Apêndice I Documentos
p. 195-235
Texte intégral
1Não me foi possível encontrar as íntegras de alguns documentos dados em extracto, nem os originais ou cópias coevas de outros reproduzidos de colecções impressas, por faltarem os respectivos registos ou diplomas no Arquivo Nacional.
2Devo a cópia dos documentos n.os 5 e 6 ao sr. P. Bartolomeu de Azevedo.
3O sr. António Francisco Barata, da Biblioteca pública de Évora, com munica-me o seguinte:
4«Existem na Camara (de Evora) documentos àcerca de ciganos desde 1549, nos Livros dos originaes a fl. 137 do II; fl. 285 do XII; fl. 315 do VI; fl. 314 do Livro de José Lopes de Mira e a fl. 100v., fl. 174v., 175 e 176 do Livro vi de Registo, com datas de 8 de outubro de 1549; 17 de agosto de 1557; 16 de setembro de 1566; 20 de maio de 1587; 15 de Julho de 1686; 15 de maio de 1694 (diversos); 22 de maio de 1694 e 23 janeiro de 1699.
5«Tratam da expulsão dos ciganos estranjeirados e da prohibição aos nacionaes de trajarem a seu uso e de não trabalharem; ordenam que os façam trabalhar e aprender offícios. Citam o art. 24.° das côrtes de Evora de 1535, feitas por D. João III.»
6Reproduzo a ortografia dos documentos consoante se encontram nos originais, registos ou colecções impressas, resolvendo em geral as abreviaturas; introduzo todavia alguns sinais de pontuação e faço algumas correcções.
N.° 1 1526
7«Alvará de 13 de Março de 1526, para que não entrem Ciganos no Reino, e se saião os que nelle estiverem; e diz quasi o mesmo que a lei 24. das chamadas das Cortes, e de 26 de Novembro de 1538, e a Ord. nov. (philippina), liv. v. tit. 69. no pr.».
8[José Anastacio de Figueiredo, Synopsis chronologica, 1790, i, 321, que cita o Liv. roxo ou 3. da Supplicação, fl. 244.]
N.° 2 1538
9No volume intitulado Capitulos de cortes e leys que se sobre alguus delles fizeram. Com priuilegio real. (74 fol.; tem no fim: Forã impressos estes Capitolos e leys per mandado del rey nosso senhor na cidade de Lixboa; per Germã Galharde empremidor. E acabarã se aos iij dias do mes de Março. Anno de M. D. XXXIX.), do qual tive presente um bello exemplar em pergaminho do Archivo Nacional, acham-se; « Capitolos geraes : que foram apresentados a el Rey dõ Johã : nosso senhor terceiro deste nome: XV Rey de Portugal: nas cortes de Torres nouas: do anno de mil quinhẽtos e vinte e cinco. E nas Deuora: do anno de mil e quinhẽtos e trinta e cinco: com suas respostas. E leys que ho dito senhor fez sobre alguũs dos ditos capitolos. As quaes forã publicadas na Cidade de Lixboa: ano ãno XVII. de seu Reynado: e XXXVII de sua idade: XXIX dias do mes de Nouembro. Auno do nacimẽto de nosso senhor Jesu christo. De mil e quinhẽtos e trinta e oyto ãnos» e entre eles se lê a fol. XXXVI:
Capitolo CXXXVIII
10«Item, senhor, pedem a vossa alteza aja por bem que nunca em tempo alguǔ entrě çiganos em vossos reynos; porque delles não resulta outro proueito se não muytos fartos que fazem: e muytas feytyçarias que fingẽ saber: em que o pouo reçebe muyta perda e fadiga.»
11«Ey por bem que não entrem ciganos em meus reynos daqui por diante como neste capitolo me pedis e disso farey ley.»
12E a foi. lxvii:
Ley XXIIII. Que os ciganos não entrem no reyno.
13«Vendo eu o prejuízo que se segue de virem a meus reynos e senhorios ciganos: e neles andarem vagando pelos furtos e outros malefícios que cometem e fazem em muyto dano dos moradores de meus reynos e senhorios. Mando que daqui em diante nenhuǔs çiganos assi homês como molheres entrem em meus reynos e senhorios: e entrando sejam presos e pubricamẽte açoutados com baraço e pregam : e despoys de feita nelles a dita execuçam lhe sera assinado termo conveniente em que se sayã dos ditos reynos e senhorios. E se despoys de passado o dito termo for mais achada algũa das ditas pessoas por não se sayr dentro no dito termo; ou posto que se saisse tomar outra vez a entrar nos ditos reynos e senhorios: sera outra vez açoutado pubricamente com baraço e pregam: e perdera todo o mouel que teuer e lhe for achado: a metade pera quem o accusar; e a outra metade para a misericordia do lugar onde for preso. O que auera lugar assi nos ciganos como em quaesquer outras pessoas de qualquer naçam que forem que andarem como çiganos: posto que ho não sejam. Porem sendo alguũ natural de meus reynos não sera lançado fora delles: e sera degradado dous annos pera cada huũ dos lugares dafrica: alem das sobreditas penas.»
N.° 3 1557
14«Lei de 17 de Agosto de 1557, que não entrem os Ciganos nestes Reinos, em que alem do que he mandado no Cap. 138. das Cortes de 1525, e 1535, se accrescentão as penas até galés, a cuja execução se procederá, como for de justiça, dando appellação, e aggravo. »
15[Figueiredo, Synopsis chronologica, ii, 22.]
N.° 4 1573
16«Alvará de 14 de Março de 1573, publicado na Chancellaria mór em Evora a 28 do mesmo mes e anno... » (Vid. o alvará de 11 de abril de 1579, abaixo reproduzido doc. n.° 6).
17«Na Apostilla de 15 de Abril do mesmo anno se declarou, que como nas mulheres não podia ter lugar a pena das galés, ficassem sugeitas ás penas da dita Lei 24. das (chamadas das) Cortes; e que tanto estas, como as mais impostas aos Ciganos fossem executadas pelos Corregedores e Juizes de Fora dos Lugares, e Comarcas, onde fossem achados sem appellação nem aggravo, e pelos Ouvidores nas Terras, onde não entrão os Corregedores por via de Correição.»
18[Figueiredo, Synopsis chronologica, ii, 168-169.]
N.° 5 1574
19Dom sebastiam etc. faço saber que Johão de torres, çiguano preso no lymoeyro, me ẽujou diser per sua petição que estamdo na villa de momtalluão morador e jmdo e vjmdo a castella fora preso he acusado pela justiça, dinzemdo que semdo ley deste Reyno que toda geração de çiguanos não vjuesem neste neste Reyno e delle se sahysem em çerto tempo e por elle não ser sabedor da tall ley por jr he vyr ha castella, fora preso he acusado pela justiça, elle he sua molher amgylyna e condenado per sentença da mor allçada, elle em çimquo anos de degredo pera as gualles e açoutados publicamente, cõ baraço e preguão, e a dita sua molher se sahyrya do Reyno em dez dias, visto como se não mostraua certjdão de quamdo hally fora pobrjcada em momtalluão, homde forão presos, como todo se mostraua da sentença que oferecia, he por que dos haçoutes, baraço de preguão hera feita execuçam e a dita sua molher hera fora do Reyno e elle ser presente, estaua no lymoeiro, homde perecia ha mjmgoa, e hera fraquo he quebrado, e não hera pera serujr em cousa de mar e muito pobre, que não tjnha nada de seu, me pedya que ouuese por bem que se sahyse loguo do Reyno ou que fose pera o brasyll pera sempre e podese leuar sua molher avemdo respeito a pena que já tinha Recebyda etc. ; e eu vemdo que me asy dise he pedir emvyou, queremdo lhe fazer mercê visto hũ parece como o meu pase (?), ey por bem e me praz se assy he como dis, de lhe cumutar os cimquo anos em que foy condenado pera as gualles, pelo caso de que faz menção, visto ho que halegua e declara, em outros cimquo anos pera o brasyll, homde leuara sua molher e filhos, visto outrosy como he feyta execuçam dos haçoutes; por tamto vos mando etc. na forma dada em allmeyrim a vij dias dabrill. el rey noso snr ho mamdou pelos doutores paullo affonso e amtonjo vaaz castello etc. dioguo fernandez a fez, ano do naçimento de noso snr Jhu xpo de m ve LXXIIIJ° anos. Roque vieira a fez escreuer.
20[Archivo Nacional, Liv. 16 de Legitim. D. Seb. e D. Henr., fl. 189.]
N.° 6 1579
Alluara sobre os çiganos
21Eu el Rej faço saber aos que este alluara uirè [que ho] que el Rey meu sobrinho que deus tem pasou hŭua proujsão feita a catorze dias do mez de março do ano de vc setěta e tres, da que o terllado he o seguinte. Eu el Rey faço saber que eu são jnformado que, posto que polla ley vinte e quatro dos capitollos das cortes que se fezerão no ano de trjnta e ojto e pello capitollo vinte e cinquo do Regimento que mandey dar aos presj dentes das allçadas que forão visitar meus Rejnos, está bastantemente proujdo pera que hos çiganos, nêhas pessoas que amdão ẽ sua companhia amdem, ně estem nos lugares dos ditos meus Rejnos, os ditos çiganos e pessoas não deixão por jsso de estar e andar nelles e fazer muitos frutos e outros insultos e dellitos de que ho pouo Recebe grande opressão, perda e trabalho. E querendo nisso prouer ey por bem e mando que ẽ todos hos lugares de meus Reynos se lançem loguo pregões pubricos, nas praças e lugares acostumados, que os çiganos e çiganas e quaes quer outras pessoas que em sua companhia andarẽ se sayão dos ditos meus Reynos dentro de trjnta dias, que começarão do dia ẽ que se derẽ os taes pregões, sě embarguo de allgũs delles terê proujsões del Rej meu senhor e avo, que santa gloria aja, ou minhas pera poderẽ estar nestes Rejnos, e acabados os ditos trjnta dias qualquer çigano que for achado nos ditos meus Reynos por esse mesmo feito sera loguo preso e açoutado publicamente no lugar omde for achado e degradado pera sempre pera as gallees posto que tenha proujsão do dito senhor Rej meu avo ou minha pera poder estar ou andar nestes Rejnos, como acjma he dito; e mando a todos meus desembargadores, corregedores, ouujdores, juizes de fora e ordjnarios e quaesquer outras justiças, hofficiaes e pessoas dos djtos meus Rejnos que cada hũ ẽ sua jurdiçam cumprão, guardem e façam asj jnteiramente comprir e guardar semdo os ditos corregedores, ouujdores, juizes de fora, çertos que se ha de preguntar por este caso ẽ suas Resjdencias, e que achandose que não teuerã diso o cujdado que deujão se ha de proçeder cõtra elles como ouuer por meu seruiço; e asj mando ao chanceler mor que pobrique esta proujsão na chancelaria e ẽuie loguo cartas cõ ho treslado della sob meu sello e seu sjnal aos ditos corregedores e asj aos ouujdores das terras ẽ que elles não estão per uia de coreiçam; aos quaes corregedores e ouujdores mando que ha pobríquem loguo nos luguares homde estjuerê e fação pobricar ê todos os outros lugares de suas comarquas e ouujdorias e Registar nos liuros das camaras delles pera que a todos seja notorio e se cumpra e de jnteiramente ha execuçam como nella se cõthem; e esta se Registara no Livro da mesa do despacho dos meus desembargos do paço e no das Rellaçõis das casas de suplicação e do çiuel ẽ que se Registarão as semelhantes proujsões ; e ey por bem que valha e tenha força e vigore como se fose carta feita ẽ meu nome por mj̃ asjnada e pas sada por minha chancelaria, sẽ embargo da ordenaçam do segundo livro, titulo XX, que diz que has cousas cujo efeito ouuer de durar mais de hũ ano passem per cartas e passando per alluaras não ualhão. Gaspar de sousa a fiz em Evora a XIIIJ° de março de mvclxxiij. Jorge da costa a fiz escreuer. E ora ey per bem e mando que ha proujsão do dito senhor Rej meu sobrinho, que deus tem, açima tresladada se cumpra e guarde jnteiramente como se nella conthem, com tal declaraçam que hos çiganos que teuerẽ leçemças del Rej dõ João, meu jrmão, que samta gloria aja, e do dito Rey meu sobrinho, as examinẽ perante hũ dos Corregedores de minha corte dos feitos ciuis, o qual se jnformara de como uiuẽ e de que mesteres usão e se sam casados e o modo e meneo de suas vjdas e costumes e parecẽdo lhe que uiuẽ bem e que trabalhão e não são prejudiciais, lhe poderã dar licença, não permitindo que uiuão juntamente è hum bairro, senão ẽ bairros apartados, e que amdem vestidos ao modo portugues, e mando ao meu chanceler mor que pobrique este alluara na chancelaria e ẽuie o trelado delle sob meu sello e seu sinal aos corregedores e ouujdores das comarquas de meus Rejnos, aos quais corregedores e ouujdores mando que ho pobriquem nos loguares omde estiuerè e o fação pobricar ě todos os lugares de suas comarquas e ouuidorias, para que a todos seja notorio, e este se Registara na mesa do despacho dos meus desembargadores do paço e nos livros das Rellações das casas de suplicaçam e do ciuel ẽ que se Registarão as semelhantes proujsões. pedro de sousa ha fiz ẽ Lixboa a XI dabril de mvc setenta e noue. Johão de sousa o fiz escreuer.
22[Archivo Nacional, Liv. 1.° de Leis, fl. 57 v.°.]
N.° 7 1592
23«Lei de 28 de Agosto de 1592, em que se exasperão mais as penas contra os Ciganos, que dentro de quatro meses não sahissem de Portugal, ou se não avizinhassem nos Lugares sem andarem vagabundos, não podendo andar, nem estar, ou viver em ranchos, ou Quadrilhas; tudo sob pena de morte natural, que se faria executar, fazendo-os para isso prender os Ministros das terras, e procedendo contra elles até á execução sem appellação, nem agravo.»
24[Figueiredo, Synopsis chronologica, ii, 261.]
N.° 8 1597
25«Aos dezasete dias do mes de junho (de mil e quinhemtos nouemta e sete annos) fiserã Camara de veraçã os sennõres Juiz e Veradores e procurador do concelho abaixo asinados. eu João Sirueira que ho escreui.
26Llogo nesta Camara pello Juiz e Veradores e procurador do concelho foi acordado que comvinha ao bem pubrico e quietaçã desta cidade nã se comsemtirem nella os siganos que os dias pasados se vierã avisinar com precatorio do corregedor do crime da Sidade de Lisboa, por quanto desdo dito tempo pera ca se tinha feito muitos furtos de bestas e outras coizas e amdaua a gente da sidade tã escamdalizada que se temia hũ mutim comtra elles, maiormente depois que ouve algũs furtos que conhesidamente se soube serem feitos per elles; posto que as testemunhas nã sabem expesificaidamente quais dos ditos siganos o fizesse (sic) ; e alem diso por esta cidade ser de gemte belicoza e da raia e acim de comtino acomtesem muitos crimes de diverças maneiras, os quais se emcobrem dibaicho desta capa de diserem que os fiserã os siganos, pello que detreminarã que fossem noteficados que demtro em tres dias se saicem desta cidade e seu termo para o que se lhe passaria carta pera lugar serto, queremdoa, e semdo achados pasado o dito termo se prosedera comtra elles com todo o rigor; e de tudo mandarã fazer este termo que todos asinarã. eu João Sirueira que ho escreui, e amtes de se asinar o dito termo mandarã requado ao sôr amdre gomçalvez de Carnide Corregedor desta Comarca para lhe darem comta deste negosio amtes de se dar execuçã o qual dise que dipois de pasada a llei nas partes omde resedira nunqua comsemtira avesinarem-se siganos dipois de serem escolhidos lugares na forma da lei e que lhe paresia muito bem nã se ametirem os ditos siganos nesta cidade pellos gramdes emcomvenientes que quada dia podẽ soseder por ser tera belicoza e da raia; por lhe asim pareser se asinaram todos, eu João Sirueira que ho escreui.
27(a) Siqr.a Carnjde. N.° de Carualjall. Joam + Soarez. Luiz Ferz.
28Por aqui õuuerão a Camara de Verasã por feita e acabada e se asinaram. eu João Sirueira que ho escreui. (u) Siqr.a N.° de Carualjall. Joam + Soarez. »
29[Livro das vereações da Camara Municipal de Elvas, do anno de 1597, fl. 54 a 55. Archivo da Camara de Elvas, armario n.° 21, maço n.° 1.]
N.° 9 1597
30«Aos tres dias do mes de junho de mil e quinhemtos e novemta e sete anos fiserã Camara deureação os sennõres Juiz e Veredores e procurador do Concelho e se asinarã. eu João Sirueira que ho escreui.
31Ilogo nesta Camara foi praticado dos muitos furtus que os siganos faziã nesta cidade e mandarã os sennõres Veradores e procurador do concelho apregoar que todo o sigano, tirado dois que estã avesinhados nesta cidade, que fosem achados nesta cidade e seu termo que fosem presos e que se prosederá comtra elles comforme a llei; oje tres de iunho de mil e quinhemto e novemta e sete anos, eu João Sirueira que ho escreui (a) J. alluez de Lemos. N.° de Carualjall. Luis Ferz.
32por aqui ouverã a Camara de uerasã por feita e acabada e se asinaraõ. eu João Sirueira que ho escreui.
33(a) N° de Carualjall. J. alluez de Lemos. Joam + Soarez. Luis Ferz. »
34[Livro das vereações da Camara Municipal de Elvas, do anno de 1597, fl. 50. Archivo da Camara de Elvas, armario n.° 21, maço n.° 1.]
N.° 10 1603
35Mandamos, que os ciganos, assi homens, como mulheres, nem outras pessoas, de qualquer Nação que sejaõ, que com elles andarem, não entrem em nossos Reinos e Senhorios. E entrando, sejaõ presos e açoutados com baraço e pregaõ. E feita nelles a dita execução, lhes seja assinado termo conveniente, em que se saiaõ fora delles. E naõ se saindo dentro do dito termo, ou tomando outra vez entrar nelles, sejam outra vez açoutados, e percaõ o movel, que tiverem, e lhes for achado, ametade para quem os accusar, e a outra para a Misericordia do lugar, onde forem presos; e sendo algumas da ditas pessoas, que com os Ciganos andarem, naturaes destes Reinos, naõ seraõ lançados delles, mas seraõ além das sobreditas penas degradados dous annos para Africa.
36[Ordenações philipinas, liv. v, tit. 69. Que naõ entrem no Reino Ciganos, Armenios, Arabios, Persas, nem Mouriscos de Granada.
37Ordenações philippinas foram concluídas em 1595 e publicadas em 1603, data que foi posta no alto do extracto.]
N.° 11 1606
38Alvará de 7 de janeiro de 1606, reproduzido na lei de 13 de setembro de 1613, em seguimento impressa.
N.° 12 1613
39Dom Philippe per graça de Deos, Rey de Portugal, e dos Algarues, d’aquem e d’alem Mar em Africa, Senhor de Guinè, e da conquista, nauegação, comercio de Ethiopia, Arabia, Persia, e da India, etc. Faço saber aos que esta minha Ley virem, que eu mandei passar hum Aluarà feito em sete de Ianeiro de mil seiscentos e seis, sobre os ciganos, que fossem achados neste Reyno vagando em quadrilhas, e nelle residissem, do qual o treslado he o seguinte.
40Eu El Rey faço saber aos que este Aluará virem, que eu sou informado, que a Ley que fiz sobre os ciganos declarada na Ordenação do liuro 5 titulo 69 imprincipio, se não cumpre, e contra forma della os Corregedores do crime desta cidade de Lisboa, e outros julgadores lhes passão cartas de vizinhança, e os fauorecem per outros modos, que não cõuem: e porque tambem tiue informação, que as Ordenações, que tratão dos ditos ciganos se não guardão tão inteiramente, nem as penas que nellas se declarão são bastantes para elles se sahirem fora do Reyno, antes continuão em roubos, e danos, que fazem a meus vassallos com geral escandalo, sendo tudo em grande perjuizo seu, e dano do Reyno, querěndo nisso prouer. Ey por bem, que todos os ditos julgadores tenhão grande vigilancia em comprir inteiramente a dita Ordenação do livro 5. e não passem as ditas cartas de vizinhãça, nem vsem de outros modos: e fazendo o contrario se lhes darà em culpa, e eu mandarey perguntar por isso nas residencias. E assi ey por bem, que posto que pellas ditas Ordenações senão dee aos ciganos mais penas que açoutes pella primeira vez que forem achados sejão degradados alem da dita pena, em tres annos para galès, e pella segunda vez sejão outra vez açoutados, e nas mais penas das ditas Ordenações, e no dito degredo de galès em dobro: e pella terceira vez serão açoutados, e encorrerão mais nas ditas penas, e em dez annos para galès: e em todas estas penas os poderão condenar os Corregedores, e Ouuidores das comarcas, e os Ouuidores das terras dos donatarios em que elles não entrão per via de correição: e as justiças lhes darão tẽpo conueniente (que não passarà de hum mes) para que se sayão do Reyno: e passado o dito termo tomando a entrar no Reyno se fara nelles a execução pellas ditas penas na forma deste Aluará. E por quanto a dita execução he de grande importancia, para bem, e quietação de meus vassallos, e do Reyno. Mando aos ditos julgadores e justiças, que assi o cumprão, e fação em todo cumprir: e ao Chãceller mór, que o publique na Chancellaria, e para vir a noticia de todos enuie logo cartas cõ o treslado delle sob meu sello e seu sinal aos Corregedores e Ouuidores das comarcas: e assim aos Ouuidores das terras em que os ditos Corregedores não entrão por via de correição. Aos quaes mãdo que logo o publiquem nas cabeças das correições: e este Aluarà serà registado nos liuros da Mesa do Desembargo do Paço, e das casas da Supplicação, e do Porto: e quero que valha, tenha força e vigor, como se fosse carta começada em meu nome por mi assinada, e asellada com o meu sello pendente, sem embargo da Ordenação do liuro 2. titul. 40. em cõtrario. Pero de Seixas e fez em Lisboa a sete de Ianeiro de mil seiscentos e seis.
41E porque sou informado, que o dito Aluará se não cumpre e executa, e que andão muitos ciganos por este Reyno vagando em quadrilhas cometẽdo muito excessos e desordẽs, e quão perjudiciaes são, aos que viuem e residem nas cidades, villas e lugares delle: e querendo prouer de maneira, que de todo os não aja, nẽ residão neste Reyno. Ey por bem, e mãdo per esta Ley que o Aluarà nesta incorporado se cumpra e execute com todo o rigor delle, sem deminuição das penas que nelle se declarão. E mando aos Corregedores do crime em minha Corte, e casa da Supplicação, e aos Corregedores do crime desta cidade de Lisboa, e aos das comarcas deste Reyno, e aos Ouuidores dos mestrados, e aos das terras dos donatarios, em que os Corregedores não podem entrar per correição. E a todos os juizes de fora, que tanto que esta Ley chegar a sua noticia a fação logo publicar em todos os lugares de suas jurisdições, limitando aos ciganos, que neste Reyno residem assi homẽs, como molheres, que dẽtro em quinze dias depois de esta publicada se sayão deste Reyno sem embargo de quaesquer licěças, que tenhão para nelle residirem, posto que sejão por mi assinadas, ou que lhes fossem passadas cartas de vizinhança: as quaes todas annullo, e as ey por de nenhum effecto. E passado o dito termo de quinze dias se executarà em quaesquer ciganos, que forem achados a pena de açoutes e galès, pella maneira que no dito Aluarà se declara: e nas molheres a pena de açoutes somẽte. E mando ao Doctor Damiam d’Aguiar do meu conselho Chanceller mòr destes Reynos, que faça publicar esta Ley em minha Chancellaria, e enuiará logo o treslado della sob meu sello, e seu sinal, a todos os Corregedores, Ouuidores dos mestrados: e aos dos Donatarios das terras em que os Corregedores não entrão per correição para a fazerem logo publicar nos lugares publicos de suas comarcas e jurisdições, e se executar como nella se contem: sendo certos os ditos Corregedores, Ouuidores, e mais justiças a que a execução, e comprimento desta Ley pertencer, que se à de perguntar em suas residencias se a cumprirão, e executarão, como nelle se declara, e que achandose, que se descuidarão na execução della, alem de me auer d’elles por mal seruido, mandarei proceder contra elles com todo o rigor: e esta Ley se registarà no liuro do registo da Mesa dos meus Desembargadores do Paço, e nos das casas da Supplicação, e Relação do Porto, e a própria se lançarà na Torre do Tombo. Dada nesta cidade de Lisboa, aos treze dias do mês de Septẽbro. Francisco Ferreira a fez. Anno do Nascimento do Senhor Iesu Christo de mil seiscentos e treze. Ioão Pereira de Castelbranco a fez escreuer. = REY. = Damiam d ’Aguiar.
42Foy publicada na Chancellaria a Ley delRey N. Senhor atras escrita por mi Miguel Maldonado, que ora siruo de escriuão da dita Chãcellaria, perãte os officiaes della, e de outra muyta gente que vinha requerer seu despacho. Em Lisboa, a 10. de Ouctubro de 1613 Annos. = Miguel Maldonado.
43Taxada a oyto reis.
44[Reproduzido de uma folha impressa avulsa no Correio Elvense, ann. I, n.° 41,9 de março de 1890. Nas Ordenações e leys, confirmadas e estabelecidas pelo Senhor D. João IV. Lisboa, 1747. iii, 166-168. Collecção chronologica de leis extravagantes. Coimbra, 1819. i, 62-64. 217-218.]
N.° 13 1614
45Carta regia de 3 de dezembro de 1614, sobre um requerimento de G. Fernandes, C. Cortez e outros ciganos que pretendiam se dispensasse com elles a lei pela qual se mandavam sair do reino; «porque importa que ela se guarde cumpridamente, se excusará a sua petição.»
46[G. Pereira de Castro, De manu regia (Ludguni, 1673), i, 10. João Pedro Ribeiro, índice chronologico remissivo da legislação portuguesa, 12, 41. J. J. de Andrade e Silva, Collecção chronologica da legislação portugueza (Lisboa 1854 e segs.), t. ii, p. 105-106. O doc. achava-se no Liv. IV do Desembargo do Paço.]
N.° 14 1639
47«Capitulo de huma Carta regia de 30 de Junho de 1639, mandando condemnar para Galés os Ciganos, que se acharem, dando-se-lhe conta dos que já estavão nellas, e dos que se achavão presos. Participada em portaria da princeza Margarida de 8 de Agosto do mesmo anno, para execução dessa carta, devendo estar chusmadas as Galés até 17 d’este mez, e declarando que a qualidade de Cigano não he de natureza; mas do seu modo de vida, quanto a se condemnarem, segundo a Lei do Reino.»
48[J. P. Ribeiro, Indice chronologico 112, 360-361 ; do Liv. IX da Supplicação, fl. 249.]
N.° 15 1646
49Senhor: – Vi o Alvara da Suplicante, que me deixou em grande admiração; porque nelle, (que he assinado pela mam de V. Magestade), se relata, que Jeronimo da Costa, seu Marido, servio a V. Magestade tres annos contínuos nas Fronteiras do Alemtejo, com suas armas, e cavallo, tudo á sua custa, sem levar soldo algum, franca, e fidalgamente: e relata-se mais em nome de V. Magestade, o valor o esforso, com que em o dito tempo se houve, relatando suas proezas, até que na Batalha do Campo de Montijo foi morto com muitas feridas, pelejando sempre mui esforçadamente. E quando eu estava com alvoroço para ler o grande prémio e remuneração, que tiverão estes serviços, em sua mulher e filhos, senão quando eu leio, que se lhe faz merce, que sejão havidos por naturaes do Reino, e que o filho macho, herdeiro dos serviços, e grandeza do animo de seu Pay em despender a fazenda, sangue, e vida pela sua terra, sem ser sua Patria, o pozessem a um officio macanico. Ao officio macanico mandara eu por o Ministro que tal Despacho deu e sem V. Magestade o ver despachos com tão humildes espíritos. Mande V. Magestade recolher este Alvara, ou tirar delle a narração de serviços, valor, e espíritos generosos deste homem, e proezas, e morte honrroza, que nelle se relatão; porque se servio tres annos contínuos com suas armas e cavalo á sua custa, sendo um pobre Sigano; porque lhe não hade V. Magestade pagar seus soldos devidos a mulher e filhos? E mande V. Magestade passar-lhe Alvara de natural e Cavaleiro Fidalgo, que he o menos Foro, que merece, e que nunca tenha, nem seus descendentes officio macanico, e sirvão sempre na guerra e milicia nos postos de Soldados e Presidios: E que se não leia, que em Alvara de V. Magestade filho de tal homem e pozerão a officio macanico, por lhe não pagar seus soldos de hum esforçado Cavaleiro, que com seu cavallo e armas à sua custa, sem soldo, servio valerozamente no Campo, athe deixar a vida, aonde tantos infamemente fugirão, a vista dos que esforçadamente morrerão, ou pelejarão. E se nesta forma deste homem, que sem obrigação de sangue e natureza servio por honrra, o fizessem os Grandes e Capitaens Generaes, Fronteiros e Governadores, servindo á sua custa em sua Patria e sem outro soldo, gastando o que tem em sua defenção, e de sua Patria, como elles mesmos, e seus famozos Pays e Avós fizerão em Africa, e índia, e Armadas, com cavallos, e criados esforçada e generozamente, como quem são, bastara ametade das decimas, e depois de quieto o Reino, partira V. Magestade com elles o defendido, e conquistado, e as Comendas e copiosos bens do Reino que para si o defendem, e devem defender, imitando este Sigano humilde no nascimento, e nobre, e generozo no procedimento; porque hir as Fronteiras, como a Ormuz, Malaca, Cofala a vencer soldos, e riquezas, e com tantas condições, e com pedir soldos atrazados, devidos ou não devidos, neste tempo sem servir a sua custa, não he o Portugal para isso, que se não sustenta, nem com thesouros nem cavallos, nem gente em numero, em que nunca podem igualar as dilatadas terras e Reinos de Castella, e thesouros do Payz; se não no natural valor, e amor da Patria e Reys, e ponto de honrra. E isto não he hir enriquecer, e ganhar dinheiro, em que alguns podem degenerar, não havendo rezão particular, que muntos terão, falo em geral. A esta mulher mande V. Magestade despachar, e seus filhos, não só no que pede, de fazer natural seu genrro que por seus serviços pessoaes tãobem o merece; mas mande-lhe V. Magestade deferir a seus serviços em forma, como peço, ou ella, na Petição que lhe mando fazer a V. Magestade, que vae junta para provocar os meios. O que requeiro como Procurador da Coroa, pelo que cumpre ao Reino; pois merece a Firma e Signal de V. Magestade, em verificação do seu procedimento. Isto se offerece e que vão a V. Magestade. &c. Lisboa 28 de julho de 1646. = Thome Pinheiro da Veyga.
50[Arch. R. Corpo Chron., P. 1., maço 118. Docum 131. João Pedro Ribeiro, Dissertações chronologicas, iv, pp. 215, 217.]
N.° 16 1647
Tresllado da ordem dos siguanos
51Dom Joam per grasa de Deus Rej de Portugal e dos algarues, da quem e dallem mar em afrjqua, snor de guiné e da conquista, navegasão, comersio, detiopia, arabia, persja e da indja etc., faço saber a uós corgedor da comarqua de eluas que eu passej ora hum aluara per mim asjnado e pasado per minha chanchellaria, do qual o tresllado he o seguinte
52Eu ell Rej faso saber aos que este aluara de lej virem que per quanto dos gitanos que mandej prender pello Rejno e se embarquarão pera as conquistas delle, fiquarão ainda na cadeja do limoejro des velhos e emcapazes de poderem seruir, com molheres e filhos, de pouqua idade, e conuir a meu servisso que elles uiuão cõ suas familjas em luguares afastados de esta corte e das frontejras, hej per bem e me pras de lles senallar pera este efeito os luguares seguintes tores uedras, lleirja, ourem, tomar, allanquer, monte mor e uello e coimbra ; dos quais não poderão sahir sem licença dos juizes delles a qual se lies não consedera per tempo llargo e se lles poreboira juntamente que não fallem geregonsa, nem a ensinem a seus fillos, nem andem em traje de sjganos e serão obreguados a traballo em quanto puderem, como fazem os naturaes do Rejno, e estando empesebeljtados por doensa ou muita idade se lies permetira poderem pedir esmolla nos mesmos luguares em que uiuerem, sem que fasão de suas trasas e embustes, a que chamão buenas djchas, e jogos de corjolla nem partidas de cavalgaduras; antes se lles poreboirá com todo o rjgor comprar a troquados (sic), com declarasão que quem o contrario fizer pella primeira ves sera logo condenado em asoites e toda a ujda pera gallés, e sendo moller, da prizão ira pera angolla degradada, ou Cabo uerde, per toda a ujda sem leuar consigo fillo ou filia; e mando que na essicução desta lei se proseda sumariamente e com seis testemunhas que pergunterá o juiz do loguar, onde o siguano for morador, e os autos que sobre a materia se fizerem serão logo remetidos a hum dos corgedores do crime da minha corte ou ministro a quem eu cometer jurisdisão e supertendencia dos siguanos, os quaes os remeterão pelos loguares nomeados e não lles sera a nenhum dos condenados admetjda petjsão para perdão; antes se devasará pelos corgedores das comarquas dos juizes dos loguares de seus destritos se observão esta llej e o que fiquar comprehendido paguara duzentos cruzados para as despezas da guera ou justiça; e os quais juizes não consentirão que os siguanos crjem seus fillos ou fillas pasando de noue anos de idade, e sendo capazes de seruir os porão a soldada na forma que se uza com os orfãos; e mando ao regedor da casa da sopljquação gouernador da rellasão do porto e aos dezembarguadores das ditas rellasois e aos corgedores do crime de minha corte e aos de esta cidade e a todos os meus corgedores das comarquas, ouuidores, juizes de fora das cidades, villas e luguares onde os ditos siguanos uiuerem, que cumpram e guardem e fasão enteiramente cumprir e guardar todo conteúdo neste aluara, como se nelle contem e o chanceller mor destes Renos o fara publiquar na Chanchellaria e envjar com meu sello e seu senal aos ditos corgedores das comarquas, ouuidores, juizes de fora, pera que a todos seja notorio o que per este ordeno e o fasão dar a esecusão, sem contradisão alguma, e da mesma manejra ás conquistas de este Rejno, onde se pobliquara pera que senão consinta aos siguanos que forẽ degradados o elles uzarem desonestos tratos e embustes, de que de antes ueuirão; e se rezestara nos Liuros do dezembarguo do paço, caza de sopliquasão, rellasão do porto onde semelhantes leis se costumão rezistar. Antonio de Moraes o fes em Lisboa aos uinte quatro de outubro de mil e seis semtos e quarenta e sete. Pedro digenes (?) revello o fes escreuer. O Conde de Santa Crus. Rej. aluara de llei..... que se hade ter com os siguanos e fillos nelle declarados, Para Vossa Magestade uer. Estevão lleitão de revellos Foi publjquado na Chanchelleria mor o aluara de ell Rej nosso snõr atras escrito por Miguel maldonado escrjuão da dita chanchelleria perante os ofisiais della e de outra muita gente que uinha requerer seu despacho Lixboa... de outubro de 647 Miguel maldonado. Co a qual llei mandej passar esta carta para vos, pella qual vos mando que tanto que vos for mostrada a fasais pobljquar e rezistar na cabesa de vosa comarqua e pobljquar brevemente nos mais luguares della pera vir a notisia de todos e se comprir e guardar como nelle se contem, e a despeza que se fizer em se pobljquar nos mais loguares de vosa comarqua será á custa das despezas dos auizos (?) e quando não ouuer sera a custa das rendas da Camara da cabesa de vossa comarqua. dada na sidade de Lixboa aos trese dias de novembro, el-rej noso Snõr pelo doutor estevão lleitão de revellos do seu conselho e chancheller mor destes Reynos e senhorios de Portugal Manoel antunes de sãpaio o fez. Ano do nascimento de noso snõr Jesus Xro de mil e sessentos e quarenta e sete eu Miguel maldonado o fis escreuer, estevão lleitão de revellos. E não dis mais a dita prouizão que bem e fielmente treslladei e rezistei do proprio que entreguei ao escriuão da coreisão que ora serue. Ao qual em todo me reporto e consertei bem e fielmente com otro ofisial abaxo asjnado e eu Baptista fang.ro da fonseca e comigo taballiam Gomes Gallvam».
53[Archivo da camara municipal de Elvas, t. i, velho do Registo, p. ii, fl. 552 v. Ordenações e leys confirmadas e estabelecidas pelo Senhor D. João IV, Lisboa, 1747. iii, 168-169. Collecção chronologica de leis extravagantes. Coimbra, 1819. i, 515-517.]
N.° 17 1648
54Decreto, em que se prohibio darem-se, ou alugarem-se casas a Ciganos
55Ao Desembargo do Paço hey por muy encarregado faça com põtualidade executar a Ley dos Ciganos, accrescentando a ella, que as pessoas, que lhes derem, ou alugarem casas incorrerão nas penas, que mandarei declarar. Lisboa, 30 de Julho de 1648.
56Com Rubrica de Sua Magestade.
57[Liv. I dos Decretos do Desembargo do Paço, fol. 215, in Ordenações e leys confirmadas e estabelecidas pelo Senhor D. João IV, etc. Lisboa, 1747, vol. iii : Colecção ii dos Decretos e Cartas, p. 273.]
N.° 18 1649
58Eu ElRey faço saber aos que este Alvara virem que por se ter entendido o grande prejuizo e inquietação que se padece no Reino com huma gente uagamunda que cõ o nome de siganos andam em quadrilhas vivendo de roubos enganos e imbustes contra o serviço de Deus e meu, Demais das ordenações do Reino, por muitas leis e prouisões se precurou extinguir este nome e modo de gente uadia de siganos com prizoens e penas de asoutes, degredos e galés, sem acabar de conseguir; e ultimamente querendo Eu desterrar de todo o modo de uida e memoria desta gente uadia, sem asento, nem foro nem Parochia, sem uiuenda propria, nem officio mais que os latrocínios de que uiuem, mandey que em todo Reino fossem prezos e trazidos a esta cidade, onde serião embarcados e leuados para seruirem nas comquistas diuididos; e porquanto ficarão ainda na cadea alguns velhos incapazes e outros escondidos neste Reino, cõ o mesmo intento mandey passar hum Alvara em vinte e quatro de outubro de seiscentos e quarenta e sete de que o treslado é o seguinte..... [Vid. Doc. n.° 16.]
59E porque no dito Aluara se trata somente dos ditos siganos prezos uelhos e incapazes sem se declarar outra parte de minha ordem e decreto que passey sobre os mais que ficarão ainda no Regno capazes de seruiço nas conquistas, exceptuando os que assistem nas fronteiras e não andassem em companhia de outros, mandando que com os que fossem inhabeis se proçedesse na forma do Aluara referido e nesta Corte se não consentissem em nenhum cazo nem sinco leguas ao redor sigano nenhum nem sigana, sou informado que nesta parte se não passou nem publicou em muitas partes como ordeney; o que pelos que estauão servindo nas fronteiras se me fes queixa que estando mais de duzentos e cincoenta em meu serviço desde o tempo de minha filice aclamação alistados com zelo e valor, com que já forão muitos apremeados; e que a dita Ley geral da prizão se não podia emtender nelles; e sem embargo disso se executava lançando-os fora da fronteira e sem paga de seus soldos, mandando os prezos ou que fossem uiuer as ditas vilas do sertão. E querendo eu em tudo prover, Hey por bem e mando que os ditos Corregedores das Comarcas executem com muita diligencia a dita primeira Ley da prizão, prendendo logo todos os siganos que acharem capazes de seruir excepto aqueles que actualmente assistem nas fronteiras e não andarem na companhia de outros e os remetão a esta Corte ao Corregedor della a que esta cometida a supritendençia (sic) deste negocio, e dos que forem velhos e inhabeis se proçeda na forma de dito Aluara e os juizes das terras onde os mando recolher e abitar os obriguem a uzar como os mais uezinhos naturais. E mando que nesta corte e sinco legoas ao redor della se não consinta sigano nem sigana algũa com cominação que o que nella se achar passado o tempo da publicação desta seja sem mais proua nem deligencia condenado em asoutes e toda a vida para galés e a sigana degradada para Angola ou cabo Verde; e as pesoas que lhe derem ou aluguarem casas e os recolherem sendo piães encorrerão em pena de tres annos de degredo para Castro Marim e trinta cruzados pera captiuos e accusador ; e sendo de mayor calidade em dois annos para Africa e sincoenta cruzados. E os fidalgos fora da Corte. E hey por bem declarar que esta ley da prizão senão emtende nos siganos alistados que seruem nas fronteiras actualmente nas companhias ou lugares em que por seus superiores seruirem, procedendo na forma trage e lugar dos naturais; e onde com licença dos Governadores das Armas a negocio e tempo limitado forem; e porque alguns por seruiços e razões particulares estão naturalizados com cartas de naturaes e vezinhos de lugares e vilas do Reino se não entenda neles a dita Ley guardando elles em tudo as condições de suas cartas. Pello que mando ao dito meu chançarel mór faça publicar na Chancellaria esta Ley e declaração e della enuiar copias sob meo selo e seu sinal aos ditos corregedores das Comarcas e mais justiças destes Reinos para terem entendido o que ultimamente tenho resoluto sobre os ditos ciganos. E o executarem inteiramente sem duuida nem contradição algŭa e se registará de nouo nas partes costumadas em semelhantes leis. André de Moraes o fez em Lixboa a sinco de fevereiro de mil e seis centos e quarenta e nove. Luiz de abreu de Freitas a fez escreuer. Rey.
60[Archivo Nacional, Leis, liv. v, fl. 1. Ordenações e leys confirmadas e estabelecidas pelo Senhor D. João IV, etc. Lisboa, 1747. iii, 169-170.]
N.° 19 1649
Decreto em que se mandárão avisar os Corregedores Do Crime da Corte, para que fizessem despejar os Ciganos
61Faça o Conde Regedor advertir da minha parte aos Corregedores do Crime da Corte, como nella me dizem andão actualmente algumas Ciganas; as quaes, posto que digão vem seguindo seus maridos, visto não terem ellas licenças para usarem do traje, lingoa, ou giringonça, seria conveniente a meu serviço, e bem da Republica lança-las dellas, e alimpar a Terra. Lisboa em 20 de Septembro de 1649. – Com Rubrica de Sua Megestade.
62[Liv. X da Supplicação, f. 23 in Ordenações e leys confirmadas e estabelecidas pelo Senhor D. João IV, etc. Lisboa, 1747, vol. iii : Collecção ii dos Decretos e Cartas, p. 273.]
N.° 20 1655
Carta de André d’Albuquerque
63«Sñor – A ordem, que Vossa Magestade foi servido mandar-me em carta de 12 de Septembro do anno passado para se prenderem os siganos, que se achassem nesta Provincia, encarreguei aos governadores e Capitães Mores das fronteiras, e Governadores, Corregedores e Ouvidores das Comarcas, para que a executassem em 25 do ditto, como Vossa Magestade o ordenava; e havendo concorrido todos nesta diligencia, se acharam somente alguns homens, que por me presentarem Provisões de Vossa Magestade, pelas quaes Vossa Magestade os ha por naturaes, e lhes dá permissão para viverem no Reino e me constar não andavão em quadrilhas daquella gente, nem tratavão com ella, os tornei a mandar soltar, e tambem algumas mulheres, que por velhas e miseráveis se não devia intender a ordem com ellas. Nesta fórma se procedeu particular, e ao diante se prenderão os siganos, que apparecerem, como Vossa Magestade tem mandado. – Deus Guarde a muito alta e poderosa pessoa de Vossa Magestade – Elvas, 2 de Fevereiro de 1655. – André d’Albuquerque ».
64[Esta carta foi copiada pelo dr. Francisco de Santa Clara de um livro pertencente ao Archivo do governo militar de Elvas intitulado Livro II do Registo, que os Senhores Governadores das Armas escrevem a Sua Magestade que Deus guarde.]
N.° 21 1682
Processo inquisitorial da cigana Garcia de Mira
65Aos sette dias do mez de Dezembro de mil seiscentos e oitenta e dous annos em Lisboa nos Estaos e caza do despacho da Santa Inquisição, estando a ré em audiencia de manhaã, o Senhor Inquisidor Pedro de Atayde de Castro mandou vir perante si da salla a hum homem por pedir audiencia, e sendo presente disse a pedira para denunciar nesta meza couza a ella pertencente e logo lhe foi dado juramento dos Santos Evangelhos, em que pos a mão sob cargo do que lhe foi mandado dizer uerdade e ter segredo, o que prometteo cumprir, e disse chamar-se Manoel Alvares da Nobrega official de brincos de cera, natural do Lugar do Cabo Villa, freguezia de S. Saluador do Taboado, termo da Villa de Amarante, e morador nesta cidade, e ser de trinta annos de idade. E logo denunciando Disse que havera tres semanas pouco mais ou menos, não se lembra do dia ao certo, estando elle Denunciante em sua casa na rua de Quebra Costas, detraz da Igreja de Nossa Senhora da Palma, chegou á sua porta hũa Sigana, e lhe disse chamar-se Catherina, representa ter sessenta annos de idade, e anda em trage de viuva com sua saya de estamenha parda e mantilha de baeta negra com capello cozido debaixo da barba, e não tem parte notauel por mais a haja de confrontar, e só que traz hũas contas brancas aconfeitadas, e mora nesta cidade em companhia de Siganos junto as cazas do Enviado de Castella, e lhe disse ter hũa Irmaã chamada Antonia Ramalha, a qual, fallando-lhe, lhe disse que elle tinha sua molher auzente, e muitos perigos que passar, se queria que lhes atalhasse, e dizendo-lhe elle Denunciante em que forma o havia de fazer, respondeo ella que por meyo dos fieis de Deos, e que por todo este mez saberia que sua molher era morta, para cujo effeito lhe pedio lhe havia de dar algum dinheiro que para os ingredientes lhe era necessario, e necessitaria de hum cruzado que elle lhe deu, e pelo premio do que nisso obrasse lhe hauia de dar duas moedas de ouro, que o Denunciante prometteo assim fazer, obrando ella por meyos licitos, e sem ofença de Deos, e tornando por outra uez a dita Sigana a sua caza, não se lembra do dia ao certo, mas haverá quinze, diante delle testemunha, e de Catherina da Costa, que uiue em sua companhia, lhe pegou na mão esquerda delle Denunciante na qual pos hum alfinete ou arame com duas bolinhas de cera em cada ponta sua, e dous alfinetes mais, pregado hum com bico em hũa das dittas bólas, e o outro com a cabeça pregada na ditta bola, com as extremidades uiradas para o pulso sem estarem juntas, e logo o obrigou a que cuspisse por tres uezes na ditta mão, na parte que ficaua cercada dos alfinetes, dizendo as palavras seguintes: em nome de Deos Padre, Deos Filho, Deos Spirito Santo, tres Pessoas e hum só Deos verdadeiro, que reynou e reynará para sempre jamais. Amen Jesus.=Santos Fieis de Deos, – obrigando-o a que repetisse estas, e as palavras seguintes e á ditta Catherina da Costa. | os dáquem e os dálem e os da nauegação, vós fostes como nós, nos seremos como vos, todos uos ajuntareis, e neste caso nos ajudareis. E logo os dous alfinetes das extremidades que estauão pregados nas bolas do arame ou alfinetes se uirarão, hum duas uezes e outro hua, ficando sempre pregados nas dittas bolas com os bicos, com as pontas dos dedos formando hũa forca, tendo elle Denunciante sempre a mão quieta, e direita sem a mouer, havendo-lhe a ditta Sigana primeiro ditto, que aquella sorte fazia para saber se sua molher era morta em viua, e que se os alfinetes se mouessem, era sem duuida ser morta, e logo tomou os dittos alfinetes, e os guardou, fazendo-lhe alimpar a mão dos cuspos com hum papel e que o deitasse na rua. Disse mais que passados tres ou quatro dias, não se lembra tambem de qual ao certo, tornou a mesma Sigana a sua caza, e dizendo-lhe se queria uer a certeza de sua molher ser morta, lh’a mostraria facilmente, e para isso pedio hum alguidar com agoa e lançando nella meia folha de papel, que lhe pedio mandasse comprar, hauendo-o passado tres uezes por baixo do trauesseiro da cama, lhe pos a mão para que se molhasse, dizendo hũas palauras que elle não percebeo, e repetio também as palauras que atraz ficão dittas da Santissima Trindade e Fieis de Deos, obrigando-o a que rezasse o que quizesse pela alma que estiuesse mais uezinha a uer a Deos Senhor Nosso, que lhe mostrou no ditto papel, e era a figura de hum defunto com quatro castiçaes, dous á cabeceira, e dous aos pées, o que tudo se figuraua na parte do papel que ficou enxuto, perfilado tudo como em debuxo, em premio do que lhe pedio cinco tostões, sendo que lhe havia dado mais meya moeda, e com outros tostões que lhe deu para a mortalha fez tudo soma de cinco mil réis, pouco mais ou menos. Do que tudo uem dar conta nesta Meza entendendo que as obras da dita Sigana não são naturaes, como elle pretendia, e sem offença de Deos, e o faz por descargo de sua consciencia, e entender que he a isso obrigado. E mais não disse e ao costume disse nada. E sendo-lhe lida esta sua denunciação, e por elle ouuida, e entendida, disse estar escritta na uerdade e nella se affirmaua, ratificaua e tornaua a dizer de novo sendo necessario, e nella não tinha que acrescentar, diminuir, mudar ou emmendar, nem ao costume ter de dizer de nouo, sob cargo do juramento dos Santos Evangelhos que outra uez lhe foi dado. Ao que estiuerão presentes por honestas e religiosas pessoas os Licenciados João Cardoso de Andrade e Joseph Coelho, notarios desta Inquisição que todos uirão e ouuirão, e prometterão dizer uerdade e ter segredo no que lhes fosse perguntado sob cargo do juramento dos Santos Evangelhos que lhes foi dado, e assinarão com elle Denunciante, e com o ditto Senhor Inquisidor. Manoel Martins Cerqueira o escreui. Pedro de Attaide de Castro. Manoel Alvares Nobrega.=João Cardoso. – Joseph Coelho.
66E ido o ditto Denunciante para fora, forão perguntados os dittos Licenciados se lhes parecia que elle fallaua uerdade, e merecia credito, e por elles foi ditto que sim lhes parecia que elle fallaua uerdade e merecia credito, e tornarão a assinar com o ditto Senhor Inquisidor. Manoel Martins Cerqueira o escreui, Pedro de Attaide de Castro. – João Cardoso. – Joseph Coelho.
67Seguem:
1. O depoimento de Catherina da Costa, solteira, de 30 annos de idade, em tudo conforme ao de Manoel Alvares, com a particularidade a mais de que a cigana mandou comprar o papel dizendo «que era necessario não fosse
a marca da que tivesse Crus».
2. O requerimento do promotor para que a cigana seja presa e processada na forma do regimento, em o qual, tendo summariado os depoimentos, conclue: «do que tudo se colhe usar a delata de palavras divinas para couzas e ter pacto com o diabo para adivinhar futuros».
3. Despacho.
4. A confissão da ré.
68«Aos quinze dias do mez de Dezembro de mil seiscentos e oitenta e dous annos em Lisboa nos Estaos, estando alli em audiencia de manhã o Senhor Inquisidor Pedro de Attayde de Castro, mandou vir perante si a h ũa molher que em onze deste presente mez foi preza nesta cidade, e recolhida nos carceres de penitencia, por pedir audiencia, e sendo prezente disse a pedira para confessar nesta meza o que entendia podia conuir ao descargo de sua consciência, pelo que lhe foi dado juramento dos Santos Euangelhos, em que pos a mão, sob cargo do que lhe foi mandado dizer uerdade, e ter segredo, o que prometteo cumprir. E disse chamar-se Garcia de Mira, molher, digo, viuua de Antonio Soares, que foi Sigano, natural de Montemor o Novo, e moradora nesta cidade junto ao Enviado de Castella e ser de cincoenta annos de idade. E logo foi admoestada que, pois tomaua tão bom conselho como era confessar voluntariamente nesta meza suas culpas lhe conuinha muito dizer toda a uerdade dellas, não impondo sobre si, nem sobre outrem falço testemunho, porque fazendo assim porá sua alma em estado de saluação, e alcançará a mizericordia que pretende. E promettendo de assim o fazer.
69Disse que haverá tres semanas nesta cidade foi ella confítente a rua do Quebra-Costas e caza de Manoel Alvares de Nobrega, official de brincos de cera, e fallando com elle lhe dissera que lhe mostrasse a mão para lhe dizer a buena dicha, e que mostrando-lh’a o ditto Manoel Alvares, lhe dissera que tinha muitos trabalhos que passar; e que respondendo o dito Manoel Alvares que já os tinha passado, lhe tornou ella confítente a dizer que não erão esses, senão outros que de nouo hauia de passar; e que entrando neste tempo hum Clerigo a fallar com o ditto Manoel Alvares, hũa molher moça que estaua no quintal das mesmas cazas a chamou com as mãos, e indo ella confítente a fallar com a ditta moça, que lhe disse chamar-se Catherina da Sylva, esta lhe disse que o ditto Manoel Alvares não era seu marido, mas era casado com hua molher que hauia fugido, e tinha illicita amizade com ella ditta Catherina da Sylua, que quizesse fazer-lhe algǔas deuoções ou feitiços que o obrigassem a recebella por molher, e ella confitente lhe respondeo que sim faria, e porque a ditta Catherina da Sylua dezejasse fallar com ella mais deuagar, e neste tempo se despedio o Clerigo que estaua fallando com o dito Manoel Aluares, disse ela confitente á ditta Catherina da Sylua que tornaria a uer-se com ella, e sahio a falar-lhe na mesma caza o ditto Manoel Aluares de Nobrega, ao qual disse que o tomaria a buscar e lhe faria h ũas sortes para saber se sua molher era uiua, ou morta, em premio do que lhe deu hum cruzado.
70Disse mais que no dia seguinte, do qual não está lembrada ao certo, tornou a caza do ditto Manoel Aluares da Nobrega, ao qual disse que queria lançar as sortes que lhe promettera para saber se a ditta sua molher, que estava auzente sem lhe dizer aonde, era uiua ou morta, e que para isso abrisse a mão direita, o que elle fez, e pondo-lhe no alvo della hua palhinha de balanço torsida e seca ao fogo, e em cada ponta da mesma palhinha hũa bolinha de cera, e em cada bolinha pregado hum alfinete com as cabeças para o pulso, dizendo-lhe que cuspisse na mesma mão para que recebendo humidade a ditta pallinha destorcesse para a banda dos dedos, e trouxesse uirados os dittos alfinetes que com effeito uirarão com a palhinha, e ficarão fazendo a forma de hũa forca, hauendo-lhe também ditto que se os dittos alfinetes uoltassem era sinal de ser morta a ditta sua molher, e não uoltando a ser uiua, sendo que não tinha duuida o hauer de destorcer a ditta palhinha, e em quanto fes as sobredittas couzas dizia as palavras seguintes: Em nome do Padre, Filho e Spirito Santo, que reynou e reynará para sempre jamais, amen. E em premio do que lhe deu o ditto Manoel Aluares meya moeda de ouro, e lhe prometteo fazer segunda sorte: a qual foi no (ao?) dia seguinte, mandando-lhe comprar hũa folha de papel, e que a mettesse debaixo da cabeceira, rezando cinco credos á honra das cinco Chagas de Christo Senhor Nosso, e tornando no dia seguinte tomou meya folha do ditto papel e a dobrou em muitas dobras asemelhando a outra meya folha que leuaua debuxada com pedra hume, em forma que fizesse a figura de hũa pessoa morta com dous castiçaes á cabecira e dous aos pés, e tendo-a na mão debaixo da mantilha, tomou na outra mão a meya folha que se hauia comprado, e fazendo algũas ligeirezas de mãos as troucou, e lançou com a agoa que tinha preparada em hum alguidar a meya folha que hauia trazido, a qual burnida com a pedra hume molhou só aquella parte que não estaua burnida em a ditta pedra lume, e ficou enxuta e figurada a estampa de um corpo morto, e dos quatro castiçaes que ficão dittos, e tornou a dizer que toda a meya folha de papel se ensopou na agoa, e que assim mostraua a figura sobreditta, do que os dittos Manoel Aluares e Catherina da Sylua ficarão admirados e entendendo que erão feiticeirias o que uiam nesta sorte, como na que fes dos alfinetes; e pedindo-lhe dinheiro para hũa offerta, lhe dera o mesmo Manoel Aluares dez tostões; e que as sobredittas couzas fez obrigada da sua muita pobreza por ser viuua, e ter filhos que alimentar, uzando de cousas naturaes, que os mesmos Manoel Aluares e Catherina da Sylua poderão conhecer se forão aduertidos, dizendo as palauras sobredittas e mandando dizer as orações que a Igreja approva, sem animo nenhum de offender a Deos Senhor a Nosso; mas de ainda assim não lhe ser licito está muito arrependida; pede perdão e que se uze com ella de mizericordia.
71Foi-lhe ditto que tomou bom conselho em declarar nesta meza as couzas de que tem dado conta nella, que se abstenha de as tornar a commetter, sem outras semelhantes que possão introduzir erros, e abuzos no povo Christão, porque tomando a reincidir nellas será castigada com todo o rigor. E por dizer que nem por pensamento tornará a commeter semelhantes culpas, e engano, foi outra uez admoestada em forma, e mandada a seu carcere, sendo-lhe primeiro lida esta sua confissão, que por ella ouuida e entendida, disse estar escritta na uerdade e assinei eu Notario por ella não saber escreuer de seu consentimento com o ditto Senhor Inquisidor. Manoel Martins Cerqueira o escreui. = Pedro de Attaide de Castro. – Manuel Martins Cerqueira.
72Aos vinte e dous dias do mez de dezembro de mil seiscentos e oitenta dous annos em Lisboa nos Estaos, e caza de Despacho da Santa Inquisição estando aly em audiencia da manham senhores inquisidores, mandarão uir perante a si a Gracia de Myra Sigana, Ré preza conhecida neste processo, e sendo prezente foi reprehendida asperadamente e aduertida que se tomar a cahir nas culpas porque foi preza será castigada com todo o rigor de justiça. E outro sy será condemnada em penas pecuniarias, e que restitua o dinheiro e pessas que acceitou a algũas pessoas por meyo de seus embustes, o que tudo prometteo cumprir sob cargo de juramento dos Santos Euangelhos, que pera este effeito lhe foi ddado e que lhe he dada licença pera se poder hir para onde bem lhe estiuesse e que goarde segredo em tudo o que vio, ouuiu e com ella nesta Meza se passou, o que tambem prometto cumprir; de que fiz este termo de mandado dos Senhores Inquizidores que aqui assinarão e eu Notario, de consentimento da Rée por não saber escreuer. João de Mesquita que o escreui.=Pedro de Attaide de Castro. – João de Mesquita de Macedo.
73[Archivo Nacional. Processos inquisitoriaes, n.° 1236.]
N.° 22 1686
Registo de húa Provisão de Sua Magestade sobre os Siganos
74«Dom Pedro por graça de Deos Rey de Portugal e dos Algarves, daquem e dalem mar em Africa, Senhor de Guiné &. Faço saber a vos corregedor da comarca da cidade de Elvas que, por ser informado de que de Castella se expulsavão os siganos e estes se passavão a este Reyno em tanta quantidade que aos Povos pequenos seria muito dificultoso o poderem seportar esta quasi inundação de gente tão osioza e prejudicial por sua vida e costumes, andando armados para melhor cometerem seus asaltos, como a experiencia tẽ mostrado com as universaes quexas o que tudo se seguia de senão conservarem as Leis estabelecidas contra elles e se omittião por respeitos que a sua industria adqueria. E convir ao serviço de Deos e meo que de todo se extreminẽ, sem que se lhes premita habitação neste Reyno nem trato qualquer que seya. Hey por bem e vos mando não premitaes entrem neste Reyno nenhum destes siganos e os que de facto tiverem entrado os prendereis logo nas cadeas publicas e me dareis conta. E quanto aos que já são naturaes, filhos e netos de Portuguezes (porem com habito genero e vida de siganos), os obrigareis a tomarem domisilio serto, donde não poderão sahir nem mudar sem minha especial licensa, nem possão andar vagabundos em quadrilhas pelo Reyno e achando-os nesta forma (?) os prendereis e lhe não consentireis uzem de trage particular, mas que se vistão do costume do Reyno e em aquelles que encontrarem a Ley sobre elles estabelecida a fareis executar na forma que nella se contem, com declaração que os annos que a dita Ley dá para Africa seyão para o Maranhão. E logo que esta receberdes mandareis pôr editaes publicos em que lhes assinareis tempo para lhes ir a noticia esta minha resolução, e asestindo no nosso destrito os mandareis notificar e fareis trasladar esta ordem nas camaras dessa comarca para que os juizes dellas a fação executar, como nella se contem, de que remetereis as certidões, que serão entregues a Francisco Pereyra de Castello branco, escrivão da minha camara, advertindo que toda a omissão com que vós e os ditos Juizes vos ouverdes neste particular, não dando a execução esta ordem, se vos hade dar em culpa que para este effeito mandey acrescentar este capitulo aos mais do Regimento das rezidencias. ElRey nosso Senhor o mandou por seu especial mandado pelos Dezembargadores Diogo Marchão Themudo e Bras Ribeiro da fonseca, ambos do seu Conselho e seus Dezembargadores do Paço. Miguel vieyra a fez em Lixboa aos 15 de julho de 1686. Francisco Pereyra de Castello branco a fez escrever. Bras ribeiro da Fonseca. Diogo Marchão Themudo. Por resolução de Sua Magestade de 10 de junho de 1686 em consulta do dezembargo do Passo. E não continha mais a dita provizão que eu Manoel da Silveyra de Azevedo escrivão da camara fiz tresladar neste tombo e a propia me reporto e por verdade me asiney do meu sinal de que uzo e a propia entreguey ao Corregedor da Comarca. Elvas aos vinte dias do mes de julho de mil seiscentos e outenta e seis annos. Manoel da Silveira de Azevedo, escrivão da Camara, o fis escrever e asinei. Manuel da Silveira de Azevedo.»
75[Tombo ii do Registo dos Alvarás, Provisões, Cartas e mais ordens de Sua Magestade, a fl. 12. Archivo da Camara de Elvas, armario n.° 8].
N.° 23 1686
Decreto, em que se mandou commutar o degredo de África para o Maranhão
76Tenho resoluto que com os Ciganos e Ciganas se pratique a Ley, assi nesta Corte, como nas mais Terras do Reyno; com declaração, que os annos que a mesma Ley lhes impôem para Africa, sejão para o Maranhão; e que os Ministros que assi o não executarem, lhes seja dado em culpa para serem castigados, conforme ao dolo, e omissão, que sobre este particular tiverem; para o que ordenei ao Desembargo do Paço se acrescentasse este Capitulo aos mais do Regimento das Residencias. O Regedor da Casa da Supplicação o tenha assi entendido, e nesta fórma o faça executar pela parte, que lhe toca, encarregando-o aos Ministros de Justiça, e que com todo o cuidado se empreguem nesta diligencia. Lisboa 27 de Agosto de 1686. – Com Rubrica de Sua Magestade.
77[Liv. X do Supplicação, fl. 276, in Ordenações e leys, etc. Lisboa, 1747, vol. iii : Colecção ii dos Decretos e Cartas, p. 273].
N.° 24 1694
Registo de huma Prouizão de Sua Magestade pelo Dezembargo do Paço ao Corregedor desta Comarca para que os siganos nascidos neste Reyno tomem genero de vida ou o despejem dentro em dois meses.
78Dom Pedro por graça de Deus Rey de Portugal e dos Algarues, daquem e dalem mar em Africa, senhor de Guine &. Faço saber a vós Corregedor da Comarca de Elvas, que por quanto sou informado que os siganos nascidos neste Reyno conthinuam em seus excessos e delitos, sem tomarem genero de vida nem officio de que possam sustentarse, vivendo arranchados e juntos em quadrilhas, trazendo os mesmos habittos e trages de ciganos, sem terem domecilio certo, tudo contra a minha rezolução que sobre esta matéria mandey publicar no anno de 1689 (sic), e porque tem mostrado a experiencia que não seruio thegora de remedio bastante e convem muito tratar da quietação e socego de meus vassalos, euitandose todos os dias os delitos que se podem temer de gente tam licencioza na vida e costumes. Hey por bem e vos mando que tanto que esta receberdes mandeis logo por em todas as Villas e lugares dessa Comarca edictais públicos que todos os ciganos nascidos neste Reyno que logo não tomarem genero de vida, de que possam sustentarse na forma da dita minha rezoluçam do anno de 1689. sayam deste Reyno dentro em dois mezes com pena de morte e passado o ditto termo serão hauidos por banidos, e se praticara com elles a pena do banimento na forma da ley. assi e do mesmo modo que tenho rezoluto com os siganos castelhanos que entrarão neste Reyno; e na execução desta deligencia que vos hey por muito recomendada poreis todo o cuidado advertindovos sereis seueramente castigado por qualquer descuido que nisto tiuerdes; e para que os vossos sucessores não possão alegar ignorancia, mandareis registar esta minha rezolução nos Livros da Correição e nos das Cameras de cada hũa das Villas dessa Comarca, de que me dareis conta, remetendo certidão de como assy o tendes executado; e nas terras aonde não entrardes enviareis a coppia desta Ordem ao Provedor dessa Comarca e da mesma sorte aos Juizes de fora e ordinário della para que cada hum em sua jurisdição a execute e a obserue assy como a vós volla encarrego, porque da mesma sorte mandarei proceder contra elles pelo descuido que nisso tiuerem. El Rey Nosso Senhor o mandou por seu especial mandado pelos Doutores Diogo Marchão Themudo e Bras Ribeiro da Fonceca ambos do seu concelho e seus Dezembargadores do Paço. Thomas da Sylva a fes em Lixboa a 15 de Mayo de 1694. Diogo Marchão Themudo. Braz Ribeiro de Affonseca. E não continha mais a dita Prouizão que bem e na verdade tresladey e a propria entreguey ao dito Corregedor e por verdade tresladey e a propria entreguey ao dito Corregedor e por verdade assiney em Elvas aos 17 de junho de 1694. João Bressane Leite escrivão da Camara o escrevi. João Bressane Leite. »
79[Tombo ii do Registo dos Alvarás, etc., fl. 63 v. Archivo da Camara de Elvas, armario n.° 8.]
N.° 25 1694
Registo de huma Prouizão de Sua Magestade pelo Dezembargado do Paço para que o Corregedor desta Comarca faça despejar deste Reino dentro em dois meses os siganos castelhanos intruzos nelle.
80Dom Pedro por graça de Deus Rey de Portugal e dos Algarues, daquem e dalem mar em Africa, Senhor de Guiné &. Faço saber a vós Corregedor da Comarca de Elvas que, por quanto sou informado que pelas rayas deste Reino tem entrado muitos siganos castelhanos, os quais havião cometido muitos e varios crimes, e porque convem evitar o grande prejuízo que de homens tam licenciozos e criminozos se pode seguir aos meus vassalos. Hey por bem e vos mando que tanto que esta receberdes mandeis logo por em todas as Villas e lugares dessa Comarca edictais públicos em que se declare que todos os que tiuerem entrado neste Reino sayão delle em termo de dois mezes, com pena de morte, e passado o dito termo serão havidos e bamnidos e se praticara com elles a pena de bamnimento na forma da ley; e na execução desta deligencia que vos hey por muito recommendada poreis todo o cuidado, advertindovos sereis seueramente castigado por qualquer descuido que nisso tiuerdes; e para que vossos sucessores não possão alegar ignorancia, mandareis registar esta minha rezolução nos livros da correição e nos das camaras de cada hũa das villas dessa comarca, de que me dareis conta, remetendo certidão de como assi o tendeis executado, e nas terras aonde não entrardeis, inviareis a coppia desta ordem ao Provedor dessa comarca e da mesma sorte a todos os Juizes de fora e ordinarios d’ella. E que cada hum em sua jurisdição a execute e observe e assim como a vós vollo encarrego porque do mesmo modo mandarey proceder contra elles pelo descuido que nisto tiuerem. El Rey Nosso Senhor o mandou por seu especial mandado plos Doutores Diogo Marchão Themudo e Bras Ribeiro da Affonceca ambos do seu concelho e seus Dezembargadores do Paço. Thomas da Sylva a fez em Lixboa a 15 de Mayo 694. Francisco Pereira Castello branco a fez escreuer. Diogo Marchão Themudo.=Bras Ribeiro de Affonseca. – E não continha mais a dita Prouizão que eu bem e na verdade tresladey e a própria entreguei ao dito Corregedor em Elvas aos 17 de Junho de 1694. João Bressane Leite escrivão da Camara escrevi. João Bressane Leite.
81[Tombo cit, fl. 61 v].
N.° 26 1696?
Registo da carta do officio de Thezoureiro da Camara por que Sua magestade que Deus guarde fes merce da propriedade delle a Antonio Rois de Pinna.
82Dom Pedro por graça de Deus Rey de Portugal e dos Algarves daquem e dalem mar em Africa snõr de Guine e da conquista & nauegaçam comercio de Ethiopia Arabia Pérsia e da índia &. Faço saber aos que esta minha carta uirem que por parte de Antonio Roiz de Pinna me foy aprezentado hum meu Aluara passado pla minha Chansellaria do theor seguinte & – Eu El Rey faço saber aos que este Aluara uirem que Antonio Roiz de Pinna escriuão serventuario do officio das execuções da cidade de Elvas me representou que eu fui seruido ordenar a Lopo Tavares de Araujo estando seruindo de Corregedor daquella Comarca em Abril de 694 que prendesse a hum cigano chamado Manuel Roiz Roza e hauendolhe por mi recomendado a dita prizão, a qual o dito Corregedor encarregou ao meirinho da correição, e a elle, que hindo ambos a villa de Oliuença, aonde viuia o sigano, lhe entrarão em caza na noite de 26 do dito mes, requerendolhe da minha parte por muitas vezes se desse a prizão, o que não quizera fazer, antes os envestira com estoque de seis palmos e húa rodella, tirando-lhe muitas estocadas e pancadas, com hũa das quais lhe quebrara a espada ao meirinho e ficara brigando com elle somente
83[Não está concluido este registo, que se acha a fl. 80 do Tombo ii do Registo dos Alvarás, Provisões, Cartas e mais ordens de Sua Magestade. – Archivo da Camara de Elvas, armario n.° 8],
N.° 27 1699
84«Provisão Regia de 9 de julho de 1699 para serem remettidos presos ao Limoeiro os Ciganos».
85[J. P. Ribeiro, Indice chronologico, io, 275.]
N.° 28 1708
86Eu ElRei faço saber aos que esta minha Lei virem, que, por ter mostrado a experiencia não haverem sido bastantes as disposições da Ordenação do Reino e outras Leis posteriores, e varias ordens, que em diversos tempos se passárão para os Ciganos não entrarem no Reyno, e se conservarem nas Terras delle, nem para que estes, e outros homens, e mulheres de ruim vida, que se lhes agregão, fação com elles escandalosa vida, os Póvos sentem, e commettão, como frequentemente commettem, furtos, enganos, e outros muitos delictos e enormidades; e mandando considerar esta materia com toda a ponderação, por convir muito á Justiça e bem do Reyno darse lhe remedio: Hey por bem, e mando que não haja neste Reyno pessoa alguma de um, ou de outro sexo, que use de trage, lingua, ou Giringonça de Ciganos, nem de impostura das suas chamadas, buenas dichas : e outro-si, que os chamados Ciganos, ou pessoas, que como taes se tratarem, não morem juntos mais, que até dous casaes em cada rua, nem andaráõ juntos pelas estradas, nem pousaráõ juntos por ellas, ou pelos campos, nem trataráõ em vendas, e compras, ou trocas de bestas, senão que no trage, lingua, e modo de viver usem do costume da outra gente das Terras; e o que contrario fizer; por este mesmo facto, ainda que outro delicto não tenha, incorrerá na pena de açoutes, e será degradado por tempo de dez annos: o qual degredo para os homens será de galés, e para as mulheres, para o Brasil. E para que pontualmente se cumpra esta minha Ley, mando aos Corregedores das Comarcas, e aos Juizes de Fóra, e Ordinários, a executem em suas Jurisdicções, e contra os transgressores procedão a prisão, e a devassa, com a noticia, que dos casos tiverem; a qual devassa bastará ser de até oito testemunhas; e tiradas que forem, se por ellas tanto se provar, que contra os culpados se deve proceder, mandaráõ logo que os Reos summarimente respondão ; e com suas respostas enviaráõ os autos ao Regedor da casa da Supplicação, ainda que seja de Terras do districto da Relação do Porto; e ao dito Regedor mando que com toda a brevidade, com os Desembargadores, que lhe parecer, faça em sua presença deferir, como parecer justiça, ou seja para sentencear definitivamente, ou seja para interlocutorias, e sempre com muita brevidade. Não he porêm minha tenção, que se os ditos homens, ou mulheres tiverem outros delictos de maior pena, deixe de se proceder a execução della ; e nenhum outro tribunal, ou Ministro se intrometterá nesta materia; porque toda a superintendencia della commetto ao dito Regedor, para proceder na forma desta Ley; o qual para este effeito poderá escrever e pedir conta aos Julgadores, e elles lha darão, e todas as informações necessarias, e elle ma dará, quando convenha. etc. Alvará de 10 de novembro de 1708.
87[Ordenações e leys, etc. Lisboa, 1747. iii, 170-171. Collecção chronologica de leis extravagantes. Coimbra, 1819, t. ii, pp. 364-366.]
N.° 29 1718
Decreto, para que se passe ordem aos Governadores das Armas das Fronteiras, para que mandassem prender todos os Ciganos.
88Por convir á boa administração da Justiça exterminar deste Reyno todos os Ciganos pelos furtos, delictos graves, e excessos, que frequentemente commettem; Fui servido ordenar aos Governadores das Armas das Fronteiras, que pelos seus Officiaes os mandassem prender, para serem repartidos por diversas Conquistas; a saber, da índia, Angola, S. Tomé, Ilha do Princepe, Benguella, e Cabo Verde. E porque se me fez presente que em execução desta Ordem se achavão nas cadêas do Limoeiro muitos Ciganos, e Ciganas presos; Hey por bem que o Chancellér da Casa da Supplicação que serve de Regedor ordene se embarquem para as ditas Conquistas os que se acharem presos, na forma, que tenho resoluto. Lisboa Occidental 28 de Fevereiro de 1718.
89Com Rubrica de Sua Magestade.
90[Liv. XII da Supplicalçai, foi. 14, in Ordenações e leys, etc. Lisboa, 1747, vol. iii : Collecção ii dos Decretos e Cartas, p. 273.]
N.° 30 1745
Decreto, em que se mandarão pôr em observancia as Leys da expulsão dos Ciganos.
91Por quanto tem mostrado a experiencia o grande prejuízo, que resulta aos Povos destes Reynos da assistencia dos Ciganos, não tendo produzido o seu devido effeito as Leys promulgadas para a expulsão delles, pelo descuido, que tem havido na sua execução; Sou servido que a Mesa do Desembargo do Paço faça repetir com mayor aperto as ordens necessarias, dando providencia efficaz, para que inviolavelmente se executem as referidas Leys, e não admitta requerimento algum contrario a ellas. A mesma Mesa o tenha assi entendido, e o faça executar: Lisboa 17 de Julho de 1745. Com Rubrica de Sua Magestade.
92[Liv. iii dos Registos do Desembargo do Paço, fl. 131, in Ordenações e leys, etc. Lisboa, 1747, vol. iii : Collecção ii dos Decretos e Cartas, p. 274.]
N.° 31 1751
Copia de huma ordem que manou do Senhor Conde da Atalaja para o juizo da ovidoria e do ditto se enviou para o desta villa e se manda registar.
93«Sendo apresentada a Sua Magestade que esta província se acha infestada de siganos, havendo-se introduzido nella contra as leiis do Reyno e hordens reais expedidas sobre esta materia, e que nos giros que fazem tem cometido vários roubos e escandelosos insultos, foi servido ordenar-me que procurase que fosem presos todos os que se achasem e remetidos ás cadeias das cabeças das comarcas de sorte que em toda estta Provincia se não tornarem a ver hum só indivíduo daquella prejudicial gente, e para que possa ter a devida execusam, o que o ditto Senhor detremina logo que vosa merce reseber estta pasará as ordens nesesarias sem demora alguma aos menistros das terras da sua comarca para [o] que constando-lhes que nos seos destritos se achão alguns siganos sájão logo com os mesmos povos a prendellos, de modo que possa ter effeito huma delegencia tam recommendada por Sua Magestade; e se para segurança delia fôr nesesario que concorrão as tropas pagas, aonde as houver, poderão as justiças requerer aos comandantes dellas o aucilio que nesesitarem que pronptamente se lhes dará tudo o que for preciso, e das ordens que vosa merce expedir aos menistros da sua comarca mandará vosa merce pedir recibos da sua entrega, que me remeterá todos junttos, sem dilasam alguma, para que constando-me que algum delles, depois de as reseber, as não observão com a devida exatidão, o farei presente a Sua Magestade para que o mesmo Senhor possa ter com os transgressores da sua Real ordem a severa demonstraçam que mereserem. Deos Guarde a vosa merce munttos annos. Estremos catorze de Julho de mil settecentos e sincoentta e hum. Conde da Atalaija. Cumpra e pase ordem geral na forma que se ordena. Villa Viçosa quinze de Julho de mil sette centos e sincoentta e hum. Oliveira. E não continha mais em a dita ordem, que bem e fielmente na verdade fis tresladar e tresladei, a qual me reporto, em fé do que me asignei em raso. Villa Boim de agosto outo de mil settecentos e sincoenta e hum annos. Sobreditto o escrevi. Manoel Rodrigues Figueira ».
94[Livro ii do Copiador de alvarás e provisões da Camara (extincta) Municipal de Villa Boim, a fl. 163 v. Archivo da Camara Municipal de Elvas].
N.° 32 1753
Registo de huma carta precatoria de deligencia
95«O Doutor Joaquim Antonio de Azevedo Soares, Cavalleiro professo na ordem de Christo, do Desenbargo de El-Rey nosso Senhor e seu Corregedor com alssada em esta munto nobre e sempre leal sidade de Elvas e sua comarca pello dito Senhor que Deos gvarde, que de presente na mesma sirvo de Provedor & Faço saber ao senhor Doutor Juis de fora desta cidade, ou a quem em sua abzencia ou impedimento seu nobillissimo cargo tiver e servir, em como a mim hora me foy remetida huma ordem pello Tribunal do Dezenbargo do Passo, feyta em nome de El-Rey noso Senhor, que Deus guarde, e asinada pellos Doutores Dezembargadores Joze Pedro Emaus e Antonio Velho da Costa, de cuja ordem o seu theor e forma de verbo ad verbum he o seguinte – Dom Jozé por Graça de Deos Rey de Portugal e dos Alguarves, daquem e dálem mar em Africa, Senhor de Guiné & Fasso saber a vos corregedor da comarca de Elvas que Reprezentando-me os Juizes de fora das Villas de Souzel e Mertola a duvida que tiverão ao cumprimento das ordens que por meu servisso lhe remetera o Sargento mor de Batalha, que gouverna as Armas dessa Provincia, para effeito de tirar devasa exacta contra os siganos e quem os protegese por ser o meio mais conveniente do socego dos Povos e Bem comum, e contra os que extrahirem trigo para o Reino de Castella e lavradores que o vendem aos Castelhanos e Portuguezes que o conduzirem ou em suas cazas o deicharem albergar, dando-se-lhe parte do que resultace desta diligencia para assim mo fazer prezente, e sendo tudo visto na meza do Dezembargo do Passo, em que foi ouvido o procurador da minha Coroa, ele me fez prezente em consulta da mesma meza, fuy servido rezolver e declarar que os ditos Juizes de fora fizerão o que devião em não executar as ordens do que governa as Armas, porque Devasas só por cazos de ley, rezoluções e decretos meos he que devem ser tiradas; quanto a extracção do trigo, tenho dado a providencia necessária, e pello que respeita aos siganos hey por bem e vos mando que, constando-vos por qualquer modo que algumas pessoas do voso destricto, de qualquer qualidade ou condição que sejão, acoutão protegem ou recolhem siganos, os autoeis e prendais debacho da chave na cadeya da Cabesa da Comarca, de que me dareis conta pella meza do mesmo Dezembargo do Paso, tendo entendido que na vosa rezidencia se perguntará se cumpristeis com esta obrigação, ficando assim adisionado este capitulo aos da rezidencia. E esta minha rezolução que mando participar a todos os corregedores ouvidores e provedores deste Reyno e do alguarve fareis tambem participar as justiças subalternas de vosso destricto. Cumprio asim. El-Rey noso Senhor o mandou por seu especial mandado pellos menistros abaixo asinados de seo conselho e seus Dezembargadores do Paço. Francisco Varella de Asis a fez em Lisboa a tres de Novembro de mil setecentos e sincoenta e tres. Antonio Luis Signet de Cordes a fez escrever. José Pedro Emaos. Antonio Velho da Costa. Por rezolução do Dezembargo do Paso, digo por rezolução de Sua Magestade de dois de outubro de mil setecentos e sincoenta e tres e despacho do dezembargo do Paso de doze do dito mez e anno. Por El-Rey noso Senhor ao Corregedor da Comarca de Elvas. E não se contem mais a dita em a dita prouizão por virtude da qual mandey pasar a presente para a vos ella ser dirigida dito Senhor Doutor Juiz de fora desta cidade de Elvas ou a quem em sua auzencia ou impedimento seu nobilisimo cargo tiver e servir a qual sendo-lhe apresentada indo primeiro por mim asinada e selada com sello deste dito meu Juizo (?) que ante mim serve ou com a minha rubrica, de que valha sem sello ex cauza, que tambem em semelhantes uzo e costuma servir, a cumpra e guarde, fasa munto inteiramente cumprir e guardar asim e da maneyra que em ella se conthem e declara, e em seu cumprimento e por virtude della, sabendo Vossa merse que alguma pesoa, de qualquer qualidade que seja, desta dita cidade e seu termo, por algum modo acouta, protege ou recolhe siganos, os actue e prenda logo na cadeya publica desta cidade, executando tudo na forma da Provizão de Sua Magestade, nesta incerta, que vosa merce mandará cumprir tam inteiramente como nella se conthem, e vosa merse me mandará pasar certidam de como esta lhe foi entregue e a cumprio; como tambem mandará dar e pagar o feitio e asynatura e sello desta, que no fim hirá declarado, sendo feita desta despeza á custa dos bens do Conselho desta dita cidade; e de vosa merse asim o cumprir e mandar se cumpra e guarde, fora em tudo a justiça que costuma e he obrigado em razão de seu nobelisimo cargo que ocupa e admenistra, serviso a Sua Magestade que Deus guarde e a mim mersé, o que eu não menos farei por outras suas semelhantes, sendo-me aprezentado da sua parte pedido e deprecado mediante Justiça etc. Dada e pasada em esta dita cidade de Elvas, feita em ella ao primeiro dia do mes de Dezenbro do Anno do Nascimento de Noso Senhor Jezus Christo de mil e setecentos e sincoenta e tres annos etc. Esta vai subescripta por Jozé Bernardes escrivão proprietario do officio da correição em esta cidade de Elvas e sua Comarca etc. Paguarse-ha de feitio desta ao todo contado na forma do Regimento duzentos e setenta reis e de asynar e sello noventa reis. E eu Jozé Bernardes escrivão da Correição o sobescrevy. Joachim Antonio de Azevedo Soares. Ao sello valha sem sello ex causa trinta reis. E eu Jozé Bernardes. Cumprace Elvas sinco de dezembro de mil e setesentos e sincoenta e tres. Falcato. E não se continha mais em a dita precatoria que fiz regystar bem e na verdade e não leva cousa que duvida fasa, em fée do que a fiz escrever subescrevy e asynei de meus sinais costumado. Elvas dois de março de mil e setecentos e sincoenta e quatro annos. E eu João Pereyra Coelho, escrivam das execuções, que hora siruo de escrivam da Camara o subscrevi. João Pereira Coelho ».
96[Tombo iii do Registo da Camara Municipal de Elvas, a fl. 203. – Archivo Municipal.]
N.° 33 1756
Aviso para o Duque Regedor, em que se lhe ordena, que os Siganos, que inquietavão os moradores do Termo desta Cidade, sejão applicados a servirem nas obras publicas da mesma Cidade.
97Il.mo e Ex.mo Sr. Fazendo presente a Sua Magestade o Aviso, que V. Excellencia me dirigio na data de 13 do corrente sobre os Siganos, que inquietão os moradores do Termo desta Cidade: Foy o mesmo Senhor servido mandar declarar a V. Excellencia, que não havendo presentemente navio para Angola, em que possão ser transportados os Siganos, que se condemnarem, sejão applicados a servirem nas obras publicas da Cidade. Deos guarde a V. Excellencia Paço de Belem, a 15 de Mayo de 1756. = Sebastião Joseph de Carvalho e Mello.
98[Memorias das principaes providencias que se derão no terremoto, que padeceu a Corte de Lisboa no anno de 1755. Lisboa, 1758, pag. 106.]
N.° 34 1760
99Eu ElRey faço saber aos que este Alvara de Ley virem que sendome presente que os Siganos, que deste Reino tem sido degradados para o Estado do Brazil vivem tanto á disposição da sua vontade que uzando dos seus prejudiciaes costumes com total infracção das minhas Leis, causão intoleravel incomodo aos moradores, cometendo continuados furtos de cavalos, e Escravos, e fasendo-se formidaveis por andarem sempre encorporados, e carregados de armas de fogo pellas estradas, onde com declarada violencia praticão mais a seo salvo os seus perniciozissimos procedimentos; considerando que asim para socego publico, como para correcção de gente tão inutil e mal educada se faz preciso obriga-los pellos termos mais fortes e eficazes a tomar a vida civil: sou servido ordenar que os rapazes de pequena idade filhos dos ditos siganos se entreguem judicialmente a Mestres, que lhes ensinem os officios e artes mecanicas, aos adultos se lhes assente praça de soldados, e por algum tempo se repartão pellos Prezidios, de sorte que nunca estejão muitos juntos em hum mesmo Prezidio, ou se fação trabalhar nas obras publicas pagando-lhes o seo justo salario ; prohibindo-se a todos poderem comerciar em bestas e Escravos e andarem em ranchos: Que não vivão em bairros separados, nem todos juntos, e lhes não seja permittido trazerem armas, não só as que pellas minhas Leis são prohibidas, que de nenhuma maneira se lhes consentirão, nem ainda nas viagens, mas tãobem aquellas, que lhes poderião servir de adorno: E que as mulheres vivão recolhidas e se ocupem naquelles mesmos exercícios de que uzão as do Pais; e Hey por bem que pella mais leve transgressão do que neste Alvara Ordeno, o que for comprehendido nella seja degradado por toda a vida para a Ilha de S. Tomé, ou do Princepe sem mais ordem e figura de juizo, nem per meyo de Apellação, ou Aggravo do que o conhecimento sumario que resultar do juramento de tres testemunhas, que deponhão perante quaesquer dos Ministros criminaes respectivos aos destrictos, onde fizerem a transgressão, e provada quanto baste se execute logo a sentença do extermínio, sem que della possa ter mais recurso. Pelo que Mando ao Presidente e Concelheiros do meo Concelho Ultramarino, ao Vice-Rey e Cappitão General de mar e terra do Estado do Brazil, e a todos os Governadores, e Cappitães mores delle, aos Governadores das Rellações da Bahia e Rio de Janeiro, Dezembargadores dellas, e a todos os Ouvidores e mais Ministros, e Officiaes de Justiça do dito Estado executem e fação observar sem duvida este meo Alvara, como nelle se contem, o qual se publicará, e registará na minha Chancelaria mor do Reino, e para que venha á noticia de todos, e se não possa alegar ignorancia será tãobem publicado nas Cappitanias do Estado do Brazil, e em cada huma das suas Camaras e se registará nas ditas Rellações, e nas mais partes, onde semelhantes se costumão registar, lançando-se este proprio na Torre do Tombo. Lisboa vinte de Setembro de mil, setecentos e secenta. Rey . .. etc.
100[Registado a fol. 351 do L.° X do Registo do Real Archivo. – Antonio Delgado da Silva, Collecção da legislação portugueza, 1750-1762, pp. 749- -750.]]
N.° 35 1761
101Provisão de 8 de Fevereiro, relativa á lei de 20 de Setembro de 1760, a qual nada accrescenta de interesse.
102[Antonio Delgado da Silva, Supplemento á Collecção de legislação portugueza, 1750-1762, p. 786.]
N.° 36 1800
Rezisto de huma ordem do Entendente Garal (sic) da Policia da Corte e Reino para o Doutor Corregedor desta Comarqua a qual Remeteo ao Doutor Juis de Fora desta Cidade na forma seguinte.
103Vou munto Seriamente Recomendar a Vossa merce que espeça as ordens mais precizas a todos os magistrados da sua respectiva Comarca asim de vara Branca como ordinarios avivandos da exzecução da Lei de vinte e cinco de junho de mil e setesentos secenta e com particolaridade o paragrafo doze dela e a de vinte e sinco de Dezembro de mil e seissentos e oito que fas parte da mesma Lei e a de quinze de janeiro de mil setesentos e oitenta; pois os Repetidos fatos dos trangresores das edicadas Leis teem feito ver que os soberditos magistrados não cumprem o que nelas lhes he ordenado o que obrigou ao Genaral Dom Simmão Trazer a Reprezentar ao Princepe Nosso Senhor a grande dezerção das Tropas auseliares que estão debaxo do seo comando neste Reino, que os masgestrados não cumprem as Leis e os dexão tranzitar para a Espanha, e neste Reino teem entrado outros muntos estrangeiros sem se legetimarem como ordenão as soberditas Leis que se citoaram; sempre foi nesceçariio huma grande circonspeção a vegilancia de tão emportantes obgetos, mas munto mais, esincialmente em huma congetura que ofresem as critiquas sirconstancias e que são bem manifestas não se contentando Vossa merce em recomendar a exzecução destas deligencias aos soberditos magistrados mas vegiando se cumprem estes as çuas obrigacoins e asim continuar Vossa merce, emquanto estiver regendo essa correição, e Igualmente na conformidade da ordenação do Livro quinto Titolo secenta e nove e dos decretos e Alvaras que vão nas coleçoins numaro primeiro e segundo ao dito Titolo e desesete de janeiro de mil e seissentos e seis e de treze de setembro de mil seiscentos e treze de vinte e quatro de outubro de mil seiscentos e quarenta e sete do decreto de vinte e oito de Fevereiro de mil e setecentos e dezoito prendão todos os siganos de um e outro seço que vivão sem domecilio e andem vagos no Reino, e os filhos destes de que falo de um e outro sesso remetermos vossa merce con toda a caridade e comedamente não lhes faltando ao nesceçario alimento conduzindos em carros e cavalgaduras aos portos do Mar mais prochimos para delles virem para a Rial Caza pia desta Corte e nela serem instruídos na Moral Christã e nas obrigaçoins suciais e aprenderem as Artes e manefacturas e aqueles que pelos seos talentos se recomendarem as mesmas siencias pedindo Vossa merce ao Ilustrissimo Ex.mo Governador das Armas dessa Província que o ausseli na prizão dos referidos siganos que por ela andarem vagando e nesta regra entrarão alguns engeitados e filhos famílias que andão fugidos girando de terra em terra sem se asoldadarem nem procorarem em que se ocopar vivendo de furtos que fazem e da mendacidade a que o ósio os condus em que depois ficão servindo de grave pezo ao estado consta finalmente nesta entendencia que muitos dos Ladroins que de novo teem aparesido são, huma especia de contrabandistas que andão vendendo pelas cazas e mascarandose e por este modo não só exzeminão as entradas e saidas delas mas tambem costumão ganhar alguns dos domesticos que sara mais a seo salvo porpetrarem os robos e furtos que intentão fazer, pois que digo os que tiverem põis nestas sirconstancias devem ser logo prezos e apreendidas tambem as fazendas que se lhe encontrarem sejam o não de contrabando e as aloará formando-lhes os seos porseços vendendo-lhes, se as fazendas forem de Lei o como contrabandistas se elas forem de contrabando e nestes casos: Lembro a Vossa merce o capitolo vinte sete da prematica de mil e setesentos e quarenta e nove como tambem a Lei de quatorze de Novembro de mil e sete sentos e sincoenta e sete mas previno a Vossa merce que deve esetoar desta regra as fazendas que vão endiretura para espanha pois o que acabo de ordenar entendese a respeito das fazendas que se andão vendendo pelo entrior do Reino estas delegencias deverá Vossa merce ter sempre em vista e não só contentarsse em dar as çuas ordens mas vegiar cuidadosamente nas ezecuçoins delas como já referi a Vossa merce, e munto particolarmente estando Vossa merce adetrito como meo comiçario a comprir e fazer exzecutar o que ordeno e tambem para de futuro recomendo a Vossa merce que leia huma e muntas vezes o seo Regimento de Corregedores que litaralmente deve observar em toda a sua Comarqua e que deve praticar como Corregedor e Prezidente dela o munto principalmente sobre as plantaçoins e rezalvas dos chaparros enxertos dos zambogeiros e abreturas de algumas terras próprias para as semanteiras dos pains de toda a especia segundo a qualidade do terreno e pedir e lembro a exzecução dos officios que deregi a esse lugar nas datas de vinte sete de Maio e de treze de Julho de mil e sete sentos e oitenta exzecutando o que dis respeito a este officio nas terras de donatarios adonde não entrar a correição para nas mesmas terras fazer Vossa merce observar o que neste lhes ordeno e o que ultimamente ordenei no officio que deregi a essa Provedoria em sinco do presente mês relativo aos engeitados nas correiçoins que fizer proguntara Vossa merce se tem litaralmente exzicutado o ordenado no dito officio para Vossa merce me dar conta da sua observancia e se hover alguma omição, da parte dos exzecutores, espero da atividade e luzes de Vossa merce cumpra e faça exzecutar o que tenho ordenado nos respectivos officios que estes fins tenho espedido a esse Lugar e avivar egualmente a exzecução das indicadas Leis para que de foturo os seçores desse Lugar asim o cumprão enteiramente e fação exzecutar. Vossa merce fará rezistar o presente officio nos Livros dessa Correição, remetendo-me certidão de asim se ter exzecutado. Deos Guarde a Vossa merce. Lisboa doze de Julho de mil oito sentos. Diogo Ignacio de Pina Manique. E não continha mais no dito inserto em huma depercada que veio do Juizo da Correição, para o Doutor Juis de Fora a quem entreguei e a mesma me reporto e eu Antonio Joaquim Pereira escrivão da camara a fiz escrever. – Antonio Joaquim Pereira.»
104[Livro VI do Tombo do Registo da Camara Municipal de Elvas, a fl. 85 v.]
N.° 37 1848
105«Deve cuidadosamente exigir-se passaporte aos bandos de ciganos que transitarem pelo reino, afim de se exercer contra os que o não trouxerem a correcção e repressão ordenadas na Lei de 20 de setembro de 1760. Portaria circular 18 abril 1848. Ined. (Codigo administrativo, 18 Março 1842, e de 1854, p. 181.) »
106[Henrique da Gama Barros, Repertorio administrativo. Lisboa, 1860, Tomo i, 151.]
N.° 38 1761
Miguel Leitão d’Andrada sobre os ciganos1
107Crisp. Razão tiuerão esses senhores, e os muytos que dizeis aqui se acharão nestas festas, porque forão ellas muito pera se ver. Porem ainda me parece vos ficou por contar, hũa dança de Ciganas que eu encontrei no caminho.
108Gal. Outras cousas fora dessa, deixei eu por serem miudas, como hũa fonte de vinho, que o senhor deuoto mandou por a nossa porta, que de cima corria em hũa bacia por hũa pena, onde estaua hũa taça de prata com guarda, e bebião quantos querião. E quanto ás ciganas não as quis acceitar nesta festa o senhor deuoto antes as despedio, e elle dirá o porque.
109Devot. Tenho tamanho aborrecimento a essa gente, que nem esmolla à porta quero se lhes dê, por os ter por indinos della.
110Crisp. Disso me marauilho eu muito, porque a esmola dada por amor de Deos ainda que seja a indino não deixarà de ter o seu merecimento, por donde se deue dar a todo o necessitado, ou que mostrar selo. E ainda que o não seja basta ser por amor de Deos.
111Devot. Bem sei que a esmola conforme nella foy o intento, e charidade terá o seu merecimento. E quem a pudesse dar a todos por amor de Deos faria bem, quando isso não fosse occasião de pecar ou de não deixar o peccado, que o sol a todos allumia, porem quem não pode se não limitadamente, parece a deue antes de dar ao dino, que ao indigno, quais são quasi todos estes Ciganos, ladrões, salteadores, matadores, sem ley, nem temor della, e ellas ladras, feitiçeiras inquietadoras da honestidade das molheres, e fazendoas mal parir. Embaidoras que por dois vintẽis, ou dois pãis, não duuidarão trazer á vossa escraua, ou criada a peçonha, e o mesmo solimão pera matar seus senhores, e enganar a simplez donzella cõ nome de mesinha pera o outro casar com ella. E ainda à casada a titulo de o marido lhe querer bem, lhe dão com que os coitados vão ao outro mundo fazer experiencia da mesinha, ou ficão pera nunca mais prestar. Então a descarga disto he, que digão que o marido era hum amancebado, e andaua toda a noite, e que disso morreo assi mal.
112E sabe Deos, e suas próprias mulheres, o como, e aozadas, a quantos isto cada dia acontece. E seja verdade que todos somos pecadores, estes o são por officio, e por carta, e delle se mantém. E os que introduzirão em Portugal mil feitiçarias, e males que nelle não se sabião. Por onde eu aconcelharia a todo o homẽ que euitasse o fallar qualquer cousa sua com esta gente, nem ainda zombando ou com achaque de bona dicha, muito mais cautelosamente, e com quais rigor que com hum ferido de peste, e falo de sciencia certa. E he de notar, que se hum nosso Portugues vai ser morador em outro Reyno, em poucos annos logo falla a lingoa desse Reyno, e seus filhos ja nella e em tudo o mais como naturais mesmos da terra. E esta gente com auer tantos centos de annos que Espanha os agasalhou, que quasi elles mesmos não sabem de que nação ou Reyno procedem porque sendo Gregos que se vierão fugindo dos Turcos, se fazem Egipcios, ou Gitanos. E pello contrario, e sendo Chaldeos, como diz Iacobo Philipo Bergamate no seu livro, Supplementum chronicarum que de certos pouos chamados Zigaros, se sahirão a encher toda Europa porem que nenhures os consentem mais de tres dias, pola sutileza de seus furtos, e que por essa causa os Venezeanos, e os terem por sospeitos os lançarão de todas suas terras, e que nũca deixarão a sua lingua Chaldea, que deue ser a que lhe ouimos falar, e parece são estes de Portugal. Os quais de Zigaros se chamão ciganos, que he o mesmo. E o não perderem nunca a sua lingua não foy por certo, pera nella se lerem e vsarem de liuros Catholicos, ou de sciencias e artes que troxessem boas, senão pera milhor inteligência de suas malas artes, latrocinios, e embelecos, ou enganos, porque vzando tudo isto como vzão por officio os não possamos entender. E nós tão cegos, e descuidados, que ninguem attenta nisto, falo dos que gouernão, que o puderão remediar, e vendoo, e palpandoo cada dia e cada hora a nossas portas, e dentro de nossas próprias casas: passão por isso. E não sei como os conselheiros dos Reys, e os que gouernão as Republicas desuelando-se tanto em novas prematicas sobre ninharias, não buscão remedio a cousa tao importante como fora não estar Portugal e Espanha toda criando em suas entranhas, estas lombrigas ou digo Biboras que o estão roendo de continuo por todas as partes de seu todo. Agasalhãdoos Portugal vindo perseguidos dos Turcos vzão tão mal desse gasalhado, e beneficio.
113E pudera isso ter muyto bom remedio, embarcandoos diuididos pera o Brazil e Angola e outras nossas conquistas, e agora pera a noua pouoação do Maranhão poucos a poucos em cada nauio que fosse, e se hirião acabando de sair do Reyno, ou delles estes maos costumes, e quando isso não parecesse, fazendoos viuer dentro no meyo das cidades repartidos pello Reyno, vedandolhes o vzo do trajo, e da lingoagem, e o sair fora das Cidades e villas. O que he muito importante, e mais essencial, e obrigandoos a officios com tenda sua, ou obreiros nas alheas. E que não fossem ferreiros, que só vzão a fim de fazer gazuas, e instrumentos de roubar. E a ellas o mesmo a officios, ou vnder em tendas, ou pollas ruas e outros exercícios, com o que ou outros remedios se lhes atalhasse o furtar, e outros malefícios. E o pedir esmola que aos pobres se deue necessitados (que ha muitos nossos naturais) e não a elles que podem bem com trabalhar remediar sua vida. Pois a verdadeira charidade deue começar por nós mesmos, e pelos mais chegados nossos.
114Crisp. Nem por isso deixaria de auer outros ciganos, como ha naturais que por se darem a boa vida se lanção a pedir.
115Deuot. Tambem esse he hum grande descuido dos que gouernão não atalharem a essa desordem com algum remedio.
116Crisp. Não deue de o ter pois que tee gora se lhe não deu.
117Deuot. Não he essa boa consequẽcia que cada dia vemos darse, e acharse remedio a cousas que a nossos mayores não passou por pensamento. Quanto mais que leys ouue, e ordenações excelentes sobre isso, que ja não se praticão nem se goardão. E puderão as Republicas ou os Reys criar Magistrado, ou tribunal só pera isso, dandolhe leys, e regimento. Pondo se os coxos a officios que não hão mister pernas, como çapateiros, alfayates, ouriues, e outros, e os cegos nas casas dos ferreiros, tanger os folies, rodas de esparteiros, Cordoeiros, cirgueiros, lapidarios, e outras rodas, e na ribeira das naos a puxar por cordas, e o mais que aly ha. E os aleijados de mãos, conforme o aleijão, porteiros de concelhos, e em portas de fidalgos, pastores, egoarizos e caminheiros. Aplicando a todos o exercício, e trabalho de que se manter conforme sua sufficiencia, tirandoos das tauernas que destes de continuo estão cheas, obrigando alternadamente aos officiaes siruirense delles, e pagarlhes ou mantelos (como dizem o fazem na China, e mandando vir de lá essas leys que dizem são excelentíssimas em muitas cousas) que as leys em todas as idades se buscarão e passarão de huns Reynos a outros pera tomar dellas o mais conueniente). E goardandose cõ rigor não se cortarião muitos os braços a si mesmos cõ a cobiça de pedir, e nem cegarião muitos pays os filhos minimos acinte pelos lançar a pedir (como se diz por cousa certa o fazem em certos lugares) nem se farião outros a si mesmos outros aleijões, e chagas com este intento. Nem andarião tantas mulheres pera sustentarem o mao estado em que viuem, de dia, e de noite pedindo e lamentando-se com hũa voz muito lastimosa, e toada muito prolongada, como tudo, e outros mil excessos cada dia vemos. E passão com toda a liberdade, e a seu aluedrio de cada hum.
118E da mesma maneira se puderão poer as mulheres a officios e exercícios conuenientes, e acõmodandoas por casas a seruir onde estiuessem recolhidas, que he vergonha ver isto, e ellas logo se darem a esta vida calaceira de pedir com seus capelos, e bordão, sem auer quem acuda a esta calaçaria, se quer por rezão de estado.
119E desta ou de outras maneiras mandandose o primeiro com todo o rigor que ninguem pudesse pedir sem expressa licença do tal tribunal ou magistrado. E com trazer essa tal licença ao colo escrita em taboas, e com letras muyto grossas e de forma. Não aueria tantas desordens, e peccados mortais como ha nem tantos males, e aueria bastante esmola pera quem direitamẽte pertence e não padecerião os necessitados nobres, e enuergonhados tantas necessidades. E muytas vezes extremas, por estes velhacos lha vsurparem, e tyranizarem e nas Igrejas mais quietaçào pera as pessoas se poderem encomendar a Deos, vedandolhes o pedir dentro e o dar a esmolla dentro, pois basta pediremna à porta.
120Crisp. Deixemos os pobres Ciganos, e yr as cousas por onde vão, que nos não auemos de gouernar, nem emmendar o mundo. E pois o senhor Galacio me fes merce festejarme tanto esta tarde, e vos de me aueres de dar algumas, juntemonos aqui à manham, donde poderemos yr dar quatro passeyos por recreação refrescandonos por essas fontes, e sombras.
121Deuot. Assim seja, e a Deos.
Notes de bas de page
1 Trecho da descripção dumas festas na villa de Pedrogão grande (Beira-Baixa) na obra de Miguel Leitão d’Andrada, Miscellanea do sitio de Nossa Senhora da Luz do Pedrogão grande, etc. Lisboa, 1629. (O prologo foi escrito em 1622.) Dial, XII, pg. 335-340.
Le texte seul est utilisable sous licence Licence OpenEdition Books. Les autres éléments (illustrations, fichiers annexes importés) sont « Tous droits réservés », sauf mention contraire.
Proprietários, lavradores e jornaleiras
Desigualdade social numa aldeia transmontana, 1870-1978
Brian Juan O'Neill Luís Neto (trad.)
2022
O trágico e o contraste
O Fado no bairro de Alfama
António Firmino da Costa et Maria das Dores Guerreiro
1984
O sangue e a rua
Elementos para uma antropologia da violência em Portugal (1926-1946)
João Fatela
1989
Lugares de aqui
Actas do seminário «Terrenos portugueses»
Joaquim Pais de Brito et Brian Juan O'Neill (dir.)
1991
Homens que partem, mulheres que esperam
Consequências da emigração numa freguesia minhota
Caroline B. Brettell Ana Mafalda Tello (trad.)
1991
O Estado Novo e os seus vadios
Contribuições para o estudo das identidades marginais e a sua repressão
Susana Pereira Bastos
1997
Famílias no campo
Passado e presente em duas freguesias do Baixo Minho
Karin Wall Magda Bigotte de Figueiredo (trad.)
1998
Conflitos e água de rega
Ensaio sobre a organização social no Vale de Melgaço
Fabienne Wateau Ana Maria Novais (trad.)
2000