto de uma ciência de observação; através das colecções, as diferenças eram concebidas como algo de “natural”. Para Broca, a constituição de colecções antropológicas estava intimamente associada ao estatuto de maturidade científica, tendo em conta um anterior estado especulativo de conhecimentos: “Mas ela [a antropologia] tornou-se uma verdadeira ciência de observação após se terem acumulado materiais de estudo abundantes nos museus públicos e nas colecções particulares. Aos olhos mais ou menos engenhosos, às hipóteses mais ou menos sedutoras que não se prestavam a uma demonstração directa nem a uma refutação directa, sucedeu o estudo dos objectos sensíveis, cuja descrição e interesse podem ser facilmente discutidos e controlados. É por isso que observamos por toda a parte o progresso da antropologia seguir o desenvolvimento das colecções antropológicas em cada país” (1878a: 328).
13Constituir colecções implicava que os crânios e esqueletos recolhidos fossem devidamente identificados, a sua proveniência e atribuição cuidadosamente registadas. Esta preocupação permanece constante ao longo do século XIX, mesmo que o modo de obtenção dos materiais e os critérios de validação sofressem alterações. Com materiais recolhidos nos cemitérios, nas escavações, nas salas de anatomia e na morgue, a prática da dissecação efectua-se, a partir de então, num lugar específico, o laboratório, na presença de uma audiência constituída por colegas, dando lugar, sobretudo no caso de homens célebres, a autópsias. Verdadeira antecâmara do espaço expositivo, o laboratório transforma os cadáveres em corpos desmembrados, é aí que se efectua a passagem dos “factos naturais” para artefactos — os órgãos desmembrados destinados ao exercício do olhar. Para tornar inteligível esta passagem, é necessário interrogar aquilo que se entendia por factos, o seu estatuto, a sua relação com a teoria e as implicações epistemológicas que daí derivam.
Factos versus ideias preconcebidas
14O cuidado de dissociar os factos da sua interpretação é uma constante no trabalho dos antropólogos. Explicitamente mencionado nos escritos de Morton:
Neste estudo eu sou ainda um aprendiz; e pareceu-me ser mais sensato apresentar os factos sem o enviesamento da teoria, deixando que o leitor retire as suas próprias conclusões (Morton 1839 — Carta a John S. Phillips, Outubro de 1939).
15Esta exigência caracteriza a escola antropológica francesa marcada pelo culto dos factos. No entanto, e como mostrou subtilmente Stephen Jay Gould,
Broca e a sua escola usaram os factos como exemplos, e não como documentos limitadores. Eles começaram pelas conclusões, perscrutaram os factos e regressaram circularmente às mesmas conclusões (1983: 85).
16Investigar o estatuto dos factos no saber antropológico do século XIX implica ter em conta quais eram os modelos de cientificidade da época, como se articulavam factos e apreciações subjectivas e a dicotomia objectividade / /subjectividade. Deste posto de vista, o nosso quadro metodológico é tributário das análises delicadas de Daston / Galison (1992) e das de Schapin / /Schaffer (1985):
“Verdade”, “adequação” e “objectividade” serão entendidos como concretizações, como produtos históricos, enquanto juízos e categorias dos actores. Constituirão tópicos para a nossa investigação e não recursos a usar de forma irreflectida (Shapin/Schaffer 1985, 13-14).
17Em busca de uma legitimidade científica, a antropologia toma como modelo de referência a medicina; “duas ciências que empregam os mesmos factos, ou pelo menos factos da mesma ordem, devem ter princípios comuns, um método comum/…/Para dar à antropologia uma base sólida, era preciso seguir o exemplo da medicina, agrupando todos os conhecimentos em torno dos factos mais certos, ou seja, os factos anatómicos” (Broca, 1878b: 174). Esta reivindicação de um método científico comum exprimida por Broca era, no fundo, um argumento retórico visando o reconhecimento de um estatuto científico para a antropologia, tendo como modelo uma disciplina já estabelecida. Convém precisar, como muito bem demonstrou Elizabeth Williams, que a antropologia de Broca se demarcava da perspectiva vitalista e da tradição da antropologia médica centrada nas relações entre o carácter físico e o moral, para se consagrar aos laços entre o cérebro e as capacidades intelectuais e mentais.
O destrinçamento do “intelectual” em relação ao “moral” libertou a antropologia do fardo do fatalismo moral e — o que é talvez mais importante, dada a sua adopção do cientismo neutral — libertou-a também da própria aparência de envolvimento com preocupações morais (Williams, 1994: 263).
18Apóstolos dos factos, os antropólogos do século XIX não cessavam de proclamar a sua desconfiança perante os sistemas de ideias, as teorias. Referindo-se ao seu mestre Broca, Paul Topinard escrevia: “Rejeitando toda a teoria, esperando tudo do trabalho, acumulava pacientemente números, deixando-os falar por si próprios, e fazia da craniometria uma ciência matemática. /…/Tinha a imaginação viva, mas defendia-se como de um inimigo, nunca querendo, nas suas induções, ultrapassar o limite dos factos recolhidos friamente” (1891: 132-133). Duas observações se impõem: em primeiro lugar, a leitura destas passagens revela que a “descoberta” dos factos se tornou possível graças a processos metodológicos precisos e em particular a regras de observação. Noutros termos, o corpo humano não era directamente legível e apenas se oferecia ao olhar dos investigadores por meio de instrumentos rigorosos de observação e de medida. “Os factos são realidades objectivas, para falar a linguagem dos filósofos, e dizem respeito ao corpo inerte ou ao estado estático, e ao corpo vivo ou ao estado dinâmico” (Topinard, 1891: 13). Em segundo lugar, e dada a sua realidade objectiva, os factos não podem ser objecto de polémica como o sublinhava Broca na sua controvérsia com Pierre Gratiolet, em 1861; o conflito “passa muito mais pela interpretação dos factos do que sobre os próprios factos”. Colocar as querelas científicas no plano da interpretação dos factos conduzia a proclamar a existência de um núcleo duro, os factos, em torno dos quais o consenso era possível e, além disto, a conceder a estes factos, e ao seu estudo efectuado metodicamente, o estatuto de “reflexos da natureza”.
19Uma vez que a antropologia se ocupava de factos que eram “realidades objectivas”, o caminho estava aberto à sua exibição, exposição e disposição em vitrinas. Ao exibir factos aos olhos da comunidade científica em particular e do público em geral, os antropólogos dotavam-se de um instrumento que não só testemunhava a natureza objectiva do seu saber, mas também situava este saber na praça pública, tornando-o susceptível de verificação e de controlo.
A totalidade da colecção está depositada na Academy of Natural Sciences de Filadélfia, estando aberta ao público durante a parte da tarde (1844 — nota preambular à segunda edição).
20Quanto a Broca, depositara a colecção de crânios parisienses do século XIII na Société d’Anthropologie de Paris para verificação e controlo. Depois, as peças expostas eram objecto-testemunho e podiam servir como instrumentos do saber.
21Uma das principais objecções formuladas por Quatrefages/Hamy e Topinard, no que respeita aos seus predecessores, remetia para as observações efectuadas sobre um número restrito de crânios: assim, Camper pertencia à pré-história da craniologia étnica pelo facto de as suas observações assentarem sobre oito crânios, distinguindo-se de Blumenbach, que, com a sua colecção de 245 crânios, inaugura a craniologia étnica (Quatrefages/Hamy, 1882: 155). Às observações isoladas e parciais opõe-se o modelo das observações múltiplas e variadas conduzidas sobre vastos conjuntos, as séries. Estabelece-se uma estreita relação entre a constituição de colecções, a noção de série e o papel atribuído ao método das médias.
22Impõem-se duas considerações: em primeiro lugar, opondo-se às deduções efectuadas a partir de crânios raros julgados representativos e típicos, as séries permitiam, de modo objectivo, ou seja, sem “ideia preconcebida”, realçar os tipos médios. A escolha de um crânio típico torna-se objecto de peritagem metodológica e não de a priori teórico: “É difícil escolher, numa série, um crânio típico sem ser influenciado por qualquer ideia preconcebida ou sem negligenciar involuntariamente um certo número de caracteres. /…/ Ora, desde que se possua números que exprimam todos os caracteres importantes a estudar, a escolha de um crânio perfeitamente típico devido a todos os seus caracteres não é mais do que uma questão de cálculo de médias” (Manouvrier, s. d.: 778).
23Em segundo lugar, as colecções permitiam, por um lado, a determinação da noção de série suficiente — para Broca uma série de vinte crânios era avaliada como suficiente — composta “por um número de casos bem grande, para que a junção de um novo caso, mesmo que este forneça um número máximo ou mínimo, não exerça sobre a média uma influência considerável” (Manouvrier, s. d.: 780). Por outro lado, era através das séries que se podiam estabelecer as médias, ou seja, obter dados numerados sobre factos tomados ao acaso: “O comportamento das médias dá resultados muito mais certos; exige, sem dúvida, estudos mais minuciosos e mais longos: exige, além disso, o exame de uma grande quantidade de crânios, recolhidos sem escolha na ordem em que o acaso os apresenta” (Broca, 1861b: 645). Considerar os factos ao acaso, não os seleccionar, era reconhecer a ausência de ideias preconcebidas na própria escolha dos factos. De outro modo, os factos “falam por si próprios” e a não intervenção humana era sinónimo de uma objectividade crescente.
A ciência ou “Deusa Augusta que reina sobre a humanidade”
24Guiada pelos factos, “/…/ a ciência não pode nunca, sem perigo, partir da sua própria esfera. /…/ e quando, voltando ao seu laboratório ou ao seu estudo, eles [os investigadores] recorrem a inquéritos científicos, têm de deixar de lado os seus sentimentos e as suas ambições, e, fechando os seus ouvidos a influências externas, têm de ouvir apenas a voz calma da verdade. Porque a ciência apenas deve obediência a si própria e nunca deve curvar-se a uma parte. É um poder divino reinando acima da humanidade, para a orientar e não segui-la, e sobre ela apenas se pode dizer que nasceu para comandar e não para obedecer” (Broca, 1871-1872: 32). No entanto, esta “Deusa Augusta” — a ciência — é unicamente apanágio da “humanidade adulta”, “santificada pelo trabalho”, “fecundada pela liberdade”, distinguindo-se da “humanidade no estado de infância”, “dominada pela natureza”, “ignorante”, “oprimida por si mesma” (Broca, 1878a: 326). Aqui encontramos toda uma série de dicotomias reveladoras do modo como o discurso e a prática antropológicos eram atravessados por narrativas sociais de sexo e de raça.
25Sustentar que a única base certa da ciência “consiste em proceder do simples para o composto, do conhecido para o desconhecido, da matéria e do organismo para o fenómeno funcional” (Broca, 1871-1872: 28), conduzia a privilegiar os dados sensíveis; no que respeita à craniologia, estes factos eram obtidos por um “modo de pesquisa” específico, a craniometria. A crença na doutrina de que os factos “falavam por si próprios” permitia aos antropólogos atribuírem aos fragmentos corporais o estatuto de dados da natureza, sem questionar o seu carácter de artefactos, explícito no acto de dissecação e nas etapas de categorização, de classificação e de exposição. Apesar da vontade firme de Broca “de sacrificar o pitoresco a favor da seriedade” (Broca, 1878a: 329), na exposição internacional das ciências antropológicas de 1878 podemos constatar que o tema da evolução dos macacos antropóides para o homem, das raças primitivas para as civilizadas, através de séries de esqueletos e de crânios, era dado a ver de um modo narrativo. De uma sala à outra, os visitantes eram convidados a seguir uma viagem no tempo e no espaço, sendo ao mesmo tempo espectadores e actores de uma história que se desenrolava aos seus olhos. A escolha do modelo expositivo para narrar a história da evolução (cada etapa de evolução sendo um episódio da longa história natural do homem) apenas ganha inteligibilidade em relação a outros modos de representação (ilustrações de livros, imagens) específicos da cultura visual deste período.
A procura de uma nova linguagem
26É com Broca que as medições e os instrumentos de observação atingem um grande desenvolvimento, conduzindo a uma revisão total dos conhecimentos antropológicos através da utilização de dados quantitativos e da reformulação do estatuto do observador. Graças à medição, podiam-se obter “fórmulas precisas e números” (Topinard, 1885a: 128). Definir quais os pontos de medida pressupunha determinadas escolhas por parte dos antropólogos, visto que estes pontos não se encontravam na natureza humana nem estavam inscritos na cabeça dos homens. Neste sentido, pode afirmar-se que o privilégio concedido a certas medidas em detrimento de outras, tal como o número de medidas, estava dependente das convenções científicas da época. Assim, Quatrefages e Hamy concordam em adoptar trinta e oito medidas directas sobre o crânio e quarenta sobre a face.
27A enfâse posta no estudo dos caracteres antropométricos só ganha sentido face à desconfiança tida pelos antropólogos no que respeita aos caracteres físicos descritivos julgados “vagos”, “pessoais”, veiculando “ideias preconcebidas”, contrariamente aos caracteres antropométricos, “precisos e científicos”, que “fazem de certas partes da antropologia uma ciência quase matemática” (Topinard, 18885a: 220). Para Topinard, o “método de medição” opõe-se assim ao “método do sentimento” (1873: 852); esta oposição remetendo, por sua vez, para as dicotomias factos / julgamentos de valor, objectividade/subjectividade. Segue-se a procura de uma linguagem não verbal para descrever a diferença e para a tornar visível com a ajuda de um número ou de um quadro: “A ciência só se faz e só avança de uma forma segura através das medições; se exceptuarmos estas últimas, tudo dá lugar à ilusão: a impressão, a personalidade, substitui o facto bruto, implacável, perante o qual se deve inclinar. O eterno objectivo da ciência antropológica é a substituição de um número, de uma fórmula, por uma palavra, por uma frase. A média de um carácter está, por vezes, numa diferença não perceptível à vista, mas um número, ou mesmo uma décima, pode torná-la visível” (Topinard, 1885b: 399). Consolidar o saber antropológico sobre dados quantificáveis e mensuráveis era adoptar os modelos de cientificidade do século XIX. A especificidade da pesquisa antropológica não reside tanto na crença positivista de uma objectividade quantificada, mas nos esforços incessantes para evitar a dimensão subjectiva num domínio onde o corpo era ao mesmo tempo modo e objecto de conhecimento.
28Apagar a presença do sujeito, criar uma linguagem numérica, passava pelo uso de instrumentos específicos cuja importância heurística era dupla: recolher dados não contaminados pela intervenção humana e disciplinar a observação sensorial, tendo em conta que os sentidos eram falíveis. Como escrevia Broca: “O objectivo destes instrumentos é substituir apreciações de qualquer forma artísticas, que dependem da sagacidade do observador, da precisão do seu golpe de vista, — e muitas vezes das suas ideias preconcebidas —, por procedimentos mecânicos e uniformes, que permitem expressar em números os resultados de cada observação, estabelecer comparações rigorosas, reduzir o mais possível as hipóteses de erro” (1860-1863: 348-350). Do mesmo modo, Joseph Barnard Davis, co-autor de Crania Britannica (1865) com John Thurnam, sustentava que “não se deve confiar numa mera estimativa visual — pois o olho pode ser facilmente induzido em erro e porque o valor das observações deste tipo é, de facto, de pouca utilidade, a não ser que se baseie em medições muito cuidadosas” (1870: 186). Sem entrar no detalhe da antropometria, das suas diversas técnicas de medição — craniometria, cefalometria, encefalometria, osteometria — e dos seus instrumentos — compasso de espessura, goniómetro, cefalógrafo, craniógrafo —, convém, no entanto, examinar o método gráfico e, em particular, a craniografia.
29“A craniografia tem um duplo objectivo. Serve, por um lado, para obter figuras que se intercalam num texto, de modo a tornar ao mesmo tempo as descrições mais curtas e mais claras; por outro lado, serve para traçar desenhos de grande exactidão e rigor, sobre os quais se praticam construções e medições que seriam ora impossíveis, ora muito difíceis de praticar directamente sobre o crânio” (Broca, 1875a: 114). Obter uma reprodução automática da curva do perfil craniano e facial através do craniógrafo era atribuir aos instrumentos uma exactidão maior do que as dimensões sensoriais; além disso, a presença humana, e, especialmente, a do antropólogo, estava reduzida, porque eram os instrumentos que “trabalhavam”, mecanicamente, como se fossem dotados de autonomia: “O craniógrafo desenha num abrir e fechar de olhos todos os contornos” (Broca, 1860-1863: 351). Segue-se que os desenhos e as reproduções gráficas obtidas por processos mecânicos têm um estatuto mais objectivo do que as produções humanas; as consequências epistemológicas que daí derivam são de grande importância:
As imagens tornaram-se em algo mais do que meras ferramentas auxiliares; elas eram as palavras da própria natureza (Daston e Galison 1992: 116).
Instrumentos que disciplinam os sentidos
30Este aparato instrumental deve ser examinado em relação aos sentidos. Com efeito, os instrumentos permitem, por um lado, melhorar a percepção, aumentar a capacidade sensorial. Com a sua ajuda era, então, possível observar caracteres imperceptíveis ao olhar, mesmo que esses mesmos instrumentos pudessem contribuir, como se verá mais adiante, para criar factos. Por outro lado, os instrumentos corrigem e disciplinam os sentidos, porque estes eram, por essência, falíveis. Dados erróneos, falíveis e subjectivos, são os atributos conferidos aos resultados obtidos pela visão: “Não se pode negligenciar o uso da simples visão para se criar uma opinião imediata e aproximativa. Nem sempre se têm à mão os instrumentos necessários /…/ Mas é preciso não esquecer que este sistema está cheio de ilusões” (Topinard, 1873: 857).
31Ter em conta a natureza falível dos sentidos era reconhecer de qualquer forma a dimensão fisiológica que lhes está subjacente e, por isso, a sua extrema variabilidade. Esta desconfiança relativamente aos dados fornecidos pela visão e o uso de instrumentos que aumentam a capacidade dos sentidos estão relacionados com a dimensão fisiológica do acto de ver e com o papel activo do sujeito na construção da realidade sensorial. Como demonstrou Jonathan Crary, a emergência de uma visão subjectiva está estreitamente associada ao processo de transformação da “visão humana em algo mensurável e, portanto, intercambiável” (1991: 16-17). A quantificação e o uso de instrumentos de medida em antropologia, longe de serem traços específicos deste saber, são, pelo contrário, comuns às ciências desta época, que se esforçam por alcançar “o estado de observação sem um sujeito observador”, ou seja, “a objectivação da observação científica” (Swijtink, 1987: 268).
32A questão do erro era central para um saber que se pretendia objectivo. Três tipos de erro podiam surgir: o primeiro, associado a um número insuficiente de factos; o segundo, dependendo do modo como os factos foram recolhidos, o terceiro, derivando do observador. Os dois primeiros tipos de erro eram susceptíveis de correcção; assim, na segunda edição do seu Catalogue, Morton escreve:
Nesta edição corrigi cuidadosamente vários erros e inadvertências da edição anterior, e a parte egípcia da série foi alvo de uma atenção particular. A classificação de uma parte desta em época faraónica e época ptolemaica é omitida, uma vez que parece ter sido baseada em dados inseguros por parte do distinto personagem de quem a recebi (1844 — nota preambular à segunda edição).
33O terceiro tipo de erro, o erro pessoal, era o mais difícil de ser corrigido porque se devia à acção do observador. No entanto, não se trata de um erro derivado do acto de observação devido à dimensão fisiológica subjacente, mas de um erro que tem a sua origem no facto de que observadores munidos dos mesmos instrumentos de observação podiam chegar a resultados diferentes. Este tipo de erro, o erro individual, atraiu, em particular, a atenção dos antropólogos uma vez que punha em questão o aparelho instrumental; Topinard reconhecia que “o erro ou o desvio individual, que se admite tanto em astronomia como em antropometria, depende de variadas causas inevitáveis, como do modo como a luz incide sobre as divisões do compasso,/…/da imperfeição do instrumento, etc.” (1885a: 230).
34A comparação com a astronomia não é fortuita; com efeito, é neste domínio que, desde os anos 1820, são encontradas soluções — a descoberta do que ficou chamado personal equation — para os erros pessoais derivados das diferenças fisiológicas.
Os observadores devem ser corrigidos no que diz respeito às peculiaridades próprias que advêm da sua aparelhagem fisiológica e psicológica, como mostrou Swijtink (1987: 268);
35segue-se a tomada em consideração do observador “como parte integrante do processo de medição”, “sendo os observadores e os instrumentos tratados de forma igual”. À semelhança da astronomia, os antropólogos procuram corrigir ao mesmo tempo os instrumentos e as observações pessoais, recorrendo à medição e ao método das médias.
“Esqueletos magníficos e sem cheiro”: objectos naturais/objectos culturais
36A dissecação dos cadáveres, a preparação dos esqueletos, seja em laboratório, seja em viagem (“raspam-se os ossos, submetem-se a maceração, depois expõem-se ao ar livre e, em pouco tempo, eles tornam-se magníficos e sem cheiro” — Broca, 1865: 78-79), as preparações anatómicas, estas operações não retiravam, aos olhos dos antropólogos do século XIX, o estatuto de factos aos objectos naturais. Da mesma forma, os bustos de bronze e os moldes eram considerados “objectos naturais”, visto serem modelados e esculpidos em presença do modelo. A adequação à realidade e a exactidão parecem ser os critérios segundo os quais se efectua o agrupamento nas exposições de elementos dissemelhantes, tais como preparações naturais, esqueletos e bustos de bronze. Por exemplo, para os bustos e para as estátuas que representavam raças “exóticas”, o facto de terem sido executados por artistas, seguindo processos geométricos, na presença do modelo, era suficiente para conferir a estes objectos, que actualmente se qualificariam de representações, o estatuto de working objects. Assim, os bustos de bronze executados por Charles Cordier, discípulo de Rude, “verdadeiras obras de arte”, tinham um “valor ao mesmo tempo científico e artístico” (Verneau, 1898: 335). Contudo, René Verneau, conservador adjunto das colecções de antropologia no Muséum, reconhecia que uma “galeria antropológica apresenta, naturalmente para o grande público, um aspecto um pouco monótono. Tentámos dispor as peças da maneira menos desagradável ao olhar, respeitando escrupulosamente a classificação metódica” (1898: 335). Era ao nível dos modos de exposição e da diversidade dos materiais (pinturas a óleo, fotografias a carvão, bustos de bronze da galeria antropológica do Muséum d’Histoire Naturelle), que se pretendia obter um efeito artístico.
37Esta exigência de apresentar os objectos de uma maneira considerada “agradável aos olhos” e num “golpe de vista” fazia parte do sistema de convenções da época, que, num certo sentido, guiava o modo de representar a realidade. Assim, os antropólogos franceses, de modo a tornar inteligíveis os conteúdos das exposições, tiveram de usar convenções que fossem familiares para os visitantes; pela aceitação destas convenções relativas ao conhecimento e à habilidade de representação, o carácter artístico da produção das representações desaparece e estas adquirem a qualidade de “espelhos da realidade”. É neste sentido que as preparações anatómicas e os crânios, tal como os bronzes, eram colocados num mesmo plano, pelo seu valor de informação. Sem entrar em detalhes sobre a noção de realismo e sobre os realismos do século XIX, aspecto desenvolvido por Ludmilla Jordanova (1989: 45-48), convém, no entanto, notar que admitindo que a arte/realidade (natureza) eram entidades distintas, os antropólogos procuravam, contudo, precisar a natureza desta distinção e o fundamento das suas afinidades. O problema colocava-se, então, nos termos seguintes: arte e antropologia, mas também a arte como uma forma de antropologia; nesta ordem de ideias, os bustos feitos por Cordier e as esculturas de Emmanuel Frémiet, paralelamente ao seu valor artístico, eram considerados como working objects. Convém sublinhar que, na segunda metade do século XIX, a antropologia, tal como a arte, estavam confrontadas com questões semelhantes relativas ao problema da construção de representações realistas.
Factos ou artefactos?
38Pode adiantar-se que os “objectos naturais” expostos nas colecções antropológicas não eram dados da “natureza”, visto que tinham sido seleccionados, tratados e classificados pelos antropólogos, em resumo, eram artefactos. Todavia, à luz das concepções antropológicas da segunda metade do século XIX, as preparações anatómicas, tal como os crânios, eram incontestavelmente factos, dignos de figurar num museu antropológico ou de história natural. Pelo contrário, era ao nível do modo de ver, de ver melhor graças aos instrumentos, que algumas objecções eram colocadas no que respeita aos factos observados e à sua “realidade”. Ou seja, com o aperfeiçoamento dos instrumentos de observação, corria-se o risco de afastar da realidade e de ver caracteres que de outro modo passariam despercebidos. Assim, Topinard não hesitava em comparar a utilização dos instrumentos de medição por parte da craniologia com o uso do microscópio na medicina: a “craniologia deve evitar um erro comum intrínseco a uma nova ciência. Em medicina, por exemplo, quando o uso do microscópio se tornou uma prática corrente, pretendeu-se provar rapidamente o princípio do cancro. /…/ Do mesmo modo, em craniometria, antes de se efectuar um julgamento sobre o valor de um determinado carácter de um crânio isolado ou de uma série inteira, é preciso conhecer o seu significado e a sua capacidade em toda a escala das raças, saber os limites destas variações, como e em que circunstâncias varia, sem que isso constitua um carácter de raça, etc.” (Topinard 1873: 855-856). “Muitos caracteres craniológicos, aliás, não poderiam ser reconhecidos com precisão, sem a ajuda de instrumentos”, afirmava Léonce Manouvier. Estas observações, vindas de um autor que criticará a utilização abusiva do índice cefálico enquanto critério classificatório das raças humanas, sublinham implicitamente a possibilidade de criar factos através de instrumentos. Este questionamento por parte dos antropólogos sobre o poder dos instrumentos é efectuado igualmente noutros domínios científicos, como o demonstrou Ian Hacking:
Até à década de 1860, verificaram-se sérios debates sobre se os glóbulos vistos através de um microscópio seriam artefactos do instrumento ou elementos genuínos de matéria viva (eram artefactos) (1983: 194).
O corpo em exposição
39Os documentos visuais relativos às exposições são pouco numerosos e a ausência de catálogos das colecções do Muséum e da Société d’Anthropologie de Paris tornam difícil saber exactamente quais as técnicas e estratégias expositivas adoptadas. Dois modelos expositivos se desenvolvem, um de carácter permanente nos museus e galerias antropológicas, dedicado à pesquisa e ao ensino, destinando-se particularmente aos investigadores e a um público restrito; o outro alargando-se no quadro das exposições universais, visando o grande público (o carácter problemático do uso destas duas categorias — investigadores e público — foi sublinhado de modo pertinente por Steven Shapin (1990)). Estes dois quadros expositivos, longe de se contradizerem, completam-se, visto que, para além do desenvolvimento de congressos internacionais aquando das exposições universais, muitas vezes, são os mesmos homens que têm a seu cargo as exposições temporárias e permanentes, como foi o caso de Topinard, responsável simultaneamente pelas colecções do Musée Broca e pela exposição internacional das ciências antropológicas na Exposição Universal de 1878.
40Da análise das colecções acima referidas, é possível sublinhar três aspectos: em primeiro lugar, a ausência de caracteres fisiológicos remete para o facto de que estes “não se adequam a uma exposição destinada aos olhos e frequentemente apenas se apreciam pelos seus resultados” (Topinard), distinguindo-se dos caracteres físicos que “se vêem ao contrário, demonstram-se e podem ser evidenciados numa exposição de muitas maneiras”. O obstáculo que constituía a exibição dos caracteres fisiológicos devia-se ao facto de que estes “apresentam, muitas vezes, variedades individuais muito mais amplas do que os factos anatómicos”, como o tinha sublinhado Broca (1865: 167-168). Por conseguinte, a vantagem dos caracteres anatómicos residia no facto de serem estáveis, de poderem ser medidos e os resultados expressos em números, logo, susceptíveis de serem apresentados sob forma de quadros. A associação estreita entre caracteres físicos e a noção de demonstração não é arbitrária; permite colocar a questão de saber em que medida a escolha dos caracteres físicos, como elementos centrais das colecções antropológicas, não foi guiada por exigências de ordem estratégica em termos de legitimidade científica (comparação com a medicina anatómica), retórica (possibilidade de verificação e de demonstração) e expositiva (conservação).
41Em segundo lugar, a fronteira natureza/cultura passa pelo corpo. As “esculturas grosseiras dos selvagens”, tal como os moldes, são colocadas numa mesma categoria, enquanto “as fotografias e os desenhos de nativos com os seus respectivos trajes remetem para a secção de etnografia”. Na galeria de antropologia do Muséum, “cada grupo humano é representado por tudo aquilo que permite dar conta dos seus caracteres físicos. Para além de retratos fotográficos, as vitrinas contêm bustos, máscaras, troncos, membros moldados, por vezes até indivíduos inteiros” (Verneau, 1898: 332). Pouco importa, então, a natureza dos meios usados para descrever o corpo — modelos, bustos, fotografias — porque não são os materiais que estabelecem a fronteira, mas aquilo a que se referem — o corpo, nu ou vestido. As dicotomias — natureza / cultura, antropologia / etnografia remetem, afinal, para a separação entre corpo e mente; assim, os objectos etnográficos são designados por “produtos de inteligência humana”. Considerar as dicotomias menos em termos de oposição (Jordanova, 1986: 34-36) e mais em relação às suas zonas de confluência e de sobreposição convida a relativizar a dualidade corpo / mente, tanto mais que nas colecções antropológicas existiam objectos etnográficos e vice-versa.
42A terceira observação deriva da precedente: a importância dada à história natural do homem conduz a que as modificações atribuídas à natureza humana pela cultura sejam tomadas em consideração quando estas se referem ao corpo na sua dimensão anatómica. Assim, as deformações artificiais do crânio (na América e na Europa, especialmente em Toulouse), as mutilações dentárias são expostas (Verneau, 1898), da mesma forma que ossos trabalhados, troféus de crânios e crânios sobremodelados. No entanto, estas modificações não são expostas como sendo o resultado de uma prática cultural, mas enquanto testemunhos de modificações exercidas sobre a natureza humana e por isso tornadas naturais.
43Estas colecções pressupõem uma determinada concepção da natureza humana. A aparente diversidade exibida apenas serve para delinear melhor as fronteiras entre o homem e o animal e entre o homem ocidental e o Outro; ela serve também para definir melhor o normal e o seu duplo, o patológico. Não é surpresa que o conceito de normalidade ocupe um lugar central nas diversas ciências do século XIX, desde a medicina à sociologia, passando pela antropologia. É provavelmente nesta orientação normalizadora (como mostrou Georges Ganguilhem, a noção de normal está associada ao conceito de média) que reside a especificidade das colecções antropológicas e médicas relativamente às colecções anatómicas para o “grande público” com objectivos morais, tal como o Museu Spitzner. Nesta perspectiva, as designações “desvios da natureza” e freaks apenas ganham sentido em relação à noção de normalidade; como Susan Stewart sublinhou:
Recorrentemente referido como freak of nature [aborto da natureza], o freak era de facto um freak da cultura. O seu estatuto anómalo é articulado pelo processo do espectáculo, o qual distancia o observador, “normalizando” este ao mesmo tempo que marca o freak como uma aberração/.../ Posto em exibição, o freak representa a enunciação da fronteira e a garantia de que o espaço ermo e selvagem — o exterior — é agora território (1984: 109-110).
44Dar a ver através de coisas visíveis — crânios, cérebros, preparações anatómicas, esqueletos — a ordem classificatória invisível que regia ao mesmo tempo os mamíferos e as raças requeria técnicas expositivas específicas. No Muséum d’Histoire Naturelle, o modo de apresentação começava com “as raças humanas fósseis”, depois os materiais relativos às variedades fisiológicas e patológicas do esqueleto e do corpo, e finalmente as raças humanas actuais (classificadas segundo uma ordem geográfica); este modo de apresentação procurava evidenciar a unidade da espécie humana no tempo — dos homens fósseis aos homens actuais — e no espaço (as diversas raças eram apenas variedades no seio de uma mesma espécie). Percorrendo as diferentes salas e indo de uma vitrina à outra, o visitante era convidado a seguir um percurso cronológico e geográfico, “começámos pelos negros de cabelos lisos; acabámos nos brancos” (Verneau, 1898: 334), percurso que fornecia um acesso visual e conceptual à longa história da vida humana na Terra.
45Certos da força de persuasão que tinham os números, os antropólogos desta época souberam tirar proveito destes últimos, seja para demonstrar pressupostos teóricos (o volume do cérebro entre as diversas raças), seja, de um modo muito mais subtil, para mostrar numa linguagem não verbal aquilo que não era visualizável. Assim, o crânio médio, sendo virtual, “apenas pode ser representado através de números ou por um desenho executado segundo esses números” (Manouvrier).
46Se os números tinham o poder de persuadir era devido ao facto de estarem expostos em instituições, museus, que, como mostrou notavelmente Ludmilla Jordanova,
são loci de poder, eles garantem a validade do que é visto e exibido (o que dá nas vistas) (1993: 259).
47A exposição de objectos, de evidências materiais, era uma confirmação visual e uma demonstração que tornava supérfluos as palavras e o texto; além disso, o seu poder de persuasão derivava da convicção segundo a qual ver é acreditar. No espaço de exposição, o visitante podia verificar, controlar e ver a natureza humana e a diferença racial. No entanto, é verdade que aquilo que o visitante via era afinal aquilo que os “investigadores” tinham visto e julgado digno de ser dado a ver. Entre o olho do antropólogo e o do visitante interpunham-se as operações de escolha dos objectos, de identificação e de categorização. Ora, estas operações eram passadas em silêncio como se o visitante e os cientistas tivessem modos de ver e experiências visuais semelhantes; neste sentido, “os museus científicos e médicos comportam este sentido de visão não mediada”, para retomar a fórmula de Ludmilla Jordanova.
Uma cultura visual
48O século XIX é incontestavelmente o século dos museus, ou seja, de espaços reservados ao exercício do olhar, implicando o “tempo do ver” (Pomian). Se se tornou banal, após numerosos estudos, adiantar que a modernidade está estritamente associada a um novo regime visual, resta, contudo, mostrar como diversos campos do saber se dedicam a criar ao mesmo tempo linguagens visuais e espaços reservados ao olhar. Martin Rudwick (1992), pôs em evidência, em geologia e em paleontologia, a pesquisa de uma linguagem visual capaz de dar conta das profundezas do solo, exprime-se através de mapas e de ilustrações que se encontram nos livros. No domínio da fisiologia, as pesquisas de Etienne-Jules Marey (1830-1904) conduziram à constituição de uma linguagem gráfica para exprimir os movimentos do corpo, que, neste sentido, têm afinidade com os processos gráficos dos antropólogos. Falar de “influência” de um domínio científico sobre outro é não ter em conta o modo como estes dois domínios se inscrevem num mesmo contexto, numa mesma cultura, “uma vez que os modos historicamente específicos de conhecer o natural dão azo a modos correlacionados de escrever sobre o natural” (Jordanova, 1986: 17).
49É significativo que a procura de uma linguagem visual esteja no centro de diversos campos disciplinares; a ponto de se poder falar de uma cultura visual comum. Esta manifesta-se tanto no espaço das exposições e dos museus, quer sejam de arte, de arqueologia, de história, de etnografia e de história natural, como na convergência de preocupações teóricas em torno do fenómeno da visão por parte dos fisiologistas, dos antropólogos e dos historiadores de arte. Os estudos de Eugène Chevreul sobre o contraste simultâneo das cores (1839) têm repercussões ao mesmo tempo sobre o quadro cromático de Broca e sobre os modos de expor, especialmente no que diz respeito à cor do fundo das vitrinas e dos móveis; do mesmo modo, as pesquisas de Broca sobre o índice orbitário são tributárias das reflexões de Hermann von Helmholtz, cujo Handbuch der Physiologischen Optik (1867) foi traduzido por Emile Javal, membro da Société d’Anthropologie de Paris. A preocupação, por parte dos organizadores de exposições, de fornecer aos visitantes um golpe de vista é reveladora da sua tomada de consciência dos pressupostos epistemológicos e estéticos subjacentes ao acto de ver.
50No início deste texto, associámos o processo de constituição da diferença racial às suas modalidades de visualização. Que os caracteres físicos privilegiados pela antropologia sejam duradouros e susceptíveis de serem conservados é da ordem da evidência; Topinard escrevia: “O esqueleto é a única parte do homem que se conserva nas sepulturas, e o crânio é o que se recolhe mais facilmente. /…/ Os ossos apenas nos colocam na presença de populações desaparecidas, de raças extintas” (1891: 134). No entanto, esta evidência merece ser questionada tanto mais que a crítica da craniologia e do índice cefálico, nos finais do século XIX, passa pela tomada em consideração de critérios tais como a estatura, a dimensão dos membros, a forma dos cabelos, a cor dos olhos, em resumo, de elementos que dificilmente se prestam a ser expostos e que remetem para a antropologia biológica e morfológica. Além disso, a mudança de enfoque das aparências físicas para o interior do corpo (através dos códigos do DNA) e o desenvolvimento da genética das populações permitiram invalidar a noção de raça, de fixidez dos tipos raciais e tornaram toda a classificação racial inoperante.
51No entanto, seria redutor apreender o processo de visualização da diferença racial como um processo cumulativo no qual “interpretações correctas” vieram substituir interpretações preconcebidas social e culturalmente. Se os antropólogos franceses do século XIX “viram” diferenças raciais e sociais nos cérebros e nos crânios e se existiram interpretações dos mesmos vestígios físicos opostas, era essencialmente devido ao facto de que a habilidade de interpretar dados requer uma aprendizagem no interior de uma determinada tradição cultural. Poderíamos acrescentar que é o problema da “descoberta” dos vestígios tanto humanos como animais que se torna problemático, como bem ilustrou Mary Bouquet (1993) a propósito do Pithecanthropus de Eugène Dubois e a própria categoria de “factos naturais”. Questionar a escolha dos materiais expostos, vestígios físicos ou artefactos, e examiná-los enquanto produtos culturais implica ter em conta as sucessivas renegociações dos laços entre natureza e cultura no passado e nos nossos dias e a natureza artefactual dos nossos objectos de conhecimento.
52Tratar as colecções científicas como produtos culturais implica, por um lado, o facto de a ciência ser uma parte do campo cultural que define simultaneamente o que é digno de ser visto e os modos de ver. Assim, afastar o espectáculo do sangue, expor esqueletos magníficos e evitar o horror, faz parte do processo de modificação das representações do corpo e do “abaixamento do limite do tolerável”, para retomar a fórmula de Alain Corbin (1991). É neste sentido que as colecções antropológicas, do mesmo modo que as relações entre ciência e literatura analisadas por Georges Levine, são
moldadas pela sua participação na cultura envolvente — nas comunidades intelectuais, morais, estéticas, socioeconómicas e políticas que simultaneamente as geram e delas retira a sua forma (Levine, 1987: 5).
53Por outro lado, as colecções antropológicas são produtos culturais devido ao trabalho dos antropólogos, que identificam, recolhem, comparam e categorizam as colecções, conferindo-lhes, desse modo, sentido. Além disso, se se tem em conta que os objectos de conhecimento, neste caso, o corpo humano, “são já socialmente constituídos”, como demonstrou Sandra Harding, devido
aos significados culturais contemporâneos que estes objectos têm para toda a gente, incluindo toda a comunidade científica, através das formas e significados que estes objectos adquirem para os cientistas devido a gerações anteriores de discussão científica em torno deles (1993: 17).
54então, o caminho está aberto para o questionamento crítico das nossas categorias.
Nota
55Uma parte desta pesquisa foi levada a cabo durante a minha licença sabática, pelo que agradeço ao Departamento de Antropologia Social do ISCTE a licença concedida e à Fundação Luso-Americana o apoio material prestado. Uma versão mais extensa deste texto vai ser publicada em: Science as Culture. The Politics of Display editado por Sharon MacDonald, a quem agradeço as sugestões e comentários críticos. Os meus agradecimentos também a Miguel Vale de Almeida pela sua infinita paciência, e a Cláudia Freire, pela ajuda preciosa no trabalho de tradução.
Bibliographie
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Auteur
Professora auxiliar no departamento de Antropologia Social do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE), tem trabalhado ultimamente em torno de museus etnográficos, modos de representação visual e sobre as categorias objectos naturais/objectos culturais. Esta temática tem sido desenvolvida sob forma de artigos publicados em Travellers’Tales: Narrative of Home and Displacement (Routledge, 1994) e Romantisme (n.° 8, 1994) e de comunicações orais apresentadas no colóquio “Le Territoire du Musée”, (Musée Orsay, Paris, 1994) e no College Art Association Conference, Boston 1996.
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