Capítulo 4. A rua como lugar de referência. Identificando domicílios em Lisboa no século xix
p. 65-78
Texte intégral
1À primeira vista a questão da identificação dos domicílios pode aparecer como um problema básico de difusão e de aplicação de regulamentos e de normas administrativas que, pouco a pouco, foram sendo elaboradas, no caso de Lisboa sobretudo ao longo das primeiras décadas do século xix. A lógica geral que conduziu à organização dos espaços urbanos nas grandes cidades europeias desde o fim da Idade Média é globalmente bem conhecida. A rua constitui a principal escala de intervenção1: planos de alinhamento das vias, numeração dos prédios, fixação da toponímia... Em Lisboa foi apenas em 1855 que o governador-civil regulamentou definitivamente o modo de numeração das portas e dos prédios. Tratou-se de uma última advertência. Passada uma longa produção normativa, com efeitos limitados, o edital de 31 de Dezembro de 1855 voltou apenas a expor as diferentes regras respeitantes à numeração das portas e prédios da capital2. As normas visuais – tamanho e posicionamento dos números – e as regras de numeração – servindo o Tejo de referência para iniciar a numeração – já estavam estabelecidas desde meados do século xviii. Mas a aplicação era da responsabilidade dos proprietários, o que ocasionava algumas falhas. Numa portaria publicada em 1843, o Ministério do Reino lembrou o interesse público de uma tal medida. As autoridades administrativas tinham de orientar e fiscalizar a aplicação dos regulamentos: "...sendo a numeração das portas dos diferentes prédios da capital uma medida de polícia preventiva, necessária a muitos ramos de serviço público”3. A definição de regras rigorosas teve por principal objectivo uniformizar modos de identificação para facilitar os usos externos da parte de um visitante ou da administração local. Apesar da ambiguidade da linguagem administrativa oitocentista – fala-se de “números de polícia”, remetendo aqui o termo “polícia” mais para a ideia de administração do que de fiscalização – o controlo social e a necessidade de uma gestão normalizada da vida urbana acabaram por ser objectivos de segundo plano em relação às vantagens em termos de “serviço público” tal como a organização de uma posta domiciliária, evocada na portaria de 1843.
2Assim sendo, a questão da identificação dos domicílios colocou-se de uma maneira mais aguda na medida em que os actores da vida urbana se iam diversificando. Visitantes, novos residentes, turistas, comerciantes estrangeiros... a cidade moderna aparece como um meio aberto que tem de ser sempre acessível para todos os utentes. A minimização do tempo de aprendizagem assegura a “produtividade” e uma boa funcionalidade do espaço urbano (Gourdon, 2005: 24)4. No prólogo do Itinerário Lisbonense de 1804 – um dos primeiros roteiros sistematizados das mas de Lisboa – é assim apontada a necessidade de reconhecer e identificar as ruas, becos, calçadas, praças e os lugares mais conhecidos para “utilidade, uso e comodidade dos estrangeiros e nacionais”5. Já temos aqui indícios da relação existente entre identificação dos domicílios e evolução geral das sociedades urbanas.
3Na realidade, a procura de uma uniformização dos modos de identificação nem sempre se traduziu na elaboração de sistemas estáveis que tivessem imposto regras douradoras. Até mesmo a toponímia fica dependente de usos incertos. Em Lisboa a permanência do topónimo Rossio para designar a praça oficialmente nomeada, desde 1836, Praça de Dom Pedro IV, pode ser entendida como indício de conflitos entre diferentes representações e práticas da centralidade urbana (Castilho, 1937 [1889]). A toponímia é uma peça central do léxico urbano que resulta das evoluções complexas e descontínuas dos usos, das funções e das sensibilidades (Huetz de Lemps, 1998). Um mesmo espaço pode ser identificado com diferentes designações, as quais reencaminham para referências sociais, culturais ou temporais específicas. Por isso a análise da toponímia permite também assinalar usos sociais do espaço urbano.
4A primeira questão que gostaria de colocar aqui é em que medida os endereços individuais ou os modos de declaração das moradas podem ser considerados como objecto de estudo histórico. O silêncio dos historiadores sobre esta questão poderia ser um sinal de alerta. Existe sempre o risco de se ter apenas encontrado um assunto demasiado restrito, afinal sem grande interesse e que teria tudo do mauvais sujet (Saunier, 1996). A resposta à mera questão “onde mora” implica situar-se pessoalmente no espaço físico da cidade, ou seja, escolher referências toponímicas (um nome de rua ou de sítio, oficial ou de uso corrente), categorias espaciais que podem ou não corresponder a categorias administrativas (o concelho, a paróquia, a freguesia ou, pelo contrário, uma rua, um largo, um pátio). Implica também situar-se num lugar, isto é, num espaço social e afectivamente investido (Lousada, 2005). Parece óbvio que não existe uma resposta única a esta questão. A variabilidade das respostas abre novas perspectivas para este estudo, estabelecendo uma ligação estreita entre o modo de declarar ou identificar um domicílio e o meio social envolvente.
5A morada dos indivíduos pode ser vista como um sinal de identificação socialmente construído. E o ponto de encontro entre modelos normativos estandardizados (um nome de rua, um número de porta ou de andar) e lógicas de tipo comunitário pelas quais a identificação do domicílio revela, em certa medida, modos de viver ou habitar a cidade. De uma maneira geral, é necessário compreender como se conjugam lógicas normativas que se vão reforçando ao longo do século xix e lógicas relacionais que permanecem. Cruzando estas diferentes perspectivas e olhares sobre a cidade, cheguei à conclusão de que não houve um processo contínuo e regulado que teria conduzido a uma normalização cada vez mais acentuada das referências espaciais em Lisboa. Várias lógicas ou sistemas de identificação coexistem ao longo do século. A recepção dos quadros normativos ou regulamentares foi irregular, incompleta e diferenciada em função dos espaços, dos meios e das situações. A rua impõe-se como um sistema onde interagem diferentes componentes das sociedades urbanas. A variação dos modos de identificação dos domicílios em Lisboa no século xix pode dar conta dos pontos de equilíbrio provisórios deste sistema. Testemunha ainda a diversidade e a evolução dos modos de habitar a rua, isto é, de investir ou de praticar um lugar (Stock, 2004). E aqui que se situa o meu objecto de estudo.
6Limitando o meu estudo à Lisboa do século xix corro o risco de ter de sobreinterpretar informações frágeis ou parcelares. Este tipo de investigação, que toca na análise de elementos de identificação individual, é geralmente concebido numa longa duração. Beatrice Fraenkel estudou, por exemplo, como a assinatura, entre os séculos vi e xvi, foi a pouco e pouco sendo reconhecida como sinal de identidade (Fraenkel, 1992). Este longo processo testemunha a variação em função das épocas, dos lugares e das culturas, de noções tão problemáticas como a identidade, o indivíduo, os sinais ou as características de identificação. Uma outra abordagem possível seria a perspectiva comparada. Seria, por exemplo, possível comparar os modos de identificação dos domicílios em diferentes cidades, em contexto sociais ou culturais bastante diferenciados. No Japão, por causa de uma unificação relativamente tardia das grandes áreas urbanas, foi elaborado um sistema complexo de sinalização onde as vias públicas e as casas privadas disputam o papel de principal referência de identificação. Os nomes de casas acabam por ter uma função quase tão importante como os nomes de rua (Takeshi, 2005). O ritmo do crescimento urbano, a adaptação da rede de vias públicas às novas funções e às novas actividades, a evolução do modo de ocupação do território urbano, as formas de propriedade ou, numa palavra só, a história de cada cidade ou de cada agregado urbano, reflectem-se na lógica adoptada para a identificação dos domicílios.
7Deixando de lado a longa duração e a perspectiva comparada, proponho seguir uma metodologia um pouco diferente que repousa na confrontação entre várias escalas de análise. O enunciado da morada de um indivíduo, ao contrário do que ocorre com a assinatura, não tem de ser necessariamente invariável e, em grande medida, não resulta de uma escolha pessoal. As zonas de negociação entre factores individuais – a relação pessoal com o espaço de residência ou com o meio social de vida – e factores colectivos – a organização do espaço urbano, os regulamentos municipais – constituem o meu principal ponto de observação. Diferentes olhares sobre a cidade têm de ser confrontados. Mas onde buscar esses olhares? Tais processos deixaram de facto poucos vestígios nos arquivos. Duas actividades administrativas tiveram, no entanto, um papel importante na difusão de práticas homogéneas neste domínio. A organização da posta diária em Lisboa e a redacção dos registos paroquiais na ocasião de um nascimento aparecem como dois momentos onde se colocou claramente a questão da identificação dos domicílios pessoais. Estas duas actividades são, segundo modalidades bastante diferentes, peças do processo de construção de um Estado liberal moderno que procura intervir em todo o território através de práticas uniformizadas. Todavia, o modo de recepção e de aplicação de tais medidas está também dependente das características dos meios sociais locais6.
8Coloco em evidência relações entre processos conexos que actuam em contextos e escalas diferentes. Posso assim cruzar fontes, escalas de análise, situações ou posições sociais: as declarações registadas nos registos paroquiais mas também os debates no seio da administração portuguesa; as práticas administrativas nacionais ou locais e os comportamentos individuais; a atitude dos habitantes, dos administradores ou dos visitantes.
Normas e práticas: a organização da posta domiciliária
9Nas primeiras décadas do século xix houve várias tentativas de organização da posta domiciliária – ou posta diária – em Lisboa. Um primeiro regulamento é publicado em 18017. Instaura-se um serviço reservado aos assinantes. A organização da posta domiciliária é um projecto ambicioso que pressupõe resolver, pelo menos, dois tipos de dificuldade. A primeira refere-se ao encaminhamento do correio, de uma maneira rápida e segura, através de uma organização administrativa integrada. A segunda, na outra ponta da cadeia, prende-se com a identificação e a localização dos destinatários das cartas. Interessa-me aqui apenas o problema da identificação dos domicílios das pessoas a quem era dirigida uma correspondência. Não se trata de um problema marginal. Obviamente, até aos anos 1830, um grande conjunto de questões é debatido: o circuito seguido pela correspondência, o sigilo da correspondência, a remuneração dos carteiros, a frequência da distribuição, etc. Todavia, a questão da identificação dos domicílios e, mais especificamente, do reconhecimento do espaço urbano aparece como essencial. Ocupa um lugar importante, tanto nos regulamentos sucessivos – em 1801,1821 e, também, um projecto de regulamento redigido em 1817 – como nas correspondências administrativas conservadas no Arquivo da Fundação Portuguesa das Comunicações e que dizem respeito ao período de 1817 até 1836.
10A principal inovação da administração dos Correios é a divisão da cidade em distritos – 17 distritos em 1801, 18 em 1821 – que se impõem como os quadros territoriais de referência para a organização do serviço. Como era fácil de prever, a noção de “morada” não beneficia de uma definição clara nestes textos sucessivos. Na realidade, nunca foi expressamente encarada a ideia de transformar a “morada” ou o “endereço” numa verdadeira categoria administrativa que tivesse servido, entre outros, para a identificação dos habitantes da cidade8. Em 1801 a pessoa que quiser “as suas cartas em casa” mandará “declarar o seu nome, rua e distrito em que reside” (artigo 5.°). O projecto de regulamento de 1817, que nunca chegou a ser aplicado, produz uma definição mais completa: as cartas têm de estabelecer no subscrito “nome da rua, travessa ou beco, número da porta, e o nome do bairro ou sítio em que se achar a rua, não sendo a rua das mais principais e conhecidas, na falta do nome do bairro ou sítio tentará declarar o nome da praça, igreja, ou rua, mais conhecidas que lhe fica na vizinhança” (artigo 9.°). O regulamento de 1821 usa pela primeira vez a palavra “morada” [“todas as cartas que trouxerem no sobrescrito a morada das pessoas a quem vierem dirigidas serão (...) immediata e pontualmente entregues nas mesmas moradas...” (artigo 2.°)] sem especificar os diferentes elementos que nela devem figurar.
11Se a rua – e as suas derivações (o beco, a travessa...) – aparece naturalmente ao lado do nome do destinatário, como o elemento central que constitui a morada, a administração dos correios tenta também tirar partido das outras unidades territoriais já preexistentes e mais ou menos interiorizadas nas representações tradicionais da cidade (os bairros, os sítios) ou, pelo contrário, criadas para o efeito numa perspectiva claramente funcional (os distritos postais). À partida, o papel hegemónico da rua não é assim tão óbvio. É pelo menos discutido. Nos diferentes documentos elaborados entre o fim do século xviii e o início da década de 1830 encontram-se indícios de uma hesitação entre vários modos e escalas de apreensão do espaço urbano. Diferentes níveis de territorialização da cidade estão presentes nos textos regulamentares e cada um deles corresponde a sistemas específicos de reconhecimento e de orientação espacial. No entanto, a “rua” acaba geralmente por ser eleita como o espaço de referência. Nas formulações das moradas é o único elemento de identificação que designa propriamente um espaço da cidade. Os números dos distritos não são referidos e o bairro de residência raramente consta nestas formulações9.
12Para estabelecer regras gerais que permitam um bom funcionamento do serviço em todo o território da cidade, a administração dos correios adopta dois tipos de estratégia. A primeira está explícita e claramente exposta nos regulamentos ou nos diferentes textos produzidos pela administração dos correios. Prende-se com o reconhecimento do espaço da cidade: isto é, com a transformação das formas urbanas em sítios identificáveis à distância, sem recorrer às informações que circulam entre vizinhos ou habitantes de um mesmo bairro ou de uma mesma zona da cidade.
13Como já referi, a regulação para o estabelecimento da pequena posta de 1801 estabelece o princípio da divisão da cidade de Lisboa em distritos. O primeiro efeito destes cortes espaciais é o de constituir uma hierarquização entre os espaços urbanos, favorecendo os bairros centrais no acesso à distribuição domiciliária. No projecto de regulamento de 1817 o serviço abrange também parte do subúrbio da capital mas com algumas restrições: apenas nos sítios que “se acham numerados” e que ficam ao sul de uma linha que passa por Beato, Arroios, Sete Rios, a tapada de Alcântara e o convento de Belém (artigo 10.°). O regulamento de 1821 cria de facto uma desigualdade de tratamento entre os 9 distritos “do interno” e os 9 “da extrema”. Esta desigualdade justificada pelas características demográficas dos espaços em questão – os distritos periféricos são geralmente menos povoados – é reafirmada a cada etapa da organização da posta diária. Nos distritos da periferia são inferiores os números de caixas ou depósitos previstos para receber as cartas e os números de “correios volantes” em serviço. A diferença de trato fica também simbolicamente registada nos códigos associados a cada distrito. Os distritos “internos” são identificados pelas nove primeiras letras do alfabeto e os da “extrema” com a letra repetida do distrito interior a que correspondem (AA; BB; CC; DD...) (artigo 8.°). Estes códigos eram utilizados para marcar os sacos, chaves e todos os instrumentos de trabalho pertencentes a cada um dos distritos.
14A história urbana raramente se interessou pelas lógicas sociais e políticas subjacentes às operações de divisão administrativa da cidade (Silveira, 1997)10. No caso das administrações dos correios, a introdução de distritos tem sobretudo por objectivo assegurar um melhor serviço. É difícil falar aqui de controlo social ou de vontade de fiscalização do território (Loschak, 1978). Os distritos postais são instrumentos funcionais que racionalizam a relação com o espaço sem excluir, dentro de perímetro de intervenção, nenhuma zona da cidade. Todavia, as operações de divisão administrativa não são necessariamente mecânicas. Os distritos postais pensados no início do século xix adoptam e fortalecem representações específicas da centralidade urbana. Como a maior parte das unidades administrativas, referem-se também a configurações sociais e espaciais já existentes (Saunier, 1996). Por fim, ampliando um pouco o objecto de estudo, podemos sugerir que uma unidade administrativa altamente especializada, tal como o distrito postal, pode também, na longa duração, fornecer sinais de identificação por vezes utilizados para reivindicar a pertença a um mesmo lugar11.
15Se a divisão da cidade em distritos aparece logo como uma peça central do dispositivo elaborado pela administração dos correios, a utilização das formas urbanas preexistentes, ou dos recursos que a cidade oferece, é mais hesitante e aproximativa. O regulamento de 1801 contém em anexo um Roteiro dos 17 distritos de Lisboa. Estamos aqui numa fase de invenção ou de construção de um modelo. No procedimento de identificação do espaço urbano, a rua e, geralmente, a rede de vias públicas (travessas, becos, largos, praças, etc.) são postas em concorrência com outros elementos de referência: igrejas, conventos, palácios, quartéis, chafarizes, locais de acontecimentos históricos, residências de personagens famosas, entre outros. A identificação faz-se com a ajuda das formas urbanas, mas também dos usos reconhecidos dos espaços ou de uma memória partilhada. Identificam-se, antes de tudo, lugares onde se misturam referências formais e vivências. A cidade ainda não corresponde a um espaço coerente e contínuo. Uma das designações mais comuns neste roteiro é “sítio”: mais de cem estão referenciados. Até o Chiado é classificado como “sítio”. E o que são estes sítios senão “vestígios derradeiros de sucessivas, seculares e não menos desordenadas conquistas feita pela população crescente aos terrenos imediatamente adjacentes ao primitivo âmbito da cidade” (Brito, 1935: 213)? Estes “sítios” são pontos isolados, independentes uns dos outros. Pelo contrário, as “ruas” vão constituindo redes quase ininterruptas de referências, cobrindo a cidade toda: uma rua desemboca sobre outra rua; consegue-se atravessar a cidade, andando de rua em rua (Vidal, 2007).
16Em 1817 a subdirecção dos correios elabora um novo documento denominado “Ruas, travessas, becos, classificados como tais com a identificação do número do districto a que pertencem”. Trata-se de uma lista com ordem alfabética das vias públicas classificadas em três categorias: ruas; travessas; e becos, largos, praças e todos os mais sítios. Nesta altura as vias públicas – as ruas – já prevalecem como pontos de referência. No entanto, um outro documento contém uma lista dos “sítios, conventos, quintas que não têm numeração do número do districto a que pertencem”. Surge aí uma outra cidade, mais caótica. Cerca de oitenta categorias de formas ou objectos urbanos são registados: alto, arco, casal, chafariz, colégio, convento, fonte, forno, forte, hospital, jardim, horta, igreja, ermida, pátio, quinta, sítio, vale, etc. As ruas e outras vias públicas não estão ausentes desta segunda lista – figuram 12 ruas, 18 travessas, alguns becos, calçadas e estradas – mas trata-se apenas de vias não numeradas. Desapareceram as referências aos acontecimentos ou às residências de personagens famosas. Todavia, cada elemento desta segunda lista possui uma presença original no espaço urbano e, em larga medida, conserva um carácter singular que não abre possibilidades de categorização ou de ordenação. São peças únicas.
17Estes dois documentos, conservados em anexo de um projecto de regulamento, atestam a duplicação do sistema de orientação no seio do espaço urbano. Estas duas listas têm estatutos bastante diferentes. Não apenas um simples inventário de vias públicas, como também, para retomar a tipologia elaborada por Jack Goody, uma lista retrospectiva que regista usos sociais que se construíram numa longa duração (Goody, 1977). Este processo enquadra-se num movimento mais geral de diferenciação das imagens associadas à cidade. Já está feita a distinção entre, por um lado, roteiros ou guias que oferecem um instantâneo da organização espacial da cidade, dando a ver a diversidade das referências possíveis, e, por outro lado, documentos, geralmente de uso administrativo, onde está consagrado um número limitado de normas com finalidades específicas. De um lado, a cidade como espaço simbólico, do outro, a cidade como espaço gerido (Lepetit, 1988: 70). Nos seus discursos a administração dos correios refere-se sistematicamente a este esforço de gestão do espaço urbano. Ainda em 1833, João de Sousa Pinto de Magalhães, subinspector-geral dos Correios e Postas do Reino, escreve ao secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros para salientar a necessidade “de estabelecer a divisão da cidade em círculos e a subdivisão desses em distritos” e de ter um boa planta da capital que “aponta com exactidão todas as ruas e praças dela”12.
18A segunda estratégia adoptada pela administração dos correios para implementar um bom funcionamento do serviço não chega a ser enunciada. Várias disposições dos regulamentos apostam na identificação das residências com base nos conhecimentos interpessoais. Esta estratégia, cujas marcas estão disseminadas no seio das várias disposições regulamentares, aparece, antes do mais, como uma prática que acaba por ter uma importância essencial na organização quotidiana do serviço. Porém, nas séries de escolhas inerentes ao processo de organização da posta diária, existem lógicas interligadas. Seria um erro opor práticas e normas e estabelecer um processo linear onde as práticas informais se iriam pouco a pouco afastando em relação ao que nós, hoje em dia, consideramos ser regras formais.
19De facto, nos três textos regulamentares redigidos durante as primeiras décadas do século xix, a questão da identificação dos domicílios é tratada de três maneiras distintas. Em 1801 esta questão não tem grande relevo. As pessoas interessadas pelo novo serviço têm de declarar a sua residência. Estamos aqui numa relação directa, sem intermediários. O vocabulário é ainda impreciso: fala-se de casa e não de domicílio. A identificação está assegurada através de uma declaração com todas as possibilidades de ajuste que este processo supõe.
20Em 1817 já não existe esta declaração prévia. Qualquer pessoa pode receber cartas no seu “domicílio”. Este projecto de regulamento é bastante lacónico. Nada diz sobre os intermediários (os carteiros). Mas já vimos que, pela primeira vez, é definida a noção de endereço. A rua impõe-se formalmente como principal referência, apesar de existirem ainda possibilidades de utilizar outros elementos como as igrejas ou outra vias vizinhas. Mas é apenas um recurso.
21Finalmente, o regulamento de 1821 reforça as duas lógicas de identificação dos domicílios: as que se referem a normas válidas para toda a cidade e as que repousam sobre jogos relacionais, a pequena escala. Pela primeira vez, fala-se de “morada” das pessoas. Mas esse texto dá também uma grande relevância ao papel do “correio volante”, o carteiro. São cuidadosamente enunciados critérios precisos para exercer a função: saber ler e escrever, ter boa reputação e conhecer o distrito onde se vai exercer a profissão. O candidato tem de apresentar atestados que provem a sua boa reputação, ou seja, a sua lealdade e os seus bons costumes. Sobretudo tem de morar no distrito onde quer exercer a actividade. Conhecer pessoalmente os habitantes e os seus domicílios é uma condição prévia. Na história da posta domiciliária em Portugal, trata-se de uma disposição transitória que, sem dúvida, reflecte uma percepção historicamente datada do universo urbano13. Nos primórdios da instauração deste novo serviço administrativo, o carteiro tem obviamente de conhecer o espaço formal da cidade, mas também o meio social onde vai exercer a sua actividade. Esta maneira de pensar nunca é tão clara como quando se trata de evocar a organização dos giros. Na verdade, este ponto não é objecto de grandes comentários, pois tudo é deixado à livre interpretação dos “correios volantes” que entregam as cartas segundo “a ordem que mais convém ao seu distrito e que só eles bem conhecem”14. As lógicas relacionais intervêm também a outro nível. Caixas para a recolha das cartas são colocadas em lugares estratégicos da cidade. Estas caixas ficam sob responsabilidade das lojas que “gozam de mais crédito”, com preferência para a mercearia do bairro. A intervenção dos habitantes de cada distrito postal é, portanto, solicitada.
22Os modos de identificação dos domicílios vão variando porque são também variáveis os modos de pensar e de representar a cidade. As disposições regulamentares e a organização quotidiana da posta domiciliária implicam ajustamentos na percepção e no uso do espaço urbano. Lisboa desdobra-se entre a cidade dos distritos e a cidade dos giros. A primeira reduz-se integralmente a um número limitado de unidades espaciais. A segunda organiza-se no quotidiano, em função das situações e dos encontros. A cidade das ruas – aquela do roteiro de 1817 – é então um compromisso entre o espaço gerido e o espaço vivido. Desta análise das práticas elaboradas através da organização da posta domiciliaria, sobressai a ideia de que a velha oposição entre a rua como elemento físico de constituição da cidade ou como facto social – de um lado a via pública e os prédios e do outro os habitantes e os transeuntes – nem sempre parece pertinente. A rua aparece aqui, antes do mais, como um lugar de negociação entre vários interesses e hábitos.
Recepção, negociação e usos personalizados
23Estudar a recepção dos quadros regulamentares que pouco a pouco impuseram um modo de identificação dos domicílios é uma tarefa difícil. O silêncio das fontes é cada vez mais pesado quando se procura distinguir situações locais à escala de um bairro, de uma rua, ou até de um prédio. Parece óbvio que, fora de qualquer constrangimento administrativo, os modos de identificação dos domicílios são ainda mais variáveis e personalizados. Falta saber qual é o significado de tais fenómenos do ponto de vista da história da sociedade lisboeta.
24Avançando um século, e afastando-me um pouco do meu campo cronológico, vou passear do lado da Alfama do fim da década de 1930. O meu guia é o fecundo novelista Eduardo de Noronha (Noronha, 1939). No início de Alfama. Gente do Mar um “mareante” recentemente desembarcado inquire sobre o paradeiro de uma tia. Interpela transeuntes do lado do Largo de São Rafael. Apesar de não ser completamente forasteiro – “nascido na Rua do Salvador e baptizado nesta freguesia” – confessa ter dificuldade em encontrar o seu caminho “nestes cachopos, por meio dos quais [navega] de cerração fechada e de bitácula apagada, sem ver bóia à proa” (Noronha, 1939: 21-22). Passo a citar um fragmento de um diálogo particularmente curioso com um embarcadiço, velho habitante de Alfama:
“– Venho à cata de uma tia que morava para as bandas de Santa Engrácia.
– Não se lembra do nome da rua?
– Era uma ladeira como a das ondas quando se crispam em serras.
– Calçada do Cascão?
– Parece que sim.
– Como se chamava a sua tia?
– Inácia de Jesus.
– Não assim só pelo nome, de uma forma tão vaga, não é fácil conjecturar coisa de valia...” (Noronha, 1939: 21)
25Elementos precisos e concretos como o nome e a rua de residência parecem de pouca utilidade: são considerados “vagos”. A conversa prossegue em torno de algumas velhas histórias de vizinhança. Aí, faz-se luz. A tia era uma conhecida da mãe do embarcadiço. Este tipo de cenas “castiças” abunda na literatura popular da viragem do século, influenciada por representações tradicionais de Lisboa15. A imagem dos bairros populares é construída através destes discursos que valorizam as sociabilidades tradicionais, o próximo, os entrelaçamentos de relações entre vizinhos e familiares, a pequena escala do bairro ou da rua. Neste contexto social e cultural parece impossível abordar a questão da identificação do espaço urbano e, nomeadamente, dos domicílios, sem ter em conta as pequenas redes de relações interpessoais que estruturam estes meios sociais. Os sinais de identificação normalizados, tal como a morada, teriam então um valor limitado, quando não fossem completados e confrontados com informações elaboradas com base nas vivências locais. Pelo menos, os usos são flexíveis.
26Podemos então formular a hipótese de que, na Lisboa oitocentista, existiam variações nos modos de identificação dos domicílios em função dos meios socais e das situações locais. Os esforços de organização do espaço urbano lêem-se à escala da cidade inteira. Devem ser analisados à luz de um contexto político e social, nacional ou até internacional, singular: o profundo movimento de reorganização administrativa do país impulsionado pelas ideias liberais; a aceleração de processos como a industrialização ou a urbanização em grande escala, que transformam a vivência dos lisboetas. Mas podem ser contrabalançados por ajustamentos que operam numa micro-escala, com ritmos e sentidos próprios e, às vezes, antagónicos.
27Para tentar verificar esta hipótese, analisei um conjunto de declarações nos registos paroquiais lisboetas nas últimas décadas do século xix. Apresento neste texto resultados intermédios de uma investigação de longo curso sobre a sociedade lisboeta do século xix. O objectivo geral é observar e compreender alguns aspectos dos modos de construção das identidades sociais, nomeadamente através de um estudo sistematizado de uma série de declarações nos registos paroquiais. Defendo a ideia de que a diversidade das atitudes dos utentes – os declarantes – em relação aos constrangimentos impostos pelo processo de normalização das práticas administrativas – essencialmente depois de 1859 e da regulamentação do registo paroquial – fornece informações sobre a organização e a estruturação da sociedade lisboeta. Trata-se de analisar sinais de identificação usuais: a morada, o nome, a profissão. De uma maneira geral, o processo de verificação das identidades recai essencialmente sobre as redes de interconhecimento, que permitem certificar o valor das informações declaradas. Os declarantes não têm de provar expressamente a sua identidade16. Faz parte da função dos párocos afirmar formalmente que os conhecem. Na segunda metade do século xix a expressão “aos quais todos conheço e dou fé serem os próprios” conclui a identificação dos pais e dos padrinhos nos registos de baptismo. Estes registos têm então um valor híbrido: contribuem para a construção de uma “identidade de papel” (Kaufmann, 2004) – como o passaporte ou o bilhete de identidade – mas revelam também modos de sociabilização dos indivíduos.
28Passo então a enunciar algumas pistas de reflexão acerca dos modos de declaração das moradas no registo paroquial em Lisboa durante a segunda metade do século xix. Fiz uma primeira aproximação a este tema de investigação com base na análise pormenorizada da redacção de alguns registos paroquiais. Constitui um corpus reduzido de 48 registos de baptismo de três paróquias lisboetas (São Vicente, Mercês e Alcântara), redigidos entre 1840 e 1910. Transcrevi integralmente os primeiros registos dos meses de Janeiro e Junho dos anos 1840, 1850, 1860, 1870, 1880, 1890, 1900 e 1910. Fiz uma análise qualitativa da redacção dos registos, estando atento ao vocabulário utilizado, às formulações e às informações seleccionadas quando se trata de mencionar um lugar de nascimento ou de casamento, ou um domicílio.
29Destaco dois fenómenos importantes. Primeiro, existe claramente um processo de secularização das referências espaciais e dos elementos de identificação presentes nos registos de baptismo, seja pela introdução de um vocabulário administrativo mais neutro, seja pelo abandono de referências antigas. É possível verificar um processo de secularização das categorias administrativas de uso corrente. O “concelho” acaba por substituir a “diocese” e o lugar de nascimento dos pais passa a ser citado em vez do lugar de baptismo. Estas evoluções não correspondem a uma modificação de regulamentos, nem à difusão junto dos párocos de novos modelos ou de novas instruções para a redacção dos registos. As suas consequências são variáveis: o local de nascimento e o de baptismo geralmente coincidem; pelo contrário, a substituição da “diocese” pelo “concelho” conduz a uma alteração significativa do valor da informação recolhida. Difícil é também elaborar hipóteses consistentes no que toca aos factores impulsionadores de tais evoluções: podemos, no entanto, pressupor que os párocos teriam sido provavelmente influenciados pela difusão de novas formas de identificação dos espaços associados à existência de cada indivíduo. Surgem aqui marcas de uma história dos modos de identificação e de classificação dos territórios em Portugal.
30O segundo fenómeno que gostaria de destacar tem a ver com o que se pode designar como “efeitos do meio” (Dutour, 2002: 36). Desde a década de 1840, a morada dos pais está indicada de uma maneira relativamente formalizada nos registos: o nome da rua e o número da porta. Em S. Vicente, a partir da década de 1870, o andar e o número da porta figuram também nos registos. Em Alcântara este tipo de informação aparece mais tarde, na década de 1880. Na paróquia das Mercês, na véspera da I República, as moradas continuam a ser transcritas de uma maneira bastante aproximativa: é relativamente frequente ver referido apenas o nome da rua de residência. Podem ser encaradas várias hipóteses para explicar estas variações que perduram no tempo e que, portanto, não estão apenas ligadas aos hábitos de alguns párocos. A natureza do substrato arquitectónico de cada espaço urbano pode ser um elemento de resposta. Podem existir também distinções entre grupos sociais na maneira de determinar os seus laços com o espaço residencial. Mas podemos igualmente interrogar-nos acerca da influência das formas das redes de interconhecimento sobre essas variações. Onde as redes de interconhecimento são menos cerradas, por se tratar de meios sociais mais abertos, compostos por populações mais móveis, os indivíduos podem ser reconhecidos e identificados com base em elementos objectivos claramente definidos (nome, morada, profissão).
Apontamentos finais
31Um objecto como o modo de identificação dos domicílios permite perceber melhor as relações entre as populações citadinas e o seu espaço de vida. Neste sentido, é sem dúvida um objecto de história urbana. Incita a analisar jogos relacionais e a repensar categorias como o domicílio ou a residência. Tal objecto permite evidenciar processos pouco explorados. Pensar a cidade como um conjunto de “ruas”, organizar e identificar o espaço urbano através de listas de ruas, becos, travessas, avenidas, etc., são operações complexas que revelam uma certa concepção da vida urbana. Nem sempre corresponderam às práticas e aos usos. De uma maneira geral, estas operações estão associadas a uma fase particular da evolução das sociedades urbanas. As designações podem ser discutidas, focando os factores socioeconómicos (a industrialização) ou sociopolíticos (o liberalismo), mas parece óbvio que tal estudo tem de ser encarado numa perspectiva bastante alargada de uma história social do espaço urbano como categoria de percepção e de classificação (Saunier, 1996). Assim sendo, apesar do seu carácter peculiar, o estudo dos modos de identificação dos domicílios permite reencontrar as grandes linhas de força da história urbana.
32No caso de Lisboa, o fim do século xviii e as primeiras décadas do século xix aparecem como um momento-chave em que são elaborados instrumentos – tais como os roteiros – que traduzem novos olhares sobre a cidade e uma evolução nas vivências e nos hábitos. Como interpretar o sentido desta evolução? O que significa a escolha da “rua” como principal elemento de identificação dos domicílios? Através do estudo da organização da posta domiciliária vimos que esta escolha pode corresponder a um compromisso, à procura de um equilíbrio entre diferentes níveis de apreensão e de leitura do espaço urbano. De um ponto de vista funcional, trata-se também de um compromisso entre hábitos e interesses dos forasteiros e dos habitantes, entre factores endógenos e exógenos. O movimento geral de normalização da identificação do território urbano não teve por consequência o total afastamento dos outros modos, nomeadamente das lógicas sustentadas pela história de cada espaço, pelas memórias colectivas e pelas redes de relações. Na realidade, a normalização permitiu sobretudo diminuir os tempos de aprendizagem, segundo a ideia de que a cidade já não pode ser apenas a cidade dos seus habitantes.
Bibliographie
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Notes de bas de page
1 Todas as obras que tratam da evolução dos espaços urbanos acabam por dar conta deste processo. A história da Europa urbana, publicada em 2003, sobre a direcção de Jean-Luc Pinol, contém numerosas referências às formas de aplicação das leis e regulamentos em vários contextos urbanos (Pinol, 2003). Mas são ainda escassos os textos que abordam directamente esta questão. A rua raramente foi considerada como objecto histórico, ao mesmo nível que o bairro, por exemplo. Nos últimos anos o tema surgiu, no entanto, com alguma consistência. Várias publicações apresentam linhas programáticas ou esboços de estudos particularmente aliciantes. O tema das sociabilidades e dos usos do espaço público são os mais presentes, mas a rua é também considerada como sistema urbano que tem a sua própria coerência (Landau, 1992; Garden, 2006; Doumerc, 2005; Larsen & Petersen, 1997; Joyce, 2003).
2 Diário do Governo, n.o 4, 4 de Janeiro de 1856.
3 Diário do Governo, n.o 228, 28 de Setembro de 1843.
4 Esta aprendizagem não se limita ao reconhecimento do espaço (Roncayolo, 2003: 62).
5 Itinerário Lisbonense, 1804, Lisboa, Impressão Régia.
6 E de destacar aqui a importância particular do Registo Civil no conjunto dos debates políticos em Portugal durante a Monarquia constitucional.
7 Este estudo baseia-se essencialmente na documentação do Arquivo da Fundação Portuguesa das Comunicações [AFPC1 e, nomeadamente, nas informações contidas no dossiê: “Documentos relativos ao estabelecimento da posta diária, distribuição domiciliaria e apartados (1817-1836)”.
8 A questão da transformação da noção de residência em categoria administrativa aparece também ao longo da segunda metade do século xix quando foram elaborados diferentes instrumentos de contagem ou de identificação da população, tais como os censos e os registos paroquiais. E a distinção entre “população de facto” e “população de residência habitual” presente nos censos do fim do século. Esta mesma distinção aparece em algumas formulações dos registos paroquiais e, depois de 1911, civis (Vidal, 2006: 159-162).
9 Sobre este ponto as fontes não são completamente esclarecedoras (Morato, 1995).
10 Em contexto urbano as contribuições mais aprofundadas limitam-se a cartografar as evoluções das unidades espaciais (Alves, 2004).
11 Um fenómeno observável por exemplo na cultura hip-hop, hoje em dia (Rérat, 2006). Nos países ocidentais é apenas na segunda metade do século xx, e em Portugal no fim dos anos 1970, que o código postal é formalmente instituído, paralelamente à mecanização da triagem do correio (Scheele, 1970).
12 “Carta”, 26-10-1833, em “Documentos relativos ao estabelecimento...”, op. cit., AFPC.
13 Esta disposição não figura nos regulamentos posteriores. Ver por exemplo: Reforma Postal. Decreto de 27 de Outubro de 1852 e Regulamento para a sua execução, Lisboa, Imprensa Nacional, 1853.
14 “Relatório do Subinspector-Geral dos Correios”, 6-11-1833, “Documentos relativos ao estabelecimento...”, op. cit., AFPC.
15 Ver, por exemplo, na mesma época, os romances de Armando Ferreira. E para o fim do século xix, os de Gervásio Lobato.
16 O Regulamento do Registo Paroquial de 1859 obriga à apresentação de documentos “irrecusáveis” apenas no caso de “procuração” e nomeadamente para o casamento de menores, na ausência de “superior legítimo” (artigos 12.°el4.°).
Auteur
Historiador, Centro em Rede de Investigação em Antropólogia (CRIA / ISCTE-IUL), professor da Universidade Autónoma de Lisboa.
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