Capítulo 15. Rave: imagens e éticas de uma festa contemporânea
p. 191-204
Texte intégral
1Este texto tem como propósito identificar as imagens que os participantes de um conjunto de festas contemporâneas, normalmente designadas por raves, produzem acerca destes eventos. Tal reconhecimento far-se-á com base na análise de um conjunto de éticas que aí se encontram representadas e que, sendo diferentes entre si, surgem muitas vezes sobrepostas gerando formatos compósitos.1
2A noção de ética é aqui utilizada numa acepção sociológica, com o objectivo de designar um conjunto de finalidades, regras de comportamento e formas de avaliação comportamental que se encontram na base das práticas desenvolvidas pelos agentes sociais e através das quais estes lhes conferem sentido.2
3Para proceder à análise recorremos à evidência empírica obtida em situações de observação directa desde 1997 (Chaves, 1998), bem como a um conjunto de entrevistas exploratórias realizadas a frequentadores de rave parties. Procurámos também cruzar estas informações com diversos dados obtidos em pesquisas nacionais e internacionais (Azevedo, 2002; Calafat e outros, 1998; Saunders, 1996; Gamella e Róldan, 1997; Kokoreff e Mignon, 1994; Kotarba, 1993).
Festas tecnológicas e tecnologias da festa
4Um dos elementos centrais na definição e identificação das raves prende-se com a circunstância de, qualquer um dos seus três principais componentes,3 — música, ambiente cenográfico e substâncias psicotrópicas — contar com um forte aparato de alta tecnologia.4
5De facto, a produção musical utiliza aqui meios sofisticados e em constante inovação. Caixas de ritmo, sons programados em sintetizador, samplers e computadores servem de base a um trabalho de (re)criação produzido in loco pela figura do DJ. As diversas heranças da música de dança, o surgimento de novas máquinas e o ensejo de distinção converteram a cena musical rave num contexto onde proliferam múltiplos estilos musicais. Apar do house (120 a 130 BPM),5 do techno (140 BPM) ou do garage, foram surgindo muitos outros como o hardcore, o trance psicadélico, o jungle ou o drum’n’bass. Com excepção de géneros que apenas podem ser escutados nos espaços de chill-out,6 a música das raves, tem em comum o facto de possuir uma batida repetitiva e muito acelerada (entre 120 e 180 BPM).
6A parafernália técnica manifesta-se igualmente na criação de elementos cenográficos extra-musicais, determinantes na criação das atmosferas apropriadas, nomeadamente através de lazeres, video-walls onde se projectam vídeos de dance music e máquinas de realidade virtual.7 Os cenários construídos não são, porém, homogéneos. A produção e a manipulação do espaço é diferenciada consoante nos encontramos, por exemplo, numa área ou numa festa dedicada ao house, ao techno ou ao goa trance.
7Um terceiro tipo de tecnologia que se encontra presente é de natureza farmo-química. A par de diversos produtos legais comercializados pelos organizadores do evento, é possível, também, encontrar em circulação um conjunto de substâncias psicoativas de utilização ilícita. Os produtos mais vezes utilizados são os canabinóides. Contudo, a substância de eleição das raves, e que com elas estabelece uma estreita relação simbólica é, sem dúvida, o MDMA (3, 4 Metilenodioxidometanfentamina).8 No início da sua utilização, este produto era reconhecido pelos consumidores pelas suas qualidades geradoras de empatia, mas também por possuir algumas propriedades energéticas e um quase inexistente potencial alucinogénio. Esta combinação relativamente singular de características levou a que fosse classificado no interior de um novo conjunto de substâncias — os entactogéneos ou empatogéneos — sendo os seus efeitos, na perspectiva farmacológica, explicados através da sua actuação sobre os neurotransmissores da serotonina e da dopamina.
8Neste momento, o termo MDMA é praticamente desconhecido pelos utilizadores que se referem simplesmente a ecstasy mas, com maior frequência, a “pastilhas”. Estas alterações terminológicas coincidem com uma extrema rarefacção do MDMA no mercado. Presentemente, esta substância deu lugar à introdução ou à reintrodução de compostos químicos do tipo MDA, MDEA, ou MDBD que possuem, segundo os utilizadores experimentados, menos propriedades empatizantes e um efeito mais próximo das anfetaminas.9 Todavia, e segundo revelam os raros testes químicos disponíveis, mesmo estas substâncias circulam em doses reduzidas e a maior parte das “pastilhas” contém, quase exclusivamente, anfetaminas que fornecem, sobretudo, energia e um estado de vigília e concentração.
9Um outro conjunto de substâncias que passa, também, a adquirir proeminência nestes contextos é o dos alucinogénios, nomeadamente o LSD, o 2CB e a Ketamina. Estes produtos são geralmente designados pelo termo “ácidos”.
Da (co)existência das éticas
10Importa neste momento referir que encontramos não só raves diferentes (Chaves, 1998) mas também modos distintos dos participantes as representarem e (co)produzirem.
11As imagens que os ravers fazem das festas manifestam-se em diversos aspectos, designadamente nas finalidades e valorações que lhes atribuem, no modo como seleccionam e manipulam as tecnologias disponíveis e na forma como interagem com os copresentes.
12Entendemos que estes aspectos poderão ser identificados de uma forma mais sistemática se procurarmos organizá-los com base num conjunto de éticas, no interior das quais eles surgem articulados entre si de um modo típico.
13Um primeiro conjunto de finalidades e regras comportamentais identificado nas raves pode ser denominado de ética de informalização e descomprometimento. Nela encontra-se presente um aspecto comum à grande maioria dos habitantes destas festas, permitindo gerar um acordo mínimo acerca do seu sentido. Trata-se da exaltação do hedonismo, princípio que elege o “sentir-se bem” e a obtenção de finalidades eufóricas e prazenteiras como elemento base do comportamento.
14De facto, quando são inquiridos acerca das experiências de alteração de estados de consciência que experimentam através da música e das substâncias psicoativas, os intervenientes descrevem-nas, geralmente, como situações de “bem-estar”, “prazer” e “felicidade”. Como afirmava um entrevistado: “(…) com o ecstasy é tudo muito lindo. É tudo bué da lindo, e é do tipo: olhas para o mar e dizes, ‘anda cá’ e ele vem”.10
15Segundo esta ética, a rave deve ser concebida como uma “cápsula securizadora”, ou melhor, como uma espécie de fractura com os contextos espacio-temporais quotidianos da “modernidade tardia”, instâncias onde as auto e hetero expectativas para a obtenção de “realização pessoal” se intensificam e as probabilidades de falhar constituem riscos geradores de permanente ansiedade (Giddens, 1994 [1991]). Deste modo, encontrar-nos-íamos perante um “sector de estilo de vida” onde os participantes se consideram, por momentos, suspensos num “ritual dionisíaco” (Rietveld, 1993: 43); ou seja, parcialmente libertos de formas de classificação social, bem como de compromissos gerados pela pertença a quadros identitários exteriores à festa.11 Do ponto de vista relacional, estes princípios traduzem-se numa intensificação das formas de “desatenção pública” (Goffman, 1971) e numa informalização das relações sociais entre os participantes. Segundo alguns autores ocorreria mesmo um processo de “diluição do self” num único corpo colectivo em êxtase, sendo esse, justamente, o desejo dos ravers.12 Por vezes, os entrevistados sugerem estes elementos explicitamente, como se constata no seguinte depoimento: “(…) não é refugiar porque isso é um bocado feio, mas, pronto, não consigo arranjar uma palavra para neste momento substituir o refugiar-me de algum pensamento menos feliz numa dada altura (…) descarregas momentos de stress da tua vida ali e depois tens uma semana absolutamente descontraída pela frente”; ou ainda na seguinte afirmação: “(Pretendo nas raves)… fugir um pouco à realidade (…) estar desviado da realidade (…) a gente entra, tipo, numa realidade virtual, estamos, tipo, num jogo de computador.”
16A convicção de que a rave se deve converter numa “cápsula securizadora” onde as formas de apreciação e de julgamento das performances individuais se encontram muito atenuadas está também presente nos textos de Saunders. Veja-se por exemplo como este autor, que se destacou como cultor e divulgador do ecstasy, descreve a sua primeira entrada numa festa deste tipo: “A música era o techno habitual, embora não tão duro como noutros casos, e eu tentei seguir o conselho de um amigo para me mover com os sons do baixo, ignorando o resto. Entrei na dança no meu modo autoconsciente muito habitual, dando atenção ao que as outras pessoas estavam a fazer e sabendo bem que era mais velho do que a maior parte. Então imperceptivelmente comecei a relaxar e fundido no ambiente soube que fazia parte dele. Não havia necessidade de estar autoconsciente. Não tive dúvidas de que era aceite; não havia nada que pudesse fazer que os incomodasse, porque estavam simplesmente a ser eles mesmos, fruindo a sua liberdade, livres das neuroses e dos constrangimentos da vida normal” (Saunders, 1996: 3).
17De acordo com este primeiro quadro ético, desenvolvem-se formas de tolerância para com as manifestações de extroversão extática, nomeadamente por relação à dança efusiva, embora tais desempenhos adquiram um valor negativo se parecerem simulados, realizados para agradarem a espectadores, e não baseados num sentimento de euforia “autêntico”.
18A análise da informação recolhida permite-nos verificar que se encontra igualmente nestes eventos uma ética empática. Esta constitui-se com base na ideia de que, nas raves, deve ser dada prevalência ao relacionamento estreito e emocional entre os indivíduos.
19Embora muitos participantes que desenvolvem formas de informalização e descomprometimento não se rejam por esta crença, a empatia encontra-se profundamente associada com a primeira ética analisada. Sobretudo, se considerarmos que os participantes empáticos entendem que a quebra de inibições e da formalidade, bem como o desenvolvimento de um sentimento fusional, são condições essenciais para a obtenção do desejado registo empático.
20Em várias situações, observámos que o estreitamento das relações pessoais se restringe a um grupo reduzido, como é o caso das pessoas que se dirigiram em conjunto para a festa. Noutros momentos, ele torna-se ecuménico, alargando-se à totalidade dos presentes, mesmo a desconhecidos. Este princípio de abertura encontra-se associado à ideia de que a rave constitui um locus de atenuação das diferenciações sociais clássicas, como, por exemplo, as que se baseiam na classe social, na etnia ou no género. Qualquer uma dessas categorizações entraria, por assim dizer, “em crise” deixando de ser observada e de funcionar como um elemento limitador das relações sociais.
21Podemos identificar estes aspectos nas raves realizadas em Portugal, como se depreende do seguinte trecho: “Todas as tribos estiveram representadas ou mandaram representantes. Psicadélicos, betos, guerreiros do tecno, ravers com apetrechos fluorescentes. Jovens tias (…), modelos em dia de folga e técnicos da construção civil a conviverem lado a lado amistosamente”.13 No entanto, é em depoimentos obtidos noutros países que esta ética surge expressa com particular clareza, como neste caso: “Eu não pude evitar a partilha dos sentimentos que estava a ter, algo que normalmente nem sequer pensaria em fazer. Falei com pessoas de todas as raças e antecedentes. Julgo que não parei de falar toda a noite.” (cit. em Saunders, 1996: 50).14
22De acordo com a ética empática, a própria partilha da droga é entendida como um acto benigno. Disponibilizar a droga que se possui é, como refere uma entrevistada, fazer uma “boa acção”, dado que permite ao outro usufruir igualmente do estado de “bem-estar”, favorecendo a experiência de envolvimento conjunto.
23Se procurarmos observar os estados empáticos, verificamos que estes contam com uma reduzida presença de linguagem verbal. A comunicação processa-se através da dança contínua acompanhada de sorrisos em redor, constituindo os beijos e os abraços, modos de interacção frequentes que, por vezes, culminam, no que alguns autores designam de “orgias sensitivas”. Ao contrário do que a expressão indicia, tais situações não obedecem, na maior parte das vezes, a objectivos de aproximação sexual. Pelo contrário, junto dos indivíduos que funcionam de acordo com uma ética empática, a sinalização de que se procura um “parceiro sexual” é mesmo considerada incómoda e desajustada. Este facto encontra-se claramente relacionado com a atenuação das diferenciações de género, bem estilizada na generalização do vestuário unissexo e na redução das formas estereotipadas de sedução mútua. Constatações similares foram realizadas noutros países. É o caso de França, onde Kokoreff e Mignon (1994: 60) referem: “O ecstasy é assim um meio de voltar a pôr em questão as normas de divisão entre os sexos: as relações de dominação apagam-se em benefício de um modo unissexo de entrar na dança: os efeitos do ecstasy reduzem as formas de exibição e de sedução.”15
24Como nos sugerem estes autores, deparamos, sob o enquadramento da ética empática, com a escolha preferencial do ecstasy do rol das substâncias disponíveis. O seu uso é conciliado com os canabinóides, tendendo a suprimir-se o consumo de álcool, pois este pode neutralizar os efeitos empáticos que se pretendem obter com o ecstasy. É além disso frequente discutir-se o modo como a alteração da composição química das pastilhas comprometeu a empatia, degradando a qualidade da festa.
25De facto, segundo alguns autores e participantes, as propriedades farmacológicas do MDMA, seriam responsáveis pela criação da informalidade e da empatia. É o caso de N. Saunders (1996) quando refere: “Acredito que os efeitos do ecstasy diminuem ou eliminam a experiência do medo, por isso torna-se possível mergulhar em áreas onde normalmente não se entraria” (p. 195).16
26Do nosso ponto de vista, cremos, porém, que embora os estados de consciência e o tipo de relações sociais obtidos no interior da rave possam, em parte, ser propiciados pela substância, as dimensões sociológicas são essenciais para a sua compreensão. Em primeiro lugar, porque a escolha do ecstasy do conjunto dos produtos disponíveis, radica já no objectivo de se atingir um estado de alteração de consciência específico, cuja definição e valorização foram socialmente produzidas no interior de um grupo particular de consumidores. Em segundo lugar, porque as expectativas socialmente construídas acerca dos efeitos da substância, bem como o contexto social em que são administradas, têm profundas repercussões no modo como os efeitos vão ser, “de facto”, sentidos e interpretados pelo utilizador (Becker, 1963, 1967, 1980; Zindberg, 1974, 1980). Talvez assim se explique que alguns consumidores continuem a experimentar situações de empatia, mesmo não tendo ingerido MDMA e que outros revelem não sentir qualquer experiência desse tipo ao consumirem o mesmo produto.
27A maior parte dos participantes que se aproximam das duas éticas anteriores não organizam um discurso acerca das repercussões que as raves poderão ter no “mundo social exterior”. Deparamos, todavia, com uma minoria de frequentadores que entendem que a sua importância extravasa largamente o espaço e o momento da sua realização. Estes ravers colocam-nos perante um terceiro tipo de ética. Referimo-nos a uma ética militante que, muito sinteticamente, assenta na ideia que os ravers deveriam prosseguir o objectivo de, através do hedonismo e da empatia, se ressocializarem a si e a novos intervenientes. Esta ressocialização é aqui concebida como uma “transformação mental” que, embora iniciada a nível individual, acabaria por induzir transformações sociais. Como refere um entrevistado: “(…) tudo está na cabeça das pessoas e muitas vezes essas lutas políticas e sociais que se têm, se calhar não levam a lado nenhum, se calhar o que interessa é a mudança individual; e a partir daí partir.”
28Trata-se, portanto, de um movimento cujo impacte político começaria por concretizar-se ao nível micro da festa sob os auspícios de uma droga sintética, estendendo-se depois a uma escala mais ampla. Veja-se, por exemplo, o depoimento esclarecedor de um DJ obtido por Gamella e Róldan (1997): “A alegria é viciante (…), a empatia com as pessoas (…). Ou seja, a energia que produzem mil pessoas com as caras felizes ao mesmo tempo (…). Então, claro, se queres recuperar isto, tens que voltar na semana seguinte, porque enches-te de energia positiva num mundo não positivo. (…) Há empatia com os outros e o ecstasy faz com que tu o vejas. Estamos todos unidos e não sabemos. Chegamos a pensar que houve um momento na história que sem drogas estávamos todos unidos de alguma maneira, que de alguma maneira estamos todos unidos mas não nos damos conta. Se estamos todos unidos, significa que todos somos iguais, que todos podemos retomar um projecto comum para este planeta, para esta cidade, para esta cultura”.
29Encontramos, na literatura, diferentes exemplos de pessoas que afirmam ter sido já “transformadas” graças às raves e ao ecstasy. É o caso de um skinhead que assegura ter sido “curado” do seu machismo e chauvinismo (Wright, 1998: 241), ou de um consumidor de ecstasy que colaborou numa obra de Saunders (1996), afirmando o seguinte: “Coisas como o dinheiro ou o tipo de trabalho que tinha passaram a não ter qualquer importância. Tornei-me mais interessado em desenvolver amizades genuínas em vez das amizades sem qualquer sentido que tinha anteriormente. Os amigos anteriores notaram que eu mudei, particularmente nas minhas opiniões e valores (…). Posso dizer-te honestamente que sou uma pessoa melhor pelo facto de ter tomado ecstasy. Acredito firmemente que é uma droga com insight e maturidade” (p. 36).
30Para a ética militante, a difusão do “espírito da rave” deveria manifestar-se em três dimensões da vida social. Em primeiro lugar, numa harmonização com os outros e com a natureza; em segundo lugar, numa já referida diluição dos modos estandardizados de relacionamento. Ambos os aspectos surgem expressos nas declarações de uma entrevistada: “(na rave) há uma harmonia com a natureza, é uma questão de harmonização com tudo o que te rodeia (…), a maneira das pessoas estarem umas com as outras, uma maneira mais livre e espontânea.” Um terceiro impacte, teria lugar na promoção de relações de tipo comunitário que colocariam em causa os “valores do individualismo” e da competição. Esta ideia encontra-se expressa no seguinte excerto de um folheto promocional: “A rave é uma viajem de regresso à descoberta da nossa herança tribal, que contradiz a filosofia norte americana do individualismo, que rejeita os valores comunitários”.17
31Alguns militantes consideram que estes aspectos correspondem a uma actualização de um património que radica nos movimentos contra-culturais dos anos 1960. É o que se acontece, por exemplo, com o produtor da Ravestock, (uma das primeiras megafestas rave realizadas nos EUA), ao afirmar o seguinte, “Penso que nos tornámos a geração do novo Woodstock. Juntos podemos fazer tudo”; ou ainda: “O Ravestock enviou uma mensagem à América do rock n’roll para que desperte! Estamos nos anos 1990 (…). Podemos fazer a diferença amanhã e no futuro. Voltámos à necessidade tribal básica de, pela dança, expressar as nossas raízes, amar o nosso irmão e estar gratos pela vida”.18
32Os indivíduos que desenvolvem uma ética militante, opõem-se a um largo contingente de participantes, cuja presença é por eles considerada um sinal da massificação das raves e uma “perversão” do seu “verdadeiro sentido”. Pretendem referir-se a um conjunto de frequentadores que funciona de acordo com uma ética de apresentação e sedução. Trata-se de uma ética que, para além de não se diferenciar das que se podem encontrar noutros espaços juvenis, é seguida por pessoas que não distinguem significativamente as raves de qualquer outro tipo de festas.
33De facto, embora esta ética partilhe com as anteriores a disposição para a obtenção de euforia e de prazer, acaba por se distinguir claramente das restantes, na medida em que consente a observação e a avaliação mútuas entre os participantes. Mais do que isso, nesta ética restaura-se a importância da atenção conferida às performances dos copresentes, designadamente às formas de dançar, bem como aos modos de cada um se apresentar perante os outros, o que, obviamente, esbate o “sentimento fusional” e introduz formas de ansiedade na interacção.
34Este modo de estar cava, pois, uma distância particularmente acentuada relativamente à ética empática, não se manifestando aqui qualquer disposição para o desenvolvimento de relações universais, e muito menos para a diluição de barreiras estatutárias, ou seja, para a promoção de um certo igualitarismo no contexto da festa. As diferenciações e as fronteiras sociais permanecem relativamente inalteráveis, nomeadamente no que respeita às diferenciações de género. Por sua vez, o “ver e ser visto”, realizado com o objectivo de procurar “parceiro sexual” encontra aqui um ascendente assinalável. Grande parte da construção da “fachada pessoal” é desenvolvida de acordo com o objectivo de exprimir sensualidade e de gerar excitação sexual, designadamente através do vestuário, tornando-se mais notória a presença de indumentárias que simbolizam clivagens entre os universos masculino e feminino. O mesmo se passa com a gestualidade e com as próprias formas de dançar que, como refere Kotarba (1993), se desenvolvem num hip-hop style sensual, próximo do que se encontra em certos clips da MTV.19
35Tal como parece acontecer nos EUA (Kotarba, 1993), os participantes que, em Portugal, se aproximam de uma ética de apresentação podem ser fundamentalmente encontrados nas raves que decorrem em discotecas onde a sua presença se torna frequentemente maioritária.
36Do ponto de vista da utilização de substâncias psicoativas, poderemos referir que embora o cenário seja, igualmente, caracterizado pelo policonsumo, envolvendo substâncias como a cocaína, o haxixe, as pastilhas e os ácidos, o álcool continua, neste caso, a ser claramente predominante. Relativamente às pastilhas (ecstasy), não lhe são aqui atribuídos significados particulares, a não ser o de facultarem a possibilidade de se dançar por muito tempo e o de propiciarem alguma euforia. O facto dos efeitos empáticos do MDMA terem, porventura, desaparecido em virtude da alteração da composição química do ecstasy, não merecem, por seu lado, qualquer comentário, o que se prenderá com o facto de serem pouco procurados e, porventura, pouco conhecidos.20
37Em paralelo com o conjunto de éticas que já foram sinteticamente delineadas, surgem algumas outras de menor expressão, das quais destacamos uma ética de aprendizagem. Os participantes que funcionam, tendo-a como referência, entendem que, nestes eventos, podem obter uma mais-valia ao nível do conhecimento, declarando atingir estádios de reflexão e de “consciência das coisas” antes inacessíveis, bem como modos judiciosos de ler a realidade. Atente-se, por exemplo, na seguinte afirmação de um entrevistado: “Obtemos um aprofundamento do conhecimento, (…) se consegues aproveitar certos e determinados aspectos da tua moca consegues chegar lá mais rápido (…). Depende do grau mental que já tenhas atingido, normalmente a tripe leva a pensamentos que a gente, pronto, sóbrios, não consegue atingir (…), com tudo o que eu tenho aprendido e conhecido, depois do meu conhecimento com o LSD, tem-me dado muita coisa que eu tenho procurado trazer para o mundo real, transpondo para lá para casa, transpondo aos meus amigos, transpondo a toda a gente.”
38Como se depreende deste trecho, esta ética tende a dar proeminência ao papel das substâncias psicoativas na experiência festiva global. Poderíamos mesmo arriscar dizer que, com excepção da música, a festa não é considerada indispensável para a obtenção dos estados alterados de consciência ambicionados.
39Nestas situações, os alucinogénios (pastilhas) adquirem um ascendente por relação a todas as outras substâncias. O ecstasy combinado, por exemplo, com LSD, 2 CB, MEM ou com o 2-CT-2, orienta a experiência para uma vertente mais “intelectualizada” e dirigida para o desenvolvimento de insights (Saunders, 1996: 144).
40Como alguns entrevistados afirmam, é habitual que, para os indivíduos “pastilhados”, a experiência da festa adquira um carácter “mais introspectivo”. Nesses casos, porém, a dança não perde necessariamente fulgor. Passa sim a incluir formas de “deriva alucinogénia” nas quais a relação com os outros tende a perder importância quando confrontada com o objectivo de se fruir os elementos ambientais, como, por exemplo, as sequências rítmicas; os objectos fluorescentes e uma variedade de efeitos visuais. Esta fruição, que, segundo os próprios, se metamorfoseia em aprendizagem, estende-se à própria relação com os objectos naturais: árvores, flores, mar, etc. É, aliás, comum que essa experiência aconteça, dado que as raves preferidas por indivíduos que se aproximam desta ética têm lugar em “ambientes naturais”, como, por exemplo, as festas de goa trance que habitualmente se realizam em quintas, florestas ou praias.
41Os insights que os indivíduos afirmam experimentar, assim como as referências à “expansão da mente” — inteligência e sensibilidade — invocam-nos autores que defendem as virtudes das drogas psicadélicas, como T. Leary (1970), A. Huxley (1954) e T. McKenna (1998 [1992]), ou determinadas formas de “ficção tecnológica ciberpunk”,21 onde se afirma, por exemplo, que existem fortes relações entre o LSD e o desenvolvimento dos computadores, nomeadamente através de um alegado consumo desta substância levado a cabo por engenheiros de Silicon Valley, durante a década de 1960.22 De qualquer modo, as menções explícitas a estes elementos pelos frequentadores das raves em Portugal são praticamente inexistentes, o que, se não nos permite concluir liminarmente que este imaginário se encontra ausente das festas rave aqui realizadas, leva-nos, pelo menos, a considerar que ele se torna bastante raro e difícil de localizar.
Notas finais
42Este texto pretende sugerir um conjunto de hipóteses para futuras investigações, onde as éticas aqui descritas deverão ser aprofundadas e reequacionadas. Enquanto ponto de partida, cremos que comporta duas vantagens. Por um lado, permite-nos equacionar as festas rave e os participantes na sua diversidade, resistindo a tentativas de homogeneização. Em segundo lugar, permite que nos filiemos num património de teoria e investigação socioantropológicas sobre o consumo de drogas que acreditamos ser particularmente profícuo (Velho, 1998; Becker, 1967; Willis, 1976; Young, 1971; Burr, 1984). Nele se defende que a selecção das substâncias psicoativas, os significados que lhe são atribuídos e mesmo os seus efeitos, devem ser analisados em articulação com os recursos e os quadros representacionais dos diversos grupos sociais de consumidores. Este facto remete-nos forçosamente para um conjunto de configurações éticas que extravasam os momentos em que o consumo se realiza e que se projectam sobre múltiplas outras dimensões da vida. Apenas as limitações impostas pela síntese, nos obrigaram a centrar exclusivamente nas éticas produzidas por relação à festa.
Bibliographie
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Notes de bas de page
1 O uso da noção de “ética” para o estudo deste tipo de situações foi inspirado pelos artigos de Robert Veatch (1977) e de Elvin Smith (1988).
2 Embora consideremos que esta noção se aproxima do conceito de ethos (Pierre Bourdieu, 1980: 133), preferimos, neste caso, utilizar o termo ética pois alguns dos participantes destas festas explicitam de modo consciente e intencional estas finalidades e princípios, nomeadamente quando comunicam entre si. Não podemos portanto pressupor que tais elementos se encontram apenas presentes de um modo prático, disposicional e não consciente.
3 Os interessados poderão encontrar exercícios de definição e historicização do movimento rave em textos recentes (Azevedo, 2002).
4 Diversos autores conferem, também, uma centralidade a este aspecto, como se poderá depreender da seguinte afirmação de McKay (1996): “A cultura rave nos anos 1990 (…) é frequentemente definida quer no seu interior quer no exterior como um discurso de celebração tecnológica: em vez de rejeitar, assimila a tecnologia, começando no telemóvel e continuando por aí adiante. É pois natural que uma das suas formas musicais se chame techno. Para Kristian Russel a cultura rave pode ser vista, de facto, como 100% tecnologia” (p. 108). Por sua vez, Kotarba (1993) refere, a propósito dos participantes: “A juventude actual (…), hábil na relação com tecnologias e acostumada ao entretenimento guiado por computador, torna-se particularmente atraída pela cena rave” (p. 1); “Estes jovens chegam à rave sabendo já facilmente como manipular a realidade através de meios artificiais. O uso de drogas psicadélicas pode não ser causado pela realidade virtual dos jogos Nintendo, mas o uso desta droga complementa certamente a versão Nintendo da realidade”. (p. 10)
5 BPM significa “batidas por minuto”.
6 Trata-se de uma área mais calma das raves, geralmente utilizada para repousar nos intervalos da dança.
7 Para mais pormenores, consultar Eunice Azevedo (2000: 149).
8 Até início dos anos 1980 o MDMA encontrava-se circunscrito a contextos espiritualistas new-age e a certas práticas psicoterapêuticas de orientação analítica, com o fim de favorecer desbloqueios emocionais e despoletar a comunicação (Shulgin, 1990, 1986; Beck e Rosenbaum, 1990; Watson e Beck, 1991). Só mais tarde começou a ser introduzido nas festas de acid-house.
9 No caso do MDA, regista-se também a presença de consideráveis propriedades alucinogénias.
10 A constante presença deste tipo de princípios, segundo os quais a obtenção de prazer e, naturalmente, a libertação da dor, do mal estar e do sofrimento, devem imperar na festa, encontra-se identificada noutros trabalhos, designadamente numa investigação recente onde se afirma que “Apesar das diferenças sociais (…), constatou-se uma convergência de opiniões em relação à finalidade fundamental da prática do acto raving: a diversão e a experiência colectiva do êxtase”. (Azevedo, 2002: 110).
11 Eunice Azevedo (2002), inspirando-se na obra de V. Turner e num texto de J. Pina Cabral (2000), convoca, para esta discussão, a noção turneriana de estado liminóide.
12 Seguindo, o pensamento de Gilles Deleuze e Felix Guattari, Tim Jordan (1993) defende que o corpo dos ravers, no seu delírio colectivo, deve ser encarado segundo a noção de corpo sem orgãos; corpo esse que a rave-machine, concebida enquanto máquina desejante, permitiria criar (p. 130): “O que pode ser reconhecido como uma produção raving, ouoqueé desejado pelos ravers através da construção de um evento rave é uma permanente indução num estado desubjectivizado, próximo do êxtase. À medida que as pessoas afectadas pelas drogas dançam durante horas sob padrões alternados de luz coordenados com a música, alcançam gradualmente um estado de euforia comum.” (p. 129)
13 Citado em www.yornsoundsystem.com/viewmaster/vm_lisboa/frameset_viewmaster.html, a propósito de uma rave realizada em 8 de Junho de 2001, perto da Aldeia do Meco.
14 Torna-se igualmente curiosa a seguinte afirmação a propósito da realização de raves na Irlanda do Norte: “Na porta do armazém, ninguém pergunta a tua religião. As raves são o ultimo ponto de encontro para os filhos da violência católica e protestante. Nunca conhecemos nada a não ser o ódio. É sempre o mesmo: eles de um lado e tu do outro, excepto nas raves.” (“Ulster”, San Francisco Chronicle, 10/26/94. cit. em Saunders, p. 50).
15 Como esta afirmação sugere, o ecstasy (MDMA) é apontado, quer por aqueles que investigam os seus efeitos, quer pela maior parte dos seus utilizadores, como uma substância que provoca uma atenuação da importância conferida às relações sexuais (Saunders, 1997; Rudgley, 1998). Ver, também, Kotarba (1993: 7), a propósito de raves realizadas nos EUA.
16 Numa outra afirmação Saunders (1996: 94) diz o seguinte: “A sensação que tive com o MDMA enquanto falava com os meus amigos foi única. Eu senti-me confiante, amado e aceite e, mais do que isso, senti que ela (interlocutora) queria realmente saber. (…) Senti-me tão livre e tão seguro e tão capaz de me aceitar a mim mesmo, a todos os meus sentimentos e pensamentos. Nada era vergonhoso ou feio”.
17 Cit. em Azevedo (2002: 32). Estes princípios parecem estar particularmente difundidos junto de certos grupos contraculturais que habitam em comunidades nómadas e que frequentam e promovem rave parties. É o caso dos travellers. Ver George Mckay (1996) e Mckay (org.) (1996).
18 Cit. em Saunders (1996: 187-88).
19 O mesmo autor distingue a existência de determinados participantes de raves em Houston, Texas, que nos parecem aproximar-se desta ética e que, no seu entender, correspondem a cerca de 40% dos frequentadores. Kotarba, que designa esta categoria por weekenders (frequentadores de fim-de-semana), refere o seguinte: “Os weekenders escolhem os seus clubes a partir de bebidas especiais, dia da semana, presença de membros do sexo oposto, música e moda (…). Os weekenders tendem a ser muito críticos relativamente às pretensões políticas das raves.” (Kotarba, 1993: 7)
20 O próprio consumo de álcool em grandes quantidades, realizado em simultâneo com o de ecstasy é um sinal disso mesmo, dado ser do conhecimento comum, entre os consumidores empáticos, que o álcool inibe os efeitos empatizantes experimentados com a substância.
21 Ver a este propósito Rushkoff (1994) e Mckay (1996).
22 Para uma melhor compreensão destes aspectos consultar as referências que Kokoreff e Mignon (1994: 52) fazem à obra de T. Leary, nomeadamente a uma entrevista concedida por este autor à revista Rolling Stone (13/01/88).
Auteur
Sociólogo; Departamento de Sociologia da FCSH-UNL; Fórum Sociológico — Centro de Estudos (FS-CE/UNL).
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