A recordação e o lugar
A construção da memória dos espaços na IVª Crónica Breve de Santa Cruz de Coimbra
Résumés
Procuramos neste estudo evidenciar a questão da construção da memória dos espaços e da sua manipulação discursiva no processo de elaboração de uma crónica medieval. Propomo-nos, para isso, a observar e analisar as funções das referências a espaços no processo de construção do discurso da chamada IVª Crónica Breve de Santa Cruz de Coimbra. Conhecendo a possível origem dos elementos em que esta crónica se terá baseado, o contexto em que terá sido redigida ou copiada e a sua relação com outras fontes narrativas, esta afigura-se como um laboratório de grande importância para a compreensão das formas de construção da memória letrada em meados do século XIV. Pretende-se, assim, traçar uma visão de conjunto em torno da importância do elemento espacial na construção dessa crónica, questionando a possível influência que a sua manipulação terá exercido no processo de elaboração do discurso e analisando igualmente a influência que esse discurso poderá ter recebido da conjuntura em que terá sido redigido ou copiado. Procuramos, desta forma, não apenas fornecer alguns elementos para uma análise global da crónica, mas também contribuir para ampliar a compreensão acerca da importância da espacialização e da sua utilização na construção da memória letrada medieval.
In this study we seek to highlight the issue of the construction of the memory of spaces and their discursive manipulation in the process of elaboration of a medieval chronicle. We propose, therefore, to observe and analyse the functions of references to spaces in the process of construction of the discourse of the so-called 4th Brief Chronicle of Santa Cruz de Coimbra. Knowing the possible origin of the elements on which this chronicle has been based, the context in which it has been written or copied and its relation with other narrative sources, it seems a laboratory of great importance for the understanding of the forms of construction of written memory in the middle of the fourteenth century. Our aim is to draw an overview of the importance of the spatial element in the construction of this chronicle, questioning the possible influence that its manipulation had exerted in the process of elaboration of the discourse and also analysing the influence that this discourse may have received from the context in which it was written or copied. In this way, we seek not only to provide some elements for an overall analysis of the chronicle, but also to contribute to broadening the understanding of the importance of spatialization and its use in the construction of medieval written memory.
Entrées d’index
Keywords : 4th Brief Chronicle, space, written memory, Santa Cruz of Coimbra
Palavras chaves : IVª Crónica Breve, espaço, memória letrada, Santa Cruz de Coimbra
Note de l’auteur
Este trabalho é financiado por fundos nacionais através da Fundação para a Ciência e a Tecnologia, no âmbito do projeto UIDB/00057/2020
Texte intégral
1Com a edição, em 2008, daquela que terá sido a «primeira crónica portuguesa»1, Filipe Alves Moreira não só apresentava e sistematizava a hipótese de ter existido um texto português anterior a 1282, no qual uma narrativa de Afonso Henriques surgiria junto de notícias de pendor analístico2, mas voltava também a chamar a atenção para um outro texto que lhe está diretamente associado, a chamada IVª Crónica Breve de Santa Cruz de Coimbra3.
2Esse título, comumente empregue para designar aquele texto, tem sido mantido entre os que sobre ele se debruçam e inclusive pelo seu mais recente editor, Fernando Venâncio Peixoto da Fonseca4. Com efeito, também entre os Anais, crónicas breves e memórias avulsas5 do Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra publicados por António Cruz em 1968 a partir de um conjunto de manuscritos conservados na Biblioteca Municipal do Porto, se encontrava um conjunto de quatro «Chronicas breves» que Alexandre Herculano, que lhes havia atribuído o título de «Crónicas Avulsas», apresentara em 1856 no primeiro volume dos Portugaliae Monumenta Historica6. Estas faziam parte de um códice conhecido como Livro das Lembranças, um conjunto de textos e fragmentos narrativos que a oficina claustral dos crúzios, possivelmente preocupada em salvaguardar a memória do cenóbio, agrupara por via da encadernação ao longo do séc. XVI. A compilação dos textos remontava, porém, ao séc. XV, o mesmo século em que as duas primeiras crónicas breves terão sido redigidas ou copiadas7. Os compiladores introduziriam ainda não somente aquela que ficou conhecida como a IIIª Crónica Breve, na sua essência um fragmento da refundição de cerca de 1400 da Crónica Geral de Espanha de 1344, como também a IVª Crónica Breve, de algum modo a mais problemática das quatro pela incerteza da datação e pela possível anterioridade de grande parte do seu conteúdo.
3Não obstante, tal como tem vindo a ser apontado, será anterior à redação original da Crónica de 1344 e, tal como ela, produzida durante o reinado de Afonso IV, possivelmente em data aproximada de 1330 ou 1340, consoante diferentes autores8. Se assumirmos 1340 como a data de produção do texto, a memória mais recente que aí se registava era a desse Rey dom Afomso que foy ao Sallado9, recordando, ainda que apenas de passagem, o confronto das hostes cristãs com o Islão que tivera lugar nesse mesmo ano, conforme fixaram os registos historiográficos desse século e dos seguintes10. Esse local associava-se assim simbolicamente ao filho, Afonso IV, sobre quem nada mais se dizia, mas não ao pai, D. Dinis, de quem laconicamente se guardava a memória do início do reinado, do casamento com a rainha Isabel filha dElRey dom Pedro de Aragam11, do casamento da filha Constança com Fernando IV de Leão e Castela e da sua morte, aos tres dias de Janeiro12 de 1325. Factual ou não, nenhuma outra informação era acrescentada, silenciando-se mesmo o local da sepultura13 sem acrescentar qualquer outra palavra sobre os seus espaços de ação, limitando-se o autor a afirmar que reinara nesse território de Purtugall durante quorenta E çinquo Annos14.
4Por contraste, o mosteiro cisterciense de Alcobaça surgia como o lugar onde se fizera sepultar o seu pai, Afonso III, em 1279, que o cronista recordava como muy boo Rey E muy Justiçosso, acrescentando que manteve sseu Reyno em paz E ssem contenda nem huũa15. Esse é igualmente indicado como o local escolhido para o eterno descanso da Infanta Sancha, de quem se diz que morreu em Sevilha e que seria enterrada juntamente com o pai16. Sobre o rei não se adiantará também muito, exceto que casou com dona Beatriz de Castela e que desta teve descendência, atalhando que reinara por xxxj Annos e sete meses e dez e oito dias17. A fonte apresentara-o antes, como o conde de Bolonha que viera tolher o reino a sseu irmãao18, após as queixas feitas ao Papa pelo bispo de Coimbra, D. Tibúrcio, pelo arcebispo de Braga e por muitos outros que não são identificados19. O relato toma neste ponto como tópico central a entrada redentora de um Afonso III que chega do exterior para organizar o reino que o irmão levava pera mal20, imputando por isso ao próprio Sancho II alguma da responsabilidade. Culpava também, como é sabido, os conselheiros deste, o casamento com Mécia Lopez de Haro e a saída de mandado da Rainha dona Berengária, sua tia, para que deixasse de ser muy boo Rey e de Justiça21. Parecia ser, portanto, a ideia uma saída inglória, de um certo ocaso daquela figura que o autor tentava fazer chegar ao seu auditório. Acrescentava por isso o destino do rei deposto, que seguira para Castela, bem como a indicação que fora inumado no fim da vida na antiga capital do reino visigótico, Toledo22, cidade que embora mantivesse o peso simbólico da memória, funcionava aqui simultaneamente como um lugar de desterro, o símbolo da distância e do esquecimento.
5Tratavam-se, através dessa visão, de dois herdeiros perfeitamente legítimos da Coroa e do espaço português e que não lançavam quaisquer dúvidas sobre a adequabilidade dos seus descendentes na continuação da dinastia. Continuavam, além disso, a expansão do território que Afonso II já lograra conquistar, como recordava a crónica, através da referência à conquista de Alcácer do Sal em outubro de 121723, embora não registe esta data nem nenhuma outra, e aponte apenas outros lugares24, mais retóricos que objetivos. Não deixa, no entanto, de ser interessante reparar como se fazia eco dessa conquista territorial e se silenciavam as dos seus filhos. O próprio casamento com dona Urraca, filha de Afonso VIII, que a fonte não deixava de apontar como o que veençeo a batalha do Muradal25, ou das Navas de Tolosa (como escreverá depois o Conde D. Pedro de Barcelos no seu Livro de Linhagens e na Crónica de 1344) parecia evidenciar-se como um exemplo para a sua prole, onde o texto incluía aquele Infante D. Fernando, senhor de Serpa26, ou a infanta dona Leonor, que foi cassada em 1229 com o filho do Rey das martas, ou seja, da Dinamarca27. A crónica associava-o ainda ao cenóbio alcobacense, onde jaz soterrado em huũa Nonbre capeella que el fez a sua custa28 e local que, como vimos, o filho escolhera também para enfrentar a eternidade.
6Quebrava, nesse sentido, com as disposições do pai, Sancho I, que escolhera Santa Cruz enquanto lugar preferencial para o seu túmulo, mas também da mãe, a rainha Dulce, da sua meia-irmã Constança Sanches e da sua irmã Branca. Seria esse também o local, segundo a crónica, para onde um outro filho de Sancho I, o Infante D. Pedro, Conde de Urgel, teria levado os corpos dos mártires franciscanos de Marrocos29. Com essa indicação, o cronista reforçava a ligação simbólica da Coroa ao cenóbio crúzio, não apenas no sentido da espiritualidade, mas também no plano das relações materiais, fossem elas ficcionais ou não. O mesmo não acontecia, por exemplo, com outros filhos, como Rodrigo Sanches, falecido em 1245 e sepultado no Mosteiro de Grijó30, ou com a Infanta D. Sancha, cujo corpo seria depositado no Mosteiro de Lorvão31. Na narrativa do reinado de Sancho I acrescentava-se ainda a referência linhagística das relações entre a família real portuguesa e a castelhano-leonesa, apontando nesse contexto a batalha do Muradal e as conquistas de Córdova, Sivilha e toda Andaluzia, por Fernando III de Leão e Castela que as filhou a mouros32.
7Mas Santa Cruz era também o espaço que o cronista reconhecia, ou atribuía, como o local de sepultura do quase mítico Afonso Henriques, e que dizia povoada, ou fundada, pelo próprio em tempo que andaua a Eera em mil e çento e seteenta Annos33. Coimbra, de forma geral, é também um dos espaços de ação que o cronista identificava como um dos mais caros ao monarca34. Era essa cidade o palco do conflito com o legado papal que o intimava a libertar a mãe, mas também aquela que, no testamento «oral» com que quase abria a crónica, o Conde D. Henrique pedia ao filho que não perdesse huum palmo, desde Astorga35 até Coimbra. A ligação ao território edificava-se também através da via bélica, das pelejas e dos recontros, contra as tropas partidária de dona Teresa, levando às possíveis conquistas dos castelos de Neiva e da Feira36, em terras de Santa Maria, de Guimarães37, de Ourique38, de Braga, onde o conde D. Henrique pedira para ser sepultado39, ou no famoso caso de Valdevez40, em que a crónica refere que o emperador foi ferido em na perna deestra e foisse a Toledo41, por medo de perder a cidade.
8Mas o universo toponímico de Afonso Henriques era ainda completado pelas conquistas de cidades dominadas pelo Islão. Começando por Santarém42, em 1147, onde se dirigiu com o sei Jrmãao o qual jaz sopultado em na ousia do mosteiro de Alcobaça43, que o próprio rei fundara quando hia filhar a cidade e não depois, como a documentação parece sugerir, através da conhecida carta de doação e couto de 8 de abril 115344. O próprio cronista introduz a contradição, ao dizer que da tornada fez ElRey dom Affomso o Mosteiro, a qual he muy rica abbadia45. Através dessa fundação, numa ou noutra data, até em nenhuma das duas, o cronista ligava o primeiro rei aos seus descendentes através de um espaço sacral. Acrescentava Lisboa46, tomada no mesmo ano e dizendo que aí fez hi huum mosteiro muy rico aa sua custa ou chamom Sam Vicente de Fora47, outro centro da espiritualidade posterior, e o alargamento do território até Évora48, exatamente antes do tantas vezes chamado «desastre de Badajoz»49, local que identificava a falibilidade da eficácia guerreira daquele monarca. Mas, mais do que isso, a introdução desse espaço marcava também uma memória que desembocava num tema que, através da pessoa de Afonso Henriques, exemplificava a possibilidade, sempre em aberto, de que qualquer soberano poderia chegar a estar naquela posição e, no limite, justificando-a.
9Quando, em 1341-1342, se recordavam tantos lugares e se ignorava a parte final do reinado de D. Dinis, o cronista mostrava como as relações espaciais se tornavam mais complexas do que pareceria a uma primeira vista, evidenciando a profunda ligação ao território e aos espaços de particular significado, mas como que admitindo também uma necessidade de justificar e solidificar as extensões da Coroa a todo o espaço. O processo de legitimação e de afirmação do direito régio sobre o território, comum a praticamente toda a Europa, avançava lentamente há mais de um século no reino de Portugal e continuaria a fazer o seu caminho sob diversas vias. Apesar da fixação das fronteiras do reino nas últimas décadas do século XIII, o redator do texto sentia ainda a necessidade, impulsionado talvez pelo soberano, para fixar as fronteiras narrativamente no plano simbólico e memorialístico da crónica.
10Ao contrário da memória mais imediata, marcada por uma intensa incompatibilidade entre Afonso IV e D. Dinis, e talvez demasiado fresca para que pudesse ser fixada pelos cronistas régios, a memória do tempo longo, dos antepassados e das suas relações com o espaço pareceria mais inócua mas, paradoxalmente, mais mobilizadora. Por outro lado, o Conde de Barcelos, meio-irmão de Afonso IV, saberia aproveitar a memória mais recente para difundir a sua conceção nobiliárquica do espaço ibérico50. O filho legítimo de D. Dinis, o mesmo que governava desde 1325 e que em 1340 pudera afirmar o seu lugar na dinastia enfrentando os mouros junto ao rio Salado, por seu lado, assumira a tarefa de garantir que a memória das praças ganhas ao Islão pelos seus antepassados não se perdia, quer o tenha feito antes ou depois desse confronto com as hostes islâmicas. Num ou noutro caso, e quer tenha partido ou não da sua iniciativa, aquele texto procurava evidenciar a sua ligação aos reis guerreiros e assegurar que esta se estabeleceria futuramente, lembrando ao mesmo tempo que esses reis de quem descendia Afonso IV, excetuando o seu pai, haviam andado a la guerra a filhar o reino de Portugal51. O direito ao território começava a garantir-se também por aí. Tal como o meio-irmão, Afonso IV saberia perfeitamente, ou talvez alguém o soubesse por si, que controlar o passado através da escrita significava controlar o presente, e que só controlando o presente poderia controlar o futuro.
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Notes de bas de page
1 MOREIRA, Filipe Alves (2008) - Afonso Henriques e a primeira crónica portuguesa. Porto: Estratégias Criativas.
2 Os argumentos apresentados por Filipe Moreira partem fundamentalmente das hipóteses que CATALÁN, Diego, (1962) - De Alfonso X al conde de Barcelos. Cuatro estudios sobre el nacimiento de la historiografía romance en Castilla y Portugal. Madrid: Gredos, levantou, tanto acerca da existência de um texto produzido antes de 1282 que conteria uma versão da chamada «estória» de Afonso Henriques, como acerca da dependência do texto da IVª Crónica Breve de Santa Cruz de Coimbra em relação a uma Crónica Portuguesa de Espanha e Portugal de 1341-1342 (também conhecida como Crónica Galego-Portuguesa de Acenheiro, uma vez que as suposições sobre a sua existência se baseiam no relato que Cristóvão Rodrigues Acenheiro, também ele autor de uma crónica, faz do contacto com o texto). Nas conclusões do investigador português, o texto do século XIII que conteria essa estória incluiria ainda a base do relato de Sancho II que a IVª Crónica Breve segue. Desse modo, o texto teria sido não só conhecido, mas também utilizado pelo redator do original crúzio daquela «crónica breve» e teria características que o aproximavam do estilo cronístico, sendo por isso o primeiro exemplo de uma crónica medieval portuguesa. Para uma exposição mais detalhada dos argumentos do autor remetemos para MOREIRA, Filipe Alves (2011) - “Um novo fragmento da «Crónica Portuguesa de Espanha e Portugal de 1341-1342» e suas relações com a historiografia alfonsina”. In Ferreira, M. R.; Laranjinha, A. S.; Miranda, J. C. (org.) - Seminário Medieval 2009-2011. Porto: Estratégias Criativas, pp. 289-321; MOREIRA, Filipe Alves (2008) - Afonso Henriques e a primeira crónica portuguesa. Porto: Estratégias Criativas, pp. 17-102.
3 Este texto de carácter breve regista a memória dos sete primeiros reis portugueses. Tem vindo a ser discutida sobretudo a referência à Batalha do Salado, em 1340, por se tratar possivelmente de uma interpolação. Apesar dessa possibilidade, que podemos admitir como bastante provável na senda de autores como MOREIRA, Filipe Alves (2010) – “A historiografia régia portuguesa anterior ao Conde de Barcelos”. In Ferreira, M. R. (coord.) – Cadernos de Literatura Medieval. O Contexto Hispânico da Historiografia Portuguesa nos Séculos XIII e XIV. Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra, pp. 33-51, não nos interessa aqui discuti-la, já que, se o seu valor simbólico não foi instrumentalizado no momento da redação (por omissão), o foi certamente depois. De um ou de outro modo, a memória dos espaços do reino estava em construção tanto em 1330 como em 1340. Que aquela batalha viria reforçar o ideário da nobreza e/ou de Afonso IV, colocando-os como os sucessores legítimos dos reis e cavaleiros da “Reconquista”, como apontamos na nota 10, estamos convencidos que sim. Contudo, essa questão não influencia determinantemente, assim o pensamos, a associação dos outros monarcas, de outras personagens e de vários acontecimentos a outros espaços e à formação da sua memória.
4 FONSECA, Fernando Peixoto da (2000) – Crónicas breves e memórias avulsas de S. Cruz de Coimbra. Lisboa: Edição do autor.
5 Editados em 1968. Utilizamos também a edição Peixoto da Fonseca citada na nota anterior.
6 HERCULANO, Alexandre (1856) - Portvgaliae monvmenta historica. Scriptores: V. 1, fasc. 1. Lisboa: Academia das Ciências.
7 KRUS, Luís (1993a) - “Crónicas Breves de Santa Cruz de Coimbra”. In Lanciani, G.; Tavani, G. (org.) - Dicionário da literatura medieval galega e portuguesa. Lisboa: Caminho, p. 194.
8 Veja-se um resumo da questão, por exemplo, em MOREIRA, Filipe Alves (2010) – “A historiografia régia portuguesa anterior ao Conde de Barcelos”. In Ferreira, M. R. (coord.) – Cadernos de Literatura Medieval. O Contexto Hispânico da Historiografia Portuguesa nos Séculos XIII e XIV. Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra, pp. 33-51, que apresenta e discute os argumentos da crítica, com Lindley Cintra e Diego Catalán a sugerirem a data aproximada de 1340, e o próprio Filipe Moreira a apoiar a hipótese de 1330, já levantada por Costa Veiga. Sobre a importância dessa questão para o nosso estudo, veja-se, supra, a nota 3.
9 CRUZ, António (1968) – Anais, crónicas e memórias avulsas. Porto: Biblioteca Pública Municipal, p. 147; FONSECA, Fernando Peixoto da (2000) – Crónicas breves e memórias avulsas de S. Cruz de Coimbra. Lisboa: Edição do autor, p. 119. Note-se, no entanto, que essa notícia poderá ter sido introduzida numa data posterior à redação original do texto, como já dissemos, o que não deixaria de ser também significativo. Ainda assim, sobretudo dado o contraste entre o destaque que tem Afonso IV na narrativa e a forma como esta parece deixar no esquecimento a figura do seu pai, consideramos verosímil a hipótese de que terá partido de uma iniciativa régia ou de círculos próximos desta (MOREIRA, Filipe Alves (2008) - Afonso Henriques e a primeira crónica portuguesa. Porto: Estratégias Criativas, pp. 91-92), mas não necessariamente em 1340, como afirmámos antes.
10 De resto, no plano simbólico-ideológico e tendo em conta também a apropriação que o Conde de Barcelos faz desse tópico no seu Livro de Linhagens do Conde D. Pedro (1980), ed. por José Mattoso. Lisboa: Academia das Ciências de Lisboa, vol. I, 21G14, (embora aí, como assinalava KRUS, Luís (1994) – A concepção nobiliárquica do espaço ibérico (1280-1380). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian-JNICT, p. 234, se estabelecesse uma distinção. Não se trataria de uma valorização imediata dos monarcas cristãos, mas era antes aos fidalgos castelãos e portugueses que se associava o papel preponderante na manutenção cristã de Tarifa, abrindo a Afonso XI a possibilidade de filhar a praça de Algeciras e com ela garantir o domínio das praças do cabo da Espanha, o que viria a suceder em 1343, após quase um ano de cerco), essa breve referência à batalha do Salado ultrapassaria a mera evocação de um confronto circunstancial entre forças de diferentes credos. Fazia-se da vitória cristã não só uma repetição da vitória de Carlos Martel em 732, em Poitiers, e com isso um travão a um hipotético restabelecimento do predomínio islâmico na Península, mas repetia também o sucesso das Navas de Tolosa (em 1212) e evocava uma certa afirmação da unidade ibérica que parecia repor a possibilidade de se cumprir o destino «libertador e redentor» (KRUS, Luís (1993b) - “Crónica Geral de Espanha de 1344”. In Lanciani, G.; Tavani, G. (org.) - Dicionário da literatura medieval galega e portuguesa. Lisboa: Caminho, p. 190) desse espaço, fragmentado desde a queda da monarquia visigótica, no século VIII, associada em parte ao rei Rodrigo e ao episódio da abertura da casa de Hércules em Toledo (MIRANDA, José Carlos (2016) - “A Crónica de 1344 e a escrita profética”. e-Spania, 25, http://0-journals-openedition-org.catalogue.libraries.london.ac.uk/e-spania/26194). Rui de Pina referiria a esse respeito que Afonso IV fizera aos seus Portuguezes huma falla em que lhes recordava precisamente esse rei visigodo e os esforços dos monarcas portugueses desde Afonso Henriques e seus leays vassallos, & bons cavalleyros na conquista dos territórios que a gora tinhaõ (PINA, Rui de (1936) - Chronica de ElRey Dom Afonso o quarto. Lisboa: Biblion, p. 168). O mesmo tipo de discurso é já referido no fragmento manuscrito do Livro de Linhagens da Biblioteca da Ajuda, do século XIV, onde se refere como a terra da espanha foy perduda por Rei Rodrigo e ganhada pelos mouros (BROCARDO, Teresa (2006) - Livro de Linhagens do Conde D. Pedro. Edição do fragmento manuscrito da Biblioteca da Ajuda (século XIV). Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda, p. 42). São essenciais para a compreensão da importância político-militar e simbólica da batalha, neste âmbito, os estudos de SOUSA, Bernardo Vasconcelos e (1989) - “O sangue, a cruz e a coroa. A memória do Salado em Portugal”. Penélope. Fazer e Desfazer História, 2, pp. 28-48, e de O’CALLAGHAN, Joseph F. (2011) - The Gibraltar crusade: Castile and the battle for the Strait. Philadelphia: University of Pennsylvania Press, pp. 162-188. Note-se ainda que, quer a IVª Crónica Breve tenha sido de facto redigida originalmente junto de círculos próximos da Coroa ou não e quer a informação sobre o Salado tenha sido logo aí incluída numa primeira redação ou acrescentada num momento posterior, será relevante a questão de que esse dado tenha sido introduzido, em tese, para recordar que o rei tinha também desempenhado um papel relevante no confronto contra o Islão, ao lado ou à frente daqueles fidalgos castelãos e portugueses de quem o meio-irmão de Afonso IV registava as linhagens. Num movimento mais arrojado, como também KRUS, Luís (1994) – A concepção nobiliárquica do espaço ibérico (1280-1380). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian-JNICT, p. 311, o refundidor faria depois contrastar a figura de um rei carregado de «naturais incertezas e receios» com a do nobre Álvaro Gonçalves Pereira, mas os processos seriam aí bem distintos.
11 CRUZ, António (1968) – Anais, crónicas e memórias avulsas. Porto: Biblioteca Pública Municipal, p. 147; FONSECA, Fernando Peixoto da (2000) – Crónicas breves e memórias avulsas de S. Cruz de Coimbra. Lisboa: Edição do autor, p. 119.
12 CRUZ, António (1968) – Anais, crónicas e memórias avulsas. Porto: Biblioteca Pública Municipal, p. 147; FONSECA, Fernando Peixoto da (2000) – Crónicas breves e memórias avulsas de S. Cruz de Coimbra. Lisboa: Edição do autor, p. 119. Não deixa de ser interessante reparar como os únicos topónimos no reinado de D. Dinis, além do Salado, se reportam aos reinos peninsulares com os quais se haviam estabelecido importantes laços por via do matrimónio, nomeadamente Castela (através do noivado da sua filha Constança com o rei Fernando IV de Castela) e Aragão (através do casamento do próprio monarca com Isabel, filha do rei Pedro III de Aragão). Essas referências simbolizariam, sem referir as tensões internas com o clero e com o filho, também a relativa pacificação, por via político-diplomática, da relação com os reinos peninsulares durante o período dionisino, mas a própria definição de fronteiras conduzida sobretudo na segunda metade do século XIII, ambas herdadas por Afonso IV (MATTOSO, José (1997) – “1096-1325”. In Mattoso, J. (dir.) – História de Portugal. Vol. 2. A monarquia feudal. Lisboa: Estampa, pp. 128- 133; PIZARRO, José Augusto (2012) – D. Dinis. Lisboa: Temas e Debates, pp. 95-113). No que diz respeito à data da sua morte, contudo, parece ter sido registada de forma incorreta, já que terá falecido a 7 de Janeiro de 1325 e não a 3, com 63 anos (PIZARRO, José Augusto (2012) – D. Dinis. Lisboa: Temas e Debates, pp. 325-327).
13 O lugar escolhido por D. Dinis seria então o mosteiro de Odivelas, que o próprio mandara construir, como se sabe, numa zona onde possuía diversos terrenos (PIZARRO, José Augusto (2012) – D. Dinis. Lisboa: Temas e Debates, p. 177), tendo embora, num primeiro testamento, declarado a vontade de se fazer sepultar em Alcobaça. Isabel de Aragão, de igual forma, escolheria primeiro Alcobaça, num testamento com a data de 1314, e só depois preteriria o panteão cisterciense em favor de Santa Clara de Coimbra quando, em 1327, já viúva, manda redigir de novo o seu testamento (SOUSA, António Caetano (1739) – Provas da História Genealógica da Casa Real Portuguesa. Lisboa, pp. 114-121; ANDRADE, Filomena (2014) - Isabel de Aragão. Rainha Santa, Mãe Exemplar. Lisboa: Temas e Debates., pp. 258-264).
14 CRUZ, António (1968) – Anais, crónicas e memórias avulsas. Porto: Biblioteca Pública Municipal, p. 147; FONSECA, Fernando Peixoto da (2000) – Crónicas breves e memórias avulsas de S. Cruz de Coimbra. Lisboa: Edição do autor, p. 119. O cômputo é correto, uma vez que D. Dinis não chegaria a completar os 46 anos de governação, iniciada a 16 de Fevereiro de 1279, com pouco mais de dezassete anos. A crónica em apreço, porém, afirma de forma contundente que havia, quando compeçou a reinar, XVIII anos. Que, tal como o pai, recebia na crónica aquela intitulação dotada de «carácter territorial» (VENTURA, Leontina (2009) – D. Afonso III. Lisboa: Temas e Debates, p. 178): “rei de Portugal e do Algarve”.
15 A intenção de se fazer sepultar junto de seus pais em Alcobaça data de 1271, ano em que manda lavrar o seu testamento. Viria a morrer somente a 16 de Fevereiro de 1279, em Lisboa, e aí seria sepultado no Convento de São Domingos, que o próprio rei afirmava ter fundado a par do de São Domingos de Elvas, conforme se lê nesse mesmo documento (SOUSA, António Caetano (1739) – Provas da História Genealógica da Casa Real Portuguesa. Lisboa, p. 55). É depois trasladado para o panteão régio alcobacense em 1289, pouco depois da celebração da Concordata que levantava a interdição do reino e que abrandava de certa forma as muitas contendas com a Igreja (VENTURA, Leontina (2009) – D. Afonso III. Lisboa: Temas e Debates, pp. 179-185). Curiosamente, a informação acerca da sepultura em S. Domingos não é transmitida pela cronística do séc. XIV, ou seja, nem pela IVª Crónica Breve, nem pela Crónica de 1419, nem pela refundição de 1400 da Crónica de 1344, mas será recuperada somente mais tarde por PINA, Rui de (1907) - Chronica d'el-rei D. Affonso III. Lisboa: Escriptorio, p. 66) ou LEÃO. Duarte Nunes de (1600) - Primeira Parte das Chronicas dos Reis de Portugal. Lisboa: Pedro Crasbeeck, p. 106). Na preferência por Alcobaça acabaria possivelmente por pesar não apenas o facto de ser a necrópole de seus pais, mas por certo também a importância e influência espiritual que o cenóbio cisterciense ainda mantinha desde os tempos em que havia sido fundado, na segunda metade do século XII, garantindo-lhe uma forma adicional de o ligar aos seus antepassados e legitimar o seu estatuto régio. Era essa ligação que a fonte fazia ao adicionar os termos: E jaz soterado em Alcobaça na capella dos Reis a par de seu padre (CRUZ, António (1968) – Anais, crónicas e memórias avulsas. Porto: Biblioteca Pública Municipal, p. 147; FONSECA, Fernando Peixoto da (2000) – Crónicas breves e memórias avulsas de S. Cruz de Coimbra. Lisboa: Edição do autor, p. 119).
16 Eram ainda referidos como descendentes o rei Dom Donis, a ifante Dona Branca e o ifante Dom Afonso. Embora a crónica faça somente referência à sepultura de Sancha com seu padre, em 1302, em Alcobaça, também aí seria sepultada a rainha Beatriz, sua esposa, em 1303, e lá se encontrariam com o Infante Fernando, falecido em 1262, e o Infante Vicente, cuja data de morte permanece incerta. Uma filha ilegítima do rei, Urraca Afonso, seria ainda sepultada num outro mosteiro cisterciense, São João de Tarouca (o mesmo lugar que escolheria Pedro Afonso, o bastardo primogénito de D. Dinis), ao passo que o Infante Afonso, primogénito de Afonso III, ficaria sepultado no mosteiro de S. Domingos de Lisboa (GOMES, Saúl (1996) – “Os panteões régios monásticos portugueses nos séculos XII e XIII”. In 2º Congresso Histórico de Guimarães. Actas. vol. 4. Guimarães: Câmara Municipal de Guimarães, p. 292). É possível que a referência a Sevilha, associada a essa quarta filha do monarca (sobre quem pouco se sabe, como apontam VENTURA, Leontina (2009) – D. Afonso III. Lisboa: Temas e Debates, p. 254, e PIZARRO, José Augusto (1997) - Linhagens medievais portuguesas: genealogias e estratégias (1279-1325). Porto: Edição do autor, v. I, p. 171, aparentemente deslocada no contexto da exposição narrativa, tivesse partido de uma memória dos redatores que completava a informação acerca do nascimento da mesma Infanta no Livro das Eras (CRUZ, António (1968) – Anais, crónicas e memórias avulsas. Porto: Biblioteca Pública Municipal, p. 76). Mas evocaria também as relações com aquela urbe titular da Andaluzia, a «nova Toledo» (KRUS, Luís (1994) – A concepção nobiliárquica do espaço ibérico (1280-1380). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian-JNICT, p. 234) que Fernando III de Castela e Leão, com bula de cruzada, havia tomado em 1248 (ver AYALA MARTÍNEZ, Carlos (2017) – “Fernando III y la Cruzada Hispánica”. Bulletin for Spanish and Portuguese Historical Studies, 42-1, pp. 23-45).
17 Embora Afonso III faça uso do título régio, tanto quanto sabemos, somente a partir de Março de 1248 (cf. Chancelaria de Afonso III, liv. II, doc. 25), ao longo de 1247 assume já o governo do reino como regedor e «defensor» (VENTURA, Leontina (2009) – D. Afonso III. Lisboa: Temas e Debates, p. 100). O mesmo terá assumido o redator, embora não saibamos em que dados ou documentação se baseou para fornecer uma duração tão precisa em termos de meses e dias. Em todo o caso, terá começado a contagem a 29 de Julho de 1248. Tanto a Crónica Geral de Espanha de 1344 (2009), ed. por Luís Filipe Lindley Cintra. Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda, vol. IV, p. 242, como a Crónica de Portugal de 1419 (1998), ed. por Adelino de Almeida Calado. Aveiro: Universidade de Aveiro, p. 162, arredondam o valor para XXXII annos.
18 CRUZ, António (1968) – Anais, crónicas e memórias avulsas. Porto: Biblioteca Pública Municipal, p. 146; FONSECA, Fernando Peixoto da (2000) – Crónicas breves e memórias avulsas de S. Cruz de Coimbra. Lisboa: Edição do autor, p. 118.
19 A fonte faz ainda a referência à tomada de quantas vilas boas i havia em Portugal por Afonso III, de tal forma que nom ficou senom Coimbra (podemos encontrar exatamente a mesma frase no Livro de Linhagens do Conde D. Pedro (1980), ed. por José Mattoso. Lisboa: Academia das Ciências de Lisboa, v. I, 7C8). Coimbra seria, de resto, a «área geográfica em que se passa o essencial da luta entre os dois irmãos (…), ou melhor, a diocese» coimbrã (VENTURA, Leontina (2009) – D. Afonso III. Lisboa: Temas e Debates, p. 96) e durante o ano de 1246 (e parte de 1247, segundo a mesma autora) o centro das tropas aliadas de Sancho II. Não por mero acaso, já que precisamente a ocupação da sede régia se devera, em parte, ao facto de o referido D. Tibúrcio ser um dos executores do mandato apostólico para a deposição do monarca. Sobre a participação nesse processo de D. Tibúrcio e do arcebispo de Braga, D. João Viegas de Portocarreiro, ver VENTURA, Leontina (2009) – D. Afonso III. Lisboa: Temas e Debates, pp. 88-90, e FERNANDES, Hermenegildo (2010) – D. Sancho II. Lisboa: Temas e Debates, pp. 334-336.
20 CRUZ, António (1968) – Anais, crónicas e memórias avulsas. Porto: Biblioteca Pública Municipal, p. 146; FONSECA, Fernando Peixoto da (2000) – Crónicas breves e memórias avulsas de S. Cruz de Coimbra. Lisboa: Edição do autor, p. 118. CATALÁN, Diego (1962) - De Alfonso X al conde de Barcelos. Cuatro estudios sobre el nacimiento de la historiografía romance en Castilla y Portugal. Madrid: Gredos, p. 282, notou o facto de a IVª Crónica Breve se interessar mais por justificar a deposição, focando as razões para tal e libertando-se dos escolhos que de alguma forma pairavam sobre a imagem do monarca, do que confirmar os estereótipos de um mau rei. A representação dessa deposição e a imagem de Sancho II tem sido, de resto, amplamente estudada sob vários pontos de vista (FERNANDES, Hermenegildo (2010) – D. Sancho II. Lisboa: Temas e Debates, pp. 320-330; MOREIRA, Filipe Alves (2012) - “‘E des ally foi pera mall’ – o reinado de D. Sancho II na cronística medieval portuguesa”. Revista Diálogos Mediterrânicos, 3, pp. 160-171; VARANDAS, José (2003) - “Bonus Rex ou Rex inutilis: as periferias e o centro (redes de Poder no reinado de D. Sancho II (1223-1248)”. Lisboa: FLUL. Tese de Doutoramento, pp. 231-412).
21 CRUZ, António (1968) – Anais, crónicas e memórias avulsas. Porto: Biblioteca Pública Municipal, p. 146; FONSECA, Fernando Peixoto da (2000) – Crónicas breves e memórias avulsas de S. Cruz de Coimbra. Lisboa: Edição do autor, p. 118.
22 Essa associação à antiga cabeça da monarquia visigótica parece algo a que poderíamos chamar uma simbologia factual e ao mesmo tempo inversa. Por um lado, afastado da governação, será rei sem reino. Como antes dissemos, Afonso III só chegará a fazer uso da titulatura régia depois do seu irmão, a 30 de Janeiro de 1248. A referência à antiga capital dos Godos era praticamente vazia de sentido, ao contrário da simbologia que a deposição do corpo na catedral de Toledo clamava, para mais ao lado de um seu antepassado – Afonso VII de Leão e Castela –, ligando-o não só à sua linhagem, mas acrescentando-lhe também a associação à herança dos godos e a um passado “total” da Hispânia, já que aquela cidade mantinha ainda vivos os traços arquitetónicos e urbanísticos, mas também a respiração da presença e do domínio islâmico (FERNANDES, Hermenegildo (2010) – D. Sancho II. Lisboa: Temas e Debates, pp. 15-24). Porém, mesmo essa simbologia, brilhante na aparência, apresentava laivos decadentistas. Por um lado, passaria à posteridade representado como um rei infeliz, antítese absoluta daquele antepassado que o ladeava e que certa crónica recordava como imperador (a Chronica Adefonsi Imperatoris), e que trazia também à memória Afonso VI, o imperator totius Hispanie, que em 1085 conquistara aquela cidade (cf. REILLY, Bernard (1988) – The Kingdom of León-Castilla under King Alfonso VI, 1065-1109. Princeton: Princeton University Press, pp. 136-148). Por outro lado, a própria urbe entraria numa certa penumbra quando, no final daquele ano de 1248, os muros de Sevilha se renderam às forças da Hispânia cristã. Curiosamente, o mesmo aconteceria à cidade de Coimbra, a cidade que Sancho preferira a todas as outras no reino (num contexto e por razões obviamente diferentes), quando, pouco tempo depois, é ultrapassada por Lisboa na preferência de Afonso III (DIAS, João Alves (1980) – “Itinerário de Afonso III (1245-1279)”. Arquivos do Centro Cultural Português, XV, Separata, pp. 460-463).
23 A Crónica de Portugal de 1419 (1998), ed. por Adelino de Almeida Calado. Aveiro: Universidade de Aveiro (pp. 112-113), seguindo o Gosuini de Expugnatione Salaciae Carmen (ver em particular PEREIRA, Maria Teresa (1996) – “Memória Cruzadística do Feito da Tomada de Alcácer, 1217”. In 2º Congresso Histórico de Guimarães. Actas. vol. 2. Guimarães: Câmara Municipal de Guimarães, pp. 348-349), acrescenta uma data específica para a conquista definitiva daquela praça: 18 de Outubro de 1217. Ao contrário do que a IVª Crónica Breve refere, o rei, na prática, não gaanhou Alcácer, já que «deambula pelo reino» enquanto o ataque àquelas muralhas decorre (VILAR, Hermínia (2008) – D. Afonso II. Lisboa: Temas e Debates, p. 169), e ao longo do mês de Outubro daquele ano se encontraria entre Trancoso, Quintela e Coimbra, onde terá permanecido até ao início de Dezembro (DIAS, João Alves (1986) – “Itinerário de Afonso II (1211-1223)”. Estudos Medievais, 7, Separata, p. 43; VILAR, Hermínia (2008) – D. Afonso II. Lisboa: Temas e Debates, p. 332). Não obstante, se a lacónica referência à tomada da praça de Alcácer, ocultava, entre outras coisas a chegada de cruzados a Lisboa (entre estes homens impelidos à cruzada pelo IV Concílio de Latrão, em 1215, estaria, ao que se supõe, Gosuíno, o autor do poema anteriormente referido) e a participação de uma parte destes no assédio, não ocultava, porém, o valor simbólico daquela cidade em relação aos outros lugares. Não somente de um ponto de vista histórico, já que fora em tempos sede de uma civitas romana que manteria, grosso modo, a sua importância até ao período do domínio islâmico, o qual, após um hiato entre 1158 ou 1160 e 1191, terminaria definitivamente em 1217, mas também de um ponto de vista estratégico-militar. Pelo restauro das muralhas após a recuperação almóada dos Banū Wazīr, pela proximidade à foz do rio Sado e pelo controlo que permitia sobre todo o vale desse rio, da orla marítima da Península de Setúbal e do acesso naval a Lisboa, mas também pelo facto de ser um ponto de apoio para as incursões no sudoeste da península (como atestam as descrições dos geógrafos de língua árabe, veja-se, entre outros a descrição de Al-Idrīsī, em Geografía de España, p. 170. Ver também KHAWLI, Abdallah (1997) – “La famille des Banu Wasir dans le Garb d’al-Andalus aux XIIe et XIIIe siècles". Arqueologia medieval, 5, pp. 111-112).
24 CRUZ, António (1968) – Anais, crónicas e memórias avulsas. Porto: Biblioteca Pública Municipal, p. 146; FONSECA, Fernando Peixoto da (2000) – Crónicas breves e memórias avulsas de S. Cruz de Coimbra. Lisboa: Edição do autor, p. 118. Não terá sido Afonso II a ganhar propriamente esses outros lugares sem identificação específica, como refere o redator da crónica, mas terão sido sobretudo fruto dos avanços das ordens militares para sul. Que esses avanços territoriais não se limitaram à conquista de Alcácer pode ser deduzido, por exemplo, através de uma bula de Inocêncio III, datada de 1216, em que o papa assegura ao bispo de Évora a jurisdição sobre o território de domínio cristão entre os limites da sua diocese e a fronteira com os almóadas (MATTOSO, José (1997) – “1096-1325”. In Mattoso, J. (dir.) – História de Portugal. Vol. 2. A monarquia feudal. Lisboa: Estampa, p. 102).
25 CRUZ, António (1968) – Anais, crónicas e memórias avulsas. Porto: Biblioteca Pública Municipal, p. 146; FONSECA, Fernando Peixoto da (2000) – Crónicas breves e memórias avulsas de S. Cruz de Coimbra. Lisboa: Edição do autor, p. 118. Não deixa de ser interessante reparar como esta fonte associa a batalha travada em 1212 ao desfiladeiro do Muradal e não ao vale onde aquela teve lugar, hoje conhecido como Llano de las Américas (MONTEIRO, João Gouveia; MARTINS, Miguel Gomes; AGOSTINHO, Paulo Jorge (2012) – “Las Navas de Tolosa (1212): a Batalha dos Quatro Reis”. In Monteiro, J. G. (coord.) - Guerra e Poder na Europa Medieval. Das Cruzadas à Guerra dos 100 Anos. Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra, pp. 147-148; HUICI MIRANDA, Ambrósio (2000) – Las Grandes Batallas de la Reconquista Durante las Invasiones Africanas. Granada: Editorial Universidad de Granada, pp. 282-289). E, de igual forma, também não segue as informações transmitidas pela historiografia coeva e posterior, que referia o lugar como um ponto próximo do castelo de Navas de Tolosa, quando na verdade este se encontrava a cerca de 12km (vejam-se, a título de exemplo, a Crónica Geral de Espanha de 1344 (2009), ed. por Luís Filipe Lindley Cintra. Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda, vol. IV, p. 238, e o Livro de Linhagens do Conde D. Pedro (1980), ed. por José Mattoso. Lisboa: Academia das Ciências de Lisboa, v. I, 7C5). A Crónica de Portugal de 1419 (1998), ed. por Adelino de Almeida Calado. Aveiro: Universidade de Aveiro, p. 104, apresentará depois, com maior rigor, Afonso VIII como o que vemçeo a batalha alem do porto do Muradal, cerca do castelo que chamom as Noves.
26 O Infante Fernando de Serpa, falecido em 1246, com 28 anos, recebe o senhorio de Serpa, «na fronteira mais meridional com o Islão (…) quase como um prémio ou reconhecimento» da sua maioridade, aos 14 anos (PEREIRA, Armando (1998) – “O Infante D. Fernando de Portugal, Senhor de Serpa (1218-1246): história da vida e da morte de um cavaleiro andante”. Lusitania Sacra, 2ª série, 10, p. 100). O ano, como notou o mesmo investigador, é 1232, o ano da conquista de Serpa ao Islão, sendo possível que tenha ainda participado nas tomadas de Beja, Alvito ou Aljustrel, entre 1232 e 1234. Por seu lado, Serpa havia sido conquistada pelo ramo português da Ordem do Hospital juntamente com Moura, com direitos e vastas propriedades nesses lugares. Tratava-se de uma região na margem esquerda do Guadiana e de fronteira, não só com o território almóada, mas também com Castela, da qual nenhum acidente geográfico a separava. De tal modo que, em 1252 Afonso X, que reclamava o direito de jurisdição sobre o reino do Algarve, recebe de Afonso III a soberania sobre esse território e logo em 1253 colocará sob a alçada jurisdicional de Sevilha, entre outros lugares, Aracena, Aroche, Alfajar de Penna e Ayamonte, Moura e também Serpa, procurando assim deslocar a fronteira entre os reinos para o Guadiana (GARCIA, João Carlos (1984) – “O Baixo Guadiana – Formação de uma fronteira”. In III Colóquio Ibérico de Geografía. Barcelona, 27 Septiembre – 2 Octubre, 1983. Acta, ponencias y comunicaciones. Barcelona: Universitat de Barcelona, p. 612), com a clara exceção do reino algarvio, cujo centro de atração seria ainda a antiga Híspalis, mas afirmando também a relação de dependência do monarca e Conde de Bolonha aos herdeiros do trono castelhano-leonês (MATTOSO, José (1997) – “1096-1325”. In Mattoso, J. (dir.) – História de Portugal. Vol. 2. A monarquia feudal. Lisboa: Estampa, p. 87). Entrava assim em rota de colisão com os interesses de Afonso III, que, apesar do acordo, as continuará a considerar como suas, atribuindo foral, por exemplo, a Aroche em 1255. Com o Tratado de Badajoz de 1267, o Algarve regressa às mãos do rei português, mas a margem esquerda do Guadiana, incluindo Serpa, continuariam sob o domínio do monarca castelhano. A situação só teria uma primeira resolução em 1283, quando Afonso X doava à sua filha Beatriz os lugares de Moura, Noudar, Mourão e Serpa, uma segunda em 1295, quando D. Dinis consegue que Serpa, Moura, Aracena e Aroche lhe sejam entregues, e finalmente com o Tratado de Alcañices (1297), quando as duas primeiras ficam definitivamente no reino português (cf. GARCIA, João Carlos (1984) – “O Baixo Guadiana – Formação de uma fronteira”. In III Colóquio Ibérico de Geografía. Barcelona, 27 Septiembre – 2 Octubre, 1983. Acta, ponencias y comunicaciones. Barcelona: Universitat de Barcelona, p. 612; VENTURA, Leontina (2009) – D. Afonso III. Lisboa: Temas e Debates, pp. 171-172, 247-248; Crónica de Alfonso X (1999), ed. por Manuel González Jiménez. Murcia: Real Academia Alfonso X el Sabio, p. 19-22).
27 CRUZ, António (1968) – Anais, crónicas e memórias avulsas. Porto: Biblioteca Pública Municipal, p. 146; FONSECA, Fernando Peixoto da (2000) – Crónicas breves e memórias avulsas de S. Cruz de Coimbra. Lisboa: Edição do autor, p. 118. Tratava-se de Valdemar III da Dinamarca, com quem a Infanta Leonor casou em 1229, tornando-se Rainha. Seguia assim os passos da sua tia Berengária, que casara com Valdemar II em 1214. A Dinamarca, reino nórdico e distante na imagética popular, simbolizava aqui um conjunto de reinos europeus e de cortes com os quais os infantes de Sancho I e Afonso II haviam tecido uma «hábil teia» relacional (BRANCO, Maria João (2010) – D. Sancho I. Lisboa: Temas e Debates, p. 192; VILAR, Hermínia (2008) – D. Afonso II. Lisboa: Temas e Debates, p. 13). Também a refundição de c. 1400 da Crónica Geral de Espanha de 1344 (2009), ed. por Luís Filipe Lindley Cintra. Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda (vol. IV, p. 238) e a Crónica de Portugal de 1419 (1998), ed. por Adelino de Almeida Calado. Aveiro: Universidade de Aveiro (p. 105) transmitirão uma corruptela daquele topónimo, identificando Valdemar III como ho filho del-rey das Marchas.
28 CRUZ, António (1968) – Anais, crónicas e memórias avulsas. Porto: Biblioteca Pública Municipal, p. 146; FONSECA, Fernando Peixoto da (2000) – Crónicas breves e memórias avulsas de S. Cruz de Coimbra. Lisboa: Edição do autor, p. 118. Apesar da «profunda ligação mantida com Alcobaça e a particular devoção que o unia a esta ordem» (VILAR, Hermínia (2008) – D. Afonso II. Lisboa: Temas e Debates, p. 313), não é totalmente claro que Afonso II tenha preterido o panteão régio de Santa Cruz de Coimbra em favor do cenóbio cisterciense apenas por motivos de ordem devocional e pela relação privilegiada que mantinha com o abade daquele lugar. Com efeito, e seguindo a mesma autora, essas mesmas razões serão também insuficientes para explicar um curioso documento de 1220, em que o rei manifestava ser favorável à adoção da regra de Cister pelos crúzios.
29 CRUZ, António (1968) – Anais, crónicas e memórias avulsas. Porto: Biblioteca Pública Municipal, p. 146; FONSECA, Fernando Peixoto da (2000) – Crónicas breves e memórias avulsas de S. Cruz de Coimbra. Lisboa: Edição do autor, p. 117. Sobre a figura do Infante D. Pedro, em particular, veja-se DIAS, Isabel (2014) – “D. Pedro Sanches e a lenda dos cinco mártires de Marrocos”. In Silva, C. G. (coord.) - O imaginário medieval. Lisboa: Colibri, pp. 123-131, e sobre as relações com o irmão as diversas informações presentes no já referido estudo de Hermínia Vilar. De resto, a crónica aproveitava esta figura para estabelecer a ponte entre as relíquias daqueles mártires, Santa Cruz e a família real, iniciando a partir daqui, regressivamente até Afonso Henriques, um elogio dos que integravam o panteão régio daquele mosteiro. Vejam-se ainda, para uma contextualização do aproveitamento da imagem daqueles franciscanos em contexto português, os trabalhos de KRUS, Luís (2011) – A construção do passado medieval. Textos inéditos e publicados. Lisboa: Instituto de Estudos Medievais, pp. 133-149; DIAS, Isabel (2009) – “La légende des cinq martyrs franciscais du Maroc (1220) dans son contexte portugais”. Franciscana, XI, pp. 1-25; DIAS, Isabel (2014) – “D. Pedro Sanches e a lenda dos cinco mártires de Marrocos”. In Silva, C. G. (coord.) - O imaginário medieval. Lisboa: Colibri. pp. 123-131.
30 Sobre esta figura ver essencialmente BARROCA, Mário (2013) – “As quatro faces de Rodrigo Sanches”. Portugália, 34, pp. 151-189. Curiosamente, neste ponto do texto, o cronista referirá mais descentes e parentes de Sancho I do que até aqui vinha fazendo ou faria depois, mas referirá apenas o local de sepultura daqueles que escolheram Santa Cruz e São Salvador de Grijó, outra comunidade que seguia a regra de Santo Agostinho.
31 Sobre esta Infanta veja-se PIZARRO, José Augusto (1997) - Linhagens medievais portuguesas: genealogias e estratégias (1279-1325). Porto: Edição do autor, vol. I, p. 165, e BRANCO, Maria João (2010) – D. Sancho I. Lisboa: Temas e Debates, p. 140. Encontramos aqui um exemplo daquilo que antes dissemos, já que a fonte apenas refere que Sancha entrou no moesteiro de Lorvão (CRUZ, António (1968) – Anais, crónicas e memórias avulsas. Porto: Biblioteca Pública Municipal, p. 145; FONSECA, Fernando Peixoto da (2000) – Crónicas breves e memórias avulsas de S. Cruz de Coimbra. Lisboa: Edição do autor, p. 117), de obediência cisterciense, ao passo que, no caso da Infanta Branca que morreu em a Auga d’Alfaxara (Guadalajara), acrescenta a deposição do corpo em Santa Cruz.
32 A referência, algo desconexa da restante narrativa por se reportar a um outro reinado e a um tempo futuro que o redator poderia eventualmente ter acrescentado adiante (desde logo no reinado de Afonso III, já que neste quase não fazia referência a esse acontecimentos) e até por se revelar um tanto hiperbólica, serviria para reforçar as ligações de Sancho I aos monarcas castelhano-leoneses e às sua conquistas territoriais no al-Andalus. Recuperava, para tal, um otimismo providencialista que regressava à batalha das Navas de Tolosa para a tomar como um ponto de viragem na «reconquista», que levaria à conquista das principais urbes da Andaluzia. Sancho I, o filho do «fundador» e soterrado em Santa Cruz com ele, era assim destacado como o antepassado legítimo dessas conquistas por também ele ter conseguido avanços significativos na direção do Algarve, fazendo-se embora tábua rasa das perdas territoriais frente a al-Mansur (BRANCO, Maria João (2010) – D. Sancho I. Lisboa: Temas e Debates, pp. 153-191).
33 CRUZ, António (1968) – Anais, crónicas e memórias avulsas. Porto: Biblioteca Pública Municipal, p. 143; FONSECA, Fernando Peixoto da (2000) – Crónicas breves e memórias avulsas de S. Cruz de Coimbra. Lisboa: Edição do autor, p. 115. A obra iniciar-se-ia em 1131, mas só ficaria concluída em 1132, data que esta crónica conserva. Seguindo MATTOSO, José (2014) – D. Afonso Henriques. Lisboa: Temas e Debates, p. 113, os crúzios «fizeram sempre da sua ligação ao fundador da nacionalidade um motivo de honra, e consideraram sua incumbência e responsabilidade cultivar a sua memória». A eles se deveram, de facto, os primeiros registos sobre Afonso Henriques e era de algum modo esse legado e essa ligação que os cónegos de Santa Cruz pretenderiam reforçar com textos como este. Tratar-se-ia não apenas, por isso, de uma relação estritamente espiritual, mas também memorialística. Sobre a importância de Santa Cruz enquanto centro de apoio à soberania de Afonso Henriques e seus descentes, assim como pilar espiritual e cultural, veja-se, para além da síntese de MATTOSO, José (2014) – D. Afonso Henriques. Lisboa: Temas e Debates, pp. 112-124, também o estudo de MARTINS, Armando (2003) – O mosteiro de Santa Cruz de Coimbra na Idade Média. Lisboa: Centro de História da Universidade de Lisboa, pp. 730-732, 834-840.
34 Com efeito, Coimbra será, a partir de 1131, o local privilegiado de residência daquele monarca. Para além das implicações práticas desse facto (como o afastamento da nobreza senhorial nortenha, a fixação numa estrutura urbana que lhe permitia opor a sua autoridade às estruturas senhoriais, obter o apoio de cavaleiros-vilãos, a possibilidade de manter e reforçar a atividade guerreira, mas também de se ligar a uma cultura moçárabe, em muito distinta daquela que predominava a norte do Douro; cf. MATTOSO, José (2014) – D. Afonso Henriques. Lisboa: Temas e Debates, pp. 105-111), ao redator interessariam sobretudo as de ordem simbólica, já que tanto o mosteiro de Santa Cruz como a própria cidade se viam secundarizadas, na primeira metade do século XIV, em detrimento de outras latitudes e de outras fontes de espiritualidade, como vimos.
35 A referência a Astorga surgia já na Primeira Crónica Portuguesa e é possível que tivesse origem numa memória bastante anterior. Com efeito, essa fora não só a cidade onde o Conde D. Henrique falecera, como a mesma que lhe tinha sido entregue pela rainha D. Urraca juntamente com Zamora, em 1110, e representava ainda o limite do território longamente disputado, sobretudo, entre o reino de Portugal e o de Leão (MATTOSO, José (2014) – D. Afonso Henriques. Lisboa: Temas e Debates, p. 34, 239).
36 Tem sido bastante disputada a adesão do castelo de Santa Maria da Feira à revolta de Afonso Henriques. Passamos brevemente em revista os dados da questão. Sobre o apoio do castelo de Neiva ao futuro rei parece haver poucas dúvidas, já que aquele emitiu uma carta de couto respeitante ao mosteiro de Manhente, cerca de Neiva (BARROCA, Mário (2003) – “O arco pré-românico do mosteiro de Manhente (Barcelos)”. Revista da Faculdade de Letras - Ciências e técnicas do património, 2, pp. 666-667; MATTOSO, José (2014) – D. Afonso Henriques. Lisboa: Temas e Debates, pp. 61-62; Documentos Régios. Documentos Medievais Portugueses (1958), ed. por Rui de Azevedo. Lisboa: Academia Portuguesa da História, doc. 86bis), meses antes da batalha de São Mamede, em Junho de 1128. As dúvidas levantam-se então em torno desse documento, já que o infante refere aí estar no castelo de «Faria» (a cerca de 20km de Neiva), e da informação transmitida pela IVª Crónica Breve. De um lado, FERNANDES, Armando de Almeida (1978) – Guimarães, 24 de Junho de 1128. Nos 850 anos da batalha de S. Mamede. Barcelos, interpreta a referência ao topónimo «Feira» nesse texto como uma deturpação de Faria, enquanto que, por outro lado, José Mattoso apresenta argumentos no sentido de que não só Faria teria aderido à revolta de Afonso Henriques, como muito possivelmente também a Feira de Santa Maria o tivesse feito (MATTOSO, José; KRUS, Luís; ANDRADE, Amélia (1989) – O Castelo e a Feira. A Terra de Santa Maria nos séculos XI a XIII. Lisboa: Estampa, pp. 145-150; MATTOSO, José (2014) – D. Afonso Henriques. Lisboa: Temas e Debates, p. 62). A mesma questão se coloca quanto ao redator, portanto, já que este tanto pode ter optado por elidir o nome de Faria e de sublinhar apenas a Feira, como surge também na Crónica Geral de Espanha de 1344 (2009), ed. por Luís Filipe Lindley Cintra. Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda (vol. IV, p. 216), como pode ter originado ou ter-se baseado num erro textual.
37 Também Guimarães é, na crónica, algo secundarizada em relação a Coimbra, excetuando o caso do cerco de Guimarães. Sobre a sua importância e para uma análise desse acontecimento, ver MATTOSO, José (2014) – D. Afonso Henriques. Lisboa: Temas e Debates, pp. 58-61, onde se pode ler que «representa a primeira confrontação dos nobres de Entre Douro e Minho (…) com o rei de Leão e Castela, o que quer dizer que este passou a ter de defrontar o conjunto da nobreza regional portucalense. (…) Em segundo lugar significa que, a partir dali, o infante passou a desempenhar um papel preponderante na evolução dos acontecimentos do condado. Em terceiro lugar, (…) o problema da relação política do condado com o rei de Leão ficava, na prática, suspenso (…).» (p. 60).
38 A menção a Ourique, carregada de simbologia crística e legitimadora do título régio de Afonso Henriques, pode bem ter sido recuperada da hagiográfica Vida de São Teotónio (2013), ed. por Aires Nascimento. Lisboa: Colibri, pp. 150-151, que aponta a vitória contra cinco reis dos infiéis in campo Haulich. MATTOSO, José (2014) – D. Afonso Henriques. Lisboa: Temas e Debates, pp. 157-166, sintetiza o contexto, a memória histórica e procura aclarar o que poderá ter de facto acontecido, inclinando-se para a hipótese de um grande fossado no interior do Alentejo, em 1139, para afirmação da superioridade das forças portuguesas.
39 Reforçando assim o valor simbólico da antiga capital do reino suevo e sede episcopal enquanto indiscutível parte do legado territorial de Afonso Henriques e pilar fundamental da sua governação, personalizada pelo arcebispo João Peculiar (ver MATTOSO, José (2014) – D. Afonso Henriques. Lisboa: Temas e Debates, pp. 185-188).
40 Recordava-se para esse topónimo sobretudo o chamado «recontro de Valdevez», que oporia Afonso Henriques ao seu primo Afonso VII e que terminaria com um pacto de tréguas entre ambos. Vejam-se duas análises diferenciadas, mas complementares, das memórias e das motivações políticas desse acontecimento em KRUS, Luís (2011) – A construção do passado medieval. Textos inéditos e publicados. Lisboa: Instituto de Estudos Medievais, pp. 229-234, e MATTOSO, José (2014) – D. Afonso Henriques. Lisboa: Temas e Debates, pp. 191-193.
41 CRUZ, António (1968) – Anais, crónicas e memórias avulsas. Porto: Biblioteca Pública Municipal, p. 141; FONSECA, Fernando Peixoto da (2000) – Crónicas breves e memórias avulsas de S. Cruz de Coimbra. Lisboa: Edição do autor, p. 113. É possível que a forma como se faz referência ao medo de Afonso VII de perder Toledo pretendesse, em tese, mostrar o estado periclitante em que aquela derrota perante Afonso Henriques o deixara, exaltando assim o feito guerreiro do rei que a seguir foisse logo daly. E gaanhou todo Purtugall per ssas armas como sse fosse de mouros.
42 Cuja conquista antecede a de Lisboa e seria transmitida num curioso texto, o Quomodo sit capta Sanctaren a rege Alfonso comitis Henrici filio, em que o autor se identifica com o próprio rei, e que terá sido redigido possivelmente no Mosteiro de Santa Cruz (MATTOSO, José (2014) – D. Afonso Henriques. Lisboa: Temas e Debates, pp. 237-238; PEREIRA, Armando (1996) – “A conquista de Santarém na tradição historiográfica portuguesa”. In 2º Congresso Histórico de Guimarães. Actas. vol. 5. Guimarães: Câmara Municipal de Guimarães, pp. 301-302). Mas para além da sua importância estratégica para a progressão em direção a sul, Santarém representava de igual modo um bastião do moçarabismo, à imagem de Coimbra, e, portanto, uma ajuda possível à conquista ou obtenção da cidade por meios mais diplomáticos do que aqueles que o Quomodo sit capta Sactaren transmitia.
43 Esse suposto irmão, a que a crónica chama Pedro Afonso levanta sérios problemas de crítica textual, desde logo por não existir nenhum registo de um suposto irmão de Afonso Henriques entre 1147 e 1174. Poderia, como aponta MATTOSO, José (2014) – D. Afonso Henriques. Lisboa: Temas e Debates, p. 234, ser um irmão (frater) religioso e não de sangue, cuja trasladação dos ossos ocorreria em 1293 para Alcobaça, data aproximada daquela em que se escrevia o texto de Santa Cruz em apreço e que aí teria fixado uma falsa memória ou pelo menos uma memória deturpada.
44 Documentos Régios. Documentos Medievais Portugueses (1958), ed. por Rui de Azevedo. Lisboa: Academia Portuguesa da História, doc. 243.
45 CRUZ, António (1968) – Anais, crónicas e memórias avulsas. Porto: Biblioteca Pública Municipal, p. 144; FONSECA, Fernando Peixoto da (2000) – Crónicas breves e memórias avulsas de S. Cruz de Coimbra. Lisboa: Edição do autor, p. 116. Causa alguma perplexidade este elogio a Santa Maria de Alcobaça sobretudo vindo de uma instituição que com ela disputava o panteão régio e com a qual criaria algumas tensões num horizonte temporal próximo em que se copiava a crónica (Martins, 2003, pp. 514-520). Será isso uma marca da utilização algo acrítica de fontes anteriores, da cópia integral do texto da Crónica Portuguesa de Espanha e Portugal de 1341-1342 (de que esta dependia) ou uma marca da influência de fatores externos, isto é, de promotores do texto no séc. XIV? Não nos é possível dar uma resposta definitiva, mas cabe-nos lembrar que essa informação não surge nem na Primeira Crónica Portuguesa (Moreira, 2008, p. 135), nem no Livro de Linhagens do Conde D. Pedro (vol. I, 7B8), nem na Crónica Geral de Espanha de 1344 (2009), ed. por Luís Filipe Lindley Cintra. Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda (vol. IV, p. 233) nem ainda nas informações recolhidas por Acenheiro (Chronicas dos Senhores Reis de Portugal, p. 30-31), que apenas apontam a construção do mosteiro. A hipótese apontada por Moreira (2008, p. 88) é a de que essas informações teriam sido acrescentadas precisamente no mosteiro de Alcobaça ao longo do processo de transmissão da crónica até hoje e, portanto, num período posterior a 1340.
46 Apesar das fontes coevas que chegaram até nós sobre a tomada de Lisboa, a fonte não se alonga na exposição desse facto que teria uma importância decisiva na campanha militar de Afonso Henriques. Sobre a tomada de Lisboa através das fontes narrativas veja-se a síntese de Mattoso (2014, pp. 239-241).
47 CRUZ, António (1968) – Anais, crónicas e memórias avulsas. Porto: Biblioteca Pública Municipal, p. 144; FONSECA, Fernando Peixoto da (2000) – Crónicas breves e memórias avulsas de S. Cruz de Coimbra. Lisboa: Edição do autor, p. 116. Ao contrário do que se disse do elogio feito a Alcobaça, o elogio ao mui rico mosteiro de São Vicente de Fora surgia já na Primeira Crónica Portuguesa (MOREIRA, Filipe Alves (2008) - Afonso Henriques e a primeira crónica portuguesa. Porto: Estratégias Criativas, p. 135) e depois, por exemplo, no Livro de Linhagens do Conde D. Pedro (1980), ed. por José Mattoso. Lisboa: Academia das Ciências de Lisboa, vol. I, 7B8. A ligação, neste caso, era mais óbvia, dado que o rei entregara aquele cenóbio a cónegos regrantes portugueses, possivelmente vindos de Grijó, como refere o Indiculum fundationis monasterii beati Vicentii Vlixbone (2001), ed. por Aires Nascimento, In A conquista de Lisboa aos mouros. Lisboa: Vega, pp. 192-197.
48 Afonso Henriques tomaria posse de Évora em 1166, quando lhe concede carta de foral (Documentos Históricos da Cidade de Évora (1998), ed. por Gabriel Pereira. Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda, pp. 17-19), embora a sua conquista tenha acontecido entre Setembro e Outubro de 1165 pela mão de Geraldo Sem-Pavor (que a terá vendido ao rei; MATTOSO, José (2014) – D. Afonso Henriques. Lisboa: Temas e Debates, p. 299), e promove a restauração da diocese. Filiava aquele espaço simultaneamente no arcebispado de Braga e no espaço de influência afonsina, apropriando-se dele política e religiosamente (PEREIRA, Armando (2008) – Geraldo Sem Pavor. Um guerreiro de fronteira entre cristãos e muçulmanos c. 1162-1176. Porto: Fronteira do Caos, p. 52). A crónica, no entanto, colocava o rei como seu conquistador, atribuindo-lhe assim uma glória de que não tivera o proveito.
49 Esse senhorio «enquistado entre as margens do universo cristão e do islâmico, do qual o próprio Afonso Henriques poderia beneficiar, dado configurar uma forte barreira protectora do reino português em relação a futuros ataques muçulmanos (…) [configurava] a possibilidade de construir um potentado de fronteira militarizado, com vantagens negociais claras em relação aos diferentes beligerantes em presença e usufruindo dos benefícios económicos da guerra externa.» (PEREIRA, Armando (2008) – Geraldo Sem Pavor. Um guerreiro de fronteira entre cristãos e muçulmanos c. 1162-1176. Porto: Fronteira do Caos, p. 54). Ao invés disso, Badajoz acabaria por ficar intimamente ligado com o volte-face do reinado de Afonso Henriques e toda a fase final da sua vida, embora ela tenha obviamente continuado depois disso (MATTOSO, José (2014) – D. Afonso Henriques. Lisboa: Temas e Debates, pp. 303-305).
50 KRUS, Luís (1994) – A concepção nobiliárquica do espaço ibérico (1280-1380). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian-JNICT.
51 Livro Velho de Linhagens (1980), ed. por José Mattoso. Lisboa: Academia das Ciências de Lisboa, p. 23.
Auteur
CIDEHUS/Universidade de Évora, Bolseiro de doutoramento FCT (SFRH/BD/145621/2019)
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