Capítulo 2. A Sombra Esquiva dos Lusitanos: Exercícios de Etnogenealogia
p. 63-82
Texte intégral
1Num artigo depois parcialmente retomado em After Tylor, George Stocking (1992, 1994) abordou o tema dos livros que na história da antropologia não foram escritos. Os exemplos que dá são dois: Tylor e a edição revista de Primitive Culture, obra inicialmente editada em 1971 e considerada um dos clássicos da antropologia evolucionista e Malinowski e a monografia sobre o parentesco trobriandês. Em ambos os casos, apesar dos autores terem anunciado publicamente ser seu objectivo publicar essas obras, elas nunca chegaram a ser editadas. Em ambos os casos, também, Stocking mostra como esses não-acontecimentos permitem sublinhar aspectos importantes do desenvolvimento histórico da antropologia: a crise do paradigma evolucionista na viragem do século, no caso de Tylor, a marginalidade de Malinowski no novo curso que os estudos sobre família e parentesco ganharam na antropologia britânica a partir de Radcliffe-Brown. A conclusão implícita do artigo de Stocking é a de que se aprende tanto com o que realmente aconteceu como com aquilo que não chegou a acontecer, aprendese tanto com a história dos êxitos como com a história dos insucessos.
2Exemplos de tipo similar aos fornecidos por Stocking poderiam ser dados para a história da antropologia em Portugal. É o caso dos trabalhos de Consiglieri Pedroso sobre botânica e medicina popular que, embora formalmente anunciados pelo autor (Pedroso 1988b: 114 e 256 [1879/80: 331; 1882: 219]), nunca chegaram a ver a luz do dia. É também o caso da Etnografia Portuguesa de Leite de Vasconcelos (1933, 1936, 1942), obra prematuramente interrompida pela morte do autor ao fim do terceiro de um conjunto previsível de dez a doze volumes. É ainda o caso da anunciada e nunca concretizada monografia de Jorge Dias sobre Castro Laboreiro, que deveria completar o ciclo de monografias sobre comunidades de montanha do norte de Portugal de que fazem parte Vilarinho da Furna (Dias 1948a) e Rio de Onor (Dias 1953a) Em qualquer dos casos, o que nunca chegou a acontecer dá-nos indicações úteis sobre algumas linhas de força, constrangimentos ou características principais de um determinado campo disciplinar.
3É na mesma linha que podemos encarar o «dossier» a que este capítulo é consagrado-o «dossier» dos lusitanos. Não tanto que sobre ele não tenham sido escritos ensaios ou livros. Como veremos, até foram escritos vários. O fascínio pelas teses lusitanistas na antropologia portuguesa é de facto indesmentível. Mas o que avulta nesse «dossier» é o modo como esse fascínio acaba por ser contrariado por promessas não cumpridas, por projectos de livros inacabados e/ou abandonados, por silêncios, dificuldades e viragens que gradualmente o vão transformando num enredo titubeante e incompleto, talvez mesmo falhado.
4Isto é: à semelhança dos livros não escritos por Tylor ou Malinowski referidos por Stocking, o «dossier» lusitano configura-se também como uma história de insucesso.
EXUMAÇÃO E TRIUNFO DOS LUSITANOS
5Entretanto, à partida – como em muitas outras histórias de insucesso – pareciam estar reunidas as condições para que as coisas se tivessem passado doutro modo.
6De facto, afirmando-se como uma «antropologia de construção da nação», a antropologia portuguesa ao longo do período que medeia entre 1870 e 1970 configura-se – como vimos no capítulo anterior – como uma antropologia fortemente comprometida com a construção de um discurso de características etnogenealógicas (Smith 1991) sobre Portugal. Como em muitos outros países europeus, a antropologia portuguesa deu-se de facto como objectivo recorrente a fundamentação da nação como uma «comunidade étnica de descendência», baseada em antecedentes étnicos providos dos argumentos da antiguidade e da originalidade, isto é, apoiada numa «etnogenia» peculiar e remota, de que a cultura popular seria exactamente o testemunho. Descontemporaneizada (Fabian 1983) pelo olhar do etnólogo, a cultura popular era vista como um dos terrenos por excelência a partir dos quais era possível enraizar a existência da nação na longa duração da tradição e da etnicidade. A importância sucessiva que tiveram na antropologia portuguesa paradigmas historicistas de interpretação da cultura popular – desde correntes difusionistas pré-evolucionistas como o difusionismo de Benfey ou o turanianismo, até à mitologia comparada e ao difusionismo propriamente dito – deve ser interpretada justamente a esta luz. Em qualquer dos casos, o que está em causa é o potencial analítico que essas correntes ofereciam para os exercícios etnogenealógicos inscritos no projecto nacionalista da antropologia portuguesa. Viajando espacialmente no país e nas suas tradições, o etnólogo procedia a uma autêntica e gratificante viagem no tempo étnico da nação.
7Nesse seu comprometimento com um projecto de tipo etnogenealógico, a antropologia portuguesa – em segundo lugar – não depende exclusivamente de si, mas está, pelo contrário, estreitamente vinculada às teses e conclusões obtidas no âmbito de outros campos disciplinares, como a história ou a arqueologia. Os seus vínculos com a arqueologia são, em especial, particularmente fortes1. O pano de fundo que possibilita o diálogo entre os dois campos disciplinares é fornecido pela sua comum preocupação com os antecedentes étnicos precisos de uma população nacional determinada2. No quadro deste objectivo comum, estabelece-se entretanto uma divisão de trabalho entre ambas as disciplinas que tem a ver, em primeiro lugar, com as fontes utilizadas. Enquanto que a arqueologia estuda os antecedentes étnicos da nação a partir dos vestígios materiais da pré-história – eventualmente combinados com a interpretação dos testemunhos da literatura antiga sobre os povos «primitivos» da Europa-, a etnografia fá-lo pelo seu lado a partir dos hábitos e costumes dos camponeses encarados como sobrevivências conjecturais desse fundo étnico ancestral. Essa divisão de trabalho estende-se depois aos objectivos que cada disciplina prossegue. A arqueologia tem de certa maneira a seu cargo o estabelecimento de uma espécie de lista dos antepassados étnicos da nação. A antropologia, pelo seu lado, deve proceder, a partir dessa listagem, à demonstração, com base na cultura popular, das relações de continuidade entre esses antepassados e a nação na sua dimensão actual.
8É justamente neste quadro que a história do «dossier» lusitano parece reunir, desde muito cedo, condições para se tornar numa história de sucesso. De facto, a partir de final dos anos 1870, os lusitanos transformam-se gradualmente num dos horizontes a partir do qual podia ser pensada a etnogenealogia de Portugal3. Martins Sarmento – uma das figuras centrais da arqueologia oitocentista em Portugal – desempenha a esse respeito um papel central. Com recurso à leitura de fontes antigas sobre a Península Ibérica e com base na interpretação de um certo número de achados arqueológicos – com destaque para os castros e para as antas e dólmenes do norte e centro de Portugal – Martins Sarmento procede de facto a um trabalho de verdadeira exumação dos lusitanos como antepassados étnicos de Portugal.
9Essa exumação dos lusitanos fez-se inicialmente – entre 1876 e 1879 (Sarmento 1933a, 1933b, 1933c) – à luz de teses de contornos celticizantes, então relativamente em voga na Europa4. A partir de 1880, os lusitanos passam entretanto a ser vistos – como provável resultado do impacto das teses indo-europeístas da mitologia comparada – como os representantes de uma primeira vaga de migrações de povos indo-europeus para o ocidente, entre os quais se encontrariam os ligures, de que os lusitanos seriam de alguma forma os representantes mais ocidentais (Sarmento 1933d, 1933e, 1933f). Em qualquer dos casos – celtas ou pré-celtas indo-europeus – os lusitanos seriam os antepassados por excelência de Portugal.
10Propostas inicialmente por Martins Sarmento, as teses lusitanistas tenderão a ganhar, à medida que nos aproximamos dos anos 1890, um certo consenso, que se manterá até relativamente tarde. Por detrás desse consenso encontra-se antes do mais a natureza particularmente eficaz da narrativa etnogenealógica para Portugal que podia ser construída a partir delas. Por seu intermédio ganhava corpo – em primeiro lugar – uma etnogenealogia provida dos argumentos da originalidade e da antiguidade. De facto, por um lado, embora inseridos em correntes migratórias mais vastas, os lusitanos testemunhavam de qualquer maneira de uma tendência precoce para a individualização. Por outro lado, a sua origem remontava àqueles que eram – nas teses celticistas e indo-europeístas – os tempos mais remotos de uma pré-história europeia etnicamente identificável. Em segundo lugar, a etnogenealogia para a nação construída em torno dos lusitanos, baseando-se na identificação clara de uma só população como responsável principal pela formação étnica de Portugal, permitia uma nacionalização retrospectiva dos antecedentes étnicos muito mais eficaz e apoiada no modelo que, no mesmo período, triunfava noutros países europeus. Tal como os alemães descenderiam dos germanos (Bausinger 1993), os franceses dos gauleses (Pomian 1992) e os gregos modernos dos antigos helénicos (Herzfeld 1986), os portugueses descenderiam dos lusitanos
11Recebendo a sua força destes argumentos implícitos, o consenso que se estabelece em Portugal em torno das teses lusitanistas a partir de 1890 é particularmente evidente, em primeiro lugar, na arqueologia, onde duas figuras centrais desempenharão a esse respeito – como teremos ocasião de ver – um papel de grande importância: Leite de Vasconcelos e Mendes Correia. Em segundo lugar, esse consenso parece também ganhar a história, onde as teses voluntaristas de Alexandre Herculano parecem adequar-se mal, à medida que nos encaminhamos para a viragem do século, ao clima de nacionalismo cultural reinante (Ramos 1994). E instala-se, em terceiro lugar, de uma forma mais geral na vida cultural portuguesa. Assim o testemunham, por exemplo, as inúmeras revistas culturais portuguesas que contêm no seu nome uma referência aos lusitanos: desde a Revista Lusitana de Leite de Vasconcelos– à qual de resto regressaremos no decurso deste capítulo – à Lusa de Cláudio Basto, passando pela Lusitânia de Carolina Michaelis de Vasconcelos (1851-1925)5. É também a essa luz que podemos olhar para as teses de Joaquim de Vasconcelos acerca das raízes pré-históricas tanto da arte popular portuguesa como do estilo românico (Vasconcelos 1908, 1909). É ainda nesse contexto – como teremos também ocasião de verificar no capítulo 4 – que nasce também, com um obscuro tenente coronel que tinha tomado a seu cargo a reconstituição da «cava de Viriato» em Viseu, o debate em torno da casa portuguesa. Na sua aparente disparidade, estes exemplos confirmam a importância das teses lusitanistas em vários horizontes da vida cultural portuguesa.
RESISTÊNCIAS INICIAIS
12Marcadas pelo crescendo de influência que acabámos de pôr em evidência, as teses lusitanistas esboçam desde a sua formulação inicial por Martins Sarmento um horizonte de trabalho possível para a antropologia portuguesa e para as suas tentativas de interpretação etnogenealógica da cultura popular portuguesa.
13Martins Sarmento tinha sido, de resto, o primeiro a sugeri-lo. Segundo o autor, de facto, a cultura popular seria um dos melhores testemunhos dessa continuidade fundamental entre os lusitanos e Portugal. Utilizando como método principal para a localização dos «monumentos» arqueológicos dos lusitanos, as tradições populares relativas a mouros e mouras, Martins Sarmento encarava estas como uma espécie de memória popular – obliterada pela cristianização – dos antecedentes lusitanos de Portugal. A sugestão de que o culto lusitano das fontes se reflectiria num certo número de tradições populares relativas à água, e, sobretudo, a ideia de acordo com a qual não existiria solução de continuidade entre os cultos religiosos dos lusitanos e uma parte importante do panteão católico popular português – que não seria senão o resultado da cristianização de cultos pagãos – faziam parte desse mesmo padrão interpretativo, que tendia a ver os lusitanos como uma força ainda actuante na paisagem cultural do país.
14Entretanto, apesar destas suas sugestões, as teses de Martins Sarmento terão inicialmente um eco limitado no interior da antropologia portuguesa. De facto, esta, nos anos 70/80 do século xix, preferirá outras opções para os seus exercícios etnogenealógicos.
15Entre essas opções avulta desde logo a mitologia comparada, cuja influência – como ficou sugerido no capítulo anterior – é particularmente nítida em Consiglieri Pedroso, Adolfo Coelho e Leite de Vasconcelos, reencontrandose também, embora de forma mais diluída, nalguns textos de Teófilo Braga. Por intermédio da mitologia comparada, vemos afirmar-se, na antropologia portuguesa dos anos 1870 e 1880, uma leitura etnogenealógica da cultura popular portuguesa que sublinha as suas raízes genericamente indo-europeias. Essa leitura assenta em dois dispositivos principais. Por um lado, na afirmação, por via comparativa, dos vínculos indo-europeus de tal ou tal aspecto da cultura popular portuguesa. Por outro lado, na reivindicação da originalidade e da superioridade relativa da tradição portuguesa por referência à tradição indo-europeia6. Embora esta afirmação do quadro indo-europeu como quadro principal de referência não fosse em princípio incompatível com uma referência mais particularizada aos lusitanos, esse passo não é entretanto dado.
16Simultaneamente à mitologia comparada, uma outra linha presente na antropologia portuguesa dos anos 1870 e 1880 é o eclectismo etnogenealógico. Esta segunda linha de trabalho é, como vimos, particularmente bem representada por Teófilo Braga. Embora a sua obra comece por se situar sob o signo das teses celticistas (1867a, 1867b) e moçárabes (1871), a partir de 1883 ela estabiliza-se em torno de um modelo tripartido de análise da etnogenia da cultura popular portuguesa, em que é posta em evidência o contributo de três camadas étnicas sucessivas na formação de Portugal tal como esta poderia ser lida a partir da cultura popular. Os ocupantes dessas camadas são entretanto variáveis. Assim, no prefácio aos Contos Tradicionais Portugueses (1987 [1883]), são identificados os turanianos, os indo-europeus e a civilização cristã e ocidental. Em O Povo Português nos seus Costumes, Crenças e Tradições (1985 [1885]), Braga começa por referir de novo a importância de um primeiro fundo pré-árico, de características turanianas. Seria a esse fundo que se teriam sobreposto as migrações celtas – primeiro, com os ligures e depois com os celtas propriamente ditos – dando origem aos celtiberos. Uma terceira influência decisiva na formação etnogenealógica de Portugal seria por fim constituída pelos moçárabes, resultantes da fusão dos germanos com os árabes7.
17Em qualquer dos casos – apesar do seu eclectismo etnogenealógico e da sua versatilidade – Braga mostra-se indiferente às teses lusitanistas. Estas apenas surgirão muito mais tarde na sua obra, na introdução à 3.a edição da História da Poesia Popular Portuguesa (1902). Revendo as suas posições anteriores em torno do tema, Teófilo defende agora a importância de um fundo ligúrico, pré-celta, na poesia popular portuguesa, que ele designa como sendo um fundo «lusista».
18Apesar pois das sugestões etnológicas de Martins Sarmento, a antropologia portuguesa permanece inicialmente alheada das potencialidades etnográficas das teses lusitanistas.
19As razões exactas para isso não são entretanto fáceis de precisar. Podem eventualmente prender-se com questões de «timing»: as teses de Sarmento estavam então ainda muito frescas. O facto de elas surgirem defendidas por alguém que, a partir da província, se situava a contra-corrente da historiografia então dominante em Portugal – onde ainda ecoava o cepticismo de Herculano – deve ter tido também algum peso. Mas, mais provavelmente, a indiferença da antropologia dos anos 1870 e 1880 relativamente às teses lusitanistas de Martins Sarmento pode ser entendida como o resultado de diferentes estratégias de gestão do impulso nacionalista subjacente às suas preocupações etnogenealógicas.
20Assim, do ponto de vista dos defensores de uma aproximação baseada na mitologia comparada, as teses de Sarmento, embora inseridas – depois de 1880 – na corrente indo-europeísta, corriam o risco de proceder a uma nacionalização excessivamente prematura desses indo-europeus «portugueses» que seriam os lusitanos, enfraquecendo as possibilidades de inserção plena da literatura e das tradições populares portuguesas no património comum indo-europeu. Nesta situação, os etnólogos portugueses influenciados pela mitologia comparada parecem ter optado por uma narrativa mais genérica, susceptível de capitalizar de forma mais efectiva o prestígio que então rodeava. – como mostrou Olender (1989) – as teses indoeuropeias.
21Quanto a Teófilo Braga, a sua opção – sobretudo a partir de 1880 – parece ser outra. Nela exprime-se antes do mais, a preocupação com a construção de um «mito de origem» susceptível de conferir ainda maior profundidade temporal à nação portuguesa. E nessa perspectiva que podemos encarar o peso que nas suas concepções ocupa um fundo étnico pré indoeuropeu. A valorização deste permitia fazer recuar ainda mais no tempo a etnogénese da nação portuguesa. Simultaneamente, Braga evidencia também um continuado fascínio pelas teses celticistas, que se revelam entretanto difíceis de compatibilizar com as teses lusitanistas na formulação que, a partir de 1880, Martins Sarmento lhes tinha dado, ao defender que os lusitanos resultariam de uma migração de povos indo-europeus pré-celtas. Finalmente, nas teses etnogenealógicas de Teófilo Braga há também uma maior abertura às conclusões obtidas no interior de outros campos do saber, com destaque para a história. É justamente desse ponto de vista que pode ser encarado o peso que, persistentemente, Braga dá aos moçárabes na etnogénese portuguesa.
LEITE DE VASCONCELOS E OS LUSITANOS: DA CONTINUIDADE À JUSTAPOSIÇÃO
22Dada esta conjuntura inicial de indiferença relativamente às teses lusitanistas, será pois preciso esperar algum tempo para que a situação comece a mudar e para que os primeiros sinais de atracção pelas posições inicialmente defendidas por Martins Sarmento se comecem a manifestar.
23Esses primeiros sinais provêm de um etnólogo que se encontra então na fase inicial de uma carreira que o conduzirá a médio prazo a uma posição de grande destaque não apenas na antropologia portuguesa, mas de uma forma mais geral, na ciência e na cultura portuguesas do seu tempo: Leite de Vasconcelos8.
24A aproximação de Vasconcelos às teses lusitanistas parece ter sido facilitada por dois factores principais. Por um lado, pela sua proximidade com a arqueologia, que tinha estado já na origem da publicação de umas «Notas PréHistóricas» em 1880 (Vasconcelos 1880-81). Por outro lado, pelas suas relações de amizade com Martins Sarmento. A correspondência entre ambos é assídua e nela, assuntos etnográficos articulam-se com temas arqueológicos e vice-versa (Vasconcelos 1958)9.
25Ora bem, essa dupla proximidade relativamente à arqueologia e a Martins Sarmento irá determinar, por volta de 1885, uma mutação maior na sua carreira. Tendo até aí investigado e publicado basicamente na área da etnografia, Vasconcelos irá a partir de então concentrar o essencial das suas atenções na arqueologia.
26O primeiro sinal dessa reorientação é dado por Portugal Pré-Histórico (Vasconcelos 1885). E é confirmada em 1887, com a sua nomeação para director da Biblioteca Nacional de Lisboa (BNL), onde Leite de Vasconcelos assegurará, entre outras tarefas, a leccionação de uma cadeira de numismática – uma área que, nomeadamente no tocante à chamada «numismática antiga», possuía inúmeros pontos de contacto com a arqueologia. José Leite de Vasconcelos dá então início à constituição de uma pequena colecção museológica – referida designadamente na sua correspondência com Martins Sarmento (Vasconcelos 1958) – integrada sobretudo por objectos de valor arqueológico.
27Mas é sobretudo em 1893, com a criação do Museu Etnográfico Português que essa reorientação arqueológica se tornará mais evidente. Apesar do seu título – mais tarde mudado para Museu Etnológico Português –, o Museu constitui-se a partir de um espólio em que os objectos arqueológicos são dominantes. Entre eles, e para além da própria colecção que Vasconcelos havia reunido na BNL para apoio às suas aulas de numismática, encontrava-se sobretudo o importante espólio de Estácio da Veiga (1828-1891), arqueólogo algarvio com um destacado papel na emergência da arqueologia em Portugal na segunda metade do século xix. Presente nas suas colecções iniciais, esta vocação arqueológica do Museu reencontra-se também na orientação genérica que desde muito cedo lhe é imprimida. Por detrás dela perfila-se uma concepção historicizante do povo português em que a arqueologia ocupa justamente um lugar fulcral. Mais do que a ilustração exclusivamente etnográfica da cultura portuguesa, o Museu visa uma representação de conjunto do povo português, dotada de grande profundidade temporal, de que a «etnografia moderna» – para retomar uma expressão recorrente nos textos de Leite de Vasconcelos – não seria senão uma parte. Assente numa visão da «história da civilização portuguesa» em «épocas» – «pré-histórica, proto-histórica, romana, bárbara, arábica, medievalportuguesa, do Renascimento e moderna» (Vasconcelos 1915: 18) –, o Museu não só dá particular ênfase a objectos de natureza arqueológica, como coloca a etnografia propriamente dita – representada através de uma única secção, correspondente à «época moderna» – numa posição algo subordinada.
28Secundado pela criação, em 1895, da revista O Arqueólogo Português – dirigida pelo próprio Leite de Vasconcelos – a fundação e posterior desenvolvimento do Museu Etnológico irá originar um comprometimento profundo do autor com a arqueologia, não apenas no plano meramente institucional, mas também no plano científico. As suas deslocações pelo país passam a ter objectivos mais resolutamente arqueológicos como decorre de uma leitura atenta dos textos reeditados na recolha De Terra em Terra (Vasconcelos 1927) ou dos relatórios da actividade de Vasconcelos e dos colaboradores de Museu Etnológico entre 1893 e 1914 (Vasconcelos 1915). Uma parte fundamental da sua produção passa também a privilegiar a arqueologia, como o testemunham as numerosas contribuições que escreve para a revista O Arqueólogo Português, as suas participações nos congressos internacionais de arqueologia do Cairo (1909) e de Roma (1912) e, sobretudo, a publicação, entre 1897 e 1913, dos três volumes das Religiões da Lusitânia (Vasconcelos 1897, 1905, 1913), a obra fundamental de Leite de Vasconcelos no domínio da arqueologia.
29Esta reorientação dos seus interesses científicos, embora duradoura, não exclui entretanto, por um lado, a prática simultânea – embora em plano mais secundário – da etnografia. E tem simultaneamente em vista, por outro lado, um posterior regresso a tempo inteiro à etnografia. De facto, defendendo a continuidade entre o passado dos arqueólogos e o «presente» dos etnógrafos, Vasconcelos parece ter encarado a sua reorientação para a arqueologia como um desvio pelo passado que tinha entretanto como objectivo um regresso posterior ao presente. É de facto nesse sentido que aponta uma das poucas referências explícitas que é possível encontrar na sua obra em relação ao assunto, quando escreve, na introdução às Religiões da Lusitânia, que a reconversão arqueológica da sua actividade se ficaria a dever à necessidade de efectuar um desvio arqueológico pelo passado como condição para o entendimento do presente:
Tendo eu começado, desde muito novo, a investigar a par da Glotologia, a Etnografia moderna de Portugal, sobretudo as superstições, os costumes, as lendas e a literatura popular, fui levado, pela sucessiva complexidade do trabalho, a ocupar-me das coisas antigas, quando elas serviam no círculo dos meus estudos, para aclarar os factos da actualidade (Vasconcelos 1897: XXVII).
30Isto é: privilegiando uma análise historicista do material etnográfico, Leite de Vasconcelos parece ter trocado a etnografia pela arqueologia em nome dos ganhos interpretativos que uma investigação mais aprofundada e directa do passado poderia vir a ter no estudo etnográfico do presente. A confirmação do que acaba de ser dito é dada pelo seu regresso, a partir da segunda metade da década de 1910, à investigação etnográfica, depois de mais de quatro décadas em que o seu investimento determinante foi o arqueológico. Como demonstrei noutro lugar (Leal 1996), os seus Estudos de Etnografia Comparativa – em particular os consagrados à figa (Vasconcelos 1925a) e ao signo saimão (Vasconcelos 1918) – relevam justamente de uma etnografia iluminada pelo conhecimento mais detalhado do passado arqueológico de que ela seria a sobrevivência.
31Em todo este processo de diálogo entre etnografia, arqueologia e de novo etnografia, parece ser justamente central o fascínio exercido pelas teses lusitanistas de Martins Sarmento. Assim, em 1885, no seu primeiro ensaio consagrado à arqueologia – «Portugal Pré-Histórico» – Leite de Vasconcelos escreve, numa óbvia alusão às teses de Alexandre Herculano
[andarem] mal avisados (...) aqueles que supõem que a nacionalidade portuguesa começou na Batalha de Ourique, e que D. Afonso Henriques, primeiro rei, é também o primeiro pórtico da nossa história. Antes de Ourique, e antes ainda do momento em que o território portucalense aparece mencionado nos documentos, há um grande lapso – a Lusitânia; antes da Lusitânia, um lapso muito maior – Portugal pré-histórico. A aclamação de um rei não determina, só por si, o início da vida de um povo. Para se afirmar que a história portuguesa data do século xii, era primeiro preciso provar (o que não se fez nem se pode fazer) que havia uma perfeita antinomia entre os Portugueses, os Lusitanos e os povos pré-históricos deste rincão do Ocidente (Vasconcelos 1885: 4).
32Três anos depois, em 1888, dois textos testemunham de novo a importância da Lusitânia no empreendimento arqueológico de Leite de Vasconcelos. Numa crónica publicada no jornal Repórter, o autor, passando em revista as contribuições mais relevantes de vários contemporâneos seus em domínios como a linguística, a etnografia, a antropologia física e a arqueologia, escreve – forçando de forma clara uma realidade muito mais complexa – estarem «todos esses trabalhadores» interessados «em resolverem a questão das nossas origens étnicas e [em] determinarem cientificamente os laços que ligam a Lusitânia a Portugal» (Vasconcelos 1888a). Na sua lição inaugural ao Curso de Numismática da BNL (1888b), finalmente, argumentando acerca da importância de factores como o território, a raça, a história, as tradições ou a língua na definição da nacionalidade, Leite de Vasconcelos, ao procurar demonstrar a antiguidade desses elementos, assume mais uma vez como referência central a Lusitânia. Relativamente ao território, sublinha por exemplo que «Portugal está compreendido na Lusitânia» (1888b: 21-22). No tocante à raça, embora a determinação do «grau de parentesco físico-fisiológico em que os povos pré-históricos e históricos da Lusitânia está para com os Portugueses» se encontre «ainda em parte por fazer (...) não há razões para deixar de admitir certa comunidade de sangue» (id.: 22-23). «Em relação à História, esta é contínua: muitas das nossas populações, por exemplo, assentam ainda hoje num solo perfeitamente lusitano ou luso-romano» (id., ibid.). Quanto às tradições
seria fácil mostrar como das épocas mais antigas da Lusitânia, ainda mesmo dos tempos pré-históricos, até hoje se têm mantido muitas crenças, costumes, etc., e como a maior parte das lendas da nossa Igreja e usos cristãos derivam do paganismo (id.. ibid.).
33Finalmente, «em relação à língua, ela é talvez a prova mais convincente dessa confraternidade primordial dos Lusitanos [com os romanos]» (id., ibid.).
34Presente nestes textos de 1885 e 1888, esta referência à Lusitânia como quadro interpretativo por excelência do passado pré e proto-histórico de Portugal continuará a orientar a pesquisa arqueológica posterior de Leite de Vasconcelos. A melhor prova disso é, como se sabe, aquela que é geralmente considerada a sua obra mais relevante no domínio da arqueologia: as Religiões da Lusitânia. Definindo a religião como «um dos elementos mais importantes (...) no viver de um povo» (Vasconcelos 1897: XXVII), Leite de Vasconcelos desenvolverá aí um elaborado estudo das religiões da Lusitânia desde os tempos pré-históricos às invasões bárbaras, passando pela romanização. Encarada como uma contribuição parcelar para uma «História da Lusitânia», a obra retoma e sistematiza na sua Introdução o essencial das ideias defendidas pelo autor em 1888 relativamente à continuidade entre a Lusitânia e Portugal:
se o território de Portugal não concorda exactamente com o da Lusitânia, está porém compreendido no dela; (...) a língua que falamos é, na sua essência mera modificação da que usavam os Luso-Romanos; (...) muitos dos nossos nomes de lugares actuais provêm de nomes pré-romanos; (...) certas feições no nosso carácter nacional (...) encontravam[-se] já nas tribos da Lusitânia; (...) grande parte dos nossos costumes, superstições, lendas, isto é, da vida psicológica do povo, datam do paganismo; (...) bom número das nossas povoações correspondem a antigas povoações lusitânicas ou luso-romanas; (...) numa palavra, quando estudamos, por miúdo, qualquer elemento tradicional da nossa sociedade, (...) achamo [-nos] constantemente em estreita relação com o passado, ainda mesmo com o mais remoto (id.: XXVI).
35Isto é, o passado arqueológico que Vasconcelos se propõe examinar é antes do mais um passado construído em torno da referência central aos lusitanos e à Lusitânia10.
36Da mesma maneira, o posterior regresso de Vasconcelos à etnografia estava também condicionado pela frequência das teses lusitanistas. Isto é qualquer coisa que se pode entrever desde logo no título – Revista Lusitana – dado por Vasconcelos à revista de etnografia que fundara em 1897. Embora pioneira, essa atitude não tardará – como vimos – a ser imitada até à exaustão no decurso das próximas décadas. A mesma dependência da etnografia relativamente às teses lusitanistas reencontra-se também na lógica expositiva adoptada no Museu de Etnologia, em que a secção consagrada à etnografia moderna «fecha» um percurso arqueológico centrado na Lusitânia. Finalmente, essa é também uma ideia presente nas Religiões da Lusitânia. Assim, logo no I volume da obra, Leite de Vasconcelos, ao mesmo tempo que – como vimos atrás – insiste na continuidade entre os povos da Lusitânia e o povo português no respeitante designadamente ao «carácter nacional», aos «costumes, superstições, lendas, (...) [e à] vida psicológica», e, de uma maneira geral, a «qualquer elemento tradicional da nossa sociedade» inclui também, designadamente ao longo do I volume – consagrado à pré-história de referências comparativas entre as práticas religiosas dos «nossos maiores» e as tradições populares portuguesas contemporâneas. As referências contidas no II volume à continuidade entre o culto do deus lusitano Endovélico e um certo número de práticas populares actuais (Vasconcelos 1905: 145-146), ou a inclusão de um Apêndice final sobre «Os Vestígios do Paganismo» (Vasconcelos 1913: 593-607) – «que principalmente se conservam nas tradições populares e ainda nos usos da Igreja» (Vasconcelos 1897: XXXIII) – participam da mesma intenção.
37Esta preocupação de estabelecer laços de continuidade entre os lusitanos e a cultura popular portuguesa reencontra-se também após o regresso mais efectivo de Vasconcelos à etnografia. É o que se passa desde logo com os Estudos de Etnografia Comparativa, em particular com os ensaios sobre o «Signum Salomonis» (Vasconcelos 1918) e sobre «A Figa» (Vasconcelos 1925a). Tive já ocasião de sublinhar o modo como estes ensaios são dominados por preocupações de tipo etnogenealógico e o peso que nessas preocupações têm os lusitanos (Leal 1996). Assim, a difusão do signo saimão em Portugal teria sido facilitada pelas suas similitudes com a suástica lusitana. Quanto à figa, teria sido introduzida em Portugal pelos luso-romanos.
38Preocupações idênticas reencontram-se na Etnografia Portuguesa. De facto, esta obra é vista, desde o momento em que é concebida, na continuidade do percurso arqueológico de Vasconcelos centrado nos lusitanos. Essa ideia é afirmada no prefácio ao I volume:
A Etnografia Portuguesa refere-se principalmente aos tempos modernos; todavia (...) dar-se-ão nela (...) notícias históricas antigas da idade média em diante: a obra formará pois (...) continuação da que se intitula Religiões da Lusitânia, porque começará no séc. viii, quando (...) acabou a Lusitânia histórica, e como que já surge Portugal (Vasconcelos 1933: 11).
39E é também confirmada pelo seu discípulo e biógrafo Orlando Ribeiro: as Religiões da Lusitânia e a Etnografia Portuguesa «formam uma espécie de Monumenta Ethnica de Portugal, desde o paleolítico até à actualidade» (Ribeiro 1994 [1942]: 36).
40Parece pois indesmentível a atracção que exercem em Leite de Vasconcelos as teses lusitanistas. Entretanto, esse fascínio pelos lusitanos e pela Lusitânia é apenas um dos lados da medalha. De facto, a obra de Vasconcelos é simultaneamente caracterizada por dificuldades grandes em traduzi-lo de forma efectiva, isto é, em teses categóricas sobre a cultura popular portuguesa.
41É o que sugere desde logo uma leitura atenta do Apêndice dedicado às sobrevivências do paganismo nas Religiões da Lusitânia. Inicialmente, esse Apêndice é apresentado como um objectivo importante da obra: na introdução geral é-lhe dado um relevo idêntico ao de cada uma das três partes em que a obra se divide (1897: XXXIII). Entretanto, na sua concretização prática, o Apêndice acaba por ficar manifestamente aquém dos objectivos previamente enunciados. Com pouco mais de quinze páginas, inicia-se com uma confissão das dificuldades que o assunto apresentaria:
De tais vestígios [do paganismo] há uns cuja história podemos mais ou menos seguir (...); há outros que não podemos relacionar directamente com documentos antigos, mas que pelo seu carácter, e pela sua estranheza em meio de crenças católicas, manifestam que provêm de estirpe não cristã, conquanto seja difícil, e às vezes impossível, detectar quais os que têm filiação lusitana, quais os que a têm romana, quais os que a têm germânica, ou outra (1913: 593-594; os itálicos são meus).
42Nos Estudos de Etnografia Comparativa, por seu lado, se as referências aos lusitanos estão lá, uma leitura mais atenta dos textos revela o seu carácter apesar de tudo secundário. Assim, a difusão do signo saimão em Portugal, embora facilitada pela suástica lusitana, seria efectivamente da responsabilidade dos judeus. Quanto à figa, os luso-romanos de que fala Leite de Vasconcelos são mais romanos do que lusos. Finalmente, no respeitante à Etnografia Portuguesa, apesar das intenções anunciadas – ou por causa delas –, os lusitanos avultam como a principal ausência. O facto de a obra ter sido interrompida pela morte do autor é certamente um factor explicativo para essa ausência. Mas não parece ser entretanto o único. Tudo indica que, com o material entretanto acumulado tanto no plano arqueológico como no plano etnográfico pelo próprio Vasconcelos, seria de facto difícil demonstrar a continuidade entre lusitanos e portugueses.
43É certo que o horizonte lusitano se mantém vivo e que em nenhum ponto da sua produção se procede à crítica explícita do projecto lusitanista. Mas tudo se passa como se da continuidade inicialmente postulada entre lusitanos e portugueses, Vasconcelos não consiga senão enunciar a sua justaposição. Teria havido lusitanos e haveria portugueses, mas a influência efectiva de uns sobre outros fica por demonstrar. Nessa exacta medida, a história da paixão lusitana em Vasconcelos é, de algum modo, a história de uma paixão não correspondida.
EM NOME DO PLURALISMO ETNOGENEALÓGICO: JORGE DIAS E A DOMESTICAÇÃO DO PARADIGMA LUSITANISTA
44A mesma atracção pelas teses lusitanistas que estrutura a produção de Leite de Vasconcelos é reencontrável na obra de Jorge Dias, em particular nos seus primeiros textos, que se estendem ao longo do período que vai de 1946 – logo após o seu regresso da Alemanha – até 1950. Neste período, Jorge Dias irá publicar, entre outras contribuições marcantes – com destaque para Vilarinho da Furna (Dias 1948a) –, um conjunto de artigos sobre as formas de habitação primitiva no NW português (Dias 1946, 1947, 1948c, 1993 [1949], 1950) e o seu livro Os Arados Portugueses e as suas Prováveis Origens (Dias 1948b).
45Estes textos reflectem, por um lado, a formação teórica do autor, feita na Alemanha, onde contactou e assimilou o difusionismo alemão: a problemática das origens étnicas de cada um destes elementos culturais é neles determinante. Mas reflectem, por outro lado, uma certa proximidade que parece ter-se estabelecido entre Jorge Dias e Mendes Correia por ocasião do regresso do primeiro a Portugal. De facto, como é sabido, Mendes Correia foi uma figura decisiva no apoio institucional ao trabalho de investigação de Jorge Dias. Ora bem: Mendes Correia era nesse período – como ficou sugerido atrás – o mais importante defensor de teses lusitanistas na arqueologia portuguesa, onde tinha ocupado o lugar de alguma forma deixado livre pelo regresso de Vasconcelos à etnografia. Utilizando – à semelhança de Martins Sarmento – os castros como referência central, Mendes Correia procedeu entretanto à revisão do estatuto histórico dos lusitanos: estes seriam pré-celtas aparentados com outros povos ibéricos que se teriam depois misturado com os celtas (Mendes Correia 1928). Simultaneamente, procedeu a um trabalho de patriotização dos lusitanos bastante apreciado, de resto, nos meios culturais e científicos do Estado Novo.
46Devido tanto à sua proximidade com Mendes Correia como à própria voga que, por seu intermédio, as teses lusitanistas continuavam a manter e a consolidar nas narrativas arqueológicas centradas na etnogenealogia dos Portugueses, Jorge Dias irá justamente privilegiar, no quadro dessa sua procura inicial das origens da cultura popular portuguesa, uma aproximação marcada pela centralidade das referências aos lusitanos.
47Essa tendência cristaliza antes do mais – de uma forma embora ambígua – em torno do problema das construções de planta circular características do noroeste português, aquilo a que mais tarde Jorge Dias chamaria de «construções primitivas». Dias procede à defesa da continuidade entre essas «construções primitivas» actuais e as construções de planta circular dos castros e citânias. À pergunta «haverá (...) um parentesco entre os construtores das actuais casas redondas e os habitantes das antigas citânias», Jorge Dias responde afirmativamente:
tudo leva a crer que essa maneira tradicional de construir casas redondas ou arredondadas representa uma linha tradicional de continuidade através dos séculos, que só nos nossos dias se rompe inteiramente perante a revolução total das formas tradicionais que a técnica ocasionou (1948c: 166).
48Simultaneamente, Dias advoga nos seus artigos uma tese ecléctica quanto às origens étnicas dos inventores dessas construções. Estas seriam uma criação de populações pré-celtas posteriormente reforçada e desenvolvida devido à influência celta:
É (...) natural que as invasões célticas trouxessem a tradição da construção circular que tanto podia ser criação sua como herança de povos pré-indo europeus das regiões da Europa em que habitavam. Quando partiram dessas regiões para invadir a Península Ibérica trazendo as suas tradições e costumes, encontraram-se com povos de diferentes origens e tradições com os quais tiveram de lutar, até realizar um fenómeno de unificação de qualquer tipo (fusão, assimilação, domínio, etc.). É natural que alguns desses povos indígenas também conhecessem a construção circular que teria tido desde então um desenvolvimento extraordinário devido ao encontro ou sobreposição do mesmo tipo de construção dos dois povos, um já existente na região e outro trazido pelos povos invasores (1946: 183-184).
49Embora a figura dos lusitanos não apareça mencionada de forma explícita nesta ou noutras passagens de sentido similar, as referências a Martins Sarmento e a Mendes Correia no quadro da discussão sugerem que essas populações pré-celtas co-responsáveis pelas casas circulares seriam os lusitanos.
50Mas é sobretudo em Os Arados Portugueses e as suas Prováveis Origens que este fascínio pelas teses lusitanistas é mais flagrante. O argumento central do texto tem a ver com a identificação de três tipos fundamentais de arados no território português. Entre esses tipos encontrar-se-ia o arado radial. A área de distribuição desse tipo de arado coincidiria com uma das grandes áreas geográficas de Portugal de acordo com o modelo proposto por Orlando Ribeiro – o Portugal Transmontano – e, nessa medida, a sua adopção ficar-seia a dever a razões ligadas às características geográficas dessa área. Mas, simultaneamente, a difusão do arado radial nessa área do território português seria o resultado de uma influência étnica determinada. É justamente neste ponto do argumento de Dias que reaparecem os lusitanos, mencionados agora de uma forma clara. De facto, teriam sido eles os criadores do arado radial, designado também por Dias como arado radial lusitano ou lusitânico (1948b: 108). O arado radial seria nessa medida o arado mais português, não só por ser o mais arcaico, mas também pela sua capacidade de expansão em zonas de colonização portuguesa (id.: 107).
51Isto é: tal como surge ilustrado neste conjunto de textos, o percurso inicial de Jorge Dias prolonga também à sua maneira o fascínio pelos lusitanos nos exercícios etnogenealógicos da antropologia portuguesa. Esse fascínio reencontra-se nos «Elementos Fundamentais da Cultura Portuguesa» (Dias 1990a [1953]). Aí, a complexidade e o carácter contraditório do temperamento português são explicados como o resultado da etnogenealogia pluralista de Portugal, etnogenealogia na qual os lusitanos – «um povo rude, sóbrio e espantosamente resistente e aguerrido» (1990a: 143) – ocupariam um lugar de relevo.
52Mas, tal como em Leite de Vasconcelos, também em Jorge Dias este fascínio pelas teses lusitanistas é apenas um dos lados da medalha.
53De facto, partindo de uma posição de atracção inicial por essas teses, Jorge Dias parece ter-se defrontado, tal como Vasconcelos, com algumas dificuldades na sua aplicação plena. Algumas dessas dificuldades têm aliás certa semelhança com as encontradas anteriormente por Vasconcelos. É o que se passa relativamente às construções circulares. Este «dossier» conhece um fim abrupto em 1950, para só renascer nos anos 1960, já sem Jorge Dias, quando Veiga de Oliveira e os seus colaboradores o retomam no âmbito de um levantamento e análise sistemáticas dos diferentes tipos de construções primitivas portuguesas (Oliveira, Galhano & Pereira 1969). O fim abrupto desse interesse inicial de Dias pelo tema parece ter sido de alguma forma influenciado pelo eventual surgimento de elementos que punham em questão as teses etnogenealógicas inicialmente defendidas por Jorge Dias. Assim, num texto de 1949, Dias defende que não há continuidade – «identidade étnica» (1993 [1949]: 86) como ele escreve – «entre as actuais populações de construtores dessas cabanas e os antigos castrejos» (id., ibid.). E em 1950, no último dos textos consagrado por Dias ao problema, a completa ausência de quaisquer referências etnogenéticas torna claro o abandono desse inicial fascínio ambiguamente lusitanista.
54Entretanto, os obstáculos maiores para a confirmação plena das teses lusitanistas por Jorge Dias parecem provir de outro lado. De facto, como ficou sublinhado atrás, essas teses propunham uma espécie de exclusivo relativamente aos antecedentes étnicos do país. Era mesmo aí que se parecia situar – como vimos – um dos motivos da sua eventual superioridade relativamente a narrativas concorrentes. Ora este exclusivo chocava-se desde o início com a efectiva diversidade de populações que se tinham sucedido historicamente no território português. É justamente para resolver essas dificuldades – como vimos – que Vasconcelos, por exemplo, lança mão de soluções como o acento na Lusitânia ou a transformação dos romanos em luso-romanos, etc... Mas o reconhecimento de outros contributos étnicos não desaparecera entretanto da cultura portuguesa. A visão predominante a respeito desses contributos é entretanto uma visão cumulativa, como o mostra, por exemplo, a História de Barcelos ou como está implícito na Etnografia Portuguesa de Vasconcelos. Há uma listagem variável de populações que se terão sucedido no território português, sem que seja explicitado de que modo e até que ponto cada umas delas contribuiu para a formação e o desenvolvimento da cultura portuguesa.
55Jorge Dias vai adoptar a esse respeito uma visão diferente, mais dinâmica e sistemática. Como vimos, um dos aspectos fundamentais da reflexão antropológica de Jorge Dias é a sua sensibilidade em relação à diversidade do país. Essa sensibilidade estrutura-se em torno do modelo proposto por Orlando Ribeiro e baseado na distinção entre Portugal Mediterrânico, Portugal Atlântico e Portugal Transmontano. É justamente a justeza desse modelo que a investigação de Dias em torno dos arados parece confirmar. De facto, para além do arado radial, Dias identificou ainda no território português dois outros modelos de arado, que ele denominou de arado de garganta e de arado quadrangular. Tal como o arado radial coincidiria, como vimos, com uma das áreas geográficas proposta por Orlando Ribeiro – o Portugal Transmontano – sucederia o mesmo com os dois outros tipos de arado. De facto o arado de garganta estaria ligado ao Portugal Mediterrânico, enquanto que o arado quadrangular se encontraria no Portugal Atlântico. Só que da mesma maneira que o arado radial, ligado a uma área geográfica precisa, seria também a expressão de uma corrente étnica determinada, o mesmo aconteceria com os restantes modelos de arados. Ligados a dois quadros geográficos distintos, eles seriam também os testemunhos de duas influências étnicas também elas diferenciadas: romanos e árabes, no caso do arado de garganta, e suevos, no caso do arado quadrangular.
56Isto é: se é possível demonstrar a continuidade entre lusitanos e portugueses, essa continuidade não é entretanto exclusiva. Para que os lusitanos possam continuar a fazer parte do quadro etnogenealógico do país, sugere o bom senso científico que eles estejam entretanto acompanhados. Só uma parte da cultura portuguesa pode ser interpretada de acordo com o modelo lusitanista.
57À semelhança pois de Leite de Vasconcelos, embora de uma forma diferente, os resultados finais do fascínio inicial de Jorge Dias pelas teses lusitanistas acabam por ser relativamente decepcionantes. Isto é tanto mais verdade quanto – com excepção dos «Elementos Fundamentais da Cultura Portuguesa» – os lusitanos acabarão por ser os grandes ausentes da produção posterior de Jorge Dias. Orientando-se de acordo com o modelo etnogenealógico inicialmente testado em Os Arados Portugueses e as sua Prováveis Origens, esta irá de facto privilegiar antecedentes étnicos distintos para a cultura popular portuguesa. É o que se passa designadamente com o estudo de Dias e dos seus colaboradores sobre os espigueiros, inteiramente dominado pela sombra do suevos (Dias, Oliveira e Galhano 1963)11.
58Há entretanto uma grande diferença entre o resultado final do fascínio pelos lusitanos em Vasconcelos e em Dias. Enquanto que no primeiro autor, o enfraquecimento dos lusitanos deixa uma espécie de vazio etnogenealógico, no caso de Jorge Dias ele permite, pelo contrário, a construção de uma narrativa etnogenealógica alternativa, baseada na valorização do pluralismo etnogenealógico como modelo explicativo da singularidade portuguesa. Esse é de facto – como teremos oportunidade de ver no próximo capítulo – um dos argumentos fundamentais desenvolvidos por Dias em «Os Elementos Fundamentais da Cultura Portuguesa» (1990a [1953]).
59Evitada ou contornada na antropologia portuguesa desde as formulações pioneiras de Teófilo Braga, essa narrativa permite, por um lado, a construção de uma galeria de antepassados étnicos mais ajustada às conclusões entretanto obtidas por historiadores, filólogos e arqueólogos e simultaneamente sintonizada com uma das correntes então dominantes na etnologia europeia: o difusionismo. Mas permite sobretudo que a originalidade de Portugal passe a ser postulada por intermédio da complexidade única da personalidade base dos portugueses vista precisamente como o resultado dessa etnogenalogia pluralista e do modo como ela teria enraizado nos portugueses um conjunto de profundas antinomias de carácter. Isto é: no preciso momento em que se torna – mais uma vez – claro que não é possível fazer repousar os antecedentes étnicos da nação nas vantagens da narrativa lusitanista, emerge uma narrativa alternativa que compensa essa perca com ganhos de outra natureza.
CONCLUSÕES
60Num artigo recente, Anthony Smith (1995) distingue entre as concepções «gastronómica» e «geológica» da nação. No primeiro caso, a ênfase seria colocada no «carácter imaginado da comunidade nacional e na natureza fictícia dos seus mitos unificadores» (Smith 1995: 5), entre os quais os respeitantes à sua etnogénese. No segundo caso, pelo contrário, o acento seria colocado na importância da etnogenealogia. A nação é vista como «um grupo de descendência estável» (id.: 12) e como «um precipitado de todos os depósitos das gerações anteriores da comunidade», cuja herança étnica determina «o carácter da nação moderna» (id., ibid.).
61Distanciando-se de ambas as concepções, Smith tenta criar uma terceira via, baseada na ideia de que o nacionalismo é uma espécie de arqueologia. Tal como a arqueologia também o nacionalismo tem como objectivo «reconstruir o passado de uma civilização e relacioná-lo com períodos ulteriores da sua história, incluindo o presente» (id.: 14). Esse trabalho arqueológico inscrito no nacionalismo tem entretanto alguns limites. Entre esses, contar-se-iam os limites científicos:
As interpretações do (...) passado étnico dependem não apenas da ideologia nacionalista, mas também daquilo que os historiadores dizem acerca de eventos ou épocas passadas. A pesquisa histórica pode mudar a nossa avaliação dos heróis e acontecimentos relevantes no passado da comunidade, da mesma forma que pode fazer explodir mitos (id.: 17).
62Na linha das sugestões de Anthony Smith, pode dizer-se que o trabalho etnogenealógico que é possível reconhecer não apenas na antropologia, mas na história, na arqueologia e na filologia portuguesas ao longo do século xix e de boa parte do século xx, é um trabalho que se faz a meio caminho entre duas tensões fundamentais. A primeira dessas tensões deriva do seu ponto de partida nacionalista no sentido forte – ideológico, se se quiser – da palavra. A outra prende-se justamente com a ciência.
63Assim, de um lado, a procura dos antecedentes étnicos para a nação fazse de acordo com motivos em que o nacionalismo é determinante. A narrativa etnogenealógica que se procura deve propiciar não apenas a construção de uma árvore genealógica para a nação, mas a construção de um verdadeiro «pedigree», isto é: uma «arvore genealógica» que seja simultaneamente um motivo de orgulho. A originalidade e a antiguidade das origens são, em particular, especialmente valorizadas. A originalidade das origens opera como a sanção histórica para a identidade actual da nação. A antiguidade das origens enraíza ainda mais na longa duração a nação, fazendo dela idealmente uma realidade coincidente com a própria história. Entretanto, simultaneamente, a natureza ideológica desse empreendimento possui limites que lhe são fixados pelos moldes «científicos» invocados. Em cada momento, em função dos consensos metodológicos e teóricos consagrados, a exactidão, a plausibilidade e a fiabilidade são valores essenciais. Embora «nobre», o pedigree da nação deve ser verosímil, resistindo aos protocolos da prova em cada momento estabelecidos.
64É justamente nessa perspectiva que podemos olhar para os destinos decepcionantes que as teses lusitanistas tiveram na antropologia portuguesa. Na base do fascínio que elas parecem exercer, encontra-se a sedução – «nacionalista» – de uma narrativa etnogenealógica apta a dotar Portugal de antepassados providos dos argumentos da antiguidade e da originalidade e integrados num mito de origem dotado simultaneamente da máxima simplicidade e da máxima eficácia. Na base dos seus resultados decepcionantes, encontra-se um certo número de dificuldades em o suportar cientificamente e de forma verosímil na área específica da antropologia. Dificuldades de estabelecimento de linhas de continuidade demonstráveis, sobretudo em Leite de Vasconcelos – mas também em Jorge Dias. Dificuldades de análise do conjunto da cultura portuguesa nos termos exclusivos das teses lusitanistas, no caso de Jorge Dias. Em resumo, para os intervenientes principais no debate lusitanista, os lusitanos até podem ter existido, mas não só parece ser cientificamente improvável que a sua existência tenha afectado de forma profunda a nacionalidade portuguesa, como, a existir, essa influência é partilhada com outras influências étnicas tão ou mais importantes que a dos Lusitanos.
Notes de bas de page
1 Cf. Leal 1996 para um tratamento mais genérico do problema.
2 Acerca da articulação entre arqueologia e nacionalismo, cf. Díaz-Andreu & Champion 1996.
3 Para uma síntese da importância das teses lusitanistas na arqueologia portuguesa, cf. Fabião 1996. Ainda na mesma linha, mas explorando a figura de Viriato, cf. Guerra & Fabião 1992.
4 Acerca do celticismo, cf. Chapman 1978, 1992.
5 Utilizando o inventário de revistas culturais e litarárias portuguesas realizado por Daniel Pires (1996), é possível indicar um total de 25 publicações que, entre 1900 e 1940, possuíam no seu título uma referência aos lusitanos ou à Lusitânia.
6 Um bom exemplo deste segundo dispositivo pode encontrar-se na reflexão de Consiglieri Pedroso sobre as mouras encantadas (1988b: 217-227). Pedroso começa por comparar as mouras encantadas com figuras similares presentes noutras tradições indo-europeias; as nixen germânicas, as rusalki eslavas, as lac-ladies inglesas, as naida gregas, etc. Desta comparação Pedroso retém fundamentalmente a singularidade das mouras encantadas portuguesas, que ele descreve como «uma das mais poéticas criações do maravilhoso popular português» (id.: 218).
7 Estas teses foram no essencial retomadas – embora de forma retocada – em A Pátria Portuguesa. O Território e a Raça (Braga 1894).
8 Resumo, nas páginas seguintes um argumento que tive ocasião de trabalhar mais desenvolvidamente em Leal 1996.
9 Esta relação manteve-se por mais de duas dezenas de anos, tendo-se entretanto degradado nos «últimos anos da existência de Sarmento, tempo em que uma divergência a propósito do geógrafo grego Estrabão conduziu, na prática, ao corte de contactos entre os dois sábios» (Neves, António 1998: 12). A este respeito, deve mencionar-se que Leite de Vasconcelos, a par da capacidade de atracção e convívio científico com colegas e discípulos que lhe é geralmente atribuída, é também um personagem cujo relacionamento com os seus contemporâneos apareceu frequentemente envolvido em polémicas e cortes de relações. Rocha Peixoto e Vergílio Correia, por exemplo, contam-se entre os etnógrafos que se travaram de razões com o director do Museu Etnológico Português.
10 Associada a formulações ideológicas de claro sentido nacionalista, esta fixação na Lusitânia não é tanto – como em Martins Sarmento – uma fixação exclusiva nos lusitanos, mas a opção por um espaço cronologicamente muito ambicioso – desde os «alvores» da pré-história até à «fundação» da nacionalidade – onde se teriam sucedido um conjunto de povos – com relevo naturalmente para os lusitanos – cujas contribuições teriam gradualmente moldado a cultura «tradicional» portuguesa.
11 Acerca da atracção pelas teses suevas na obra de Jorge Dias, cf. Leal 1999.
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