Apêndice II. Grupos sociais em 1851 e 1892
p. 393-407
Texte intégral
1Como surgiu a actual distribuição da terra em Fontelas? Será que as fontes históricas locais podem indicar quaisquer tendências, a longo prazo, relativamente à dimensão das propriedades ou à composição dos grupos sociais da aldeia?
2Este apêndice trata de dois documentos administrativos compilados em Mosteiro, que nos dão informações sobre a estrutura passada dos grupos sociais de Fontelas: o primeiro é um recenseamento eleitoral de homens feito em 1851, e o segundo uma lista paroquial de impostos efectuada em 1892. Cada um deles nos revela uma configuração específica da estrutura ocupacional da comunidade num dado ano, mas teremos de atender à História Social e Económica de modo a poder relacioná-las com a evolução regional e nacional, tarefa que está para além do objectivo deste livro. Porém, ambas as imagens fornecidas pelas fontes são só por si elucidativas, não obstante os seus campos limitados. Observemos rapidamente os dois documentos de modo a obter uma ideia das proporções dos habitantes de Fontelas que antigamente foram proprietários, lavradores e jornaleiros.
3Antes do recenseamento de 1851, uma das primeiras fontes que discriminou os grupos sociais existentes nestas povoações foi um recenseamento da província de Trás-os-Montes feito em 1796 (Ribeiro de Castro 1796). Nessa altura, Fontelas tinha 26 lavradores e 10 jornaleiros: o termo «proprietário» não era utilizado. O lugar tinha também um eclesiástico secular, um ferreiro, um alfaiate, um pastor, dois pedreiros, quatro criados (dois homens e duas mulheres) e cinco pessoas «sem ocupação». Aparece um total de 40 fogos na lista, abrangendo 181 pessoas (91 homens e 90 mulheres); não sabemos se as crianças foram incluídas. Isto é tudo quanto o recenseamento de 1796 nos diz sobre a aldeia: é óbvio que uma comparação destas proporções com as de outras povoações da província daria mais informação (Amado Mendes 1980). Embora na altura Fontelas tivesse alguns artífices, a sua população era predominantemente agrícola: os números indicam que a maioria das casas eram de lavradores. Na área que parece corresponder ao concelho, em 1796, havia 594 lavradores, 373 jornaleiros, 201 criados, 60 pastores e uma grande variedade de artesãos. É particularmente interessante o uso da palavra jornaleiro — indicava que pelo menos alguns dos moradores de Fontelas trabalhavam à jorna. O termo pode obviamente ter tido em 1796 um significado diferente; mas o seu uso no recenseamento dá a ideia que, mesmo então, havia uma diferença (para o enumerador, para os aldeãos ou para ambos) entre lavradores e jornaleiros.
4Em 1851, a Câmara Municipal de Mosteiro elaborou um recenseamento eleitoral dos indivíduos adultos do sexo masculino nas 8 paróquias do concelho, que na época compreendia um total de 35 povoações (lembramos que Mosteiro foi elevado a vila de 1837 até 1854). Reproduz-se aqui uma página deste documento. A partir desse exemplo, o Quadro 20 apresenta os valores para a freguesia de Mosteiro, que incluem os pertencentes a Fontelas (à esquerda da coluna que contém os números totais para a freguesia encontram-se os valores para Fontelas). O recenseamento é uma fonte particularmente útil, uma vez que contém não só os nomes, idades, estado civil e naturalidade dos indivíduos listados, mas também as suas ocupações, habilitações literárias e o montante da décima anual que cada um pagava — tratava-se de um imposto sobre propriedade do qual alguns eclesiásticos se encontravam isentos.
5O recenseamento eleitoral, no seu conjunto, compõe-se de quatro listas separadas de indivíduos, a primeira das quais é um recenseamento preliminar que refere todos os homens «Eleitores de Parochia nas Assembleas Primarias». Não há modo algum de confirmar se todos os adultos do sexo masculino foram registados: alguns poderiam perfeitamente não possuir qualquer terra e assim não pagar a décima. Além disso, não sabemos se a lista inclui somente os chefes de família do sexo masculino ou também outras pessoas possuidoras de propriedade. A maioria dos recenseados tinha idades superiores a 24 anos, embora dois homens de outras paróquias apareçam com idades de 20 e 22 anos. Parece não existir qualquer regra aplicável a esses jovens; os indivíduos na casa dos 20 anos não precisavam de ser casados para poderem ser registados (muitos eram solteiros).
6Este recenseamento preliminar é seguido por duas listagens mais curtas: a primeira é constituída por todos os homens com capacidade de serem eleitores dos deputados do concelho à Assembleia de Lisboa, enquanto a segunda inclui apenas aqueles com capacidade para serem eleitos como representantes. Estas três listas foram compiladas no mesmo livro, que se intitula Recenseamento dos Eleitores de Parochia nas Assembleas Primarias, dos Eleitores de Deputados, e dos Elegíveis para Deputados. Por exemplo, na paróquia de Mosteiro o recenseamento inicial de votantes inclui 91 nomes, mas somente 16 destes tinham capacidade para eleger os representantes da freguesia em Lisboa. Uma décima mínima de 1800 réis determinava a escolha destes 16 eleitores (Quadro 20), dois dos quais eram presbíteros. Finalmente, só um destes 16 era passível de ser eleito representante: com uma décima de 6000 réis, o lavrador Miguel Pires (bisavô de D. Elvira) era a única pessoa incluída na segunda lista para a freguesia de Mosteiro. A nível concelhio (todas as 8 freguesias) estas qualificações de propriedade eram também elucidativas; de um total de 853 homens registados, somente 77 tinham capacidade para serem eleitores. Destes 77, apenas 12 foram finalmente seleccionados como representantes, e destes 12, 7 eram proprietários e 5 lavradores.
7Uma quarta lista (num livro separado) contém os indivíduos com capacidade para ocuparem cargos municipais no respectivo concelho — Caderno de Recenseamento dos Eleitores e Elegíveis para os Cargos Municipaes. Aí se impõe igualmente uma qualificação com base na propriedade: uma décima de 1000 réis (Quadro 20). Uma vez que esta qualificação era inferior à primeira, eram mais os homens que possuíam capacidade para ser eleitos para tais cargos — 36 no total. O montante da décima de cada indivíduo (provavelmente calculada em função da propriedade de cada um) tinha pois um peso directo não apenas na sua elegibilidade para cargos municipais mas também, e acima de tudo, na elegibilidade para poder votar. Dos 91 homens do recenseamento da freguesia de 1851, há 10 casos de nomes repetidos (21 indivíduos), mas somente em dois deles se trata de pessoas com o mesmo nome vivendo na mesma povoação: não obstante a pequena dimensão da aldeia (e mesmo de toda a freguesia) poder tornar esta amostra estatisticamente pouco significativa, a dimensão da população estudada garante menos possibilidades de erro na identificação das pessoas.
8Apesar daquele pequeno senão, o recenseamento de 1851 fornece-nos um quadro pormenorizado da estratificação económica dentro da freguesia de Mosteiro e nas 7 freguesias vizinhas. No Quadro 20, classifiquei os adultos do sexo masculino que aparecem no recenseamento de acordo com as suas ocupações, habilitações literárias e décimas; observemos primeiro os valores para o conjunto da freguesia.
9O grupo superior dos proprietários e funcionários camarários representava 16% das décimas da paróquia, e quatro destes tinham alguns estudos. (Do número total de 26 presbíteros listados nas 8 freguesias, 17 encontram-se registados também como proprietários.) Três dos cinco contribuintes mais abastados viviam em Mosteiro; os restantes dois moravam em Fontelas. (O funcionário da Câmara devia também ter estudos, uma vez que qualquer cargo daquele tipo correspondia normalmente a um mínimo de trabalho escrito.)
Recenseamento de Eleitores, 1851 — Abreviaturas
Annos de id.e | — Anos de idade |
Escr.am da Camara | — Escrivão da Câmara |
Jom.o | — Jornaleiro |
Labr.o | — Lavrador |
Off.al da Camara | — Oficial da Câmara |
Proprietr.o | — Proprietário |
Qualificação liter.a | — Qualificação literária |
Solt.o | — Solteiro |
V.o | — Viúvo |
1051 indivíduos encontram-se registados como lavradores e, no seu conjunto, pagavam 71% do total das décimas da freguesia; porém, somente 11 destes 51 tinham capacidade para eleger representantes da freguesia a Lisboa, enquanto 31 podiam eleger os funcionários municipais. Como foi dito anteriormente, estas duas qualificações de propriedade (com base na décima) eram, respectivamente, 1800 e 1000 réis. Uma grande parte dos lavradores possuía, pois, direitos de voto para cargos municipais.
11O terceiro grupo — os jornaleiros — representava apenas 10% da riqueza da freguesia, e a sua décima média (420 réis) era consideravelmente inferior à dos lavradores (1632); um grande número de homens neste grupo (17 dos 27) pagava décimas muito pequenas, inferiores a 400 réis. Não podemos efectivamente pôr de lado a hipótese de que existiriam mais jornaleiros que não pagavam décima e que, portanto, não se encontram registados. Só 3 destes 27 (e um pedreiro) pagavam décimas superiores a 1000 réis, sendo pois os únicos membros deste grupo com capacidade para serem eleitores dos cargos municipais. Todavia, nem os jornaleiros nem os artesãos tinham capacidade para eleger representantes da freguesia em Lisboa; além do mais, nenhum dos artífices e apenas dois dos jornaleiros possuíam habilitações literárias. Do total dos 91 homens registados, apenas 15 tinham «qualificações literárias»: eram, sobretudo, os proprietários e alguns dos lavradores mais abastados.
12Como se podem comparar os valores correspondentes a Fontelas com os totais da freguesia? Observemos a coluna do Quadro 20, que se refere só àquela povoação. Enquanto um único proprietário é aí registado, aparecem 18 indivíduos como lavradores; quatro destes tinham habilitações literárias. Três outras subdivisões podem ser propostas para este grupo naquela época: a primeira inclui os 4 homens que pagavam décimas superiores a 1800 réis, e que tinham pois capacidade, juntamente com o proprietário e o oficial da Câmara, para serem eleitores de representantes.
13A segunda abrange aqueles que pagavam décimas superiores a 1000 réis — 14 dos 18 lavradores — e tinham capacidade para eleger funcionários municipais; os restantes 4, com décimas inferiores a 1000 réis, formavam parte do recenseamento inicial, mas não possuíam qualificações para votar. Em conjunto, estes 18 lavradores pagavam a grande parte das décimas de Fontelas, ou seja, 89,5%. A maioria dos homens deste grupo pagava décimas elevadas, e os totais das décimas na aldeia representavam 1/3 do total do rendimento colectável das quatro povoações da freguesia. É significativo o facto de Fontelas ter, na altura, uma percentagem particularmente elevada do número total de proprietários e lavradores abastados da paróquia.
14Finalmente, além de um jornaleiro que pagava uma décima de 500 réis, encontram-se registados no lugar 4 artífices, que representavam apenas 6,5% do total das décimas dessa aldeia (36 660 réis); a média das décimas pagas pelos artífices era substancialmente inferior à de um lavrador. Similarmente à situação no resto da freguesia, nenhum artesão de Fontelas aparece listado como tendo habilitações literárias.
15Se bem que o recenseamento eleitoral de 1851 não possa ser considerado como um registo muito exacto da população ou da estrutura dos fogos, fornece-nos uma imagem da divisão do campesinato em três grupos ocupacionais principais: proprietários, lavradores e jornaleiros. Além disso, o próprio grupo dos lavradores se encontra dividido com base no montante (expresso nos valores de 1000 e 1800 réis) de décima, fazendo pois surgir um grupo separado de lavradores particularmente abastados; juntamente com os artífices (pedreiros e carpinteiros), estes quatro grupos configuram ainda hoje uma classificação básica para Fontelas e para a freguesia. Somente a última daquelas três designações caiu recentemente em desuso e isto é um indício do desaparecimento do grupo social constituído pelos que trabalhavam à jorna. Embora o documento em si não defina precisamente o que se entendia, em termos sociais, por «jornaleiro» ou «lavrador», dá-nos a saber que os jornaleiros, no seu conjunto, possuíam uma quantidade muito inferior de riqueza colectável à dos lavradores. Além disso, a maioria daqueles não tinha, em 1851, as qualificações de propriedade mínimas necessárias para eleger funcionários locais; pelo menos em termos formais, a sua voz nos assuntos públicos era relativamente muda.
16A distinção entre os lavradores mais pobres e os jornaleiros que viviam melhor não é muito clara; por exemplo, um certo número dos primeiros pagava décimas de 100 a 1000 réis, enquanto alguns dos últimos pagavam décimas de 400 a 1500 réis. Isto não contradiz os dados obtidos em 1976-78, que nos mostram que muitos indivíduos hoje lavradores foram jornaleiros ou criados no passado; além do mais, uma determinada quantidade de terra pode não ser só por si um factor inteiramente determinante na classificação. Por outras palavras, existia em 1851 alguma sobreposição entre as décimas destes dois grupos, o que impede que possamos concluir que todos os membros de um grupo eram necessariamente mais ricos ou possuíam mais terra do que todos os membros do outro.
17Um outro factor que nos surge da comparação das décimas de Fontelas com as da freguesia (Quadro 20) é o elevado número de jornaleiros nas outras três aldeias. Lembremos que Mosteiro sempre possuiu um número de baldios inferior ao de Fontelas, bem como menos (e menos férteis) lameiros; o total das décimas deste lugar dá a entender uma concentração das propriedades maiores e com maior valor nas mãos dos 14 lavradores abastados da povoação. Todavia, na ausência de mais informações sobre o compilador ou compiladores do recenseamento, de momento tais conclusões referentes ao montante e valor da terra não podem passar de mera especulação. Não obstante estas deficiências e possíveis incorrecções, o recenseamento continua a ser uma fonte preciosa para a análise da estratificação económica dentro do campesinato, e dá-nos provas adicionais da continuidade de uma hierarquia social no decorrer do tempo.
18A segunda fonte que nos proporciona informação pormenorizada acerca dos grupos sociais é uma lista de impostos efectuada na freguesia em 1892 — Lançamento Parochial de Impostos Directos e para a Instrucção Primaria para o Anno de 1892. A comparação desta lista de impostos com as décimas anteriores que aparecem no recenseamento eleitoral de 1851 é muito útil. A lista de 1892 foi compilada com o nome de cada contribuinte, naturalidade e rendimento colectável; 18% deste rendimento era pago em impostos ao Estado, enquanto 17% destes 18% constituía o imposto total para a freguesia: daqueles 17%, foi deduzida uma Contribuição paroquial no valor de 14% e uma contribuição para a escola primária no valor de 3%. Como a lista não inclui a ocupação de cada pessoa, confrontei os nomes dos contribuintes com as suas ocupações tal como aparecem no Rol de Confessados do mesmo ano (este documento encontra-se descrito no começo do Capítulo 5). A maioria dos indivíduos incluídos no Lançamento Paroquial pode ser localizada no Rol de Confessados e, porque a aldeia era muito pequena, em 1892 não surgiram quaisquer casos de confusão de duas ou mais pessoas com o mesmo nome. Verificou-se contudo o «desaparecimento» de alguns indivíduos que se encontravam presentes numa das listas mas não na outra; os pontos de interrogação do Quadro 21 indicam, pois, os contribuintes pertencentes à lista de impostos que não se encontram no Rol de Confessados, e que classifiquei dentro do seu provável grupo social, conforme os montantes dos seus rendimentos colectáveis.
19O número de proprietários de Fontelas era um pouco superior em 1892 ao de 1851, mas isto pode ser uma consequência das diferenças de critério dos vários compiladores. Notemos que os proprietários e os lavradores mais abastados eram, nesse ano, responsáveis pela contratação de 17 dos 20 criados da aldeia. Quatro dos proprietários e dois dos lavradores mais abastados foram os únicos indivíduos com rendimentos que provinham de lucros não agrícolas e de rendimento colectável derivado de rendas (Notas b e c do Quadro 21).
20Existia uma certa sobreposição quanto aos valores dos rendimentos colectáveis de cada grupo social, e para o facto não vejo explicação imediata; as categorias dos compiladores poderiam não coincidir com os próprios critérios de diferenciação dos aldeãos. Além disso, também aqui, as actividades compreendidas em diferentes ocupações (lavra, trabalho à jorna) podem ter tido mais significado para estas classificações do que a riqueza fundiária. Por exemplo (como é hoje o caso), em 1892 um jornaleiro com 4 hectares de terra poderia ter pago a mesma contribuição que outro morador que também possuísse 4 hectares, mas este último poderia ter arrendado outros 4 hectares e ter-se tomado assim lavrador, cultivando um total de 8 hectares; no entanto, os dois camponeses poderiam perfeitamente pagar o mesmo montante de contribuição. Por vezes, um proprietário registado no Rol de Confessados aparece listado noutro como lavrador, e vice-versa. Certos indivíduos podem ter mudado de ocupação de um ano para o outro. Além disso, a definição dada pelos próprios habitantes em 1851 acerca das ocupações pode ter sido distinta em 1892, originando assim uma alteração que pode não ser da inteira responsabilidade dos compiladores.
21Tal como acontece com o recenseamento de 1851, esta listagem poderia ser um mau indicador da população total da povoação à época. O Rol de Confessados compreendia 24 casas cujos chefes de família não se encontram na lista de impostos (Quadro 21 ao fundo); do mesmo modo, não foi possível localizar 15 contribuintes no Rol. Para o facto pode haver duas explicações: (a) os contribuintes residindo fora da freguesia poderiam estar compreendidos nos 48 não residentes, ou (b) é possível que algumas das jornaleiras tivessem parcelas de terra tão pequenas que não fossem colectadas.
22Não obstante estes problemas de cruzamento de fontes, as duas em conjunto dão-nos uma aproximação ao total dos bens (principalmente terra) pertencente aos quatro principais grupos sociais. Em 1892, do grupo de jornaleiros saía, uma vez mais, um elevado número de fogos contribuintes (20 de um total de 47), mas apenas 6,8% do rendimento colectável. Em contrapartida, este era de 48,2% para 8 casas de proprietários, no seu conjunto. A continuidade de ocupações e de posse de terras dentro destes grupos pode ser seguida até hoje; por exemplo, em 1892, o padre era coresidente de uma família de proprietário com 6 criados, possuindo esta um total de riqueza colectável no valor de 58 800 réis — parte deste valor provinha do arrendamento de casas a outros. Este fogo é hoje o da herdeira única, D. Elvira. A casa de lavrador, com uma riqueza colectável de 90 430 réis, é hoje a do pároco. Se existissem meios pelos quais pudéssemos confrontar as ocupações referidas no recenseamento de 1851 com as da lista de 1892, tornar-se-ia evidente um processo de concentração de terra dentro do grupo dos proprietários; este facto pode perfeitamente ligar-se com o aumento verificado na aldeia, após 1902, do número de jornaleiros (Quadro 12 no Capítulo 5). Entretanto, o grupo de lavradores possuía, em 1892, um rendimento colectável total de 43,7% — muito inferior ao de 1851 (89,5%).
23Se bem que estes processos sejam apenas indiciados por estas séries separadas de dados locais, a lista de impostos de 1892 dá-nos provas suplementares da diferenciação interna dentro do campesinato. Oito casas de proprietário possuíam aproximadamente metade da terra da comunidade, ao passo que 20 casas de jornaleiro não possuíam mais de 1/20. Os contornos da estrutura fundiária sofreram mudanças entre 1851 e 1892, mas a estrutura geral do controlo de terra pelos proprietários e lavradores abastados manteve-se. Em termos globais, o processo parece ter reduzido a dimensão do «campesinato médio» formado pelos lavradores, concentrando mais terra na mão dos proprietários; ou seja, as fontes indicam que, entre 1851 e 1892, a aldeia (em termos relativos) se tornou progressivamente mais polarizada entre os muito ricos em terra e os muito pobres. Embora este processo de possível concentração de terras não possa ser muito bem definido, as duas listas em conjunto revelam a presença de uma marcada hierarquia social no passado.
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